FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQUISA
CURSO DE MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS DA COMARCA DA
CAPITAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO: DESAFIOS
ORGANIZACIONAIS
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA POR
PAULO MAURÍCIO PINHEIRO MONTEIRO
E
APROVADA EM
PELA COMISSÃO EXAMINADORA
___________________________________________________________________________
ORIENTADORA: PROFª. Drª. DEBORAH MORAES ZOUAIN Doutora em Engenharia de Produção
___________________________________________________________________________
PROF. Dr. ALUIZIO LOUREIRO PINTO Ph.D. em Administração Pública
___________________________________________________________________________
DEDICATÓRIA
A Deus, por tudo.
A André, Margarida, Aírton e Iracema, avós, pelo amor, pela oportunidade do convívio, pelos exemplos, pela saudade.
A Ney e Gislene, pais, eternamente presentes como pilares de amor, sabedoria, alegria, harmonia, dedicação e apoio.
A Sylvia, esposa querida, pelo amor, harmonia, compreensão, dedicação, carinho e apoio nessa etapa de nossas vidas.
A Eduardo Germano e Conceição, sogros, pelo amor e apoio nessa jornada.
AGRADECIMENTOS
À Professora Deborah Moraes Zouain, minha orientadora, pela atenção e apoio nessa
construção especial de minha vida.
Aos Professores participantes da banca examinadora, pelas contribuições recebidas.
Aos Professores do Mestrado em Administração Pública, o reconhecimento pelos
ensinamentos e convívio neste centro de excelência.
Aos funcionários da Fundação Getúlio Vargas, pela presteza e apoio durante esse
RESUMO
O Poder Judiciário tem, cada vez mais, se destacado pelo lugar central ocupado na
arena pública. Seu papel como instituição política e como órgão encarregado da prestação
jurisdicional tem sido objeto de discussão.
Constantemente são elaborados diagnósticos a respeito de uma crise que abraça o
Sistema Judiciário. Em igual medida são propostas mudanças multifacetadas, buscando
transformar desde os trâmites processuais até mesmo o ritual de provimento dos cargos de
Juizes. Certamente estamos, desse ponto de vista, distantes do tempo em que questões de
justiça diziam respeito a um círculo fechado de bacharéis.
O debate tem se intensificado, chamando a atenção não só de juristas e operadores do
direito, mas também de congressistas, da imprensa e de representantes da sociedade civil. Até
organismos internacionais, apesar de outrora mais voltados para temas econômicos, se
inserem no debate alertando para a urgência nas reformas do Poder judiciário.
Contudo, apesar dessas mudanças e do relativo consenso da existência de uma crise,
o Sistema Judiciário continua sendo bastante desconhecido. Ainda mais com o surgimento dos
Juizados Especiais Criminais, uma nova forma organizacional surgida em 1995.
Muito do que se debate acerca desses Juizados Especiais Criminais baseia-se mais
em casos isolados do que em uma análise global, resultante da reunião de dados e de
O objetivo final dessas reflexões está centrado na análise das variáveis
organizacionais dos Juizados Especiais Criminais da Comarca da Capital do Estado do Rio de
ABSTRACT
The Judicial Authority has more and more prominence for the principal place on the
public discussion. His role performed as political institution and agency in charged of the
jurisdiction installment has been object of discussion.
Frequently diagnostics are made about a crisis that include the Judicial System. At
the same way are made diverse changes, searching transform from formalities until the ritual
of fill a job of Judge. We’re certainly, by this point of view, far from the period that the
judicial questions were corresponded to jurisconsult.
The discussion has increased, calling to order not only jurisconsult but also members
of Congress, press and of the civil organisms. Thus international organisms, despite their
economic issues, entered at the discussion being watchful to the emergency reforms to be
taken by the Judicial Authority.
However, although the changes end the relative agreement of the emerging crisis, the
Judicial System continue to be unknown. Still now with the beginning of the Juizados
Especiais Criminais, the organizational form originated in 1995.
The main core of the discussion about Juizados Especiais Criminais is centralized in
isolated cases instead of a global analysis, resulting of the join between data and observations
The final object of this dissertation is centered on the analysis of the activities of the
organizational variables of the Juizados Especiais Criminais da Comarca da Capital do Estado
SUMÁRIO
LISTA DE TERMOS E ABREVIATURAS XIV
LISTA DE TABELAS XVI
LISTA DE FIGURAS XIX
INTRODUÇÃO GERAL XX
1.1 – Introdução XX
1.2 – Objetivo Final XXII
1.3 – Questões a serem respondidas XXII
1.4 – Delimitação do estudo XXIII
1.5 – Relevância do estudo XXIII
1ª PARTE – REFERENCIAL TEÓRICO
CAPÍTULO I – Poder Judiciário – aspectos de Direito Penal
1.1.1 – Síntese histórica das idéias, escolas e tendências penais 02
1.1.1.1 – Tempos primitivos 03
1.1.1.2 – Vingança privada 04
1.1.1.3 – Vingança divina 06
1.1.1.4 – Vingança pública 07
1.1.1.5 – Direito penal dos hebreus 08
1.1.1.6 – Direito penal romano 09
1.1.1.7 – Direito penal germânico 12
1.1.1.8 – Direito penal canônico 14
1.1.1.9 – Direito penal árabe 16
1.1.1.10 – Direito penal comum 16
1.1.1.11 – Período Humanitário e Movimento Codificador 17
1.1.1.12 – Escola Clássica 18
1.1.1.13 – Escola Positiva 19
1.1.1.14 – Escola Crítica 20
1.1.1.15 – Escola Moderna Alemã 21
1.1.1.16 – Escola Penal Humanista 22
1.1.1.17 – Escola Técnico-Jurídica 22
1.1.1.18 – Escola Correcionalista 23
1.1.1.19 – Movimento de Defesa Social 24
1.1.2.1 – Direito penal indígena 24
1.1.2.2 – A legislação portuguesa 25
1.1.2.3 – A legislação brasileira no período colonial 28
1.1.2.4 – Período de dominação holandesa 30
1.1.2.5 – O Código Criminal do Império - 1830 31
1.1.2.6 – O Código Penal Republicano - 1890 34
1.1.2.7 – A Consolidação das Leis Penais - 1932 37
1.1.2.8 – O Código Penal de 1940 37
1.1.2.9 – O Código Penal de 1969 39
1.1.2.10 – A Reforma Penal de 1984 40
CAPÍTULO II – Aspectos de modelagem organizacional
2.1 –Modelo sistêmico-contingencial 42
2.2 – O modelo organizacional proposto por Jay Galbraith 46
2.2.1 – Estrutura 47
2.2.2 – Sistema de informações e processo decisório 49
2.2.3 – Sistema de recompensas 54
2.2.4 – Pessoas 54
2.2.5 – Tarefa 57
CAPÍTULO III – Procedimentos metodológicos
3.1 – Procedimentos metodológicos 61
3.2 – Limitações dos procedimentos metodológicos 63
2ª PARTE – REFERENCIAL PRÁTICO
CAPÍTULO IV – Crise e Reforma do Poder Judiciário
4.1 – A organização do Poder Judiciário na Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 64
4.1.1 – Jurisdição 66
4.1.1.1 – Função jurisdicional 66
4.1.1.2 – Órgãos da função jurisdicional 67
4.1.2 – Supremo Tribunal Federal - STF 69
4.1.2.1 – Jurisdição constitucional, Corte Constitucional e guarda da Constituição 69
4.1.2.2 – Composição do STF 71
4.1.2.3 – Competência do STF 74
4.1.3 – Superior Tribunal de Justiça - STJ 79
4.1.3.1 – Composição do STJ 79
4.1.3.2 – Competência do STJ 80
4.1.3.3 – Conselho da Justiça Federal 83
4.1.4.1 – Órgãos 83
4.1.4.2 – Tribunal Regional Federal: composição e competência 83
4.1.4.3 – Juízes Federais: organização da Justiça Federal de 1a instância -
competência 88
4.1.5 – Justiça do Trabalho 95
4.1.5.1 – Organização e competência 95
4.1.6 – Justiça Eleitoral 105
4.1.6.1 – Organização e competência 105
4.1.7 – Justiça Militar 107
4.1.7.1 – Composição e competência 107
4.1.8 – Justiça Estadual 108
4.1.8.1 – Composição e competência 108
4.1.9 – Juizados Especiais e de Paz 121
4.1.9.1 – Juizados Especiais Cíveis 121
4.1.9.2 – Juizados Especiais Criminais 125
4.1.9.3 – Juizados Itinerantes 131
4.1.9.4 – Juizados de Paz 132
4.3 – As funções essenciais à Justiça na Constituição da República Federativa do Brasil de
1988 133
4.3.1 – O Ministério Público 133
4.3.1.1 – Natureza e princípios institucionais 133
4.3.2.1 – A Advocacia-Geral da União 134
4.3.2.2 – Representação das unidades federadas 135
4.3.2.3 – Defensorias Públicas 135
4.3.3 – A Advocacia 136
4.4 – Aspectos da Reforma do Poder Judiciário 136
CAPÍTULO V – Os Juizados Especiais Criminais na Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro
5.1 – Espaço de atuação dos Juizados Especiais Criminais 138
5.1.1 – Os Juizados na estrutura organizacional do Poder Judiciário 138
5.1.2 – Instalação e funcionamento dos Juizados Especiais Criminais 140
5.2 – Análise das dimensões organizacionais dos Juizados Especiais Criminais 148
CONCLUSÕES E CONTRIBUIÇÕES 153
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 156
BIBLIOGRAFIA 164
LISTA DE TERMOS E ABREVIATURAS
ADCT/88 - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição da
República Federativa do Brasil, promulgada em 05.10.1988.
CRFB/88 - Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em
05.10.1988.
Juizados Especiais Cíveis e Criminais – nos dizeres de Silva (2001), a fim de obter
rápida solução de determinadas causas, o Governo Federal, autorizou a criação dos Juizados
de Pequenas Causas (Lei nº 7.244, de 07.11.84) e dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais
(Lei nº 9.099, de 26.08.95). Os Juizados Especiais, cujo processo, a exemplo da lei anterior
revogada, orientar-se-á pelos critérios de oralidade, simplicidade, informalidade, economia
processual e celeridade. O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação,
processo, julgamento e execução das causas cíveis de menor complexidade, assim
consideradas: as causas cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo; as
enumeradas no art. 275, II do Código de Processo Civil; a ação de despejo para uso próprio; e
as ações possessórias de valor não excedente a quarenta vezes o salário mínimo. O Juizado
Especial Criminal, provido por juízes togados e leigos, tem competência para a conciliação,
processo, julgamento e execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, assim
consideradas as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não
superior a um ano, excetuados os casos em que a lei preveja procedimento especial.
Poder Judiciário – Silva (2001) o define como constituído pelo conjunto de
autoridades, que se investem no poder de julgar, de outro modo é a designação que se dá aos
justiça; na sua missão precípua, compete aplicar as leis, vigiar sua execução e reparar, em
nome do Estado, as relações jurídicas que se tenham violado.
STF – Supremo Tribunal Federal.
STJ – Superior Tribunal de Justiça.
STM – Superior Tribunal Militar.
TA – Tribunal de Alçada.
TJ – Tribunal de Justiça.
TM – Tribunais Militares
TRE – Tribunais Regionais Eleitorais.
TRF – Tribunais Regionais Federais.
TRT – Tribunais Regionais do Trabalho.
TSE – Tribunal Superior Eleitoral.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Composição do STF, em dezembro de 2001 73
Tabela 2 Composição das Turmas do STF, em dezembro de 2001 73
Tabela 3 Comissões do STF, em dezembro de 2001 73
Tabela 4 Movimento processual do STF nos anos de 1995 a 2001 77
Tabela 5 Processos protocolados no STF por Ramo do Direito, de 1995 a 1999 77
Tabela 6 Processos de competência do Presidente -- 1995 a 2001 78
Tabela 7 Ações Declaratórias de Constitucionalidade -- 1995 a 2001 78
Tabela 8 Ações Diretas de Inconstitucionalidade -- 1995 a 2001 79
Tabela 9 Composição do STJ em junho de 2001 80
Tabela 10 Processos distribuídos e julgados no período de 1995 a 2001 82
Tabela 11 Agravos Regimentais e Embargos de Declaração julgados no período de 1995
a 2001 82
Tabela 12 Processos distribuídos e julgados nos TRF, de 1997 a 2001 86
Tabela 13 Processos distribuídos e julgados, nos TRF, em relação aos cargos providos de
juízes em 1999 87
Tabela 14 Processos distribuídos e julgados, nos TRF, em relação aos cargos providos de
Tabela 15 Processos distribuídos e julgados no 1° Grau e remetidos aos TRF de 1998 a
2000 92
Tabela 16 Processos distribuídos e julgados no 1° Grau e remetidos aos TRF em 2001
93
Tabela 17 Processos distribuídos e julgados, na Justiça Federal de 1º Grau, em relação
aos cargos providos de juízes em 1999 94
Tabela 18 Processos distribuídos e julgados, na Justiça Federal de 1º Grau, em relação
aos cargos providos de juízes em 2000 94
Tabela 19 Composição do TST em junho de 2001 99
Tabela 20 Movimentação processual do TST - 1997 a 2000 99
Tabela 21 Movimentação processual do TST - 2001 100
Tabela 22 Processos entrados e solucionados nos Tribunais Regionais do Trabalho, de
1998 a 2000 101
Tabela 23 Processos entrados e solucionados, na Justiça do Trabalho de 1º Grau, de 1998
a 2000 102
Tabela 24 Relação, na Justiça do Trabalho de 2º Grau, de habitantes / Juiz, processos
entrados / habitantes e processos entrados / solucionados / Juiz em 2000 103
Tabela 25 Relação, na Justiça do Trabalho de 1º Grau, de habitantes / Juiz, processos
entrados / habitantes e processos entrados / solucionados / Juiz em 2000 104
Tabela 27 Composição do STM em setembro de 2001 108
Tabela 28 Tribunais de Justiça, processos entrados e julgados nos anos de 1998 a 2000
113
Tabela 29 Tribunais de Justiça, processos entrados e julgados em 2001 114
Tabela 30 Justiça Comum de 1º Grau, processos entrados e julgados nos anos de 1998 a
2000 115
Tabela 31 Justiça Comum de 1º Grau, processos entrados e julgados em 2001 116
Tabela 32 Justiça Comum de 1º e 2º Graus, processos entrados e julgados em 2000
117
Tabela 33 Número de Desembargadores, nos Tribunais de Justiça, e percentual de
vacância no ano de 2000 118
Tabela 34 Percentual do número de Juízes / Juízas, na Justiça Comum de 1º Grau, em
relação aos cargos providos, percentual de vacância e demonstrativo de Juízes em relação
à população no ano de 1999 119
Tabela 35 População, Municípios e Comarcas no ano 2000 120
Tabela 36 Juizados Especiais Cíveis e Criminais no ano de 1999 124
Tabela 37 Boletim dos Cartórios – Juizados Especiais Criminais, jul.- ago. /2002 144
LISTA DE FIGURAS
INTRODUÇÃO GERAL
1.1 - Introdução
A década que está por terminar pode ser mapeada como um período de turbulências,
na qual, segundo Motta (1998), as inovações tecnológicas e as transformações sociais
dominam a sociedade contemporânea e mudam significativamente o modo de produção e de
vida das pessoas.
A percepção desse cenário destaca duas dimensões relacionadas com o campo de
atuação do Poder Judiciário. A primeira envolve o direito do trabalho que, segundo Diniz
(2001), disciplina as relações entre empregador e empregado, caracterizadas pela sua natureza
hierárquica e permanente.
Essa questão do trabalho, é explicitada pela argumentação de Rifkin (1996) segundo
a qual as inovações tecnológicas e as forças de mercado sinalizam para um mundo com taxas
crescentes de desemprego. Mundo este na qual a reestruturação das práticas de produção e a
permanente substituição de trabalhadores humanos por máquinas, resulta na diminuição dos
vínculos empregatícios e no aumento do mercado informal de trabalho.
Nos dizeres de Nascimento (1996), a ampliação das leis trabalhistas e as exigências
econômicas do desenvolvimento do processo produtivo e da tecnologia nem sempre
coincidiram. Para o Poder Judiciário, a conseqüência principal desse cenário, indutor do
aumento dos litígios entre assalariados e as organizações para os quais trabalham, reside na
A segunda dimensão relacionada ao Poder Judiciário está centrada na proteção ao
acesso à Justiça para a composição de conflitos. Proteção esta significando uma nova visão do
direito pela acessibilidade, pela redução das custas processuais e da duração do processo e,
como proposto por Cappelletti (1991), equalização das partes, pela simplificação das regras
de produção de provas e por um juiz mais ativo e menos formal, além da própria
simplificação do direito.
A questão que se coloca é o quanto de simplificação processual no acesso à Justiça, a
sociedade deseja promover por meio do Poder Judiciário.
Nesse cenário de desafios que a modernidade coloca para o Poder Judiciário, com as
dimensões acesso à Justiça e simplificação do rito processual explicitadas, os Juizados
Especiais como resposta a tais desafios, presentemente, se encontram em uma fase de
gerenciamento da mudança na estrutura organizacional.
Os Juizados Especiais, cujas diretrizes são traçadas pelos diplomas legais e pelo
conjunto de políticas formuladas pelo Poder Judiciário, ao aderir então ao processo de ruptura
com a estrutura organizacional anterior, se coloca diante da problemática da ação gerencial
nas unidades descentralizados.
A ação gerencial nas unidades descentralizadas do Poder Judiciário, reclama por um
instrumental que permita a efetividade da gestão pois, segundo Motta (1991), o crescimento, o
desenvolvimento e a complexidade alcançados pelas organizações modernas não comportam
mais ações gerenciais baseadas exclusivamente no bom senso e experiências passadas.
O diagnóstico e a modelagem organizacional se apresenta então como instrumental
para o desenvolvimento de ações gerenciais congruentes com as diretrizes traçadas pelos
Na tentativa de se pensar a problemática da gestão das unidades descentralizadas do
Poder Judiciário com a utilização do instrumental de diagnóstico e modelagem organizacional
proposto por Jay Galbraith em Galbraith (1977), ao presente estudo caberá responder à
seguinte questão:
Considerando o cenário de desafios do processo de mudanças tecnológicas e
organizacionais dentro do qual o Poder Judiciário está inserido, em que medida as ações
relacionadas às dimensões organizacionais estrutura, pessoas, informação e processo decisório
dos Juizados Itinerantes evidenciam estarem congruentes com as diretrizes emanadas dos
diplomas legais?
1.2 - Objetivo final
Essa pesquisa tem por objetivo final identificar até que ponto as ações relacionadas
às dimensões organizacionais estrutura, pessoas, sistema de informação e processo decisório
dos Juizados Especiais Criminais podem evidenciar estarem congruentes com as diretrizes
emanadas dos diplomas legais.
1.3 – Questões a serem respondidas
Para alcançar o objetivo final da pesquisa, buscar-se-á responder às questões:
1.3.1 – O que são os Juizados Especiais Criminais na estrutura organizacional do
1.3.2 – O que fundamentou a criação dos Juizados Especiais Criminais e como vem
ocorrendo a instalação dos mesmos a partir de setembro de 1995?
1.3.3 – Estão os Juizados Criminais preparados em termos de pessoal, instalações e
equipamentos para adequar as dimensões organizacionais estrutura, pessoas, sistema de
informação e processo decisório às diretrizes emanadas da previsão legal ?
1.4 – Delimitação do estudo
A pesquisa pretende abordar, nos Juizados Especiais Criminais, cenário escolhido, a
questão das dimensões organizacionais estrutura e pessoas, apresentando os contornos mais
amplos da abordagem do tema, tais como os desafios dos processos de planejamento, de
controle, de coordenação, de relações entre as unidades e da informatização, bem como
apresentando também a contribuição do diagnóstico e da modelagem organizacional na
redução do caráter aleatório da gestão.
A relação dos gestores dos Juizados Especiais Criminais com a questão da dimensão
organizacional informação e processo decisório será mapeada por meio de construção de
variáveis que reflitam as dimensões de pessoal, instalações e equipamentos.
O corte temporal será feito em 1995, em função de ser o ano de edição da lei de
criação dos Juizados Especiais Criminais. Portanto, o período de tempo objeto da pesquisa
data de 1995 até os dias atuais.
Os Juizados Especiais, instituídos com fundamento no disposto no art. 98, inciso I,
da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, providos por juízes togados, ou
togados e leigos, têm por finalidade:
• promover a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de
menor complexidade;
• promover a conciliação, o julgamento e a execução de infrações penais de
menor potencial ofensivo;
• utilização dos procedimentos oral e sumaríssimo;
• a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro
grau nas hipóteses previstas em lei.
Com a finalidade de cumprir as atribuições legais, definidoras da missão
institucional, frente ao contexto de atuação como organização judicial, emergem várias
questões relacionadas à gestão do Juizado Especial.
A capacidade de reação rápida frente às mudanças nas legislações específicas, o
contato permanente com os jurisdicionados, a busca pela qualidade, a simplicidade nas
estruturas organizacionais, o desenvolvimento da cultura organizacional e a mobilização de
recursos humanos pela delegação são questões que se apresentam.
A relevância da pesquisa está na contribuição do entendimento de como as
dimensões organizacionais estrutura, pessoas, sistema de informação e processo decisório
Especial Criminal e também na resposta aos desafios à gestão que a modernidade impõe ao
1ª PARTE – REFERENCIAL TEÓRICO
Nesta primeira parte são identificadas as diretrizes básicas que permeiam a estrutura
do Poder Judiciário, bem como os desafios impostos à gestão do Poder Judiciário com relação
ao diagnóstico e à modelagem organizacional de suas unidades descentralizadas ou seja, os
Juizados Especiais Criminais.
CAPÍTULO I – Poder Judiciário – aspectos de Direito Penal
1.1 – – Evolução histórica do Direito Penal
Neste tópico são apresentados os principais marcos da evolução histórica do Direito
Penal até o período referente à Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 –
CRFB/88. Serão formulados os conceitos e a disposição das legislações que regularam a
função jurisdicional.
A função jurisdicional se encontra como monopólio do Poder Judiciário do Estado,
conforme o inciso XXXV do artigo 5º da CRFB/88. No entanto, conforme lembra Silva
(1999), anteriormente ao período moderno encontrava-se jurisdição que não dependia do
Estado. Os senhores feudais tinham jurisdição feudal e jurisdição baronal nas dependências do
seu feudo, os donatários das Capitanias Hereditárias no Brasil colonial faziam uso das
jurisdições civil e criminal nos territórios de seu domínio e no período monárquico nacional
A proposta deste tópico objetiva uma contribuição para o entendimento das
transformações pelas quais o Direito Penal se defrontou até a CRFB/88. Conforme lembra
Nader (1997), o Direito sempre expressou a compreensão alcançada pela sociedade em
relação ao valor da justiça, sendo o entendimento humano evolutivo em relação a esse valor.
Nesse sentido, Ihering (2000) caracteriza tal processo evolutivo pela luta constante do homem
na afirmação de seus direitos fundamentais.
1.1.1 – Síntese histórica das idéias , escolas e tendências penais
A noção de que o fato social é sempre o início na formação do Direito, mostra que o
mesmo surge então das necessidades fundamentais das sociedades humanas. Jesus(2002), ao
mostrar que essas necessidades são reguladas pelo Direito como condição à sua própria
sobrevivência, indica que o fato social, caso se mostre contrário à norma de Direito, forja o
ilícito jurídico ou o ilícito penal em sua forma mais grave. O Estado, então, estabelece normas
jurídicas formando o Direito Penal, com a finalidade de tornar invioláveis os bens que protege
e de combater o crime.
A história do Direito Penal consiste na análise do direito repressivo de outros
períodos da história da civilização, comparando-o com o Direito Penal vigente, sendo que esta
história reflete o estado social e as idéias que caracterizam-no.
As fases da história penal interpenetram-se continuamente, refletindo o estado social
e as idéias que as caracterizam, de modo a não se poder falar de uma continuidade histórica
no Direito Penal. Conforme leciona Zaffaroni (2002), pode-se reconhecer nessa história que a
As sistematizações que simplificam as etapas da legislação penal no mundo se
vinculam a teorias da história, nos dizeres de Zaffaroni (2002), que, apesar de sua
multiplicidade, fazem prevalecer a teoria progressiva. Então, uma das distinções mais comuns
que tem sido formuladas, aponta que a justiça punitiva passando por algumas etapas, as quais
podem ser resumidas, segundo Prado (2002), como:
“a) Primeira época. Crimen é o atentado contra os deuses. Pena, meio de aplacar a cólera divina; b) segunda época. Crimen é agressão violenta de uma tribo contra outra. Pena, vingança de sangue de tribo a tribo; c) terceira época. Crimen é a transgressão da ordem jurídica estabelecida pelo Poder do Estado. Pena é a reação do Estado contra a vontade individual oposta à sua.”
No mesmo sentido, Zaffaroni (2002) mostra que a vingança privada como período
primitivo, a vingança pública quando o Estado toma a seu cargo a pena, a humanização da
pena a partir do século XVIII e o período atual em que cada autor dá como triunfantes suas
próprias idéias, demonstram que o iter não é linear e que vinganças privada, pública e
tendências humanistas são termos encontrados em todas as épocas.
Observa-se que a história da legislação penal nem sempre coincide com a das idéias
penais, porque, em geral, a legislação penal recolhe elementos dos ideólogos de forma a
conformar a estrutura de poder em que está inserida, enquanto as ideologias conservam
vigentes componentes por vezes mesmo que de distantes épocas.
1.1.1.1 – Tempos primitivos
Não se pode considerar a existência de um sistema orgânico de princípios penais nos
ramo do direito surge com o homem e o acompanha no tempo, isso porque o crime, como
resultante de conflitos de interesses, qual sombra , nunca dele se afastou.
Essa era primitiva ao permear os grupos sociais com um ambiente mágico e
religioso, rotulava todos fenômenos naturais prejudiciais ao homem, tais como inundações,
pestes, secas e terremotos, como resultantes das forças divinas vingativas devido à prática de
atos que exigiam composições. Como observa Mirabete (2002), para o aplacamento da ira dos
deuses foram criados séries de proibições quais sejam, religiosas, sociais e políticas, que se
não obedecidas levavam à punição do infrator para desagravar a entidade, surgindo o crime e
a pena.
A pena, originariamente, nada mais foi do que uma vingança, pois nada mais natural
que aqueles indivíduos, que viviam conforme seus instintos, revidassem a agressão sofrida,
não se preocupando se havia algum tipo de proporção ou não com o ato previamente
praticado, nem se era justo ou não o que se estava fazendo.
1.1.1.2 – Vingança privada
A vingança privada era a reação pessoal, normalmente pela agressão, sem
intervenção ou auxílio de algum estranho. Neste período a reação à agressão deveria ser,
provavelmente, a regra. Esta poderia ser de indivíduo contra indivíduo, de seu grupo social
contra o indivíduo e grupos uns contra os outros. Como era característico, o revide não era
proporcional à ofensa, ocorrendo assim lutas violentas entre grupos e famílias.
Em contraponto, surge como uma primeira conquista nesta área, o talião. Este termo,
desproporcional com o delito cometido ou seja, segundo Pedrosa (2000), buscava-se a
identidade entre o dano e a pena a ser infligida. O talião aparece nas leis mais antigas, como o
Código de Hamurabi (Babilônia), a Lei das XII Tábuas (Roma) e o Deuteronômio (povo
hebraico).
Hamurabi, também cognominado Kamu-Rabi, rei da Babilônia, viveu no século
XXIII a.C., promulgou o Código de Hamurabi, que como visto em Lima (1983), teve
repercussão importante para a história dos direitos babilônicos, asiático e hebreu; no capítulo
I, art. 1, tem-se que “se um homem livre acusou outro homem livre e lançou sobre ele suspeita
de morte, mas, não pôde comprovar, seu acusador será morto”.
Terentilo Arsa, tribuno do povo, conforme mostra Lima (1983), foi quem porfiou
durante uma dezena de anos e promoveu a medida de onde surgiu a Lei das XII Tábuas, nos
comícios dos anos 303 e 304 a.C.. Esse esforço mudou o acesso ao conhecimento das regras
de direito que, se antes era privilégio dos nobres e patrícios devido à complexidade, depois da
luta contra o senado romano passou a ser acessível ao discernimento da plebe. Segundo
Pedrosa (2000), afora a presença do talião, a Lei das XX Tábuas traz exemplos de diversos
institutos adotados no Brasil, tal como o do horário das sessões de julgamento da 1ª instância.
Uma outra conquista importante, segundo Mirabete (2002), foi a compositio, ou
composição, onde a ofensa era satisfeita mediante uma indenização em moeda, gado, vestes,
armas, ou seja, em espécie, pois aquele que ofendeu comprava do ofendido ou da família o
direito de vingança, assegurando-lhe o afastamento do castigo mediante a compra de sua
liberdade.
Nader (1997) destaca que com a compositio tem-se a criação do processo judicial,
aplicadas. Tem-se ainda que a composição foi adotada, por exemplo, no Código de Hamurabi,
no Pentateuco, no de Manu (Índia) e no Direito Germânico, podendo-se afirmar que ela
permanece até hoje entre os diversos povos sob várias formas, dentre as quais indenização,
multa e dote.
1.1.1.3 – Vingança divina
Essa fase da vingança divina, como acentua Mirabete (2002), deve-se à influência
decisiva da religião na vida dos povos antigos. Se caracteriza pelo direito penal religioso,
teocrático e sacerdotal, onde um dos principais Códigos é o de Manu, na Índia. Para esse
código, situado entre os séculos XIII a.C. e V a.C., que tinha por intuito a purificação da alma
do criminoso, pelo do castigo, de forma a alcançar a beatitude, Zaffaroni (2002) destaca que a
pena cumpria uma função eminentemente moral, além do próprio texto destacar adequada
importância aos motivos e distinguir o dolo da culpa e o caso fortuito.
A vingança divina era ora um poder social capaz de impor aos homens normas de
conduta e castigo, ora um princípio onde o que domina a repressão é a satisfação da divindade
que foi ofendida pelo crime. Este era punido com rigor, anteriormente com certa crueldade,
pois o castigo deveria estar correspondente à grandeza do deus ofendido.
Além do castigo ser severo, com penas severas, cruéis e desumanas, como garantia
desse direito ele deveria ser interpretado e aplicado pelos sacerdotes pois, segundo Mirabete
(2002), por delegação divina, somente eles poderiam interpretar os delitos e garantir a
1.1.1.4 – Vingança pública
O objetivo deste período, na visão de Mirabete (2002), era garantir a segurança do
príncipe ou soberano, por meio de uma pena, que também era cruel e severa, tendo como
finalidade intimidar todos aqueles que tivessem a intenção de cometer o mesmo delito já
praticado por outro, sabendo qual seria a sua punição.
Na Grécia o crime e a pena ainda tinham um sentido religioso. Todavia seus filósofos
e pensadores haveriam de influir na concepção do crime e da pena. Aristóteles, conforme
visto em Reale (1996), além da distinção entre o justo por natureza e o justo por convenção e
da análise das diversas formas de justiça, elabora o problema da justiça como bilateralidade.
Bilateralidade esta como uma espécie de proporção de homem para homem, de modo a não
haver uma justiça de um homem para consigo mesmo. Nader (1997) destaca também que
Aristóteles classificou a justiça em duas espécies básicas: a distributiva e a comutativa. A
distributiva se configuraria com a distribuição de bens, recompensas de modo proporcional ao
mérito de cada pessoa; a comutativa se apresentaria nas relações de troca consistidas na
igualdade entre os quinhões de recebimento e de entrega, além de se subdividir em voluntária,
quanto aos contratos, e involuntária, quanto aos delitos na qual os juízes igualavam as coisas
mediante penas.
Platão, mostrado por Nader (1997) nas Leis, aceitou o casamento monogâmico em
todas as classes sociais, aceitou o direito de propriedade, com restrições, sobre a terra e
reconheceu que a concepção do estado sem lei, na qual aos juízes era confiada a solução justa
das questões, era inexeqüível à época. Também mostrou que os textos, quanto à lei, deveriam
ser acompanhados de exposição relativa à finalidade do ato normativo, além de antever a pena
como meio de defesa social, pela intimidação – com seu rigor – aos outros, advertindo-os a
Como nesta época os pensadores tinham muita influência no que ocorria na cidade,
não haveria de ser diferente no que diz respeito ao direito penal, suas punições e como
deveriam ser efetuadas. Os gregos dividiam o crime em público e privado, e isto era feito
conforme o interesse do Estado.
1.1.1.5 – Direito penal dos hebreus
O direito penal hebreu teve como característica mais marcante o talião. Segundo
Zaffaroni (2002), o talião possuía, para alguns juristas e teólogos medievais e posteriores, um
sentido puramente metafórico que indicava a proporcionalidade da pena, enquanto para
outros, o “olho por olho, dente por dente, sangue por sangue” tinha um sentido literal e então
aplicado entre os hebreus.
Zaffaroni (2002) mostra que considerando como fonte do direito os Dez
Mandamentos, os preceitos jurídico-penais foram elaborados e conhecidos como direito penal
mosaico. Esse direito penal foi se modificando por várias escolas de direito com a justificativa
de que Deus havia dado a Moisés uma lei escrita, juntamente com uma lei oral que havia se
perdido, exigindo-se daí a sabedoria para se deduzir as conseqüências a partir das leis escritas.
Após a legislação mosaica, o direito penal do povo hebreu evoluiu com o Talmud.
Conforme lembra Mirabete (2002), o Talmud, como suavizador dos rigores da lei mosaica,
substituiu “a pena de talião pela multa, prisão e imposição de gravames físicos, sendo
praticamente extinta a pena de morte, aplicando-se em seu lugar a prisão perpétua sem
1.1.1.6 – Direito penal romano
O direito romano oferece um ciclo jurídico completo, nos dizeres de Prado (2002),
por Roma apresentar uma verdadeira síntese da sociedade antiga que possibilita a ligação
entre o mundo antigo e o moderno. Os períodos históricos estão assim demarcados: realeza,
ou período dos reis, de 753 a 510 a.C.; república, de 510 a 27 a.C.; alto império, de 27 a.C. a
284 d.C.; baixo império, de 284 d.C. a 565 d.C.; e o período bizantino, de 565 a 1453.
Na época da fundação de Roma, em 753 a. C., a pena era utilizada com caráter
sagrado, onde a figura do soberano e do sacerdote se confundiam, onde a pena era aplicada
para acalmar a ira dos deuses, pois naquela época, tudo que acontecia, sendo bom ou ruim, era
de vontade dos deuses.
O Direito penal romano no período histórico da realeza, 753 a 510 a.C., apesar da
origem sacra assim observada também nos demais povos primitivos, estabeleceu a distinção
entre o direito e a religião. Essa distinção se fez patente, nos dizeres de Cretella Júnior (1989),
pois o jus – o que a cidade permitia que se fizesse ou seja, o que regulava as relações entre os
homens sob a sanção do Estado – não se confundia com o fas – aquilo que era permitido pela
religião ou pela vontade dos deuses.
Nesse período dos reis romanos, a organização jurídica formulava o Direito como
consuetudinário, rígido, formalista e solene. Prado (2002) mostra que a figura do pater
familias, patriarca, se destacava pelos poderes quase ilimitados sobre todos os seus
dependentes, mulheres, filhos e escravos. Detinha sobre eles o jus vitae et necis, direito de
vida e de morte, como pode ser visto em Lima (1983) na Lei das XII Tábuas, na Tábua
Quarta, item 2: “O pai terá sobre os filhos nascidos de casamento legítimo o direito de vida e
No período histórico republicano, 510 até 27 a.C., a religião e o Estado se separaram,
pois até aquele momento a religião dominava, com certos métodos coercitivos, a tudo e a
todos. Isso se devia ao fato de que os sacerdotes, os intermediários entre os deuses e o povo,
conseguiam controlar a população e o Estado como melhor lhe conviessem, por medo ou
respeito. Com essa separação, o Estado passa a ter o domínio completo da população, sem a
interferência de qualquer outra pessoa ou instituição.
Surgiu a Lei das XII Tábuas (séc. V a.C.) que foi o primeiro código romano escrito.
Prado (2002) observa que essa lei iniciou o período de vivência legislativa com a conseqüente
limitação da vingança privada pelo talião e pela composição. Nesse aspecto do advento desse
código escrito, Zaffaroni (2002) constata que o direito se encontrava laicizado e diferenciado
quanto aos delitos públicos e delitos privados, ou de outra forma, ilícitos punidos pelo jus
publicum ,crimina, e pelo jus civile, delicta.
Os delitos públicos, como acentua Cretella Júnior (1989), são os que atingiam a
cidade, o Estado, dando como conseqüência um processo penal, iniciado por qualquer
cidadão, diante de tribunais especiais, que acarretava penas corporais, como morte e exílio, ou
pecuniárias revertidas ao Estado e não à vítima. Cretella Júnior (1989) mostra ainda que entre
os delitos públicos que eram punidos com a pena de morte, encontravam-se os crimes que
atentavam contra a segurança do Estado romano, o falso testemunho, o incêndio voluntário e
o roubo noturno de colheitas.
Os delitos privados, entendidos como ofensa ao indivíduo, como furto, injúria e
dano, autorizavam, como visto em Prado (2002), nos primeiros tempos, uma reação de cunho
privado, de modo que a repressão era confiada ao particular ofendido e a interferência estatal
se fazia presente apenas para regular seu exercício. Outrossim, Cretella Júnior (1989) dispõe
sucessivamente pelas fases de vingança privada, não regulamentada e regulamentada;
composições voluntárias; composições legais; e repressão pelo Estado.
Com o fim da República surgem as leges corneliae e as leges Juliae, criando assim
uma verdadeira tipologia de crimes, catalogando os comportamentos tidos como delituosos.
As leges corneliae eram aqueles crimes praticados nas relações entre os cidadãos. As leges
Juliae se preocupavam com os delitos praticados contra o Estado, dentre elas se destaca a de
ripatundis que falava sobre o peculato, proibindo a magistrados e funcionários de receberem
presentes.
O direito penal romano revelou seu caráter social, sendo esta uma das suas principais
características. Como relacionado por Prado (2002), as outras, não menos importantes, são as
seguintes:
• grande desenvolvimento alcançado pela doutrina da imputabilidade, da
culpabilidade e de seus excludentes;
• elemento subjetivo bem definido;
• desenvolvimento incompleto da teoria da tentativa;
• reconhecimento das causas de justificação, como a legítima defesa e o estado
de necessidade;
• pena entendida como reação pública, correspondendo ao Estado a sua
aplicação;
• distinção entre crimina publica, delicta privata e a previsão dos delicta
Segundo Prado (2002), apesar de conhecerem diversos elementos do direito penal, os
romanos não operaram uma sistematização dos institutos penais. De modo que os elementos
são apenas citados mas não definidos pelos juristas, como por exemplo: conhecem o nexo de
causalidade, mas não o definem; punem a tentativa, mas não a definem; conhecem o dolo, a
culpa e o caso fortuito.
Por outro lado, sem prejuízo do entendimento de Prado (2002), pode-se afirmar que o
direito penal romano, encontrado no Corpus Juris Civilis de Justiniano, contribuiu, no nosso
ordenamento jurídico e em muitos outros, com vários ensinamentos, dentre os quais: o erro, a
culpa, o dolo, a imputabilidade, a coação irresistível e a legítima defesa.
1.1.1.7 – Direito penal germânico
O Direito germano, basicamente consuetudinário, conforme lição de Prado (2002),
delineia-se em duas fases: a época germânica, a partir da formação dos primeiros reinos, em
torno do ano 378; e a época franca, próxima ao ano 481, quando então se forma um Estado
unitário com a dinastia merovíngia.
Na época germânica antiga, o direito, entendido como uma ordem de paz, concebia o
delito como a ruptura dessa, o que amoldava a reparação à esfera privada pela sujeição à
vingança ou à composição familiar. Como mostra Prado (2002), a reação à perda da paz, por
crime público ou ofensa para toda a comunidade, autorizava qualquer pessoa a se vingar do
agressor, inclusive podendo matá-lo. Sendo um crime privado, o infrator era entregue à vítima
ou a seus parentes, para que estes pudessem exercer seu direito de vingança. Essa política
criminal, que se representava uma verdadeira guerra familiar, evoluiu para um direito pessoal
Prado (2002) destaca que na época franca, os reis realizaram a idéia de que o Direito
não era somente um costume popular dedicado aos deuses, mas também de vontade do
Estado, sendo, então, os primeiros a ter uma política criminal consciente, como metódica
repressão ao crime.
A materialização dessa política indicava um sistema de composição judicial que
possuía três espécies principais: compreendia o Wehrgeld, ou seja, a indenização do dano, um
verdadeiro ato de submissão do ofensor ao ofendido; compreendia também a Busse, que era o
preço, a soma paga ao agredido ou sua família, na intenção de comprar o direito de vingança
destes; e o Fredus, que era o pagamento ao chefe tribal, ao tribunal, ao soberano com preço da
paz. A composição suprimia a vingança, e por sofrer mutações durante a história, ela deu
origem à multa, que passou a integrar o sistema das panas, e à indenização civil de caráter
jurídico-privado.
Uma característica destacada do direito germânico por Prado (2002) é a sua
objetividade, onde o importante é o elemento objetivo, o resultado alcançado. A
responsabilidade penal é objetiva pelo evento ou pelo dano material. Punia-se o dano sem
levar em conta se o fato era resultante de dolo, culpa ou caso fortuito, não sendo punida a
tentativa.
Outra característica de relevo, nos dizeres de Zaffaroni (2002), é a da tendência ao
restabelecimento da paz social pela via da reparação, com uma função reparadora do bem
1.1.1.8 – Direito penal canônico
A formação do direito penal canônico, um ordenamento jurídico pertencente à Igreja
Católica Apostólica Romana, foi baseada em várias fontes que sintetizaram o conceito de
pena dos romanos, público, e o dos germanos, privado. Esse direito surgiu recompilado no
século XV no Codex Juris Canonici.
Outra fonte canônica, citada em Prado (2002), era os Libri poenitentiales, os livros
penitenciais, instruções dadas aos confessores para administrar o sacramento da penitência e
nos quais estavam incluídas aquelas que deviam ser impostas aos diversos delitos e pecados; o
Concílio Cabilonense, em 813, repudiou e eliminou por completo os livros penitenciais,
substituindo-os por penitências impostas segundo os cânones ou as Escrituras Sagradas.
Observa-se que o novo Código de Direito Canônico foi promulgado pelo Papa João Paulo II,
em 1983.
O cristianismo influenciou as disposições da legislação penal, a partir da liberdade de
culto concedida pelo imperador romano Constantino, no ano 313, e acentuando-se quando da
declaração de única religião do Estado, feito pelo imperador romano Teodósio I em 379. Com
a conversão no ano 496 e o batismo no ano 499 do rei dos francos Clodoveu, a religião cristã
entra na monarquia franca, dando lugar a uma jurisdição eclesiástica.
O direito canônico se opunha à influência da força como prova judiciária. Essa lei
penal da Igreja, como acentua Prado (2002), teve grande importância por dois motivos: o
primeiro foi devido ao fato de que as tradições jurídicas romanas entraram, em definitivo, na
sociedade ocidental; e, em segundo, contribuiu para abrandar as práticas brutais dos povos
Prado (2002) destaca que nos primeiros períodos, o direito penal canônico teve um
caráter disciplinador, e depois, à medida que o poder estatal se enfraquecia, passava a
abranger religiosos e leigos. De forma que a jurisdição eclesiástica possuía duas divisões:
ratione personae, estabelecia que, em qualquer delito, o religioso seria julgado por um
tribunal da Igreja; e ratione materiae, na qual se firmava a competência eclesiástica, em razão
da matéria, mesmo que o crime fosse praticado por um leigo.
Em linhas gerais, as penas eram vistas como uma justa retribuição tendo como
propósito: poenae medicinales, o arrependimento e a correção do delinqüente; poenae
expiatoriae, o restabelecimento da ordem social e a exemplaridade da punição. Conforme
visto em Prado (2002), os tribunais eclesiásticos não aplicavam a pena capital, ecclesia
abhorret a sanguine, e sim encaminhavam aqueles que deveriam sofrê-la aos tribunais laicos.
O advento dos tribunais do Santo Ofício, ou Inquisição, no Concílio de Latrão em
1215, demarcou o emprego da tortura em grande escala na medida em que o processo
inquisitório ao dispensar a acusação prévia, seja ela pública ou privada, autorizava as
autoridades eclesiásticas agirem conforme seus entendimentos. Nota-se que a Igreja sempre
defendeu a mitigação das penas, mas a partir do ano 1254 o papa Inocêncio IV expressamente
autorizou e mandou observar a pena de morte.
Podem ser destacadas várias contribuições do direito penal canônico, dentre as
relacionadas por Prado (2002) tem-se: especial atenção ao aspecto subjetivo do crime (nos
crimes deve-se dar relevo à vontade, não ao evento); estabeleceu contra a vingança privada, o
direito de asilo e as tréguas de Deus, humanizando as penas; combateu as ordálias,
introduzindo as penas privativas de liberdade (inspirou as penitenciárias, onde a internação
era feita em monastérios, presos em celas) em substituição às patrimoniais, possibilitando o
1.1.1.9 – Direito penal árabe
O direito penal árabe, nos períodos anteriores à Maomé, era formado, como lembra
Zaffaroni (2002), por elementos advindos de outras culturas. De sorte que vigorava, entre
outros institutos e penas, o talião, a vingança do sangue, a mutilação, o estrangulamento e o
apedrejamento.
O Alcorão amenizou a antiga lei penal, como quando se limitava a vingança, em caso
de homicídio, à mesma forma de morte infligida à vítima e não mais à morte pelo meio mais
cruel. Zaffaroni (2002) destaca que o Alcorão além de manter algumas penas da antiga
legislação penal, tais como o apedrejamento para os crimes de adultério e a amputação da
mão para os crimes de furto, também deixou aberta a alternativa da composição em
detrimento do talião e a distinção entre homicídios dolosos e culposos.
1.1.1.10 – Direito penal comum
Como observa Prado (2002), o direito penal comum é resultante da fusão do direito
romano, do direito germânico, do direito canônico e dos direitos nacionais. O renascimento
dos estudos de direito romano teve como efeito principal restaurar na Europa o sentimento do
direito, de sua dignidade, de sua importância para assegurar a ordem e o progresso social.
Nessa época o movimento de recepção do direito romano, ou seja o trabalho dos
comentadores dos textos romanos à luz do direito canônico e dos direitos locais, originou as
escolas dos glosadores (do ano 1100 ao ano 1250) e dos pós-glosadores (do ano 1250 ao ano
1450). Zaffaroni (2002) recorda a influência desses “práticos” ou “positivistas jurídicos” na
Prado (2002) nota que ainda nesse período histórico do século XII ao século XVIII,
importantes construções surgidas com a recepção do direito romano no campo legislativo
sofreram influência direta daqueles comentaristas, tais como as surgidas na: Espanha, com a
Siete Partidas del Rey Don Alfonso el Sabio (no ano 1256); Áustria, com a Constitutio
Criminalis Theresiana (no ano de 1768); Alemanha, com a ConstitutioCriminalis Carolina
(no ano de 1532); Itália, com a CostituticionesSicilianas (no ano de 1231) e a Costituticiones
Piamopntesas (no ano de 1770); e França, com a Ordonnance Criminelle de Luis XIV (no
ano de 1670).
O processo penal do Antigo Regime, conforme lecionado por Prado (2002), tinha por
intuito a condenação do acusado em detrimento de sua função de garantia. A legislação penal
dessa época se caracteriza então pela crueldade nas execuções das penas, que eram, na
maioria das vezes, corporais e aflitivas, tendo como objetivo apenas a vingança social e a
intimidação.
Foi somente após a Revolução Francesa, que o Direito Criminal perde o seu caráter
de desumanidade. Prado (2002) registra que Voltaire chamava os magistrados de seu tempo
de “bárbaros de toga”, devido à crueldade usada por estes sobre os criminosos.
1.1.1.11 – Período Humanitário e Movimento Codificador
O Iluminismo, surgido no século XVIII, foi o responsável pela reforma nas leis e na
justiça penal. No decorrer do Iluminismo surge o denominado Período Humanitário do direito
penal, movimento que pregou a reforma das leis e da administração da justiça penal no fim do
século XVIII. Os temas em torno dos quais se desenvolve a nova ciência são, sobretudo, os do
Zaffaroni (2002) destaca que as idéias do despotismo ilustrado ou ainda, racionalistas
do século XVIII manejadas por reis e senhores autocratas, produziram uma série de reformas
no campo penal inspiradas em Beccaria. Este autor italiano Cesare Bonessana, Marquês de
Beccaria, em 1764 publicou o livro ‘dos delitos e das penas” inspirado, como mostra Prado
(2002), nas concepções de Montesquieu, Rousseau, Locke e Helvétius. Demonstrando a
necessidade de reforma das leis penais, Beccaria (2001) propõe como novo fundamento à
justiça penal um fim utilitário e político que deve, porém, ser sempre limitado pela lei moral.
Mirabete (2002) resgata Beccaria como quem tendo firmado em sua obra os postulados
básicos do direito penal moderno, como por exemplo o da idéia da estrita legalidade dos
crimes e das penas: “(...) Só as leis podem fixar as penas, não se permitindo ao juiz
interpretá-las ou aplicar sanções arbitrariamente”.
Prado (2002) ressalva que os ideais reformistas contribuíram para o início do
Movimento Codificador, que foi uma ampla mudança legislativa a partir do final do século
XVIII : “(...) A codificação, além de dar certeza ao direito, também exprime uma necessidade
lógica, por meio da qual são sistematizados princípios esparsos, facilitando a pesquisa, a
interpretação e a aplicação das normas jurídicas.”
1.1.1.12 – Escola Clássica
Prado (2002) referencia o século XIX como marco do surgimento de inúmeras
correntes de pensamento estruturadas de forma sistemática, que são as escolas penais
definidas como “o corpo orgânico de concepções contrapostas sobre a legitimidade do direito
A Escola Clássica pode ser dividida em dois grandes períodos: o filosófico ou
teórico, em que pontuou Beccaria como o precursor do direito penal liberal; e o jurídico ou
prático, em que o grande nome foi Carrara na dogmática penal. Mirabete (2002) destaca que
para essa Escola, em relação ao direito penal, deve-se utilizar o método dedutivo ou
lógico-abstrato e não o experimental, próprio das ciências naturais.
Prado (2002) relaciona os postulados basilares dessa Escola, dentre os quais:
“a) o Direito tem uma natureza transcendente, segue a ordem imutável da lei natural: o Direito é congênito ao homem porque foi dado por Deus à humanidade desde o primeiro momento de sua criação, para que ela pudesse cumprir seus deveres na vida terrena. O Direito é a liberdade. Portanto, a ciência criminal é o supremo código da liberdade, que tem por objeto subtrair o homem da tirania dos demais, e ajudá-lo a livrar-se da tirania de si mesmo e de suas próprias paixões. O Direito Penal tem sua gênese e fundamento na lei eterna da harmonia universal; b) o delito é um ente jurídico, já que constitui a violação de um direito. É dizer: o delito é definido como infração. Nada mais é que a relação de contradição entre o fato humano e a lei (...).”
1.1.1.13 – Escola Positiva
A Escola Positivista nasce, na segunda metade do século XIX, em um contexto
dominado pela filosofia positivista, além dos estudos biológicos e sociológicos. Conforme
Prado (2002), essa Escola pode ser vista como produto do naturalismo, sofrendo influências
das doutrinas evolucionista, materialista, sociológica, frenológica, fisionômica, além dos
estudos de autores como Villari e Cattaneo. Observa-se ainda que divide-se em três grandes
• antropológica, com Cesar Lombroso; sociológica com Enrico Ferri; e
jurídica, com Rafael Garofalo.
Pode-se assinalar como pontos nodais da Escola positiva, segundo Mirabete (2002):
“1) o crime é fenômeno natural e social, sujeito às influências do meio e de múltiplos fatores, exigindo o estudo pelo método experimental; 2) a responsabilidade penal é responsabilidade social, por viver o criminoso em sociedade, e tem por base a sua periculosidade; 3) a pena é medida de defesa social, visando à recuperação do criminoso ou à sua neutralização; e 4) o criminoso é sempre, psicologicamente, um anormal, de forma temporária ou permanente.”
1.1.1.14 – Escola Crítica
Mirabete (2002) observa que procurando-se conciliar os princípios da Escola
Clássica e o tecnicismo jurídico com a Escola Positiva, surgiram escolas ecléticas, como a
Terceira Escola, também chamada de Escola Crítica, na década final do século XIX.
Aproveitando as idéias de clássicos e positivistas, separava-se o Direito Penal das demais
ciências penais, contribuindo de certa forma para a evolução dos dois estudos. Referiam-se os
estudiosos à causalidade do crime e não à sua fatalidade, excluindo, portanto, o tipo criminal
antropológico, e pregavam a reforma social como dever do estado no combate ao crime
Prado (2002) destaca como mais importantes características da Escola Crítica: a
responsabilidade penal ter por base a imputabilidade moral; o delito ser contemplado no seu
Nota-se ter sido também preocupação dessa Escola evitar as discussões metafísicas
do livre arbítrio e do determinismo, que freqüentemente olvidavam as exigências reais e
impostergáveis do Direito Penal.
1.1.1.15 – Escola Moderna Alemã
Prado (2002) leciona que no contexto do positivismo crítico surge a Escola
Sociológica Alemã, Jovem Escola ou Escola de Política Criminal, nas últimas décadas do
século XIX. O ponto de partida desta escola reside na neutralidade entre livre-arbítrio e
determinismo, com a imposição ora da pena, com caráter intimidativo, ora de medidas de
segurança, a fim de assegurar a ordem social.
Ainda em Prado (2002), elenca-se as características que Franz Von Liszt designou
para a Escola, dentre as quais propõe a necessidade de separar o Direito Penal, que deverá
estar limitado à dogmática dos textos legais por meio do método lógico-abstrato, da
criminologia, que estuda unicamente o delito no seu aspecto externo aos fatores anteriores por
meio do método indutivo-experimental.
Em Mirabete (2002) tem-se que dessa Escola resultou uma grande influência no
tocante às realizações práticas, tais como a elaboração de leis com a criação do instituto das
1.1.1.16 – Escola Penal Humanista
A Escola Penal Humanista, surgida no início do século XX, pode ser denominada
humanista na medida em que enfoca o caráter ético do Direito, a ponto de estabelecê-lo no
mesmo patamar da moral. Essa Escola, na afirmativa de Prado (2002), descreve o delito sob
uma interpretação moral, ou seja, delito é conceituado como todo fato que viole os
sentimentos morais do homem; subentendendo-se que o ilícito penal é antecedido pelo
sentimento imoral.
Se por um lado existe o ilícito, do lado oposto existe a pena. Penalidade esta que,
segundo os parâmetros da Escola Humanista, é concebida como medida educativa. Como
conseqüência os atos praticados como estado de necessidade, legítima defesa ou suicídio
devem ser punidos como expressões violentas de egoísmo e de vingança. De modo e almeje
agregar ao valor da pena o grau de educabilidade do réu, com a finalidade de que este não se
torne um marginal à sociedade.
Nesse sentido, Zaffaroni (2002) lembra que essa Escola postulava a eliminação do
catálogo dos delitos de todos aqueles que não lesassem gravemente o sentimento moral, além
de que não se admitia a legítima defesa como causa de justifição porque fomentaria
sentimentos egoístas.
1.1.1.17– Escola Técnico-Jurídica
Segundo Prado (2002), esta Escola nasceu, no início do século XX, como uma
reação ao método positivista de estudo do Direito Penal, podendo ser vista mais como uma
propriamente jurídico da ciência do Direito Penal. A Escola Técnico-Jurídica entende que o
Direito Penal se resume como uma exposição sistemática dos princípios que regulam os
conceitos de delito e pena.
Os caracteres principais dessa Escola estão dispostos em Prado (2002), dentre os
quais podem ser destacados: o delito ser uma pura relação jurídica de caráter individual e
social; a pena constituir uma reação e uma conseqüência do crime; e o método utilizado ser
técnico-jurídico.
1.1.1.18 – Escola Correcionalista
A Escola Correcionalista, surgida em 1839 conforme mostrado por Prado (2002),
apresentou-se como uma doutrina cristã baseada na moral e no direito natural. Em Zaffaroni
(2002), tem-se que o expositor dessa Escola, Karl David Röder, propõe o Direito Penal com
uma missão moral de mostrar ao homem o caminho de sua liberdade, que se encontra em sua
aproximação de Deus.
Essa escola apresentou a teoria de que o delinqüente é um ser com uma anomalia de
vontade, um ser incapaz para o Direito, como se tivesse uma doença que o fizesse
desobedecer a norma penal, sendo o mais evidente sintoma disso o delito. A sanção penal
seria a forma de curar essa anomalia, sendo portanto um bem.
O objetivo sendo o de se corrigir a vontade má do delinqüente, então a pena deve
durar o tempo necessário, ou seja, deve ser indeterminada; Mas demonstrada sua
1.1.1.19 – Movimento de Defesa Social
Uma primeira teoria de defesa social surgiu no século XX, em torno de 1945. Prado
(2002) relaciona um de seus sistematizadores, Felipe Gramática, o qual propõe a eliminação
do Direito Penal e do sistema penitenciário vigentes, em favor de um direito de defesa social,
com a finalidade de adaptar o indivíduo à ordem social e não a sanção de seus atos.
O fundamento básico dessa corrente, segundo Prado (2002), é a defesa social pela
ressocialização do delinqüente e não pela sua neutralização. De modo que esse movimento
político-criminal, tem como linhas básicas: o exame crítico do sistema existente; aderência às
ciências humanas na realização de uma visão multidisciplinar do problema criminal; e uma
vocação humanista orientadora da reação social na proteção do ser humano e de garantia dos
direitos do homem.
Em suma, para o Movimento de Defesa Social, a finalidade do Direito Penal é
proteger a sociedade da criminalidade, utilizando-se como caracteres nucleares o
antidogmatismo, a mobilidade, o dinamismo e a universalidade .
1.1.2 – Síntese histórica do direito penal brasileiro
1.1.2.1 – Direito Penal Indígena
Quanto à diversidade cultural, a pluralidade dos povos que aqui viviam antes da
chegada dos colonizadores europeus levou à catalogação de mais de 170 línguas, segundo
milhões; enquanto que no final do século XX restam cerca de 500 mil índios sobreviventes.
Com a devastação ocasionada pelo contato entre europeus e índios, somente nas últimas
décadas do século XX começou-se a ter uma precária idéia da dimensão cultural, social,
econômica e tecnológica das sociedades indígenas habitantes do território brasileiro à época
da vinda dos portugueses.
No período pré-colonial, Prado (2002) relaciona a existência de regras simples
consuetudinárias, comuns ao convívio social e transmitidas verbalmente, na qual imperava a
vingança privada sem uniformidade nas formas de reação contra as condutas ofensivas. Da
mesma forma, imperava a composição por acordo entre famílias, a expulsão da tribo e
predomínio das formas punitivas corporais sem tortura. Nesse sentido, Mirabete (2002)
defende que as idéias do Direito Penal que podem ser atribuídas aos indígenas estavam
ligadas ao direito costumeiro, nos institutos da vingança privada, da vingança coletiva e do
talião.
O processo histórico mostra, então, que os usos e costumes assim como as práticas
punitivas das sociedades indígenas à época do descobrimento, em nada influíram e nem
poderiam sobrepujar as leis penais impostas pelos colonizadores.
1.1.2.2 – A Legislação Portuguesa
O estudo do sistema jurídico no Brasil, como percebido por Filho (1977), não pode
prescindir da análise da situação cultural em Portugal, do papel que nela desempenharam as
instituições educacionais e o direito, e do modo como esta cultura se transplantou para o
Brasil como forma e tipo de colonização. Dessa forma, será delineado os principais marcos na
Quando da Independência de Portugal, no século XII, o Código Visigótico e os
Cânones dos Concílios deixaram de ser observados e passou a vigorar a legislação foral.
Segundo Zaffaroni (2002), a palavra foral era utilizada para designar os códigos particulares
de leis municipais de uma cidade, vila, concelho ou julgado, ou ainda dos moradores de uma
quinta ou herdade. Os forais portugueses são encontrados em três tipos distintos, embora de
conteúdo consuetudinário comum, quais sejam, o foral de Santarém, o foral de Salamanca e o
foral de Ávila ou Évora.
O foral de Santarém tinha como características principais o nome alvazis dado aos
juízes municipais e a apreciação pelos tribunais das querelas criminais. Nos forais do tipo
Salamanca, os magistrados eram denominados de alcaides e a liberdade estava caracterizada
(como quando da permanência do servo nas terras). Nos forais do tipo Ávila ou Évora, os
magistrados eram chamados juízes e se assegurava o grau de imunidades e garantias políticas,
além da propriedade. Neste chamado período foraleiro, conforme leciona Zaffaroni(2002),
apresentava-se a vingança privada, bem como penas desproporcionais com o fato
representadas, entre outras, com a punição pela morte pelo fogo, em vida, dos falsificadores
de moedas.
O Livro de Leis e Posturas, com vigência entre os séculos XIV e XV, contém leis
penais e de processo penal advindas de D. Afonso III, de D. Diniz, de D. Afonso IV e do
Infante D. Pedro. As leis integrantes desse corpo, dentre as quais a lei básica é a lei das
injúrias, de 12.03.1355, juntamente com a legislação foraleira compuseram as Ordenações
Afonsinas, sendo que algumas vigoraram até fins do século XVIII (1800).
Já as Ordenações do Reino, se constituíram em importante codificação por compilar
algumas legislações existentes. Dentre essas legislações esparsas encontra-se disposições da