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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE CENTRO DE EDUCAÇÃO, FILOSOFIA E TEOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS‐GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO, ARTE E HISTÓRIA DA CULTURA
Marcio Esdras de Godoy
O Teatro como instrumento de sensibilização ambiental: uma
experiência de produção teatral da peça “Na Floresta”
São Paulo
2014
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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE CENTRO DE EDUCAÇÃO, FILOSOFIA E TEOLOGIA PROGRAMA DE PÓS‐GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO, ARTE E HISTÓRIA DA CULTURA
O Teatro como instrumento de sensibilização ambiental: uma
experiência de produção teatral da peça “Na Floresta”
Marcio Esdras de Godoy
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Marcio Esdras de Godoy
O Teatro como instrumento de sensibilização ambiental: uma
experiência de produção teatral da peça “Na Floresta”
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Esta pesquisa recebeu apoio financeiro
da Bolsa Mérito MackPesquisa do
Fundo Mackenzie de Pesquisa, do
Instituto Presbiteriano Mackenzie
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AGRADEÇO
Primeiramente a Deus por permitir que eu realizasse esta dissertação de mestrado e realização de um dos meus sonhos.
À minha orientadora Profª. Drª. Petra Sanchez Sanchez, pela orientação paciente e ensinamentos e por acreditar neste projeto desde o começo, até mesmo quando eu não acreditava. Obrigado!
As professoras doutoras Eliana Zaroni Lindenberg e Maria Inês Z. Sato pelas importantes contribuições por ocasião do exame de qualificação.
À minha esposa Renata, que esteve sempre ao meu lado ao longo desse processo. Obrigado e te amo. A minha filha Manuela: Filha é para você e por você.
Ao meu pai Jair e Neuza minha mãe, por me guiar no caminho correto e por sempre incentivar meus estudos. Obrigado pelas orações. Ao meu sogro Vanderlei e minha sogra Nilma, por todo apoio. Aos meus amigos que, de longe ou de perto, sempre estiveram ao meu lado, permitindo que eu nunca desistisse.
A toda equipe da peça teatral “Na Floresta” pelo apoio e entusiasmo. Quem diria que esse projeto teria proporções dessa magnitude. Agradeço ao meu irmão e artista Marcos Godoy por estar perto sempre que foi preciso, com seu talento especial.
Os meus sinceros agradecimentos à Coordenação do Fundo de Pesquisa Mackpesquisa do Instituto Presbiteriano Mackenzie, pela Bolsa concedida e pela oportunidade do desenvolvimento desta pesquisa.
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RESUMO
Essa pesquisa de caráter interdisciplinar que unifica arte e educação ambiental, buscou, por meio da arte teatral, analisar como se desenvolveu a peça intitulada “Na Floresta”, iniciada no ano de 2010. Buscou ainda abordar o desenvolvimento da produção teatral, desde a escolha da equipe, atores e produtores. Também explorou um aspecto pedagógico na maneira de fazer e ensinar teatro, desde a dramaturgia, roteirização e preparação de atores. No processo de desenvolvimento cenográfico destaca‐se a utilização de materiais e resíduos sólidos recicláveis na construção dos cenários. Da mesma forma, investigou‐se as percepções dos integrantes comprometidos com o projeto solidário com relação às questões ambientais. São apresentados novos recursos de interatividade do design de interação de espaços, bem como a importância desempenhada pela equipe de envolvidos na peça teatral no que diz respeito à realidade ambiental na Amazônia. Os resultados mostram a importância do teatro como recurso educativo, na sensibilização ambiental, na formação profissional e no compartilhamento de experiências em grupo; principalmente no processo de desenvolvimento das crianças e adultos, possibilitando a inclusão social de comunidades marginalizadas por meio da reflexão sobre os problemas ambientais do seu cotidiano.
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ABSTRACT
This interdisciplinary research that unifies art and environmental education, sought, through the art of theater, analyze how it developed the piece entitled "In The Forest", which began in 2010. He sought also address the development of theater production, from choosing team, actors and producers. Also explored a pedagogical aspect in the way of doing and teaching theater, from playwriting, screenwriting and preparation of actors. In the scenic development process highlights the use of recyclable materials and solid waste in the construction of scenery. Similarly, we investigated the perceptions of members committed to the solidarity project with environmental issues. Presents new opportunities for interaction design of interactive resources, and the importance played by the team involved in play with regard to the environmental situation in the Amazon. The results show the importance of theater as an educational resource, environmental awareness, vocational training and sharing group in experiments; mainly in the development process of children and adults, enabling the social inclusion of marginalized communities through reflection on the environmental problems of their daily lives.
10 LISTA DE FIGURAS
Figura 1 ‐ Oca construída com anéis de papelão (Artista Nido Campolongo) ...21
Figura 2 ‐ Interior da oca feita com anéis de papelão. Espaço para palestras …..……...22
Figura 3 ‐ Modelo de teatro elizabetano na época do Renascimento ………...32
Figura 4 ‐ Modelo de teatro no século XVIII. Teatro de Ópera ………..………...33
Figura 5 ‐ Teatro Amazonas inaugurado em 1896 ………...………...34
Figura 6 ‐ Ilustração representativa do estilo melodramático ………..………..35
Figura 7 ‐ Marcel Marceau em ação. Pantomima ...36
Figura 8 ‐ Teatro Alla Scala de Milão ...37
Figura 9 ‐ Clássico Teatro de Arena nos Estados Unidos ...38
Figura 10 ‐ Globe Theatre (1600). Teatro elizabetano ...39
Figura 11 ‐ Teatro elizabetano vista detalhada em corte ...39
Figura 12 ‐ Réplica do Teatro elizabetano ...39
Figura 13 ‐ Teatro de rua da Baixa Idade Média ...41
Figura 14 ‐ Teatro de rua nos dias de hoje ...41
Figura 15 ‐ Evolução dos aparelhos de iluminação ...45
Figura 16 ‐ Estudo de iluminação. Musical Sweeney Todd ...46
Figura 17 ‐ Criação da “anêmona‐plástica” convertida em pufes ...50
Figura 18 ‐ Crianças descansando no pufe e apreciando a exposição ...50
Figura 19 ‐ Construção da baleia jubarte ...51
Figura 20 ‐ Processo final de construção da baleia jubarte ...51
Figura 21 ‐ Foto da instalação pronta ...52
Figura 22 ‐ Exemplo de rubrica. Roteiro do espetáculo Alice ‐O Musical ...55
Figura 23 ‐ Cenógrafo J.C. Serroni. Um dos mais premiados do Brasil ...58
Figura 24 ‐ Figurinos do espetáculo Alice ‐O Musical, criado pelo figurinista Jota ...60
Figura 25 ‐ Vestido confeccionado com páginas de história em quadrinho ...61
11 Figura 27 ‐ Foto da peça “The Trojan Women”. Figurinos desenvolvidos
com material reciclado ………...………...62
Figura 28 ‐ Exemplo de design de iluminação criado por Marconi Araújo. Musical In Concert ....63
Figura 29 ‐ Capa do livro infantil “A Festa na Floresta” ...66
Figura 30 ‐ Priscila Muniz. Produção ...69
Figura 31 ‐ Foto da equipe de apoio e montagem de cenário do espetáculo “Na Floresta”...70
12
Figura 51 ‐ Foto da maquete ‐ vista frontal geral ...95
Figura 52 ‐ Imagens da maquete ‐ vista do praticável e estudo de iluminação com letreiro móvel ...96
Figura 53 ‐ Foto do início das montagens. Colocação dos painéis antigos ...97
Figura 54 ‐ Composição de fotográfica do processo de montagem do cenário ...98
Figura 55 ‐ Composição fotográfica da montagem do painel luminoso e processo de montagem do praticável e do cenário em andamento ...99
Figura 56 ‐ Iluminação usada no teatro ...100
Figura 57 – Composição fotográfica do acabamento e afinação do cenário ...100
Figura 58 ‐ Foto do cenário final. Vista geral ...102
Figura 59 ‐ Foto do desenho do painel central final ...103
Figura 60 ‐ Foto da lateral esquerda do cenário ...104
Figura 61 ‐ Foto da lateral direita do cenário ...104
Figura 62 ‐ Preparação dos atores ...105
Figura 63 ‐ Foto da cena com o letreiro ao fundo e foco com “canhão seguidor ...105
Figura 64 ‐ Foto oficial dos personagens e cenário ...106
Figura 65 ‐ Composição de fotos da apresentação ...106
Figura 66 ‐ Elenco com espectadores, interação após o espetáculo ...107
Figura 67 ‐ Cachoeira em Brotas. Contato do grupo com a natureza ...109
Figura 68 ‐ Montagem do cenário no palco e estruturação do espaço ...110
Figura 69 ‐ Modelos de palcos do estilo arena: circular, ovalado e semicircular ...111
Figura 70 ‐ Reconhecimento do espaço pelos atores ...112
Figura 71 ‐ Equipe recolhendo folhas na praça ...112
Figura 72 ‐ Montagem finalizada ...113
Figura 73 ‐ Ajustes finais ...113
Figura 74 ‐ Preparação dos músicos e dos atores atrás do palco ...114
13
Figura 76 ‐ Cena Dona Coruja. Plateia lotada ...115
Figura 77 ‐ Personagem Sapo Cururu interagindo com o público ...116
Figura 78 ‐ Personagens em cena ...116
Figura 79 ‐ Sala onde esta guardado todo o material da produção “Na Floresta” ...117
14
SUMÁRIO:
1. INTRODUÇÃO
...17
1.1
Justificativa
...22
1.3 Hipótese
...24
1.4 Objetivo geral
...24
1.5 Objetivo específico ...
25
1.5 Metodologia
...25
2. O TEATRO: UM INSTRUMENTO TRANSFORMADOR
...28
2.1 A Evolução dramatúrgica do teatro ...
31
2.2 Teatro como espaço físico
...37
2.3 Sobre cenografia
...42
2.4 Princípios básicos para montagem cenográfica
...43
2.5 Iluminação teatral
...44
2.6 Sonoplastia
...46
2.7 Teatro e educação ambiental
...47
2.8 Cenografia criada com reaproveitamento de materiais reciclados
...49
3. PRINCÍPIOS BÁSICOS PARA O DESENVOLVIMENTO DE UMA PEÇA TEATRAL
...53
3.1 O Roteiro de teatro
...53
3.1.1 Os atos
...54
3.1.2 As rubricas
...54
3.2 Definindo funções
...56
3.2.1 O diretor
...56
3.2.2 O cenógrafo
...57
3.2.3 O sonoplasta
...58
3.2.4 O figurinista
...59
15
3.2.6 Executor de montagem de palco
...64
3.2.7 Definindo os papéis dos atores
...64
4. A PEÇA TEATRAL NA FLORESTA
...65
4.1 Concepção
...65
4.2 Planejamento de trabalho
...66
4.2.1 Escolhendo os atores
...67
4.2.2 Primeira reunião
...67
4.2.3 Leitura de mesa
...68
4.2.4 Ensaio de palco
...68
4.2.5 Respeito ao diretor
...68
4.2.6 Personalização de desempenho
...68
4.3 Escolha da equipe
...69
4.4 Escolha e preparação dos atores
...72
4.4.1 Jogos e exercícios teatrais
...73
4.4.2 O aprender a viver juntos
...73
4.5 Proposta de trabalho
...74
4.6 Roteiro do espetáculo
...75
4.7 Sobre os materiais recicláveis utilizados
...82
4.8 Desenvolvimento da cenografia
...83
4.8.1 Esboço preliminar
...83
4.8.2 Anteprojeto cenográfico
...87
4.8.3 Conceito artístico
...88
4.8.4 Desenhos finais
...92
4.8.5 Maquete
...94
4.8.6 Montagem
...96
4.8.7 Acabamento e afinação do cenário
...99
4.9 “Na Floresta” em Brotas – SP ...
108
16
6. CONSIDERAÇÕES GERAIS...
133
7. REFERÊNCIAS ...
136
8. APÊNDICES ...
143
8.1 Roteiro de entrevistas dos participantes ...
143
8.2 Roteiro de entrevistas dos espectadores ...
144
9. ANEXOS ...
145
9.1 Anexo A ‐ Termo de consentimento livre e esclarecido ...
145
9.2 Anexo B ‐ Pontos de coleta de lixo reciclado em São Paulo ...
146
9.3 Anexo C ‐ Autorização cenógrafo José Carlos Serroni ...
148
10. GLOSSÁRIO ...
149
17
1. INTRODUÇÃO
A falta de interesse e motivação dos alunos no meio escolar, dentre outros fatores, parece ser uma das principais causas que afetam o processo de ensino/aprendizagem no contexto educacional a nível nacional. O conceito de educação que predomina, salvo algumas exceções, está atrelado tão somente ao processo de transmissão de conhecimentos teóricos, sejam eles de qualquer natureza.Manter o aluno motivado é um desafio a vencer, pois a ausência de interesse prejudica o envolvimento dos alunos com o processo de aprender. Entretanto, o aluno motivado procura sempre adquirir novos conhecimentos e aproveitar as oportunidades, com entusiasmo de modo a revelar sua disposição para outros desafios imediatos e muitas outros no futuro.
Atualmente as características do ensino formal está atrelado aos limites físicos de uma sala de aula ou instituição escolar, sob um regime rígido de horários a serem cumpridos pelos professores e alunos.
O seu rendimento escolar não se limita unicamente à aquisição de conceitos que devem ser decorados, e não se limita também a certos atributos pessoais, como inteligência, contexto familiar e condição socioeconômica.
Partindo dessa realidade o enfoque educativo em que se baseia esta pesquisa é apresentada por Vygotsky (2008), quando menciona que o processo de aprendizagem permite a aquisição de competências que podem, consequentemente, modificar seu comportamento quando a realidade assim exigir.
Com esse entendimento a mudança de atitude, também poderá ser alcançada pela experiência que resulta de novos conhecimentos pela capacidade de observações desenvolvidas pela prática motivada constantemente.
Ainda segundo Vygotsky (2008), o pensamento propriamente dito é produto de motivação, o qual, por sua vez depende dos desejos das necessidades e dos interesses inerentes a cada sujeito.
Assim sendo, a escola deveria concentrar seus esforços em descobrir diferentes estratégias para motivar os alunos, no sentido de estimular cada vez mais o interesse dos alunos. Se tida como meta essencial no processo de ensinar e aprender a motivação daria uma grande contribuição.
18 inclusive de natureza ambiental que nos afligem. Um país que valoriza a educação, construirá uma sociedade em condições de superar os inúmeros problemas, como por exemplo: a fome, a desigualdade e a injustiça. Nessa perspectiva fica muito mais fácil preservar o meio ambiente e a qualidade de vida dos seus seres vivos.
Ao lado da transmissão de conhecimentos, ou, a partir deles, os educadores devem ajudar a alargar os horizontes dos alunos, com relação aos direitos e deveres, cidadania, respeito ao próximo e convivência em sociedade e principalmente o respeito aos recursos do meio ambiente natural e meio ambiente artificial, representado pelo meio ambiente urbano.
Nesse contexto, é imprescindível incluir o teatro na educação ambiental a nível formal e não formal, como importante recurso de educação.
O teatro é um espaço no campo das artes que permite trabalhar a motivação através de diferentes habilidades intelectuais e sociais nos indivíduos. O teatro consegue envolver as pessoas de forma ativa, seja na atuação do espetáculo em si, seja nas mais diversas e complexas áreas de sua produção, tema a ser retomado ainda nessa introdução.
Por ser realizado fora dos rígidos sistemas físico‐cronológicos da educação formal, o teatro apresenta‐se como mais motivador, mesmo porque é lúdico e o lúdico é mais atrativo para as crianças e alunos, e estimular o interesse para a aquisição de conhecimentos.
A sociedade tem presenciado o aumento da preocupação com as questões do meio ambiente, principalmente com relação ao consumo irracional dos recursos naturais e as mudanças climáticas. A esse respeito, nas palavras de Castro (2003):
Essa crise, em decorrência do caráter generalizado dos desequilíbrios ambientais, é de tal ordem que não poucos sugerem que a biosfera como um todo esteja ameaçada. Contrariamente ao passado, quando as crises ambientais eram geralmente sucedidas pela revitalização do ambiente natural, a atual não sugere nenhuma recuperação posterior ao esgotamento dos ciclos biológicos dos ecossistemas (CASTRO, 2003, p. 13).
Edgar Morin (2007) é ainda mais contundente e diz:
19 Estamos frente a inúmeros desafios, dentre os quais destacamos a ética nas relações humanas, também comentada por Morin em “O método 6” (2007):
O individualismo da nossa civilização, não é tanto uma vitória do egoísmo sobre o civismo ou do privado sobre o público, mas o resultado do processo histórico da emancipação da massa que instala, para o melhor e o pior, a responsabilidade dos nossos atos em nós mesmos (MORIN, 2007, p. 91).
O resgate da ética, tendo o compromisso social como um de seus componentes, pode colaborar para minimizar os graves problemas ambientais, de maneira a conscientizar a sociedade contemporânea. Essa consciência crítica pode provocar mudanças comportamentais e de atitudes em relação à importância de preservar o meio ambiente para as gerações futuras.
Nas várias conferências que ocorreram, procurando encontrar soluções para os problemas ambientais e garantir a qualidade de vida e do meio ambiente, as ações educativas, passaram a ser consideradas imprescindíveis, enfatizando assim a importância da educação Ambiental.
A esse respeito a UNESCO (2005) estabeleceu para o período de 2005 a 2014 a Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável, cabendo a ela o papel de promover programas, ações, metas e diretrizes no campo educacional, integrando princípios, valores e práticas. O programa incentiva que sejam utilizadas diferentes linguagens na abordagem das questões ambientais, entre elas, a arte, como vemos no excerto a seguir:
A educação para o desenvolvimento sustentável deve compartilhar as características de qualquer experiência de aprendizagem de qualidade, com os critérios adicionais de que o processo de aprendizagem/ ensino deve servir de modelo para os valores do próprio desenvolvimento sustentável (UNESCO, 2005, p. 46).
20 papel da social dos docentes para a construção de um projeto de cidadania (BRASIL/MEC, 1999).
As diretrizes curriculares nacionais apontam ainda como a educação ambiental se insere nas amplas áreas de atuação, como, Comunicação, Artes, Design e Produção Cultural. No item III.2 art. C.1. da Educação Profissional de Nível Médio (Diretrizes Gerais) pode‐se ler:
Informação, Comunicação, Artes, Design e Produção Cultural
1. Formação para o reconhecimento da diversidade biológica, cultural, geracional, de gênero e orientação sexual nos espaços e projetos de arte e comunicação.
2. Reflexão sobre a dimensão estética do meio ambiente;
3. Estudo sobre o meio ambiente cultural e seus diversos patrimônios (histórico, artístico, turístico, paisagístico, arqueológico, científico e paleontológico), com foco para o patrimônio ecológico e para a proteção da biodiversidade.
4. Inserção de estudos sobre a sustentabilidade ambiental dos produtos, serviços e ambientes, sobre gestão e análise de impactos ambientais, certificações ambientais, economia verde, sistemas de tratamento, controle e disposição final de resíduos, recursos energéticos e outros temas socioambientais relacionados às atividades.
5. Respeito às características dos biomas, paisagens e culturas na elaboração de projetos. (BRASIL/MEC, 1999, p.19)
Uma das possibilidades apontadas nesse documento que pode ajudar na conscientização das pessoas sobre a importância da questão ambiental é o teatro, com esse entendimento, sem duvida, o teatro na educação ambiental pode ser utilizado como importante recurso pedagógico, que efetivamente irá contribuir para que os indivíduos possam adquirir conhecimentos sobre as questões ambientais.
As duas problemáticas apresentadas – a questão da motivação e a questão da conscientização ambiental – se cruzam e se encontram no cerne do presente trabalho. É no teatro que se depara com a proposta pedagógica, de inclusão social e sustentabilidade do meio ambiente, realizada e estudada na presente pesquisa. Enquanto forma prática e lúdica de manifestação artística, ele já foi apontado como uma estratégia de ensino que pode trazer um dinamismo, além das diversas habilidades, que podem ser trabalhadas no indivíduo que o pratica. O teatro educativo tem essa finalidade: favorecer o aprendizado de crianças, adolescentes e adultos através de um processo de socialização que contribui para a formação de sua personalidade e ao mesmo tempo, comprometimento com a preservação do meio ambiente.
23 importante papel socioeducativo através de diversas linguagens, que envolvem as criações de personagens, as situações, lugares e tempos diferentes. Durante minha caminhada profissional com o teatro, tenho trabalhado com projetos que visam a valorização do sujeito, sempre colaborando com uma linguagem expressiva voltada para a conscientização ambiental.
O poder do teatro no campo ambiental consiste em empregar recursos que estimulem a imaginação e a criatividade, buscando simplificar idéias e, assim, explicitar certos conceitos tratados por especialistas. Como se sabe, muitas vezes, não são fáceis de serem entendidos pela maioria das pessoas, sejam elas escolarizadas, alfabetizadas ou não.
Muitas são as vantagens em se utilizar o teatro como um instrumento na educação em geral, entretanto, elas são maiores quando se trata da sensibilização ambiental. Uma delas é o exercício metodológico lúdico, por apresentar a possibilidade de atores e espectadores compartilharem sentimentos, expressando suas emoções como choro, riso, expressões faciais, entre outros. Assim seria outra maneira de divulgar o mesmo discurso que seria utilizado em uma aula expositiva tradicional e, assim, possibilitar a criação de novas estratégias de educar. Os jogos teatrais são facilitadores da aprendizagem, como afirma o reconhecido teatrólogo Augusto Boal:
Esta é a forma mais natural de aprendizagem e a mais arcaica, pois a criança aprende a viver por meio do teatro, brincando, interpretando personagens. Os jogos teatrais sintetizam as antitéticas disciplina e liberdade todo jogo tem regras claras que devem ser obedecidas; mas, mesmo obedecendo a regras, a invenção é livre, a criação necessária, e a inteligência pode e deve ser exercida (BOAL, 2003, p. 166).
O teatro também tem a vantagem ser adaptável a diferentes espaços, já que não há a obrigatoriedade de um espetáculo ser exibido em um palco convencional. Sendo assim, basta teatralizar uma idéia que configure uma história geradora de interesse, para ganhar a atenção do espectador. No caso da educação ambiental, motivos não nos faltam; existem problemas ambientais que levantam as mais diversas preocupações. Nesse sentido, é relativamente fácil montar espetáculos teatrais com base na temática ambiental.
24
A arte teatral vem sendo um instrumento eficaz nas diversas intenções da sensibilização ambiental em decorrência do uso dos jogos e brincadeiras que podem ser introduzidos com ela e, na atividade lúdica, o que importa não é apenas o produto da atividade, mas a própria ação, o momento vivido (ABÍLIO, 2008, p. 344). A linguagem teatral representa um papel muito importante no desenvolvimento humano e social e pode contribuir e acelerar a conscientização e a mudança de hábitos individuais para uma sociedade mais sustentável e ao mesmo tempo colaborar na formação de educadores ambientais, na perspectiva de proteger os ecossistemas e o meio ambiente planetário.
1.2 Hipótese
No âmbito das políticas públicas voltadas para a educação ambiental, o Ministério da Cultura, o Ministério do Meio Ambiente e a UNESCO têm publicado documentos promovendo ações e incentivando mudanças no ensino formal e não formal em vários campos e linguagens, visando o desenvolvimento de programas de educação ambiental.
Sendo assim, a hipótese que se apresenta é que o teatro, pode ser considerado um recurso educacional em condições de propiciar a construção do conhecimento sobre as questões relativas do meio ambiente; recurso capaz de colaborar no processo de ensino/aprendizagem expressando uma forma lúdica potencialmente colaboradora na sensibilização dos problemas ambientais do cotidiano e possibilitando o exercício da cidadania.
1.3 Objetivo geral
Partindo dos pressupostos citados, a presente pesquisa tem a finalidade de apresentar e analisar como se implementou e se desenvolveu o projeto da peça intitulada “Na Floresta”, no sentido de esclarecer como se deu o processo de criação da peça musical e acompanhar como ocorreu sua evolução, no sentido de obter respostas para incentivar a utilização do teatro, como estratégia pedagógica na educação ambiental, e na inclusão social de sensibilização de crianças, jovens e adultos na questão ambiental.
25
1.4 Objetivos específicos
Analisar o envolvimento dos integrantes que participaram da peça “Na Floresta” e refletir sobre a viabilidade de se criar um cenário lúdico e itinerante com materiais reciclados e recicláveis com recursos de interação e design.
Contribuir para a formação dos participantes, de modo a fomentar a construção de uma cidadania criativa e solidária e promover vivências artísticas.
1.5 Metodologia
Pela característica do estudo, optou‐se pela pesquisa qualitativa, de caráter exploratório e participante do tipo estudo de caso.
Segundo Minayo, a abordagem qualitativa é compreendida como:
[..] com um nível de realidade que não pode ser quantificado, ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (MINAYO, 2005, p. 21).
A pesquisa qualitativa nos permite ter uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, isto é, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito que não pode ser traduzida em números. Por essa razão a interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são básicas neste processo de pesquisa.
Com a atenção também voltada para um conhecimento da atual realidade, procurou‐se constituir uma interação, um vínculo entre pesquisador, integrantes e público para a situação explorada e os problemas que foram vivenciados.
Sobre este tipo de pesquisa exploratória Gil escreve:
Este tipo de pesquisa tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná‐lo mais explicito ou a construir hipóteses. A grande maioria dessas pesquisas envolve: levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesquisado e análise de exemplos que estimulem a compreensão (GIL. 2007, p. 43).
26 questionário para entrevistar os integrantes do elenco e à equipe de produção e expectadores, totalizando trinta e um componentes.
Cumpre destacar que, de acordo com Lakatos e Marconi (2007), “ O questionário é um instrumento de coleta de dados que atinge um número significativo de indivíduos”. Com ele se obtém respostas sem a interferência do pesquisador e a garantia do anonimato do participante
Essas entrevistas buscaram caracterizar uma forma simplificada do entrevistado, definindo sua participação e ligação com a peça teatral “Na Floresta”. Assim, conseguiu‐ se esmiuçar cada experiência vivida durante todo o processo. Foi utilizado o questionário para entrevistar os integrantes do elenco e à equipe de produção, no total, foram alcançados oito participantes. Algumas questões são diferenciadas, direcionadas para os dois tipos de publico‐alvo (APÊNDICE A e APÊNDICE B). Por evidente, as entrevistas respeitaram o anonimato dos indivíduos. Todas elas foram respondidas manuscritamente. Como praxe acadêmica, assinaram o Termo de Consentimento e Esclarecimento (ANEXO A) do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Foram selecionados espectadores de faixas etárias variadas: crianças em idade escolar, adolescentes, jovens e adultos. Eles foram escolhidos das comunidades onde a peça foi apresentada, respectivamente nos bairros de Vila Brasilândia e Jardim Japão, zona norte da cidade de São Paulo.
Após a aplicação e devolução dos questionários, foi realizado o tratamento dos dados e análises das respostas, os quais foram classificados em categorias, valendo‐se dos pressupostos de Bardin (1979) que define a análise de conteúdo como:
Um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativas ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens (BARDIN, 1979, p. 42).
Para a concepção da cenografia da peça, a metodologia de projeto baseou‐se no processo utilizado pelo cenógrafo José Carlos Serroni. A partir do acompanhamento do desenvolvimento do projeto do musical “O médico e o monstro”, verificaram‐se as formas e os métodos de trabalho utilizado pelo mesmo cenógrafo. Além da metodologia, esse processo foi tomado como referencial prático.
27 expectador com relação ao tema dos resíduos sólidos (lixo), colaborando, assim, com as diretrizes da nova política nacional de resíduos sólidos, bem como pode contribuir e ampliar a participação dos sujeitos envolvidos em direção a nova forma de pensar o meio ambiente.
Esta dissertação foi estruturada em cinco partes, sendo a primeira delas esta introdução, hipótese, objetivos e metodologia.
A segunda parte, intitulada “O teatro: um meio transformador” apresenta breve relato da ação teatral e sua arte. É também mostrada a evolução dramatúrgica do teatro e, do mesmo modo a sua evolução técnica. Ainda aborda o teatro e a educação ambiental e referências cenográficas criadas a partir de materiais recicláveis e reciclados.
A terceira parte, intitulada “Princípios básicos para o desenvolvimento de uma peça teatral”, traz o passo a passo do fazer teatral, desde a criação de um roteiro, até a confecção de um cenário, design de luz e seleção de atores. Uma forma de incentivo para se fazer teatro.
A quarta parte, “A peça teatral Na Floresta” descreve toda a trajetória de sua concepção até a apresentação. Mostra o planejamento do trabalho, jogos teatrais, ensaios, desenvolvimento da cenografia, a participação dos indivíduos no processo.
A quinta parte, intitulada “A sensibilização ambiental”, registra uma análise das entrevistas realizadas com os participantes e espectadores da peça.
Por fim, as considerações gerais acerca da pesquisa realizada.
28
2. O TEATRO: UM INSTRUMENTO TRANSFORMADOR
Realizar uma pesquisa sobre teatro pode tornar‐se algo complexo em função da sua longevidade, com efeito, essa antiga atividade artística nos levaria a voltar a séculos e trazer discussões de diversos tipos. Neste capítulo, optou‐se por apresentar elementos que dialogam com nosso objeto de estudo, propondo um histórico da evolução do teatro e de seus componentes, conceituando cada item, segundo especialistas da área.Do ponto de vista do entendimento comum, o teatro é conhecido por proporcionar um amplo conhecimento e ainda expandir a compreensão humana através de diversos contextos e linguagens, tanto textuais como visuais. Ele gera sentimentos distintos e nos leva a uma valorização, não apenas do espetáculo em si, mas também do sujeito que dele participa. Ao vivenciarmos o teatro, pode‐se vê‐lo como uma forma de reconhecimento comunicativo e interativo, que a um só tempo transmite e educa.
O teatro é um bem comum e, por isso mesmo, todos devem ter acesso, igualmente. Ele se enquadra dentro da arte, sendo um espaço de cultura pertencente a toda a humanidade. É um local onde cada ação exige uma reação, uma troca. Além de todo o crescimento intelectual e pessoal que concede às pessoas, ele é uma forma de comunicação, de onde nascem diversos tipos de sentimentos e expectativas, usando uma linguagem inteligível que permite expor o tema em diferentes ambientes. Entretanto, é certamente um grande desafio fazer com que o teatro permeie os meios educacionais de algumas instituições de ensino público enquanto um elemento transformador dos indivíduos que nele agem e interpretam.
Como atividade artística, o teatro promove o desenvolvimento da imaginação, da interação social e da ação dos próprios sujeitos. O uso da linguagem teatral estimula o potencial de criação do indivíduo. É o que explica Marcia Polacchini de Oliveira (2013) na coletânea Crisálida, o libertar da imaginação criadora.
Trabalhando com teatro há quatorze anos, tenho notado cada vez mais as contribuições que ele proporciona ao ser humano, contribuições essas que transcendem as configurações do movimento cênico e se estendem em relação à vida, à plateia e ao palco. A grande relevância que o teatro pode exercer na educação transcorre do seu poder de transformar diversão em conhecimento. Mais especificamente neste trabalho, será visto que estudar mais profundamente esse tema pode evidenciar a realidade atual da questão socioambiental e sinalizar para ajuda de que ela necessita.
29 indivíduo possa conhecer‐se melhor. Amplia a visão, e permite que o ser humano observe as diferentes culturas, uma vez que trabalha de modo cooperativo na produção da arte, amplia a capacidade de dialogar e ainda desperta interesse em compreender.
Pode‐se dizer que existem diversas formas de se apresentar um conteúdo conceitual e que é justamente através delas que conseguimos vislumbrar esse conteúdo. No presente estudo, a forma é o teatro e o seu conteúdo, a educação ambiental.
Segundo Touso (2000), a arte tem se constituído uma forte aliada na luta pelo cuidado com a nossa casa comum, o planeta Terra. Na verdade tem feito parte da humanidade há, pelo menos, 40 mil anos. Hoje, a arte se manifesta de diferentes modos: em muros, em paredes, em outdoors; ou então em ambientes fechados e sagrados: igreja, museus, galerias e residências (TOUSO, 2000). Ela é, portanto, parte da história da espécie humana na Terra, visto que é inerente a TODOS os homens, sem distinção, e não a apenas alguns “eleitos” (BOAL, 2005).
A necessidade de se expressar das mais diversas maneiras faz do homem um ser artístico que usa do seu potencial criativo para expor os seus sentimentos ou para deixar transparecer uma realidade ‐ que ainda não encontrou palavras para ser descrita ‐ por meio da pintura, do desenho, da escultura etc. (GOLDBERG, 2006). A arte é, pois, o instrumento materializador dessa necessidade inseparável da própria sobrevivência humana. Ainda segundo Boal (2003), qualquer arte é sempre um conjunto de sistemas sensoriais que permite aos seres humanos, e só a eles, fazer representações do real. E nas palavras de Tolstoi:
A arte não é, como dizem os metafísicos, manifestação de uma ideia misteriosa, ou beleza, ou Deus; não é, como os esteto‐fisiologistas dizem, uma forma de brincar em que o homem libera um excedente de energia estocada; não é a manifestação de emoções por meio de sinais exteriores; não é a produção de objetos agradáveis; não é, acima de tudo, o prazer; é, sim, um meio de intercâmbio humano, necessário para a vida e para o movimento em direção ao bem de cada homem e da humanidade, unindo‐os em um mesmo sentimento (TOLSTOI, 2002, p. 76).
30 fundamental entre o teatro e as outras formas de arte é a presença de um grupo de espectadores.
O teatro foi o único instrumento de prazer intelectual das multidões por cinco séculos, uma vez que entre os séculos IX e XV a Igreja Católica dominava o sistema educacional (BOAL, 2003). Influenciada por Platão (428 a.C. – 348 a.C.), que dizia que o teatro poderia trazer à tona instintos transgressores, a Igreja proibia a apresentação de espetáculos em seus domínios, embora acontecessem às escondidas, por muitos séculos.
Mais tarde, Tomás de Aquino (1225 – 1274), induzido por Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.), recomendou que se utilizasse o teatro para formar o caráter dos fiéis, já que estes eliminariam os sentimentos impuros através do processo catártico, purgando as emoções. (COURTNEY, 2010). É somente na segunda metade do século XIX que o teatro começou a ter uma participação mais efetiva na educação. O mesmo autor afirma:
Além do mais, o próprio teatro foi um importante instrumento educacional na medida em que disseminava o conhecimento e representava, para o povo, o único prazer literário disponível. Os dramaturgos eram considerados pelos professores tão relevantes quanto Homero, e eram recitados de maneira semelhante. O teatro, em todos os seus aspectos, foi a maior força unificadora e educacional do mundo ático (COURTNEY, 2010, p. 5).
No caso da relação entre teatro e educação no Brasil, os sacerdotes católicos, em especial os jesuítas, aproveitavam os espetáculos teatrais para, em um processo educacional, conquistar os indígenas e catequizá‐los. Também Paulo Freire já tecia comentários no seu livro clássico A Pedagogia do Oprimido sobre os resultados positivos empregados em sua técnica pedagógica com as dramatizações (FREIRE, 1998).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte (PCN‐Arte) apontam que o teatro pode estar aberto a todos e em todos os sentidos, seja como aprendizado, seja como arte e cultura. Além de levar ao indivíduo o acesso a textos dramáticos e espetáculos, ele poderá conhecer também a história do teatro e todo o seu percurso estético,
Levar para o aluno textos dramáticos e fatos da evolução do teatro são importantes para que ele adquira uma visão histórica e contextualizada em que possa referenciar o seu próprio prazer. É preciso estar consciente da qualidade estética e cultural da sua ação no teatro. Os textos devem ser lidos ou recontados para os alunos como estimulo na criação de situações e palavras (BRASIL/MEC, 2000, p. 86).
31 essencial do mercado da cultura. Há cursos universitários para o estudo do fazer teatral. Sabe‐se, porém, que essa ainda é uma realidade distante das classes menos favorecidas, como foi possível constatar em nossa pesquisa. Como recurso pedagógico, o espetáculo teatral se mostra extremamente conveniente para as comunidades mais carentes.
2.1 A evolução dramatúrgica do teatro
O teatro é uma arte que está em constante evolução e permanentemente se redescobrindo. O processo dramatúrgico teatral possui uma evolução que é distinta em cada uma de suas etapas. Essa evolução foi conceituada por Rubem Queiroz Cobra (2006), em três estilos de dramaturgia: dramaturgia da retórica, dramaturgia da conversação e dramaturgia da ilusão de realidade, estilos esses que aconteceram em épocas distintas e longínquas umas das outras, caracterizando, assim, cada período e marcadas por grandes nomes do teatro. Assim, nas lições de Cobra:
1. A dramaturgia retórica: vem da antiguidade até ao Renascimento, do período grego até à época de Shakespeare ao tempo de Isabel I. Nessa fase a expressão teatral recorria ao poder da retórica e da poesia, apresentava‐se sobre plataformas a céu aberto, lidava com discursos e palavras impressionantes; os atores vestiam roupas suntuosas, e desfilavam em procissão através do palco. O Drama da Retórica era consequência das condições físicas do palco elisabetano. Não havia cenários pintados ou montados, e o contexto em que a história acontecia era sugerido no drama por meio de monólogos, passagens poéticas, descrevendo a luz do luar, ou a floresta, o mar, as montanhas, conforme necessário para ambientar a história. Duas velas e a imagem de um santo sobre uma mesa era bastante para representar um templo. A magnificência, mais que propriedade da indumentária, era buscada pelo ator de plataforma na dramaturgia da retórica (COBRA, 2006).
40 Nesses teatros, “durante séculos, o palco foi uma máquina de criar ilusões, enganos, uma realidade ideal para afastar o ser humano dos mal‐entendidos que ele inventava para si mesmo” (DEL NERO, 2008).
Existem outros tipos de lugar teatral além dos citados acima, dentre os quais importa destacar um que faz parte de nossa cultura brasileira e mostra toda a nossa diversidade: o teatro de rua. Já na Idade Média, o lugar teatral eram as praças, pois não se construíam edifícios teatrais; assim, as apresentações eram o acontecimento da cidade de que todos participavam (MANTOVANI, 1989).
Podemos definir teatro de rua como “teatro que se produz em locais exteriores às construções tradicionais: rua, praça, mercado, metrô, universidade, etc.” (PAVIS, 1999, p.385). Ele ocupa áreas abertas, fazendo delas seu espaço cênico, permitindo, assim, a interação total com o público.
O teatro de rua vem ao encontro de uma realidade pela a oportunidade de apresentar um espetáculo teatral que costuma ser privilegio de apenas uma pequena parte da sociedade. Este é justamente um dos motivos que valorizam o teatro de rua: levar o teatro às pessoas que não tem acesso ao fazer teatral convencional.
Muitas vezes, o teatro de rua acaba sendo mal compreendido, visto que as pessoas, até aquelas que nunca foram ao teatro, têm em mente uma representação de teatro em palco nos moldes do teatro italiano; veem, então, o teatro de rua como como uma forma de agitação social, e acabam menosprezando‐o, o que ofusca sua missão e grandeza.
Pensar propostas que se valem do teatro de rua significa uma maneira de descentralizar o teatro, de levá‐lo às mais distintas pessoas e lugares, de democratizar a cultura e a arte teatral, colocando o ator em contato direto com o público.
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2.3 Sobre cenografia
A palavra cenografia tem origem grega e deriva de skenographia. Skene= tenda, que era onde os atores trocavam de roupas; e graphia= desenho, ou seja, eram desenhos pintados na parte da frente das tendas, onde se trocavam os figurinos dos atores (MANTOVANI, 1989).
Para os gregos antigos, a cenografia era a arte de enfeitar o teatro e de arranjar a pintura que resultava dessa técnica. No Renascimento, a cenografia consistia em desenhar e pintar uma tela de fundo em perspectiva. Já nos tempos modernos, cenografia passa a ser vista como ciência e arte de organizar o palco e o espaço teatral (MANTOVANI, 1989). Assim, a cenografia se estabelece cada vez mais como um lugar de participação no espaço cênico, ultrapassando a noção de ornamentação e de embalagem que ainda se vincula, muitas vezes, à concepção antiquada do teatro como decoração. A cenografia se configura no espaço tridimensional, ao qual seria preciso também adicionar a dimensão temporal; não deve ser compreendida apenas uma arte pictórica em tela pintada, como se deu até a época do naturalismo. A cena teatral não pode ser considerada somente como a consolidação de problemáticas indicações cênicas. Ela recusa‐se a exercer o papel de “simples figurante” com relação a um texto preexistente e categórico.
43 Pode‐se afirmar que a cenografia completa o espaço que os atores, bailarinos, cantores e outros artistas utilizam para expor outra vida. Nesse sentido, o espaço cênico deve envolver os artistas, deixando‐os confortáveis naquele espaço para que possam estar concentrados em seu trabalho; deve proporcionar ao mesmo tempo uma comunicação com o público, sendo um elo entre o palco e a plateia.
A cenografia depende muito do ponto de vista de cada cenógrafo, da formação, do campo em que atua. Ao pé da letra cenografia é a “grafia da cena”, o desenho da cena, é como você traduz num desenho plástico tridimensional um determinado espaço para atender uma determinada ação. É um projeto gráfico, plástico, ela (cenografia) é muito clima, é muito atmosfera, ela é aquilo que, de certa forma, as vezes, até subliminarmente, cria para o espectador certos momentos, certos espaços que nem estão ali (SERRONI, 1999, p. 32).
Uma boa cenografia fala por si só. Ao se abrirem as cortinas de uma apresentação teatral, a plateia pode sentir algo diferente de imediato, uma vez que a cenografia antecipa a ação ou prepara para ela. Surgem vários sentimentos, como, por exemplo, anseio ou medo, coisas que o espaço, o cenário, a iluminação e a ação podem despertar.
2.4 Princípios básicos para montagem cenográfica
A montagem de um projeto cenográfico requer do profissional a compreensão e o uso de procedimentos específicos nas praticas cênicas do espetáculo e da performance; supõe também a consciência de equipe e a experiência pessoal do processo da investigação prática. O planejamento adequado de um espetáculo parte da habilidade e competência do profissional cênico em identificar os elementos preliminares necessários, relacionando‐os na geração de uma proposta de composição cênica.
Mesmo em um projeto teatral educativo, que não requer altos custos com cenografia, é necessário que se tenha um profissional da área, habilitado para acompanhar e direcionar o projeto, entender e compreender o texto em que se baseará o trabalho cenográfico e cênico. A vantagem em trabalhar com teatro educacional está na simplicidade de se poder recorrer a soluções alternativas e criativas, às vezes levando em conta a escassez de recursos financeiros e tecnológicos.
44 do meio em que vivem. O uso de lonas e papelões para a construção de uma cenário são ótimas opções para a encenação e de fácil manuseio, como afirma Cobra (2006):
Com a utilização de papelão podem ser improvisadas os abajures, rádios antigos, oratórios, quadros pendurados na parede ou em um painel, colunas, etc. Uma viga pode ser imitada com papelão dobrado na forma própria, riscado com lápis‐cera marrom para imitar as fibras da madeira, e pintado com verniz. Papel machê pintado de cinza pode ser modelado para imitar rochas e vasos de plantas artificiais (COBRA, 2006).
2.5 Iluminação cênica teatral
A iluminação cênica teatral é um artifício que começou a ser utilizado apenas no século XVII, ganhando maior importância com a descoberta da eletricidade. No teatro, a luz não serve apenas para demarcar ou indicar onde o ator deve atuar; ela é capaz de dominar um espetáculo, proporcionando variações e ilusões impossíveis, às vezes de se imaginar. Ela se presta a delimitar o lugar da cena, sim, mas não só isso; também se encarrega de formar relações entre o ator, os objetos e os cenários.
“A iluminação em si é um elemento que pode produzir efeitos ilimitados, restaurando a liberdade... Ela se torna para nós encenadores o que é a pallet para um pintor... O ator move‐se no desenho das sombras das luzes, ele é mergulhado no ambiente que lhe foi destinado. O artista compreende facilmente quão grande é o aperfeiçoamento neste contorno” (MORAN, 2007, p.7).
Cabe à luz permitir que o espectador assista claramente o que está acontecendo em cena; que se destaque algum ato em especifico ou que oculte personagens e cenários. A iluminação pode causar ilusões permitindo que formas bidimensionais se tornem tridimensional, encorpando e dando realismo a cenas; ou seja, com a iluminação, pode‐ se ganhar o público e tornar o espetáculo muito mais atraente com aspecto de verdade.
47 perceber o ritmo que o texto possui para, então, corrigir falhas que possam provocar na execução da peça teatral um ruído de comunicação –palavras de difícil pronúncia, frases truncadas, pontuação indevida, entre outras.
2.7 Teatro e educação ambiental
Como foi colocado anteriormente, diante da evidência da crise ambiental, é necessário a pesquisa de novas formas de ensino que modifiquem e multipliquem práticas comportamentais que melhorem a relação do homem com o meio ambiente (RUSS; ALMEIDA; SAVI, 2009; GOLDBERG, 2006).
Um dos caminhos apontados para a educação é a inclusão de práticas de várias formas de expressão artística no processo de aprendizagem. Araújo e Pasquarelli (2007) afirmam que:
As artes e a religiões desenvolveram caminhos para integrar o ser humano com o cosmos. Cada uma delas em seu contexto cultural e histórico, a seu modo. Nosso papel talvez seja o de resgatar e re‐ significar esses conhecimentos para nos reencontrarmos com o mundo e, através da educação, ajudarmos outras pessoas a se reencontrarem (ARAÚJO; PASQUARELLI 2007, p. 328).
Como visto, sendo a linguagem artística natural ao desenvolvimento do ser humano, arte e educação dialogam em uma estreita relação. Para Morais e Sato (2008), a arte/educação e a educação ambiental, por terem muita semelhança, podem atuar juntas na transformação do homem. Nesse sentido, podemos conceber o desenvolvimento da expressão artística como um meio de diminuir a distância entre os conhecimentos científicos e o cidadão comum, e sensibilizar o educando para as causas ambientais (GOLDBERG, 2006) .
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A perspectiva ambiental oferece instrumentos para que o aluno possa compreender problemas que afetam sua vida, a de sua comunidade, a de seu país e a do planeta.(...) Nesse sentido, as situações de ensino devem se organizar de forma a proporcionar oportunidades para que o aluno possa utilizar o conhecimento sobre Meio Ambiente para compreender a sua realidade e atuar sobre ela. O exercício da participação em diferentes instâncias (desde atividades dentro da própria escola, até movimentos mais amplos referentes a problemas da comunidade) é também fundamental para que os alunos possam contextualizar o que foi aprendido (BRASIL/MEC, 2000, p. 48).
É cada vez mais notória a necessidade de mudanças de comportamento no agir cotidiano no que se refere ao meio ambiente. Uma delas passa por um escopo social da ação sustentável; ação que deve ser entendida como um maior domínio sobre os recursos naturais que devem ser usados com racionalidade e expressar a melhoria da qualidade de vida do presente e, ao mesmo tempo, garantir a qualidade de vida da geração futura.
Conforme Vezzoli e Manzini (2002): “Na verdade nem tudo que apresentar alguma melhoria em temas ambientais pode ser considerado realmente sustentável.”. Devido à popularização da expressão desenvolvimento sustentável, constata‐se que, em diversas atividades econômicas contemporâneas, tem‐se buscado o status do sustentável apenas para, de certa forma, demonstrar atitudes condizentes com as tendências de mercado; ou seja, a expressão tornou‐se uma estratégia de marketing para render mais produtos. Por outro lado, porém, há empresas que realmente propõem e promovem a questão da sustentabilidade estritamente vinculada à proteção do meio ambiente.
O sentido da sustentabilidade ambiental deve ser entendido como a resultante de uma combinação de fatores a serem considerados: o social, o econômico. Sem esses fatores, não existe desenvolvimento sustentável. Manzini e Vezzoli (2002) define sustentabilidade ambiental da seguinte forma:
A expressão “sustentabilidade ambiental” refere‐se às condições sistêmicas a partir das quais as atividades humanas, em escala mundial ou em escala local, não perturbem os ciclos naturais além dos limites de resiliência dos ecossistemas nos quais são baseados e, ao mesmo tempo, não empobrecem o capital natural que será herdado pelas gerações futuras (MANZINI e Vezzoli, 2002, p.22).
49 e de novas condutas pelo caminho da sensibilização, pelo exercício do imaginário do indivíduo, de modo a intervir em benefício da sustentabilidade. Sem deixar de lado que o teatro também pode ser pensado como uma possibilidade de expressão do eu, como experiência de pensamento independente e criativo que traz contribuições valiosas à educação escolar (Ribeiro, 2004).
Destaca‐se, enfim, que o teatro é um campo aberto a diversas investigações e articulações no campo da educação, uma vez que é também um conhecimento específico do ensino de arte, previsto na Lei 9394/96 Diretrizes e Bases da Educação Nacional, art. 26, § 2º. Diz esse artigo que é um componente curricular obrigatório nos diversos níveis da educação básica (BRANDÃO, 2007). Assim, a proposta é observar e analisar as possíveis contribuições da arte teatral no processo educativo especifico para o campo ambiental.
2.8 Cenografia criada com aproveitamento de materiais reciclados
Com a proposta de despertar para a conscientização ambiental, apresenta‐se um projeto que materializa de imediato essa ideia. Trata‐se de um exemplo dessa proposta mediante a criação de uma intervenção feita pelo Estúdio Bijari onde alguns designers e cenógrafos contribuíram através de formas lúdicas e criativas para a montagem de um cenário. O tema da intervenção “Oceano Invadido” é uma instalação imersa no ambiente marinho em estado de desintegração; mostra um dos mais predatórios tipos de agressão ambiental causada pelos seres humanos: a poluição ambiental dos oceanos pelos resíduos plásticos, cujos impactos de proporções globais se perpetuam por gerações, por se tratar da não biodegradáveis.Era uma exposição realizada no vão octogonal “Átrio dos Vitrais”, da Caixa Cultural Sé de São Paulo – (SP). Todos os objetos que compunham a decoração do ambiente foram os próprios matérias que causam a poluição dos oceanos: garrafas PET e sacos plásticos. Foram também criados pufes que retratavam as anêmonas‐plásticas, onde os visitantes poderia descansar e apreciar a exposição, como mostram as figuras a seguir.
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3. PRINCÍPIOS BÁSICOS PARA O DESENVOLVIMENTO DE UMA PEÇA
TEATRAL
A partir dos conceitos e evolução do teatro já apresentados, serão expostos na sequência, os princípios básicos para o desenvolvimento de uma peça teatral, princípios estes que serviram para orientar a peça “Na Floresta” e, por esse motivo foram considerados e integrados ao objeto de nosso estudo. Em toda prática artística, o desenvolvimento se dá a partir de motivações teóricas, implícitas ou explícitas. Ao mesmo tempo, a teoria sem uma aplicação prática se torna algo morto (ROUBINE, 1998). O teatro pode representar uma chance de observar várias e diferentes particularidades que se estabelecem entre a teoria e a prática, seja para o ator, seja para o público.
Pensando artisticamente, o ser humano, ao construir formas artísticas, pode transformar o espaço. Esse espaço se caracteriza por uma expressão plástica, cênica, musical ou outra. Por meio de um processo artístico, conseguimos expandir o conhecimento e também aplicar de forma prática cada aspecto literal e teórico.
Seguindo algumas diretrizes dadas por Cobra (2006), são expostas neste capítulo alguns aspectos importantes para um desenvolvimento básico e inicial de uma peça teatral. São pontuações que ajudarão o leitor a poder desbravar o mundo teatral, podendo, assim, criar desde um roteiro até, quem sabe, a execução final de uma peça de teatro.
3.1 O roteiro de teatro
Para iniciar um projeto teatral, é preciso ter em mãos um texto teatral. Ele deve estar escrito de uma forma diferenciada de um romance, de um conto ou de qualquer outro tipo de texto. O texto teatral é chamado de roteiro. Para se escrever um roteiro, é importante conhecer um pouco de teatro. Assistir a peças teatrais torna o processo menos complicado, pois elas fornecerão uma bagagem e referencias, além de inspirações para uma abertura da mente, para ideias acerca do quê criar e também do quê não criar.
É necessário que a pessoa tenha assistido a um espetáculo teatral pelo menos uma vez, e que leia alguns roteiros, para que tenha a noção completa do que é escrever uma peça, e sobretudo para compreender as limitações a que o teatro está sujeito, se comparado a outros meios de produção artística como a literatura e o cinema, e também o potencial dessa forma rica de expressão artística (COBRA, 2006).