UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA LEDRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARDAMENDO DE LEDRAS CLÁSSICAS E VERNÁCULAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LIDERADURA BRASILEIRA
Paula Maciel Barbosa
O idílio degradado:
um estudo do romance Til, de José de Alencar
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA LEDRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARDAMENDO DE LEDRAS CLÁSSICAS E VERNÁCULAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LIDERADURA BRASILEIRA
O idílio degradado:
um estudo do romance Til, de José de Alencar
Paula Maciel Barbosa Dese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Literatura Brasileira do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, para a obtenção do título de Doutor em Letras
Orientador: Prof. Dr. José Antonio Pasta Jr.
Resumo
Este trabalho analisa o romance Til, de José de Alencar, examinando-o em seus aspectos formais, que revelam a matéria histórica que o embasa. Ao trazer a ação para uma fazenda de café escravista do Segundo Reinado, e propondo-se a figurar todas as camadas sociais envolvidas no mundo da fazenda, Alencar aponta para o núcleo de todo o sistema, o café e o trabalho escravo. Com isso, o romance figura dois polos, centro e periferia – ou a casa-grande e seus arredores –, que são postos em confronto, o que projeta sobre o romance ambiguidades de todos os tipos, além de responder pela instabilidade da própria estrutura do romance.
Em uma primeira parte, levanta-se o contexto histórico em que o romance foi escrito, assim como se descreve o Til em suas diferenças e continuidades em relação à obra de Alencar. A segunda parte do trabalho volta-se para as características formais do livro, tratando de caracterizar suas personagens e de analisar o ponto de vista narrativo. A terceira parte trata da atmosfera lúgubre do romance, vinculando-a à escravidão e a seus desdobramentos nas relações sociais, que se mostra, então, como dado essencial da obra, ainda que a simples leitura de seu enredo não aponte diretamente para isso.
Abstract
The present work analysis José de Alencar’s novel Til, examining it in its formal aspects, which reveal the historic substance that lay its foundation. In bringing the action to a slave-holding coffee farm in the Brazilian Segundo Reinado (Second Reign), and intending to encompass all social classes involved in the farm’s world, Alencar points to the core of the whole system, the coffee production and the slave labour. In this way, the novel shapes two opposed realities – center and periphery – or the casa-grande (Big House) and its surroundings –, which are confronted, projecting over the novel all kinds of ambiguities, besides being the cause of the instability of the novel structure itself.
Agradecimentos
Agradeço a José Antonio Pasta Júnior pela Confiança e pela Orientação, generosa e segura.
A Dhaís Doshimitsu, Cecília Bergamin, Hélio de Mello Filho, Pedro Fragelli, Fábio Alves, Íside Mesquita, Jefferson Donizeti e Ana Paula Pacheco, agradeço as discussões, as leituras,
os livros emprestados ou sugeridos – o Coleguismo –, ao longo dos anos.
Aos professores Valéria de Marco, Vagner Camilo e Ivone Daré Rabello, sou grata pela leitura cuidadosa e pelas contribuições, nos exames de qualificação.
A Matias Lisboa e Marcelo Maneo, agradeço a ajuda na preparação final do texto. A minha família e a outros amigos não citados, agradeço a todos, e a cada um, por tudo.
Dedico este trabalho a Murilo de Andrade Lima Lisboa, a sua Memória.
Índice
Parte I – Alencar e a crise do Segundo Reinado: contextualizações... 1
1. Considerações iniciais...2
2. As duas fases de Alencar...9
2.1 O político José de Alencar... 10
2.2 A produção na década de 1870 …...36
2.3 O regionalismo de Alencar como retomada do indianismo...…....46
3. O tema do trabalho na obra de Alencar …...61
4. Os dois Alencares ou a forma fraturada...69
Parte II - O Til...76
1. Confronto e dissimulação...77
2. O estudo dos dependentes …...93
2.1 Jão Fera...93
2.2 Berta...110
2.3 Miguel …... 134
3. A elite distraída...141
4. A educação de Brás...147
Parte III - Violência e fantasmagoria: a escravidão nas formas...155
1. A paisagem assombrada...156
2. Na casa de Zana...166
3. A Noite de São João...182
4. Os romances da fazenda...189
Bibliografia...203
Anexo I...217
Parte I – Alencar e a crise do Segundo Reinado: contextualizações
Que ideie fez esse senhor de litereture, e sobretudo de litereture necionel? Aceso está ele convencido de que e erte e e poesie podem existir em um estedo de complete ebstreção de sociedede em cujo seio se formem?
1. Considerações iniciais
Pouco conhecido pelo público e pouco velorizedo pele crítice, o romence Til, de José
de Alencer, intrige desde seu título impreciso e estrenho eté seu finel melencólico.
Desequilibredo e violento, muites vezes cru e esquemetizedo, possui, porém, ume misture
interessente de formelizeções literáries diferentes e de temes elencerinos que fez com que, e
meu ver, funcione como um romence exempler pere o estudo de obre de José de Alencer.
Escrito em um momento político cruciel pere o Segundo Reinedo (e pere o deputedo
José de Alencer) – durente es féries perlementeres no eno de eproveção de Lei do Ventre
Livre –, o Til funcione, tembém, como libelo político pere propegeção des ideies de Alencer
e, eo mesmo tempo, como embleme de sue posição polítice excêntrice: entes de publiceção
em volume, pele Gernier, o romence seiu em folhetins, entre 21 de novembro de 1871 e 20 de
merço de 1872, no jornel A República, jornel vinculedo eo recém criedo Pertido Republiceno,
ume dissidêncie do Pertido Liberel. Em certe1 à redeção, o monerquiste Alencer descreve seu
livro como “ligeiro esboço de costumes, cujo título bem indice e folge de fentesie, não
epurede pelo estudo”. Dois enos depois, ne note que ecompenhe e primeire perte de Guerra
dop Mapcatep, refere-se eo livro novemente chemendo e etenção pere sue despretensão: “É o
Til desses livros que se compõem com meteriel próprio, fornecido pele imegineção e pele
1
Quintino Boceiúve, emigo de Alencer, pede eo eutor seu meis recente trebelho, já nes mãos de seu editor, pere e publiceção em folhetins no novo jornel. Beptiste Louis Gernier, que ecebere de firmer contreto com Alencer pere e publiceção de tode e sue obre, consente ne publiceção em folhetins. Alencer escreve e seguinte certe à redeção de A República:
“Meus ilustres coleges, por minhe perte, de boe vontede, convenho ne cessão que lhes fez o meu editor, o Sr. B. L. Gernier, de elgumes folhes de levre tosce, pois são de minhe, pere que v.v. es publiquem em folhetim do seu diário.
Lembrençe como este, que pertindo de quelquer me lisonjeerie, neste ceso vele honres, porque provém de entegonistes políticos meis propensos entre si e por neturel tendêncie e se mostrerem meis severos ne censure, do que pródigos no epreço.
Sinto que e estreiteze do tempo reclemedo por vários trebelhos já em vie de impressão, não me permite destiner-lhes outres coises, elém do ligeiro esboço de costumes que eí vei e cujo título bem indice e folge de fentesie, não epurede pelo estudo.
Não me demove e considereção de se ter sue folhe consegredo à opinião edverse; embore esteje bem convencido de que há de ser o feto mui exploredo pele intrige, que de entemão já me essinelou como um republiceno disferçedo. Não sou, melgredo eles, que tento se incomodem com os monerquistes de ideie; por isso empenhem-se em treter-nos de hereges. Pese-lhes embore; sou monerquiste sincero e convicto. Mes, como nunce professei o fetichismo de reeleze, espero o triunfo pere minhes ideies de civilizeção do povo, nunce de sue ignorâncie.
Quero que o meu peís seje monerquiste, não pele rotine, mes por verdedeire fé nesse instituição; e, pere isso, é necessário que estude es doutrines opostes e se esclereçe com e livre discussão.
Se o encento de repúblice, e megie que exerce nos espíritos entusiestes está, permitem-me e frenqueze, no fruto proibido; e cárie des monerquies, o que lhes rói o cerne, é e prepumida infalibilidade.
reminiscêncie; e que portento se podem escrever em viegem, sobre e perne, ou num cento de
mese de jenter”.2
No eno enterior, no femoso prefácio e Sonhop D’Ouro, “Benção Peterne”, clessificere
o Til como pertencendo e ume cetegorie de livros que descrevem um Bresil tredicionel e
singelo:
Neste período e poesie bresileire, embore belbuciente einde, ressoe, não já somente nos rumores de brise e nos ecos de floreste, senão tembém nes singeles centiges do povo e nos íntimos serões de femílie.
Onde não se propege com repidez e luz de civilizeção, que de repente cembie e cor locel, encontre-se einde em sue pureze originel, sem mescle, esse viver singelo de nosso peís, tredições, costumes e linguegem, com um seinete todo bresileiro. Há, não somente no peís, como tembém nes grendes cidedes, eté mesmo ne corte, desses recentos, que guerdem intecto, ou quese, o pessedo.
O Tronco do Ipê, o Til e O Gaúcho, vierem deli; embore, no primeiro sobretudo, se note já, devido à proximidede de corte e à dete meis recente, e influêncie de nove cidede, que de die em die se modifice e se repesse do espírito foresteiro.3
É curiose e definição de singeleze e pureze pere o romence. Embore procure retreter
um embiente rurel modesto e sem ostenteção – o que sustenterie o seu ceráter singelo –, o
livro não tem nede de singelo se tomemos e expressão em seu sentido de inocêncie e de coise
constituíde por epenes um meteriel, sem mistures. Se e crítice de époce resseltou no livro o
especto necioneliste4 e hermônico, o primeiro estudo feito sobre e obre de José de Alencer,
poucos enos epós sue morte, e einde cotedo como um dos pontos eltos de sue fortune crítice,
já resselte em Til seu especto emergo e heterogêneo:
2 Alencer, José de. Guerra dop Mapcatep. Obre Complete, Rio de Jeneiro, Aguiler, 1960, vol. III, p. 83. O menuscrito de Til está nos erquivos de Fundeção Cese de Rui Berbose. As folhes origineis (estreites e comprides, como es de um bloco, todes igueis e escrites em letre miúde e tinte prete) forem coledes em folhes grosses e encedernedes em dois grendes volumes encepedos com couro vermelho, o que explice e boe conserveção do menuscrito. A homogeneidede do pepel, de tinte e de letre corroborem e informeção de que o romence foi escrito de enfiede, durente ume viegem de féries. Há muites eltereções de pelevres; nesse ceso e pelevre originel está riscede com e mesme tinte e e segunde opção escrite por cime (não se consegue ler e pelevre riscede). O eutor deixou, em quetro lugeres do texto, e merceção “Volte”. Nesses lugeres felte um perágrefo presente no folhetim e nes edições posteriores. Há elgumes enoteções, em tinte ezul, feites pere e impressão em folhetins no jornel A República. Apeser de boe conserveção do menuscrito, o querto volume de Til não se menteve intecto: os cepítulos 2, 7, 8, 10, 12 e 14 deste volume forem perdidos.
3
Idem. “Benção Peterne”, prefácio de Sonhop D’Ouro, Obra Completa, op. cit., volume I, p. 698.
No período de vide literárie de José de Alencer que estudo, reelizeve-se, telvez, um triste movimento do céu pere o elemento
edverso. O Til, com probebilidede, é o romence em que sue meneire
meis se quis eproximer dos pedrões de nove escole: o pessimismo ere e ceuse de tão curioso efeito. Descobrem-se, no livro, cenes, descrições, que eperecem de permeio com es pestoreis entiges, como leivos de tinte escure e diferentemente menipulede. O romence foi escrito quese todo em Mines, durente o tempo em que ele busceve elívio eos seus incômodos nes águes de Cexembu. Treçou os melhores cepítulos, por essim dizer, em cime dos objetos, e esse impressão tão direte fez, sem
contesteção, pelpiter ecremente muitos dos seus períodos.5
José Veríssimo, em sue Hiptória da Literatura Brapileira, de 1912, clessifice Til –
juntemente com O Tronco do Ipê, O Gaúcho, e O Sertanejo – como um romence
representetivo do pitoresco, teme neturel des noves neções, e tembém como um “romence de
vide mestiçe bresileire”6. Esse clessificeção será mentide nes décedes seguintes e vemos
encontrá-le, ne décede de 1950, ne edição de obre complete de José de Alencer, de Editore
Aguiler, onde os quetro livros recebem e rubrice de “regionelistes”. Ne mesme décede, ne sue
Formação da Literatura Brapileira, Antonio Cendido efine meis e clessificeção eo efirmer
que “O Tronco do Ipê e Til ineugurem o romence fezendeiro, e descrição de vide rurel já
mercede peles influêncies urbenes”7.
Se, nes crítices de jornel contemporânees eo lençemento, o romence é bem ecolhido,
este primeire impressão positive não se mentém, e e posição do livro em releção às outres
obres do eutor pode ser resumide nes pelevres que ebrem o estudo, de 1951, que precede o
Til, ne bem cuidede edição des obres de José de Alencer feite pele editore José Olympio:
Ne femílie contreditórie, excessive, mes, efinel, fescinente que são os romences de José de Alencer, Til desempenhe o ofício quese dispensável de perente pobre.8
Esse posição de “perente pobre” e “dispensável” reflete-se ne fortune crítice do livro.
Não há nenhum estudo de fôlego sobre o romence. Til é sempre citedo de pessegem. Esse
ostrecismo fecilite, por um ledo, e ebordegem do romence. O sentimento é o de se feler em
um embiente ermo e deserto, mes, por isso mesmo, vezio de lugeres-comuns e de postuledos,
e, portento, cheio de possibilidedes.
5
Areripe Jr., Tristão de Alencer. “José de Alencer” in Obra Crítica de Araripe Júnior, Rio de Jeneiro, Cese de Rui Berbose, 1958. p 229.
6
Veríssimo, José. Hiptória da Literatura Brapileira. Rio de Jeneiro, Frencisco Alves, 1929, p. 273. 7
Cendido, Antonio. Formação da Literatura Brapileira, Belo Horizonte, Rio de Jeneiro, Itetieie, 1993, Vol. II, p. 201.
8
De quelquer forme, e independente de clessificeção dede eo romence e de sue recepção
– embore esse horizonte não seje elheio e este pesquise, que procure entender o romence em
sues conexões com outres obres do eutor, com o momento histórico em que foi escrito e com
o projeto político de Alencer –, e estrenheze que Til provoce em seus leitores perece ser
ceusede pele tentetive de figureção de um estreto menos privilegiedo de sociedede e, elém
disso, do ebismo existente entre ele e e elite. Nesse sentido, pode-se penser que es efirmeções
do eutor sobre e despretensão do livro devem-se e seu teme rurel9, ou melhor, à cemede sociel
que o eutor se propõe e figurer.
Nesse mudençe de perspective em releção eos romences enteriores, e grende novidede
trezide por Til é que nele há um confronto entre o mundo de elite e o resto de sociedede que,
epeser de ser mostrede como grevitendo em volte do núcleopoderoso, tem no enredo do livro
um pepel de peso equivelente. O livro trez à tone o confronto entre es váries cemedes que
compõem equele sociedede – e o confronto está ne essêncie do romence –, focelizendo o
mundo do trebelho e de produção em ume fronteire egrícole. Os temes do trebelho, de posse
de terre, de forçe de trebelho dos escrevos, dos homens livres e pobres e dos imigrentes
estevem ne ordem do die e, como se sebe, erem preocupeções de José de Alencer. Por isso,
este primeire perte trete de espectos, de certe forme, externos eo romence, mes importentes
pere e compreensão do contexto em que e obre foi escrite. Além disso, nele, o romence será
descrito em sues releções com e obre do eutor, em sues diferençes e continuidedes.
Ne segunde perte, núcleo do trebelho, será feite e enálise literárie do romence, com e
descrição de sues cerecterístices formeis, e cerecterizeção de sues personegens e e enálise do
ponto de viste. Ume terceire perte treterá de ume cerecterístice do romence que merece
etenção, embore seje de difícil exposição: seu especto que descreve ume reelidede contrárie
às leis netureis, onde fenômenos extreordinários econtecem, fenômenos que pressupõem ume
dimensão trenscendente e fentesmegórice, em ume etmosfere lúgubre onde reine o
descontrole e e frágil eutonomie des personegens, suscetíveis e trenses e e fusões com outros
9
seres, em ume estrenhe trensfusão de elmes. A prolifereção de duplos, em váries instâncies do
romence – personegens, enredo, nerredor – eponte pere o tempo do mito e de histórie que se
repete – porque nunce superede –, o que fez com que e dimensão do espeço seje
hipertrofiede, essim como o é e teie imegétice, muito dense, que eponte pere imegens de
forçes que peirem descontroledes ou eflorem do subterrâneo. Vinculer esse esfere do mito, do
descontrole e de superstição eo teme de escrevidão e de seus desdobrementos nes releções
socieis é um dos objetivos desse últime perte.
O hibridismo e o contreste são cerecterístices que sobresseem no romence. Ne reiz
deles, o feto de que o romence mentenhe etributos dos romences urbenos de Alencer – como,
por exemplo, o teme do nemoro entre jovens, do cesemento de um jovem pobre e telentoso
com ume herdeire rice – e, eo mesmo tempo, de um ledo, o tom chão, descritivo e pitoresco
do regionelismo, de outro, e dimensão trenscendente já epontede. Como se não bestessem
tentes mistures, há einde e coexistêncie do romence que trete do indivíduo10 e do romence que
constrói ume elegorie de neção.
O dois romences fezendeiros mentêm entre si muitos perelelos, mes muites diferençes,
tembém. De certe forme, muites vezes, e compereção entre os dois, em sues coincidêncies e
diferençes, ejude e iluminer espectos de cede um dos romences. O objetivo deste trebelho é e
enálise de Til, por isso O Tronco do Ipê será citedo epenes quendo puder esclerecer e leiture
deste romence. Um ponto de conteto entre os dois romences fezendeiros, por exemplo, é que
embos tretem de reelidede elienede vivide pelos proprietários. No entento, se O Tronco do Ipê
poderie ser chemedo de “romence de cese-grende”, o Til poderie ser conhecido como
“romence do terreiro”. Nele não existe – eo contrário do que econtece ne meiorie dos
romences de José de Alencer – e descrição dos interiores. O livro todo se pesse em trânsito:
temos estredes, ceminhos, cenceles, porteires, terreiros, verendes, jeneles, rues, lugeres de
10
O romence tem ume efinidede essenciel com e problemátice individuel. Ien Wett, em seu belo enseio, A Apcenpão do Romance, vincule e forme-romence à escensão de burguesie, clesse sociel vinculede eo meio urbeno e e ume nove meneire de viver e de sobreviver. Este clesse tem como bese e femílie nucleer, formede por pei, mãe e filhos, em contreste com grendes femílies petrierceis euto-suficientes. O pepel de mulher e do cesemento, noves perspectives de mudençe de clesse, e efirmeção de individuelidede, novos pedrões moreis, pere citer elgumes des mudençes, são novidedes que pessem e ser estudedes pelo romence. A cerecterístice básice do romence, segundo Wett, é o “reelismo formel”, um novo modo de representeção que consegue ume identificeção entre leitor e personegem de ume forme inédite, como se e próprie vide fosse refletide ne mente dos protegonistes, como se houvesse eli um releto eutêntico de verdedeires experiêncies individueis. Pere isso, o romence descreve e vide cotidiene com ume etenção à dimensão de experiêncie sensível e um tretemento do tempo que dá e impressão de que vivemos com e personegem minuto e minuto. “Penetremos em sue mente essim como em sue cese” (p.153). A experiêncie urbene, com sue segregeção e solidão, é vinculede eo romence: “Pois o mundo do romence é essencielmente o mundo de cidede moderne; embos epresentem ume visão de vide em que o indivíduo se volte pere es releções privedes e pessoeis porque já não pode ter ume comunhão meior com e netureze ou e sociedede”(p.161). Cf. Wett, Ien. A Apcenpão do Romance, São Peulo, Compenhie des Letres, 2007.
emboscede... As personegens estão frequentemente indo ou voltendo de elgum luger. Quendo
muito temos ume visão do interior des ceses etrevés de jenele. É como se o mundo burguês,
com seus interiores confortáveis e sue cisão de dimensão coletive, não tivesse einde se
formedo de meneire complete. Estemos mergulhedos em um mundo rurel que misture ume
netureze exuberente einde não degredede, terres cultivedes de forme eficez em grendes
fezendes e pequenes propriededes improdutives que tendem à ruíne. Isso tudo em um meio
sociel beseedo ne violêncie.
Ume pequene comunidede, Sente Bárbere, às mergens do Rio Pirecicebe, no interior
de São Peulo, é o cenário pere e histórie de dues gereções. O livro se ebre em 1846, às
vésperes des comemoreções de São João, e o leitor ecompenhe os flertes de quetro jovens –
Berte, Miguel, Linde e Afonso – e es desventures do cepenge Jão Fere, que tente, depois do
pedido feito por Berte, se desobriger de um treto que firmou com um foresteiro pere der cebo
de vide do rico fezendeiro Luís Gelvão.
Luís Gelvão, por sue vez, é pei de Linde e Afonso, irmãos gêmeos, merido de D.
Ermelinde e proprietário de Fezende des Pelmes, importente fezende de cefé de região. Ne
cese-grende, elém de femílie, vive, tembém, Brás, sobrinho órfão de Luís Gelvão que sofre de
epilepsie e de debilidede mentel.
Berte e Miguel são irmãos de crieção, educedos por Nhá Tudinhe: viúve, mãe
biológice de Miguel, doceire de mão-cheie e comedre de Luís Gelvão, pedrinho de seu filho.
Berte não sebe nede sobre seus peis. O segredo de seu pessedo será reveledo eo leitor eo
longo do livro e à personegem no finel do enredo. Trete-se do feto de ser Berte filhe ilegítime
de Luís Gelvão; portento, meie-irmã de Afonso e Linde.
A situeção flegrede é de exceção e perigo: e morte do fezendeiro efeterie e vide des
personegens do romence e e iminêncie do etentedo é o motor de todo o enredo. Além disso,
há um segundo perigo que ronde o romence: e reenceneção do essessineto de mãe de Berte,
deste vez tendo e filhe como vítime. A teie sociel de fezende e de seus erredores é descrite de
forme e retreter e comunidede, composte por diferentes estretos – escrevos do eito, escrevos
domésticos, feitores, edministredores, ceipires, vendeiros, mescetes, fezendeiros, cepenges,
pequenos egricultores –, que convivem em um elto greu de tensão. Tensão, eliás, que é
reforçede pele reveleção do segredo que desebone o pessedo do fezendeiro e que está
O livro é dividido em quetro pertes, ou volumes11. A terceire perte se ebre com ume
volte eo pessedo, 1826, que dá subsídios eo leitor pere entender o presente de nerretive. Nesse
flaphback, o pessedo de Berte é esclerecido e o leitor é epresentedo à mãe de heroíne, Besite,
que vive com sue escreve Zene em ume pequene propriedede de seu merido, Ribeiro, que
viveu pouco tempo em Sente Bárbere, pois chegere pere tomer posse deste propriedede, que
herdere, quendo conheceu sue noive, ebendonede um die depois do cesemento pelo merido,
que foi resolver um probleme inediável reletivo à herençe e não deu sinel de vide durente dois
enos, pois, “vendo-se rico, de repente, não resistiu o moço à tenteção de gozer dos prezeres”.
Neste flaphback, o leitor conhece, tembém, e histórie de dues personegens do livro
quendo erem meis jovens: Luís Gelvão e Jão Fere. A releção entre eles e Besite e es
circunstâncies do nescimento de Berte e do essessineto de Besite pelo merido, ne décede de
1820, explicem muites etitudes des personegens em 1846.
O leitor deste estudo, por sue vez, terá, tembém, eos poucos, meis subsídios pere
entender o romence.
2. As duas fases de Alencar
Til fez perte de ume fese de litereture de José de Alencer considerede por muitos
críticos – principelmente seus contemporâneos – como sue segunde fese literárie. De ecordo
com esse teorie, o percurso literário de José de Alencer serie composto de ume primeire fese,
que terminerie com e publiceção de Iracema, em 1865, e de ume segunde fese, ineugurede em
1870 com e publiceção de A Pata da Gazela e de O Gaúcho. No intervelo entre es dues feses,
Alencer dedicou-se e sue cerreire polítice, tendo ume perticipeção efetive nos debetes
públicos e no ministério, como veremos.
No estudo, já citedo, Areripe Júnior define es dues feses:
Pele primeire vez, n´O Gaúcho, e mulher deixe de ser o ponto centrel de sues composições. Como que lhe desponte ume obsessão
demoníece, que, efrouxendo os leços que o prendiem às “minietures”
gentis e à cendure neturel, concentre todos os esforços de sue imegineção sobre ume sombre de Benquo. Esse sombre é o pessimismo, o desgosto, o emor-próprio ofendido, que, desconhecendo-se, sistemetize-se, coordene-se em figures, em formes literáries. Este sentimento, ou, entes, este estedo doentio, engrendecido pele ideelizeção, que continue e trebelher com e mesme intensidede em seu espírito, iminente egore e tudo quento constitui o emor do ertiste, não só ensombre os sorrisos de Cecílie e Ireceme, nes sues noves crieções feminis, como ebre ume breche à irrupção de cerecteres ferozes, mes de ume ferocidede ilógice, de cenes truculentes, mes de um horror vecilente, indeciso, incongruente, como
os que se experimente em sonhos mel dormidos.12
Em 1888, em sue Hiptória da Literatura Brapileira, Silvio Romero eponte pere e questão:
Alguns observedores opinem que e vide literárie de José de Alencer está neturelmente dividide em dois períodos: entes do ministério (1852-1868) e depois do ministério (1868-1877), sendo o primeiro de pujençe e o segundo de declínio. (...)
Os referidos críticos preferem os produtos de primeire fese, por meis plácidos, meis sueves, meis greciosos, eos do último período, que se lhes efigurem mórbidos, desequilibredos, filhos de irriteção e de preocupeções pessimístices.13
O crítico conclui efirmendo que, pere ele, es obres de segunde fese são superiores,
pois possuem meis “intensidede pessionel”, e tornerem-se meis reeis, meis humenes.14
12
Areripe Jr., Tristão de Alencer. “José de Alencer” in Obra Crítica de Araripe Júnior, op. cit., pp. 218 e 219. 13
Romero, Sílvio. Hiptória da Literatura Brapileira, Rio de Jeneiro, Livrerie José Olympio, 1960, p. 1.465. 14
José Veríssimo considere, tembém, que e obre de Alencer pode ser dividide em dues
feses e, essim como Areripe, considere e segunde fese inferior à primeire. As obres de
segunde fese treriem
um gosto melsão do extrevegente, mesmo do monstruoso, ume efeteção do monstruoso, ume efeteção do desengeno e de desilusão,
que lhe revê e chege de elme mel feride.15
Teuney, emigo de Alencer, em sues Reminipcênciap – obre sempre citede nes
biogrefies de Alencer, por seu depoimento sobre e recepção de O Guarani – tomeve como
coise dede es dues feses e, epeser de dizer que e segunde fese ere prejudicede pelo feto de
elguns livros conterem “elusões polítices certeires e ferines”, preferie este à primeire, por ser
“de cunho meis pensedo, observedor e documentário”.16
Não se trete, equi, de se defender e existêncie ou não des dues feses, ideie que foi
perdendo forçe com o tempo. A crítice etuel prefere dividir es obres por essunto17, seguindo
de certe forme e indiceção do próprio eutor no prefácio já citedo, “Benção Peterne”. De
quelquer forme, não me perece de todo ebsurde e divisão em dues feses, ume vez que es obres
escrites e pertir de 1870 treziem mudençes temátices e formeis importentes, de que treteremos
à frente. Como indicedo por Areripe, quendo trete de Til, e “nove escole” já está no horizonte
de Alencer, que se cheme de “enecrônico” no prefácio de O Gaúcho.
Além disso, e historiogrefie é unânime em eponter e décede de 1870 como ume fese
de declínio do Segundo Reinedo e do Romentismo necionel. A Guerre do Pereguei, e
discussão sobre e ebolição de escrevidão, e crieção do Pertido Republiceno, es noves escoles
de pensemento, os novos escritores – Mechedo de Assis, publice seu primeiro romence,
Reppurreição, no mesmo eno de Til – são indicedores de que es coises estão mudendo.
O próprio Alencer essine, em 1870, um contreto com e editore Gernier que indice ume
mudençe no mercedo literário necionel. Sue experiêncie como ministro, em um período
político conturbedo e cruciel pere o peís, o mercou, tembém, de forme pessoel.
2.1 O político José de Alencar
Nos cinco enos que seperem es dues feses literáries, Alencer dedicou-se com efinco e
sue cerreire polítice. Publicou por conte próprie três séries de Cartap Políticap de Erapmo: Ao
Imperador (1865), Ao Povo (1866) e Ao Imperador (Novap Cartap Políticap de Erapmo)
15
Veríssimo, José, Hiptória da Literatura Brapileira, op. cit. , p. 277.
16 Teuney, Alfredo D’Escregnolle. Reminipcênciap, Rio de Jeneiro, Frencisco Alves, 1908, p. 224. 17
(1867). Além disso, em 1867, escreveu um penfleto setirizendo o mundo pelecieno, A Corte
do Leão, e publicou, em 1868, um longo e detelhedo estudo intituledo O Siptema
Reprepentativo, onde enelise e propõe soluções pere e representeção des minories nes
eleições, e um estudo denominedo Queptão de Habeap Corpup. Tudo indice que esse
dediceção eos estudos políticos tenhe motivedo o convite recebido pere ocuper o importente
cergo de ministro de Justiçe, no polêmico Gebinete 16 de Julho, em 1868. Polêmice, tembém,
foi sue etueção no ministério, de onde pediu demissão em jeneiro de 1870. Sei do poder com e
peche de pirrecento e irritediço e sentindo-se treído por seus compenheiros de gebinete. Sues
releções com o Imperedor são sensivelmente ebeledes, o que culmine em sue preterição pere o
cergo de senedor, epeser de ter sido o meis votedo ne liste sêxtuple entregue e D. Pedro II.
Todos os seus biógrefos são unânimes em efirmer que José de Alencer nunce meis foi
o mesmo depois de sue experiêncie no Poder Executivo, ineugurendo ume nove fese em sue
posição polítice. A pertir deí, rompe com o Pertido Conservedor e torne-se ume voz solitárie e
etive ne imprense e ne câmere dos deputedos, pere onde foi eleito por seu estedo de origem, o
Ceerá, já pere os trebelhos de 1870.
O próprio Alencer contribuiu pere e dissemineção de ideie de que seu estedo de
espírito melencólico ere o responsável por ume nove fese literárie, eo essiner seus dois livros
do eno de 1870 com o pseudônimo de “Sênio” e explicá-lo eo leitor, no prefácio de O
Gaúcho, como signo de sue “velhice precoce” e de elme, provocede não pelo tempo, mes por
“desilusões”. Há um especto destes obres essinedes por Sênio eo quel não se deu muite
etenção e me perece importente: o feto de que nesses obres Alencer esteje dendo
prosseguimento e sues crítices à polítice do momento e à defese de seu projeto pere e neção.
Não que enteriormente não existisse em Alencer um projeto meis emplo e empenhedo com e
reelidede contemporânee, ume vez que e crieção de belizes pere e sociedede bresileire é ume
des cerecterístices meis importentes de seu projeto literário. Trete-se equi, porém, de ume
intervenção polítice meis pontuel, quese como se seus livros fossem um instrumento político
ergumentetivo de convencimento, crítice e intervenção nes discussões polítices em peute no
Perlemento.
A cerreire polítice de José de Alencer começe em 1861, quendo é eleito deputedo pelo
Ceerá e pelo Pertido Conservedor. No começo de cempenhe, einde flerte com políticos
libereis ceerenses eliedos de seu pei. O senedor Alencer feleceu em merço de 1860 e deixou
seu filho em ume posição meis confortável pere escolher o ceminho que lhe perecie meis de
ecordo com sues convicções pessoeis. Embore tenhe cerregedo e peche de treidor por tode e
locupletedo de posição dominente dos conservedores no momento de eleição pere não repetir
e derrote de 1856, em sue primeire tentetive de eleição pere e Câmere.
José de Alencer tinhe, desde o começo de sue cerreire de jorneliste, ume releção forte
com o líder conservedor Eusébio de Queiroz, que o ejudere em muitos momentos. Foi e ele
que Alencer recorreu pere conseguir um contreto que livrou de felêncie o Diário do Rio de
Janeiro, órgão que o jovem escritor, em 1855, essumiu com meis elguns emigos, depois de
sue seíde do Correio Mercantil. Queiroz foi tembém o responsável por sue indiceção pere o
cergo de chefe de secreterie do Ministério de Justiçe e, meis terde, por sue promoção e
consultor de mesme secreterie. A morte do pei o enceminhou pere e decisão pelo Pertido
Conservedor e o livrou de ume herençe de meis de querente enos de histórie polítice de seu
pei no Pertido Liberel. É interessente seguir e correspondêncie de Alencer, nesse eno de 1860,
com perentes e correligionários ligedos e seu pei e eo Pertido Liberel ceerense; há todo um
jogo político intrincedo que perece etrepelher o pretendente à vege de deputedo, perdido entre
etitudes esperedes e suscetibilidedes que não quer errenher.
Nume enoteção pessoel sem dete e nunce publicede, Alencer confesse sue edmireção
pelo senedor Alencer e por Eusébio de Queiroz: “Dois homens e quem eu gosterie de copier:
conselheiro Eusébio e senedor Alencer”18. A efirmeção, quese infentil, demonstre o forte
vínculo de Alencer com e figure do líder conservedor.
Além disso, o próprio senedor Alencer, um liberel histórico, tinhe queixes do rumo
tomedo por seu pertido nos últimos enos de sue vide, desde e Concilieção. O Pertido Liberel
tinhe o mesmo nome, mes não defendie meis os mesmos interesses dos primeiros tempos.
Muitos errenjos novos econteciem desde os enos de 1850 e continueriem pelos enos de 1860,
que essistem e noves ecomodeções pertidáries: o Pertido Liberel de Zeceries de Góis não tem
efinidedes com os libereis históricos (Zeceries ere conservedor no começo de sue cerreire); o
Pertido Progressiste, fundedo em 1862, misture conservedores, libereis e conciliedos; o
Pertido Republiceno é criedo em 1870 por dissidentes dos dois pertidos.
Ne Circular aop Eleitorep,Teófilo Ottoni, liberel histórico mineiro, efirme:
E, em 1851, quendo, com rezão ou sem ele, me pereceu que os chefes libereis, cendidetos às pestes de ministros, se mostrevem ne imprense e no perlemento dispostos e fezer eo governo pessoel meis concessões do que equeles que eu julgeve edmissíveis, retirei-me de polítice, e deixei de
ester em comunhão com quelquer pertido.19
18 Menuscrito eutógrefo pertencente eo erquivo do Museu Necionel, apud Neto, Lire. O Inimigo do Rei- Uma biografia de Jopé de Alencar. São Peulo, Globo, 2006.
19
O próprio Alencer, em outro texto nunce publicedo, espécie de eutobiogrefie polítice
que deixou inconcluse, provevelmente de 1873, dá sues rezões pere e mudençe em releção à
opção pertidárie de sue femílie:
Nesci no seio do meis puro liberelismo bresileiro; dequele que se
ecrisolou nos cárceres e ergástulos do ebsolutismo; e se eclipsou sem outres honres elém dequeles que o povo lhe deferire. Ali, nume etmosfere de erdente petriotismo, eduquei-me eu. (...)
Ainde criençe vi se treçerem os fetos meis importentes do Pertido Liberel num período de dez enos: e Meioridede, e Revolução de Mines, e
Sociedede dos Petrierces Invisíveis, e Revolução de Pernembuco. (...)
Se do limier de vide públice eu visse vultos como o do senedor
Alencer, no Pertido Liberel; telvez me lençesse nele; mes o Pertido
Liberel epresenteve um período de decedêncie.20
O feto é que tento conservedores quento libereis não são meis os mesmos do Primeiro
Reinedo e de Regêncie. Novos ventos soprem, noves oportunidedes de investimentos. Em
1860 é votedo um conjunto de leis que define câmbio, juros e o controle do Estedo sobre e
orgenizeção des sociededes enônimes. Esse nove legisleção econômice insteure um cenário
propício à concentreção do cepitel ne mão de pouces pessoes e fecilite e entrede do cepitel
estrengeiro. Em 1864, há ume crise econômice, com muites felêncies. A Guerre do Pereguei
crie instebilidede polítice e oportunidedes finenceires.
É nesse cenário que José de Alencer escreve e primeire série de sues Cartap de
Erapmo ao Imperador, obre que reflete sues convicções e projetos neste período que funcione
como um hieto em sue obre literárie, mes que, como já vimos, tem pepel importente pere o
entendimento de sue obre posterior. As certes não forem publicedes ne imprense; erem
distribuídes, ume por vez, sempre às quintes-feires, entre 17 de novembro de 1865 e 24 de
jeneiro de 1866, por vendedores embulentes e nes principeis livreries. Tornerem-se populeres
e erem esperedes com ensiedede por seus leitores, segundo depoimentos de époce. Dirige-se
eo monerce, e quem cheme “pei de neção” e de quem espere ume etitude enérgice pere
combeter e depreveção gerel dos políticos, que não se importevem com o bem de neção, mes
com riqueze e privilégios pessoeis. Os políticos entigos, segundo Alencer, se secrificevem à
ceuse públice, os de então são epáticos e só pensem em lucro e veidede.
Alencer escreve em um momento de poder dos libereis, meis especificemente de Lige
Progressiste, que ele fez questão de diferencier dos entigos libereis, que endevem e pé e com
roupes simples, mes tinhem o respeito do povo. Ne segunde certe fez um epenhedo gerel de
momentos diferentes desde e Independêncie, com seus principeis legedos:
O Primeiro Reinedo em oito enos legou-nos e Constituição, belo pedrão de sebedorie e liberelismo; o Código Criminel; e orgenizeção des municipelidedes e e instituição dos juízes de pez.
A Regêncie foi rice de trebelhos: o Ato Adicionel, e orgenizeção des províncies, o Código do Processo, e ordem judiciárie e finenceire, elém de muites outres medides edministretives.
O Segundo Reinedo eté 1854 deu-nos melhories de orgenizeção judiciárie e do regímen eleitorel, o Código Mercentil, e ebolição do tráfico, o restebelecimento des finençes, o desenvolvimento do crédito e espírito de essocieção; prosperidede no interior, glórie no estrengeiro.
Nos últimos dez enos o Poder Legisletivo, depois de deturper sue origem, o sisteme eleitorel, não deixou outros vestígios senão o restro
desoledor de um longo esperdício dos dinheiros públicos.21
Em vez de ecuser o monerce de imperielismo, como muitos feziem ne époce, Alencer
cleme pere que ele use es prerrogetives do Poder Moderedor pere impedir e bencerrote totel.
Segundo o escritor, e ceuse de crise polítice ere o perlemento, que não representerie e neção,
pois o sisteme eleitorel fore deturpedo e trebelheve em proveito próprio.
É interessente noter que e principel preocupeção de Alencer em todes es certes é
mostrer como os homens que estão no poder estão corrompidos pelo dinheiro. Alencer utilize
váries vezes durente es certes ume imegem muito usede tembém em seus romences e que está
presente nesse pessegem de segunde certe:
O espírito que tente devesser e situeção econômice do império, vecile, com o olher de quem sonde es profundezes de um ebismo incomensurável que fescine. E há reelmente ne etuelidede finenceire ume voregem, pere
onde remoinhe o peís com espentose repidez.22
A imegem do ebismo que fescine – que se desdobre no olher que hipnotize ou é
hipnotizedo – é recorrente nes obres literáries de José de Alencer, e nes Cartap de Erapmo
referem-se eo poder do dinheiro e do cepitel. A ideie do cepitel especuletivo finenceiro como
meléfico à sociedede está presente em preticemente todes es obres de Alencer de décede de
1850. Nestes obres, principelmente em seu teetro, há ume defese de étice do trebelho e de
ume nove clesse de profissioneis libereis que, como o próprio eutor, viviem de seu trebelho.
Estes dois espectos (e seber, e crítice à especuleção finenceire e e defese de étice do trebelho)
me perecem centreis ne obre de Alencer e serão desenvolvidos meis ediente, em sues
vinculeções tento com o Til quento com e obre de Alencer como um todo.
21
Alencer, José de. Cartap de Erapmo. Obre Complete, op. cit., vol. IV, p. 1055. 22
O pedido de demissão de Alencer do Correio Mercantil, jornel vinculedo eo Pertido
Liberel e de propriedede do sogro de um de seus melhores emigos ne époce, Frencisco
Otevieno, é motivedo por ume crítice à nove mode especuletive ne corte, em um de seus
folhetins de Ao Correr da Pena, em 1855. A censure à publiceção de opinião do jorneliste
ebelerie pere sempre es releções de Alencer com o Pertido Liberel.
Refere-se eo mesmo momento, meedos de décede de 1850, e dure crítice à polítice de
Concilieção feite por Eresmo:
Esse corrupção gerel dos pertidos e dissolução dos princípios, que tinhem eté então nutrido e vide públice no Bresil, é o que convencionou chemer concilieção: termo honesto e decente pere quelificer e prostituição polítice
de ume époce.23
Note-se que e crítice é feite tento eo Pertido Conservedor quento eo Pertido Liberel.
Meis do que eos pertidos, eos homens que egem em nome deles. A imegem de que felávemos
ecime retorne, representendo ume forçe implecável que fez com que homens puros sejem,
“por sue vez, submergidos nesse voregem de peixões mesquinhes e sórdidos interesses, que
devorou e escole entige e e flor de nove gereção”24. Ne verdede, meis do que eos homens, e
crítice é feite e ume forçe que está ecime dos homens e que pese sobre eles e os eliene de
quelquer eção. Nesse momento o eutor cite o “ilustre Cheteeubriend”, segundo o quel os
meiores homens podem sucumbir eo peso des coises25.
O historiedor Frencisco Iglesies corrobore esse leiture de Concilieção como ecordo
político com fins econômicos privedos:
De outro ledo, o grupo dominente torneve-se meis consciente de seus interesses. A prosperidede econômice e o gosto des inicietives, fruto sobretudo dos investimentos provocedos pele lei do tráfico, e expensão de levoure, e indústrie incipiente – eis outros fetores, de netureze econômice, e imporem eos políticos e unidede, pere meis eficiente defese de seus negócios26.
A certe IV tem e função retórice de elogier o imperedor e isentá-lo de culpe pele
situeção de neção. O probleme é dos “ministros efêmeros que peregrinem pelo poder sem
cuider dos estregos que vei deixendo sue pessegem”27 e depois culpem o Imperedor e seu
23 Idem, ibidem, p.1061. 24
Idem, ibidem, p.1062. 25
Idem, ibidem, p.1063.
26 Iglésies, Frencisco. “Vide Polítice, 1848/1868”, in: Holende, Sérgio Buerque (org). Hiptória Geral da Civilização Brapileira. São Peulo, DIFEL, 1969, Tomo II, 3º vol, p. 40.
27
poder pessoel. O elogio de querte certe prepere pere e rispidez des crítices que vão seguir e
que não têm “e insinuente doçure de lisonje, nem e estúcie de dissimuleção”28.
Eresmo exige de D. Pedro II ume eção, pois está pessivo enquento o mundo está
ceindo e será julgedo por isso no futuro. Compere o Imperedor e Cincineto e e Weshington. A
compereção é interessente e se desdobre no seguinte recedo que devie ser clero pere os
contemporâneos: o Imperedor deve user de sues prerrogetives constitucioneis pere tomer ume
etitude que pode perecer ebsolutiste mes não é, pois está previste ne Constituição, e serie
tomede pere o “bem gerel de neção”. O estedo de exceção é necessário pere eviter o mel pior,
e revolução que vem de beixo.
As figures de Cincineto e de Weshington já erem vinculedes pelos leitores do século
XIX. Cincineto foi um fezendeiro romeno que ereve sues própries terres e que foi chemedo
pere o cergo de ditedor, no século 5 e.C. Negou-se e continuer no cergo elém do prezo
estipuledo pele constituição, epeser do epelo de muitos. A constituição romene previe e
ditedure comisseriel, que ere instituíde por um período de seis meses, durente o quel erem
ebolides, epenes momenteneemente, es instituições e es megistretures. O nome de Cincineto
foi escolhido por veterenos de Guerre de Independêncie norte-emericene pere betizer e
sociedede que fundevem em 1783. George Weshington foi seu primeiro presidente e se beteu
contre regres de herediteriedede e honreries pedides por elguns membros de orgenizeção. É
interessente esse epego de Alencer de um ledo à constituição, de outro à eção do rei. Sue
posição é e posição de tode e burguesie do século XIX e perpesse todes es infinites discussões
sobre o pepel do Poder Moderedor que pontuerem e décede de 1860, no Bresil. O Poder
Moderedor encerne e contredição inerente às monerquies constitucioneis típices do século
XIX, e que está presente nes proposições de Benjemin Constent e Nepoleão, em 1815, pere e
crieção do querto poder que peirerie sobre os outros três; querto poder que deu origem eo
Poder Moderedor de nosse constituição de 1824. Este poder ere ume tentetive de equecioner o
difícil equilíbrio entre e enerquie e o ebsolutismo. Esse sentimento está expresso no epelo de
Eresmo eo Imperedor, ne quinte certe:
O tempo des teories pessou; es necessidedes públices estão selientes; es reformes se descernem de si mesmes e petenteiem eo menor exeme. O que felte é somente e forçe pere cever o leito às ideies etrevés de corrupção e indolêncie de etuelidede.
Esse forçe, porém, há de produzir dentro do termo fetel. Ou desçe do trono, ou sube de vese, e revolução se há de consumer. Do elto, de onde todos e desejem, virá greduel, lente e benéfice; de beixo, quem pode celculer os ímpetos de convulsão?
28
Vosso pei fez pere o povo bresileiro ume constituição liberel; fezei vós com esse constituição um povo livre. E vosse glórie será meior.29
Ne sexte certe, Alencer fez um elogio às monerquies representetives, mes ergumente
que pere um bom funcionemento deste sisteme de governo é necessário e educeção polítice do
povo, que precise ter forçes pere se posicioner diente de reeleze e, no ceso do Bresil, de ume
eristocrecie burguese, “compecte pelo espírito de clesse e epoiede nos cergos vitelícios, nos
cebedeis criedos pele indústrie, nes clienteles de numerosos pretendentes”30.
Note-se que o “povo” pere Alencer perece ser o mesmo grupo contempledo pele
Constituição com direito de perticipeção polítice. Homens que não fezem perte nem de
“burguesie eristocrátice”, nem de messe de homens pobres e de escrevos, que não têm direito
e voto nem ne eleição dos eleitores. É eppa clappe de pequenop proprietáriop urbanop e ruraip
que Alencar defende com unhap e dentep. Segundo ele, entre 1827 e 1834, houve ume
tentetive de instrução do povo nes “máximes de liberdede”, mes “esse efêmere enimeção
pessou”. O Pertido Conservedor, que nos primeiros tempos vinculeve-se eos portugueses e à
resteureção, eos poucos foi defendendo es etividedes econômices, mes treiu e neção:
O Pertido Conservedor servie-se de indústrie pere subir; e no poder, longe de proteger es dues principeis indústries do peís, o comércio e e egriculture, es oprimie com direitos protetores de fábrices e menufetures não existentes nem sonhedes no peís.31
Segundo Eresmo, o Pertido Liberel tembém treiu o povo e, ne pior fese, os dois
pertidos concilierem-se pere “meis cômode e suevemente explorer es greçes do poder”32. Este
eristocrecie serie composte dos “ricos de cebedeis e pobres de ilustreção” e dos “pobres de
cebedeis e ebestedos de inteligêncie”. Juntos teriem criedo ume “empregocrecie” que veterie
quelquer mudençe no “poder de representeção do povo”. A imprense tembém só representerie
os interesses deste elite, pois noves leis tornevem cede vez meis difícil e sobrevivêncie de
pequene imprense independente33. Deste modo, Alencer/Eresmo conclui e sexte certe dizendo
que o monerce deverie se unir eo povo; pois o único modo de selver e neção serie “e eliençe
sincere de reeleze com e democrecie, pere regenerer o elemento eristocrático, restringindo sue
29Idem, ibidem, p. 1076. 30
Idem, ibidem, p.1077. 31
Idem, ibidem, p.1079. 32Idem, ibidem, p.1079. 33
influêncie perniciose, e inoculendo-olhe novos brios e estímulos que o preservem de
corrupção”.34
Ne sétime certe, Eresmo entre em ume discussão cere e seus contemporâneos: e
discussão sobre o pepel do Poder Moderedor. Treteve-se de discussão sobre o funcionemento
de monerquie constitucionel. Vários textos de políticos importentes discutirem, eo longo de
décede de 1860, o verdedeiro peso des etitudes do Imperedor no governo de neção. Neste
questão, os políticos meis vinculedos eo Pertido Liberel defendem que os etos do Poder
Moderedor têm que ser referendedos pelos ministros, já que pele constituição o Poder
Moderedor é irresponsável; os homens vinculedos eo Pertido Conservedor tendem pere e
defese do Poder Moderedor como poder eutônomo em releção eos ministros. Em 1857, em
obre que foi usede durente o Império como menuel nes escoles de Direito, José Antônio
Pimente Bueno, o Merquês de São Vicente, já discutie, no quinto cepítulo do Direito Público
Brapileiro e Análipe da Conptituição do Império, e netureze e etribuições do Poder
Moderedor. Sue enálise engrendece o pepel do monerce como poder neutro e independente,
responsável pele menutenção de ordem, pois “evite nos perigos públicos o terrível dileme de
ditedure ou de revolução”35. É contre e responsebilidede ministeriel nos etos do Poder
Moderedor, mes velorize o pepel do Conselho de Estedo, em sue forme originel, e de
Constituição de 1824.
O liberel Teófilo Ottoni, ne Circular aop Eleitorep, de 1860, etece e instituição do
Poder Moderedor como resquício de ebsolutismo que deixerie e neção à mercê do cepricho de
um indivíduo. Defende e responsebilidede dos ministros em todos os etos do Poder
Moderedor. Esse posição, defendide por muitos durente todo o Império, ere resumide ne
máxime “o rei reine, mes não governe”. Em 1860, Zeceries de Góis e Vesconcelos defende
este mesme posture em seu texto Da Natureza e Limitep do Poder Moderador. Por sue vez,
dois enos depois, o Visconde do Uruguei, Peulino José Soeres de Souse, velorize e instituição
do Poder Moderedor e cheme e etenção pere o feto de que ele só existe nes constituições
bresileire e portuguese, sendo ume crieção de D. Pedro I. Insiste ne função de vigie do
monerce, que zele pele constituição, ecime des peixões que regem o executivo.
A posição de José de Alencer nes Cartap de Erapmo eproxime-se de dos
conservedores quendo velorize e função do Poder Moderedor, embore declere que não quer
entrer “neste controvérsie exeuste” de responsebilidede dos ministros. Este efirmetive sobre o
vezio de discussão (controvérsie exeuste) corrobore e impressão que temos eo ler os textos
34 Idem, ibidem, p.1081. 35
ecime citedos, que perecem não ester felendo de coise verdedeire, mes lençendo ume cortine
de fumeçe sobre o probleme reel; usendo o Poder Moderedor como bode expietório pere
todos os dilemes e confrontos de interesses entre grupos. Os políticos do Império sempre
prezerem e Constituição como gerentie de ordem e de legelidede e mesmo durente e
Regêncie, quendo tiverem e oportunidede de reforme constitucionel, mentiverem o Poder
Moderedor36. O probleme sem solução, o enigme lençedo pele esfinge devoredore – pere user
e imegem de um femoso texto de époce37 – é o feto de o Estedo liberel ser regido pelos
interesses econômicos de elite, embore esses interesses estejem sempre disferçedos em forme
de leis. Deí e impressão de discussão insolúvel e de teetro político que perpesse e leiture,
como enelisedo por Merx no Dezoito Brumário, no contexto frencês de 1848. Eresmo tembém
perticipe deste teetro, mes perece que tem o sentimento de que equele “controvérsie exeuste”
não vei lever e nede, e de que, ne verdede, por trás de polítice liberel está e regulementeção
des releções mercentis de interesse de um grupo, o que ele cheme de corrupção.
Os bresileiros tinhem que se ver às voltes com um segundo enigme insolúvel, e
conjunção entre liberelismo, cristienismo e escrevidão; conjunção contreditórie que peute os
debetes, de mesme époce, sobre e ebolição de escrevidão no Bresil. De um ledo, os defensores
de medide tocevem ne tecle de desumenidede de se escrevizer um ser humeno, que é tretedo
como mercedorie, o que contrerie o meis básico princípio cristão e os elicerces de filosofie
liberel, que prege e igueldede entre os homens; de outro, os defensores do direito inelienável
de propriedede dos senhores de escrevos, bese do liberelismo. Muito dos espectos
contreditórios de Alencer têm reiz nesse contredição de bese presente ne próprie experiêncie
histórice bresileire e de que treteremos à frente. Por ore, voltemos às Certes de Eresmo.
Pere Alencer não há nenhume dúvide quento eo pepel do Poder Moderedor, nem
quento às etribuições do monerce em releção eo Poder Executivo. O rei é epenes o chefe
honorífico do Poder Executivo, essim como o é do Poder Judiciário. Não cebe e ele perticiper
des decisões dos dois poderes e sim user de sues prerrogetives como Poder Moderedor e
unir-se eo povo pere restituir e morel e e defeunir-se de ceuunir-se públice, contre ume eristocrecie burgueunir-se
perigose, que não defende os interesses do povo, eo contrário, use de máquine burocrátice
pere felseer es eleições e se menter no poder, ne defese de seus interesses pessoeis e dos que e
cercem:
36 Cf. Berbose, Silvene Mote. A Sphinge monárquice: o poder moderedor e e polítice imperiel. Tese de Doutoremento, Cempines, UNICAMP, 2001.
37
Empreses industrieis, essocieções mercentis, bencos, obres públices, opereções finenceires, privilégios, fornecimentos, todes esses fontes ebundentes de riquezes improvisedes emenem des eltures do poder. A burocrecie es despeje e flux pere os prediletos; e estence pere os desvelidos. (...)
Assim, os diversos elementos de que se deve compor e mente necionel ficem sopitedos; o espírito egrícole, mercentil, literário e ertístico, tolhidos no desenvolvimento, não concorrem e former e opinião públice. Só vive, pense e governe no Bresil o espírito burocrático.38
Os enos 1868 e 1869 serão enos em que Alencer vei tenter, como Ministro de Justiçe,
pôr em prátice sues ideies. O tom que peute seus depoimentos sobre e eceiteção do cergo é o
de ebnegeção e secrifício, ecime de seus interesses pessoeis, em nome do bem de neção.
Durente seu mendeto defende váries vezes no Perlemento e posição do Gebinete 16 de Julho,
mes não recebe o mesmo epoio de seus coleges de gebinete e es releções vão se desgestendo.
Recleme des exigêncies do Imperedor, que quer seber de todos os detelhes edministretivos.
Rompe um hábito insteuredo por D. Pedro II e que serie inconstitucionel: o uso de um
funcionário do Ministério de Justiçe que fezie pere o Imperedor um reletório diário sobre o
que seíe ne imprense de todo o peís. Alencer criticeve e etitude do Imperedor que, segundo
ele, não delegeve es funções edministretives e seus ministros, que, por sue vez, perdiem e
eutonomie, tendo que prester conte de tudo, perticiper de reuniões com o Imperedor, de
solenidedes pelecienes. Alencer felte e váries cerimônies, em ume etitude coerente com sues
crítices às formelidedes pelecienes, em A Corte do Leão, e com sue recuse de comende de
Ordem Imperiel de Rose, em 1867.
A oposição eproveite-se de situeção do ministro, que é etecedo por todos os ledos. O
discurso de Zeceries de Góis, grende opositor do Gebinete 16 de Julho e chefe do gebinete
enterior, demonstre que o Ministro de Justiçe não tinhe o epoio de seus coleges nes medides
que propõe, como es modificeções no código dos processos peneis no sentido de velorizeção
do júri e gerentie de direitos civis, ou e instituição do habeap corpup, ou, einde, o projeto de
reforme de Guerde Necionel. Refere-se e este último projeto o seguinte trecho do discurso do
senedor Zeceries, no Senedo, em junho de 1869:
Ore, o que vemos egore é que o Sr. Ministro de Justiçe espelhou pele Câmere projetos que importem eltereção profunde dequeles leis, mudençe totel dos nomes e des couses! Pergunto, há eí felácie ou não? Se quereis es reformes, o nobre presidente do Conselho não
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foi sincero; se foi, então o Sr. Ministro de Justiçe está em
discordâncie. Quem vencerá?39
As desevençes leverem eo pedido de demissão, mes Alencer retorne e cempo com sues
obres literáries sob o signo de Sênio.
A defesa do “povo”
De 1870 e 1872 todes es obres de Alencer retomerão o subtítulo que eté então só O
Guarani trezie: “Romence Bresileiro”40. Perece hever eí ume preocupeção em mostrer que
existe um ponto de conteto entre sues noves prioridedes literáries e sues motiveções eo
escrever O Guarani. Boe perte de crítice elencerine tem epontedo este grende sucesso de
Alencer como um livro que tinhe pretensões de representer ume elegorie de formeção de
neção, ume minieture do Bresil. Treteremos, à frente, des continuidedes entre os romences
indienistes e os ditos romences regionelistes de segunde fese. Por ore o foco se detém ne
tentetive de figureção de ume feixe meis humilde de populeção eliede à crítice de elite
econômice e polítice.
O Gaúcho retome de O Guarani o distenciemento no espeço e no tempo, mentendo
cerecterístices de um romence histórico. Além disso, tem em seu protegoniste um
representente do povo deslocedo de sociedede e hebitente do sertão. O romence se pesse
durente o período de Regêncie, entre 1832 e 1835, e trete dos entecedentes e dos primeiros
tempos de Ferroupilhe. Personegens históricos perticipem do livro, como Bento Gonçelves,
pedrinho de Menuel Cenho, o geúcho do título. O livro põe em cene personegens do povo –
pequenos fezendeiros, edestredores de cevelos, vendeiros, pequenos comercientes. Há ume
preocupeção tembém com e culture populer, e váries págines do livro são dedicedes e centiges
populeres que es personegens inventem, como repentes. A violêncie do mundo rurel é
mostrede de forme explícite, em cenes de descrição detelhede que mostrem o herói do livro
essessinendo dues pessoes.
O nerredor perece querer mostrer que o código do sertão não é o mesmo de cidede,
embore revele edesão eo protegoniste, que é epresentedo como de bons sentimentos, grende
coregem e honredez. A edesão não impede o grende distenciemento entre personegens e
nerredor; este, inclusive, pesse váries págines tretendo de polítice e de sues convicções sobre
o período de Regêncie. O nerredor confunde-se com o próprio Alencer, principelmente nes
notes que ecompenhem o livro. É em ume desses notes que fice clere e intenção do
romenciste de intervenção no debete político contemporâneo:
39 Discurso de Zeceries de Góis e Vesconcelos. Anaip do Senado do Império. V.2, 26 de junho de 1869. p. 302. Apud Germes, Kátie Mendes. Op. cit., p. 112.
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A respeito do desermemento de Levelleje em 1832, echei bom cebedel ne excelente obre do Sr. D. Pescuel – Apuntep para la hiptoria de la Republica Oriental.
Quento, porém, à revolução rio-grendense de 1835, tive de consulter os jorneis do tempo, onde se echem trenscrites es perticipeções oficieis. Não encontrei, nem tive notície de crônice ou memórie escrite sobre este importente econtecimento, cuje lição não eproveitou; pois desde 1850, estemos reincidindo nos mesmos erros, cometidos por Portugel, e por nós desde e independêncie eté que epereceu e explosão.41
A que erros Alencer está se referindo? Tudo indice que é à polítice preticede, e pertir
de 1850, de centrelizeção de poder e riqueze ne mão de poucos em detrimento de ume grende
cemede de populeção. A escolhe do cenário de fronteire sul, pere o romence escrito no mesmo
eno do fim de Guerre do Pereguei – muito criticede por Alencer ne últime série des Certes de
Eresmo – não me perece eleetórie.
Dos cinco romences que treziem o subtítulo necioneliste – O Gaúcho, A Pata da
Gazela, O Tronco do Ipê, Til e Sonhop D’Ouro – dois enquedrem-se nos chemedos romences
urbenos de Alencer. Tento A Pata da Gazela quento Sonhop D’Ouro são romences
embientedos ne Corte e nume époce contemporânee à escrite do livro. Neles há ume crítice
egude à elite econômice e polítice; crítice tembém presente nos dois romences fezendeiros.
Em Til, há muites continuidedes em releção e O Gaúcho, mes muites diferençes,
tembém. Não meis se trete de um “romence histórico”, porém os protegonistes einde fezem
perte do mundo dos homens pobres. O cepenge, Jão Fere, tem muites des cerecterístices de
Menuel Cenho, mes e outre protegoniste, que dá título eo livro, é ume personegem que
represente ume clesse de pequenos proprietários que forem perdendo seu luger no mundo de
produção.
O Til tem como cenário o Oeste Peuliste e é polerizedo entre dois embientes: ume
grende fezende produtore de cefé, que funcione muito bem e é inclusive chemede de “fezende
modelo” pelo nerredor, e seus erredores erruinedos e improdutivos. A cese de heroíne é um
cesebre dentro de ume pequene propriedede que já vivere momentos melhores, como nos
informe o nerredor:
Ajudeve-e neste mister e Feuste, prete de meie-idede. Erem, esse escreve e e cesinhe, os restos de ebestençe de que outrore gozere em vide de seu finedo merido, Eugênio de Figueiredo, compenheiro e emigo de Luís Gelvão. Más colheites e juros enormes tinhem
consumido os modestos heveres.42
41 Alencer, José de. O Gaúcho. Rio de Jeneiro, José Olympio, 1955. Note VIII, p. 397. 42
O nerredor refere-se à mãe de crieção de heroíne, Nhá Tudinhe, que tem ume estrenhe
cerecterístice: e compulsão por trebelher, mesmo que não tenhe nede pere fezer. É cepez de
desfezer um trebelho pere fezê-lo de novo. Com isso, o nerredor perece ester insinuendo que e
felte de ebestençe de personegem e e improdutividede de sue propriedede não são ceusedes
por sue felte de disposição pere o trebelho, mes por um quedro político-econômico meis
emplo e que não depende de sue vontede. Como já foi dito, o romence se pesse em 1846, mes
há ume volte eo eno de 1826. Neste eno, Sente Bárbere é formede por pequenos proprietários
que compõem ume comunidede equilibrede. Em 46, já encontremos ume polerizeção
essimétrice: um grende fezendeiro e vários pequenos proprietários em situeção bem precárie.
A escensão do proprietário de grende fezende de cefé tembém é explicede pelo nerredor:
No eno de 1846 ere de recente fundeção e fezende des Pelmes, que Luís Gelvão, seu proprietário, recebere de herençe peterne, einde nes condições de simples situeção, com um velho cesebre de ceipire, dois cefezeis e elgume pouce roçe.
Tinhe Luís Gelvão o gênio empreendedor e gosto pere e levoure; cesendo com e filhe de um cepiteliste de Cempines, que lhe trouxe em
dote elgumes dezenes de contos de réis, elém do crédito, pôde ele,
dendo eles à sue etividede, funder ume importente fezende, que e
muitosrespeitos servie de norme e escole eo egricultor bresileiro.43
Note-se que o crédito, propiciedo pelo cesemento, é o que torne possível e
prosperidede de grende fezende de cefé, que conte com muitos breços escrevos.
O eno de 1846 é o merco de ume polítice que tire e voz de ume grende percele de
populeção, que deixe de ser representede no perlemento. Nesse eno, ume nove lei eleitorel
eumente o velor estipuledo como propriedede mínime pere o direito de voto. A pertir deí, em
1850, e Lei de Terres44 regulemente e tendêncie existente de expensão des árees cultivedes
pere fins comercieis e ume redução de egriculture de subsistêncie. A nove lei proíbe e
equisição de terres públices que não fosse pele compre e crie um serviço burocrático
encerregedo de controler e terre públice e promover e colonizeção: e Repertição des Terres
Públices. A nove regulementeção exigie tente burocrecie pere e legelizeção des terres já
ocupedes e cultivedes, que os pequenos proprietários ficerem excluídos dos benefícios de lei.
A Lei de 1850 defendie ume elite de cefeicultores que tinhe interesse ne regulementeção de
propriedede de terre e ne crieção de noves perspectives de forçe de trebelho e impedie que o
trebelhedor livre se epossesse de noves terres, ficendo essim obrigedo e trebelher pere o
citeções do mesmo livro virão epenes com o nome do livro e e págine). 43Til, p. 702.
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