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A morada paulista moderna: espaços interiores nas residências de João Batista Vilanova Artigas

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

DANIELA PERPÉTUO

A MORADA PAULISTA MODERNA: ESPAÇOS INTERIORES NAS RESIDÊNCIAS DE JOÃO BATISTA VILANOVA ARTIGAS.

JUNHO

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A morada paulista moderna: espaços interiores nas residências de João Batista Vilanova Artigas.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito à obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

Orientadora: Profa. Dra. Ruth Verde Zein

São Paulo

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P453 m Perpétuo, Daniela.

A morada paulista moderna: espaços interiores nas residências de João Batista Vilanova Artigas. / Daniela Perpétuo – 2012.

251 f. : il. ; 30 cm.

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DANIELA PERPETUO

A MORADA PAULISTA MODERNA: ESPAÇOS INTERIORES NAS RESIDÊNCIAS DE JOÃO BATISTA VILANOVA ARTIGAS.

Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

Aprovada em

BANCA EXAMINADORA

Profa. Dra. Ruth Verde Zein – Orientadora

Universidade Prebiteriana Mackenzie

Profa. Dra. Marta Silveira Peixoto

Uni Ritter - Centro Universitário Ritter dos Reis

__________________________________________________________________

Profa. Dra. Cecília Rodrigues dos Santos

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Aos meus amados pais, pelo apoio e incentivo na realização deste trabalho.

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À Profa. Dra. Ruth Verde Zein, pela ajuda e força que me deu durante o percurso de todo o trabalho, como também o imenso aprendizado que tive com ela.

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Este trabalho pretende tratar o tema da arquitetura paulista moderna, com foco prioritário nos interiores arquitetônicos, e o estudo de caso de quatro residências selecionadas de João Batista Vilanova Artigas, analisando sua arquitetura e configuração interna, ou seja, o conjunto de elementos que criam a “atmosfera” dos ambientes. As quatro casas que serão mais atentamente analisadas são: a “Casinha”, de 1942; a Segunda Casa do Arquiteto, de 1949; a Casa Olga Baeta, de 1957 e a Residência Elza Berquó, de 1967. Outras residências do arquiteto serão mais brevemente estudadas, tais como a Casa Rubens de Mendonça, ou Casa dos Triângulos, de 1959; a Casa Telmo Porto, de 1968 e a Casa Martirani, de 1974. As análises serão realizadas a partir da comparação de fontes fotográficas de diferentes épocas e atuais. Cada conjunto de usuários, em diferentes épocas, ajudou a configurar as ambientações dos cômodos de diferentes maneiras, o que possibilita verificar, indiretamente, suas interferências nos arranjos dos interiores das casas.

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This research is concentrated on the issue of modern architecture in São Paulo, with primary focus on interior architecture, and a study case of four homes selected of the Brazilian architect João Batista Vilanova Artigas, analyzing its architecture and interior configuration, and the set of elements, which create the "atmosphere" of settings. The four homes that will be more closely analyzed are: the "Cottage" (“Casinha”), from 1942; the Second House of the Architect, from 1949; Olga Beata’s House, from 1957, and Elza Berquó’s House, from 1967. Other homes will also be studied, such as Rubens de Mendonça’s House, or Triangles’s house, from 1959; the Telmo Porto’s house, from 1968, and Martirani’s house, from 1974. The analyzis will be performed from the comparison of photographic sources from different times. Each set of users, at different times, helped set up the arrangement of the rooms in different ways, which allows to indirectly check their interference in the internal arrangements of the houses.

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Sumário

Introdução ... 10

Primeiro Capítulo: Os Interiores Arquitetônicos Modernos. ... 15

1.1 As Revistas de Arquitetura e a divulgação da casa moderna. ... 16

1.2 Cozinhas, banheiros e áreas de serviço: a busca por higiene e limpeza. .... 39

Segundo Capítulo: Casas Paulistas Modernas ... 50

2.1 Gregory Warchavchik e a inauguração da casa modernista em São Paulo. 51 2.2 Lina Bo Bardi, o Studio de Arte Palma e a Casa de Vidro. ... 64

2.3 As “Case Study Houses”: o programa americano que modificou paradigmas da arquitetura moderna. ... 75

Terceiro Capítulo: Desenho de mobiliário, quatro casas de Vilanova Artigas e outras casas do arquiteto. ... 82

3.1 Vilanova Artigas: seus métodos de trabalho e a ambientação de interiores moderna. ... 83

3.2 Artigas e o design de mobiliário. ... 99

3.3 A “CASINHA” DE 1942. ... 103

3.4 Casa de 1949 – 2ª Casa do Arquiteto ... 135

3.5 Casa Olga Baeta, 1956-1957. ... 163

3.6 Casa Elza Berquó, de 1967. ... 191

3.7 Outras Casas de Vilanova Artigas ... 212

Conclusão ... 242

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Introdução

Este trabalho pretende tratar o tema da arquitetura paulista moderna, com foco prioritário nos interiores arquitetônicos, e o estudo de caso de quatro residências selecionadas de João Batista Vilanova Artigas, analisando sua arquitetura e configuração interna. Casas que correspondem a diferentes momentos de sua produção, de sua primeira residência, a “Casinha” de 1942, até a Casa Elza Berquó, de 1967, considerando suas diferenças e semelhanças, pois em cada residência selecionada Artigas introduziu novos elementos e novas configurações e cada uma delas marcou profundamente seu trabalho.

A escolha do tema deve-se ao grande interesse da autora em pesquisar os arranjos interiores das residências, tema desenvolvido em sua especialização, em Design de Interiores, no trabalho profissional cotidiano voltado para esta área, resultando na vontade de aprofundar esses estudos na dissertação de Mestrado. Estudar as residências de um arquiteto consagrado, como Artigas, parece ser um caminho para descobertas importantes, e apesar do extenso número de estudos já existentes sobre sua obra, poucos focam no tema das ambientações internas e arquitetura de interiores de suas residências. Além disso, nunca será demais pesquisar um profissional que nos há legado um conjunto de obras tão rico e cheio de detalhes a serem re-descobertos, que esta dissertação de mestrado quer conhecer e que poderá representar o começo de novos futuros estudos.

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foco prioritário na arquitetura de interiores das áreas sociais. No estudo desses ambientes, serão analisados os volumes e dimensões, verificadas suas qualidades, o arranjo interno do mobiliário, os materiais de acabamento, a variedade de texturas, a densidade na disposição dos objetos, a iluminação natural e artificial e demais elementos que definem sua ambiência. Entende-se que uma casa habitada é um lar; essa condição que a diferencia pode ser considerada como definição de sua “domesticidade”, ou seja, a qualidade que permite habitá-la e vivenciá-la de maneira confortável. Uma casa habitada – sua arquitetura e sua arquitetura de interiores – pode apresentar variados graus de conforto e de adequação às necessidades correntes da vida cotidiana. Em uma residência cuja arquitetura seja considerada “radical” e cujos interiores são ambientados com o máximo rigor e abstração, conforme proposto pela arquitetura moderna, via de regra os objetos pessoais, familiares e antigos não são permitidos, ou não estão comumente presentes, pois o passado, em princípio, não teria lugar no moderno. Esta casa seria como uma máquina, um mecanismo de moradia, apresentando um baixo grau de domesticidade e ativando, no usuário dos seus ambientes, ou seja, no seu morador, possivelmente um menor grau de conforto – qualidade que é também ativada pelo tato, não apenas pela visão.

No que se refere à ambientação dos interiores, será analisado o conjunto de elementos que criam a “atmosfera” dos ambientes, ou seja: a distribuição do mobiliário, fixo ou não, e sua configuração e disposição; as tendências de desenho adotadas na composição desses ambientes; os objetos ali dispostos; a iluminação; as texturas, os materiais de revestimento e os tipos de superfícies utilizadas; as cores; os tecidos, estofamentos e forrações; os materiais utilizados na estrutura e composição da residência.

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possibilita verificar, indiretamente, suas interferências nos arranjos dos interiores das casas. O foco será nas áreas sociais das residências, como as salas de jantar, de estar, dos estúdios, halls de circulações e varandas; principalmente porque são os cômodos mais bem documentados, sobre os quais é possível conseguir mais material.

As quatro casas de Vilanova Artigas que serão mais atentamente analisadas são: a “Casinha”, de 1942; a Segunda Casa do Arquiteto, de 1949; a Casa Olga Baeta, de 1957 e a Residência Elza Berquó, de 1967. Outras residências do arquiteto serão mais brevemente estudadas, tais como a Casa Rubens de Mendonça, ou Casa dos Triângulos, de 1959; a Casa Telmo Porto, de 1968 e a Casa Martirani, de 1974, sobre quais também foi possível conseguir algum material para análise, embora menos amplo. As comparações com outros exemplos contemporâneos de residências, projetadas por outros arquitetos, terão papel de destaque nas análises, pois a comparação permite verificar as riquezas de cada caso e possibilita entender melhor os projetos de Artigas.

A ambientação dos interiores modernos é aspecto de extrema importância para a consolidação da arquitetura moderna e foi, provavelmente, um dos patamares mais difíceis que ela precisou alcançar. É nos espaços interiores das residências que os usuários irão viver e estabelecer um estreito relacionamento com a arquitetura; e por isso os moradores se posicionam frequentemente como “autor da ambientação de sua própria casa, ou como participante ativo do projeto”,1 como afirma Marta Peixoto. Na arquitetura moderna, isso “se agrava, uma vez que toda sua abstração parece carecer de uma maior domesticidade”.2 Ainda na arquitetura moderna, o espaço deveria conformar um contínuo unitário, onde exterior e interior fazem parte da residência e se integram em uníssono. Numa arquitetura que se referenciava no novo, na era da máquina e do progresso, a arquitetura de interiores e a ambientação

1

Peixoto, Marta Silveira. 2006. P. 2.

2

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interna dos cômodos deveria seguir pelo mesmo caminho, o rigor estabelecido na construção deveria ser o mesmo para o arranjo dos móveis, objetos e elementos nos cômodos da casa.

A dissertação foi organizada em três partes. A primeira é a de contextualização do tema da arquitetura moderna de interiores brasileira, em especial de São Paulo, tendo como fonte principal as publicações periódicas, ou seja, as revistas de arquitetura divulgadas entre as décadas de 1930 e 1970. Na segunda parte, serão analisadas algumas obras de arquitetos contemporâneos e do Artigas, podendo-se notar as semelhanças de projetos e idéias. A terceira parte é a análise crítica das quatro residências de Vilanova Artigas, complementada por alguns estudos sobre as outras três residências, enfatizando a descrição e buscando compreender as distintas formas com que as ambientações dos interiores modernos de Artigas possam ter sido configuradas e transformadas ao longo de diferentes décadas.

O primeiro capítulo irá tratar da contextualização do tema através da análise realizada nas revistas de arquitetura em circulação desde a década de 1930 até a década de 1970, em especial a Revista Acrópole, uma das revistas especializadas em arquitetura e mais importantes daquele momento. As publicações de residências, a configuração dos interiores arquitetônicos e as propagandas de novos produtos sendo introduzidos no mercado dão corpo ao contexto da época, cuja riqueza de detalhes contribui para o embasamento da dissertação.

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moderna e serviu de exemplo para arquitetos de vários países, inclusive para os arquitetos daqui e, provavelmente, também para Artigas.

O terceiro capítulo tratará das qualidades das obras selecionadas de Artigas: quatro residências, construídas em distintos momentos da carreira do arquiteto, consideradas significativas pela introdução de novas idéias e experimentações que marcaram sua carreira e consolidaram seu trabalho. A análise destas residências terá como ponto focal a ambientação de interiores e os interiores arquitetônicos, bem como seu conjunto de idéias e premissas, tratando a casa como um objeto cultural, no qual as relações entre casa e usuário se conformam na reflexão sobre o morar na modernidade. Em complemento, será apresentada uma análise menos extensa de outras três residências do arquiteto, das quais não se obteve material suficiente para um estudo mais aprofundado para este trabalho.

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Primeiro Capítulo: Os Interiores Arquitetônicos Modernos.

Este primeiro capítulo tratará de contextualizar o tema da arquitetura de interiores moderna com base em análises realizadas na Revista Acrópole, cujas publicações especializadas em arquitetura e nos interiores arquitetônicos foram importantes na época de sua circulação, de 1930 até 1970.

Será apresentada uma análise, realizada com base em fotografias publicadas na mencionada revista, sobre a gradual mudança dos interiores arquitetônicos ao longo dos anos, e como as propagandas de novos produtos inseridos no mercado, principalmente após 1950, influenciaram a introdução e consolidação do morar moderno como hábito na vida das pessoas. As áreas sociais serão o foco dessa contextualização no primeiro subcapítulo, já as cozinhas, banheiros e áreas de serviços serão apresentadoas posteriormente, no segundo subcapítulo.

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1.1 As Revistas de Arquitetura e a divulgação da casa moderna.

Como rica fonte de estudo e de embasamento teórico para o tema desta monografia, as revistas utilizadas são um ponto referencial da arquitetura corrente em cada época. No Brasil, aumentou o número de revistas de arquitetura em circulação no período após 1945. As principais revistas de arquitetura e decoração que circulavam eram: Acrópole, do período de 1938 a 1971; Habitat, de 1950 a 1965; Módulo, de 1955 a 1964; Arquitetura e Engenharia, de 1946 a 1965; Brasil Arquitetura Contemporânea, de 1953 a 1958; Arquitetura, de 1961 a 1969; Brasília, de 1957 a 1961, além de revistas de decoração, como Casa e Jardim e Casa Vogue.

A Revista Acrópole, editada entre o período de 1938 e 1971 no Brasil, foi um importante meio de comunicação específico para a arquitetura, divulgando textos de arquitetos e projetos da época. Também divulgava propagandas de lojas de decoração, materiais inéditos para as casas – como azulejos e louças de cores diferentes – aquecedores, móveis planejados para cozinhas, fogões, geladeiras e todo tipo de aparato que a casa moderna deveria ter. Por meio de suas edições, pode-se constatar como o tema ambientação moderna foi gradativamente ganhando espaço a partir da configuração e desenho dos móveis e dos novos equipamentos nas casas.

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De acordo com Marta Peixoto,

O discurso moderno, sempre muito interessado em negar toda e qualquer ligação com o passado é, frequentemente, desmascarado, por revelar uma prática apenas disfarçada, mesmo que habilmente, de ruptura. E é através das ambientações modernas que verifico quais e como as características do século XIX persistem na produção das ambientações da primeira metade do século XX, principalmente.3

Para se constatar como os hábitos e valores do século XIX ainda persistiam nas ambientações das primeiras décadas do século XX, basta analisarmos alguns interiores publicados nos anos 1930. Nas próximas figuras, publicadas na revista Acrópole, podemos notar os móveis robustos, cujo desenho faz referência a estilos europeus passados, do século XIX, além de paredes e pisos também serem rebuscados e desenhados.

Na figura 1, publicada no segundo número da revista, em 1938, podem ser vistos diversos elementos que compõem esse arranjo interno, tais como: as cortinas volumosas; o tecido de desenho rebuscado com franjas sobre o piano e o estofado felpudo sobre a banqueta; o abajur de formas sinuosas, as esculturas e bibelôs nas prateleiras atrás do piano, além do vaso de plantas, um porta retratos e outros dois objetos sobre ele; o tapete de cor clara; o móvel, localizado ao fundo da foto, no hall de circulação, que talvez seja um aparador com um objeto de decoração sobre ele e um espelho pendurado na parede logo acima. Enfim, uma série de objetos e móveis que indicavam o exemplo de ambientação de uma sala para a época e que contrastam com as vergas retas da abertura da parede para a sala, ao se apresentar sem ornamentos ou molduras em sua volta, como requeria a arquitetura moderna. O conforto e a calidez destes ambientes era associado a esta reunião de objetos, móveis e texturas.

3

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Figura 1 - Sala de estar publicada na revista. Fonte: Revista Acrópole n°2, 1938, São Paulo: Edições técnicas brasileiras, p. 27.

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Figura 2 - Sala de Jantar de uma residência. Fonte: Acrópole n°11 de 1939, São Paulo: Edições técnicas brasileiras, p. 11.

Este modo de ambientação pode ser comparado a uma descrição que Marta Peixoto faz das primeiras residências realizadas por Le Corbusier, antes de se tornar o mestre da arquitetura moderna, por isso referenciado como Charles Edouard. A autora afirma dessa forma:

O primeiro trabalho de arquitetura de Charles Edouard que foi executado é a Villa Falet, de 1906, quando ele está com 19 anos. A casa, que é feita junto com o colega René Chapallaz, é muito ornamentada, em um estilo derivado do Jura regional, com seus motivos de árvores e flores estilizadas. A ornamentação cobre paredes, portas, madeiramento, balaustradas e frisos, dominada pela idéia da síntese das artes, do gesamtkunstwerk, como aquela promovida pelo Art Nouveau.4

Segundo a autora, outros trabalhos de Le Corbusier ainda seguiram esta linha de projeto, e foi partir de 1915 que ele começou a desenhar móveis em conjunto, “subordinados à idéia de arquitetura interior”5, buscando uma maior

4

(Peixoto, 2006, p. 62)

5

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simplicidade nas formas dos móveis e objetos, além de sobriedade nas cores e texturas aplicadas, que mais tarde se manifestariam plenamente.

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Figura 3 - Propaganda de John Graz, decorador. Fonte: Acrópole n° 8, de 1939, São Paulo: Edições técnicas brasileiras, p. 28.

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Living-room – poltronas e divâ cobertos de veludo ouro antigo, com filetes de couro beje. Cortinas do mesmo veludo, com haste e suporte de ferro batido. Mesa consol (sic), com tampa preta, candelabro de madeira dourada e colorido antigo. Movel bar com dobradiças de ferro batido e outras decorações. Arca com decorações douradas coloridas.[...] Este ambiente é inspirado ao estilo Tudor Inglez, sentido com espírito pessoal, adequado ao nosso tempo. Sem copias, nem servilismo algum.6

É importante notar a referência a que o autor do ambiente fez para compor o projeto, o “Tudor Inglez”, que ele comenta como não sendo uma cópia, mas uma interpretação pessoal, e quando ele se refere a “adequada ao nosso tempo”, é provavelmente para que as pessoas vejam que a inspiração é de um estilo, mas a essência do projeto é moderna, adequada conforme os hábitos cotidianos à época. Vários cômodos publicados nas revistas possuem um nome para a ambientação, sempre com referências de países Europeus, como a Inglaterra ou a França.

6

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Figura 4 –––– "Decorações pelo professor Dinucci". Fonte: Acrópole n°°°°8, de 1939, São Paulo: Edições técnicas brasileiras, p. 20.

Na próxima sala (fig. 5), também de 1939, é possível ver móveis menos ornamentados, sem entalhes na madeira, e a presença do vidro na mesa central. Apesar dos detalhes em madeira nas portas e poucos objetos, como uma pequena estátua à direita e as flores na mesa, é um ambiente diferente dos demais, por apresentar os tetos e as paredes sem ornamentos e as duas portas localizadas nas paredes laterais, também sem ornamentos. A poltrona, no lado esquerdo, e o móvel que está ao lado direito da foto possuem um desenho de forma quadrada, com linhas mais retas, diferentemente das formas arredondadas dos móveis, com pernas torneadas, que apareciam frequentemente nas fotos do ano de 1938. Na descrição da foto, na revista, esta ambientação também realizada pelo prof. Felipe Dinucci, na residência de Carlos Rusco e possui a seguinte explicação:

Tapetes bege claro e marrom vermelho, escada de mármore marfim e preto belga. Grade da mesma, cobre lúcido (sic) e cromo. Portas de jacarandá, com faixas pirografadas, cor preta e zarcon e chapa de alumínio. Luz indireta. Pavimento mármore marfim.7

7

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Figura 5 - Decorações do Prof. Dinucci. Fonte: Acrópole n°10, 1939, p. 16.

Ao descrever a trajetória da evolução do móvel moderno, Maria Cecília nos explica que foi depois dos anos 30,

Com a emergência da arquitetura moderna, com a ressonância e o assentamento das principais idéias e polêmicas levantadas pelo Modernismo no âmbito da literatura e das artes plásticas, do decênio anterior, enfim, com o desejo de modernização geral do país, configurou-se um conjunto de fatores que desempenhou importante papel no processo de modernização da mobília brasileira.8

Esta afirmação nos confirma entrada gradual do morar moderno, proposto pelas vanguardas do século XX, como hábito na vida das pessoas.

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Em 1939, também começam a aparecer propagandas de lojas que vendem móveis modernos, como a do “Studio Casa e Jardim (fig. 6), que apresenta um móvel branco sem ornamento, de forma quadrada, um “armário tocador em acer, revestido com couro branco”9.

Figura 6 - Propaganda da loja Studio Casa e Jardim. Fonte: Acrópole n° 12, 1939, p. 30.

Os móveis que entrarão na composição das ambientações, a partir dos anos 40, são de grande importância para o começo da consolidação do interior moderno, pois, como comenta Maria Cecília Santos, acompanhavam, mesmo que com certo atraso, as:

Principais trajetórias das vanguardas européias. Primeiro, a fase de produção de um móvel dentro das tendências internacionais das artes decorativas industriais: despojado, linhas retas, seguindo os padrões Art-Déco. As linhas puras e a ausência de ornamento passam a nortear a

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concepção da mobília. Depois vieram os móveis dos arquitetos-designers, que seguiram a trilha da modernização internacional da mobília, do DeStijl a Bauhaus, entre outros.10

Considerando-se as páginas da Acrópole, porém, a ambientação mais ornamentada continuou, por vários anos, sendo a preferida, e ao mostrar referências européias, pareciam querer dar ao ambiente a ilusão de um maior grau de importância, já que a reunião de variados elementos de diversos estilos e épocas (e países), como móveis, tecidos, texturas, lustres, papéis de parede e etc, parecia outorgar o sentido de um ambiente mais rico.

Para que a ambientação de interiores moderna, proposta pelas vanguardas, empregando menos móveis e objetos de desenho moderno, de linhas mais quadradas e perfis mais finos, entrasse nas residências do Brasil, foi preciso um certo esforço dos arquitetos modernos para mostrar às pessoas – inclusive por meio das revistas de arquitetura e decoração – como deveria ser uma casa moderna. Há, em várias edições da Acrópole, artigos publicados por Henrique Mindlin, nos quais ele escreve sobre a “análise racional do projeto”, esclarecendo como os móveis deveriam ser dispostos nos interiores das residências. Ele exemplifica com vários desenhos, uns com a distribuição dos móveis em plantas de apartamentos, outros com áreas livres sem os móveis e as sombras projetadas no piso, esclarecendo que:

O conceito moderno da habitação caracteriza por uma oposição quase total às ideias predominantes no século passado e nos princípios do século XX. Ao passo que a habitação desse tempo representa, de forma concreta, as aspirações, a mentalidade, o modo de vida da burguesia na sua fase histórica de ascendência, a casa de nosso tempo é o produto da investigação mais profunda, em todos os sentidos, dos problemas da arquitetura residencial.11

10

(Santos, p. 22)

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Mindlin esclarece nesses textos que a residência precisava ser adaptada de acordo com as necessidades do homem contemporâneo, sob pontos de vista técnicos, à luz da psicologia e sociologia, tendo em vista ainda a situação econômica resultante da Primeira Guerra Mundial.

Até final dos anos 1940 (fig. 7), a maioria das residências publicadas ainda apresenta interiores repletos de ornamentos: cortinas com babados, papéis de parede floridos e estofados de cetim, todos à “moda Européia”, como se dizia nas referências.

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Figura 7 - Decorações pelo Prof. Dinucci - quarto de dormir. Fonte: Acrópole n°93, 1946, p. 16.

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É a partir de 1950 que podemos notar uma significativa mudança nos interiores publicados, bem como na oferta de serviços, equipamentos e produtos lançados para a casa e para a construção civil. No começo dos anos 50, o design de móveis sofreu profundas transformações, pois acompanhou a prosperidade em que os Estados Unidos se encontrava no pós Segunda Guerra e o aumento do consumo:

O design dos anos 50, ao provocar a abertura dos mercados e das fronteiras culturais – além da proliferação dos canais de comunicação de massa em forma de revistas, jornais, filmes e televisão – encorajou a troca de idéias, talentos e éticas em todo o mundo capitalista.12

Aqui, no Brasil, será nessa década que se começa a ter uma maior oferta de lojas com móveis modernos, com linhas mais quadradas e limpeza no desenho, como a Branco & Preto, inaugurada em 1952 (fig. 9). Foi uma loja em que um grupo de arquitetos (Carlos Millan, Jacob Ruchti, Miguel Forte e Roberto Aflalo) se reuniu e adotou, segundo Marlene Acayaba, um processo de trabalho referenciado ao das instituições norte-americanas, o Institute of Design de Chicago e o Museu de Arte Moderna de Nova York, cujo processo de trabalho entrava em contato com o design, “com a herança cultural européia do “Arts & Crafts” propugnado por William Morris e revisto por Walter Gropius na Bauhaus”.13

12

(Acayaba, 1994, p. 17)

13

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Figura 9 - Propaganda da Loja Preto & Branco. Acrópole n° 170, 1953, p. 27.

A “Branco & Preto” foi uma das lojas que se destacou no período, por causa dos móveis de design apurado e acabamento artesanal. Os arquitetos projetavam os ambientes como um todo – além dos móveis, as luminárias também eram projetadas. Estava na proposta de ambientação a disposição de todos os objetos, os revestimentos e as cores. Por esse método de trabalho, “a loja representou uma novidade no Brasil daqueles anos. Foi um empreendimento precursor na questão da arquitetura de interiores”.14

Os móveis modernos tinham como premissa reforçar a horizontalidade do ambiente interno e esse efeito acontecia com o uso de cadeiras, poltronas e sofás de espaldar baixo, além de mesas e armários de pouca altura. Podemos notar essa tendência pelas imagens, que fazem com que o cômodo pareça ter o pé direito mais alto. A limpeza formal dos ambientes propostos pelo grupo de arquitetos em muito contrasta com as decorações realizadas pela loja Dinucci, como vimos anteriormente numa propaganda de 1946.

14

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Até mesmo na década de 60, a ambientação plenamente moderna ainda não era frequente na maioria das casas publicadas, sendo comum ambientes com maior número de objetos e móveis, mais ornamentados. Mas isso não necessariamente se devia à dificuldade das pessoas em aceitar o morar moderno, pois em muitos casos os móveis poderiam ter sido herdados de família, portanto sua presença trazia a familiaridade e sensação de conforto que as pessoas precisam para se sentir “em casa”, pois cada objeto estaria carregado de valor sentimental, particular à vivência do morador. Enquanto em uma ambientação rigorosamente moderna, calcada nos princípios de recusa do passado, essa história pessoal talvez não tivesse lugar.

Muitos arquitetos modernos aceitavam, na decoração dos seus interiores, a mistura de elementos de diferentes épocas, que algumas revistas, principalmente no pós Segunda Guerra, divulgavam. A idéia não era mais fazer com que a casa fosse um mecanismo de uma máquina, mas que fosse moderna, tanto em sua construção, quanto em sua ambientação interna, levando em conta os objetos pessoais dos usuários e seus gostos pessoais.

Os fatores que mais contribuíram para a consolidação desse morar moderno foram os apartamentos, pois o tamanho reduzido destes, frente às maiores dimensões das residências, colaboraram tanto para a diminuição do número de elementos de decoração para compor uma ambientação, quanto para a diminuição do tamanho dos móveis. Também nesse caso, era mais fácil a aceitação de móveis modernos, mais compactos, já que os antigos geralmente tinham dimensões maiores e ocupavam mais espaço. Além de compacto, o móvel moderno, muitas vezes, poderia ser dobrável, feito para economizar espaço, ou incorporar mais de uma função, como ser uma poltrona ou um sofá, que por sua vez poderia vir a ser uma cama.

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foi se modernizando, simultaneamente readquirindo novos hábitos ao adaptar as casas ao uso de equipamentos elétricos e, daí, para os ambientes mais livres, com menos densidade de móveis, objetos, ornamentos, volume de estofados e cortinas, portanto, mais práticos para manutenção do dia a dia. Em muitos casos, para que o móvel moderno pudesse seduzir os consumidores, sua utilidade era associada à mulher moderna: uma nova geração que trabalhava fora e não tinha mais tanto tempo disponível aos afazeres domésticos, ou não mais dispunha de auxiliares domésticos. Por isso, os equipamentos elétricos, como os utensílios para cozinha e limpeza da casa, ou também o rádio e a televisão, modificaram a organização da ambientação interna da residência.

Mesmo assim, é em 1960 que podemos ver significativas mudanças nos interiores das residências publicadas. A ampla oferta de lojas de móveis modernos, de materiais como azulejos e pisos, equipamentos de cozinha, louças para banheiros, objetos de decoração como luminárias, tapetes e cortinas, transformou o ambiente residencial brasileiro.

Ainda na década de 60, a propaganda da loja Mobília Contemporânea, recém aberta, mostra como os móveis modernos foram se incorporando aos ambientes, com a proposta de serem funcionais, de preço acessível e bom acabamento (figs. 10 e 11). A propaganda, intitulada “Em busca de uma mobília racional”, diz o seguinte:

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variados arranjos, procurando sempre, por uma fabricação racionalizada, os melhores acabamentos dentro dos melhores preços.15

Figura 10 - Propaganda da “Mobília Contemporânea”. Acrópole n°260, 1960, p. 12.

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Figura 11- Propaganda da "Mobília Contemporânea". Acrópole, n°260, 1960, p. 14.

Pelas imagens (figs. 10 e 11), pode ser visto como era o desenho destas propostas de móveis funcionais: acabamento simples, sem muitos detalhes ou ornamentos, com desenho retilíneo e racionalizado, podendo assumir variadas funções, permitindo flexibilidade ajustada conforme a necessidade.

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O número de edifícios habitacionais verticais começou a aumentar significativamente a partir dessa década nas grandes cidades e, com isso, a dimensão da moradia (apartamentos) e dos seus cômodos também se modificou, pois eram ambientes de dimensões reduzidas se comparados às residências unifamiliares. Os móveis foram ficando cada vez menores, inclusive para atingir um preço acessível para a classe média em ascensão.

Em 1969, é publicada na Acrópole uma reportagem especial sobre Ruy Ohtake, em que o arquiteto escreve um texto sobre a habitação e aparecem algumas de suas obras residenciais. No texto, ele discorre sobre os problemas das habitações e as possibilidades de solução, que devem ser procuradas para a racionalização da construção. Ele afirma que os projetos publicados “pretendem dois aspectos básicos”:

a) É desejável que, mesmo numa única habitação, tenha como preocupação sua implantação no urbano, agindo potencialmente como fator corretivo e, às vezes, até denunciados, no emaranhado da cidade, cujo desenvolvimento caótico, sem critérios, já é plenamente reconhecido.

b) Embora tenham particularidades em função de determinadas famílias, os programas e principalmente os espaços resultantes são sempre uma tentativa de colocar aspectos generalizadores de uma habitação, qualquer que seja o morador.16

Ohtake afirma que essas generalizações aplicadas às residências são o resultado da produção industrial, mas o aspecto mais importante disso é conciliar esse fator com o da habitação, realizada para cada família que morará nela. Nesse artigo, importantes mudanças nas plantas residenciais são apontadas, como, por exemplo, a redução dos dormitórios para “dormitórios-gaveta”, pois são espaços somente para descanso e a redução das áreas de serviço e valorização das áreas sociais, estas últimas ampliadas e alçadas ao status de espaço coletivo por

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excelência. Para o arquiteto, as escolhas dos materiais são definidas em função do projeto, e não o contrário. É importante que os materiais venham servir à arquitetura e não devam, jamais, desfigurar o caráter do projeto.

Em contraponto com a busca de racionalização da construção e o aspecto de produção industrial das residências, está a ambientação dos interiores, responsável pela personalização dos ambientes. Isto pode ser percebido nas imagens publicadas, como, por exemplo, as figuras 12 e 13, onde aparecem dois ambientes da residência Tomie Ohtake, em que a estrutura é de “laje nervurada, apoiada nas paredes laterais, que são as divisas. A vedação é de concreto e bloco. Há também a questão do mobiliário de concreto: camas, mesas, bancos armários”.17

A estrutura seria suficientemente “genérica”, podendo ser repetida para outras casas. Já a ambientação é única, adapta-se ao uso efetivo que o morador desejar dar a esses espaços flexíveis, cabendo ao mobiliário e seu arranjo a definição dos usos, que não mais são definidos por “cômodos” isolados, mas se mostram integrados. Estes recursos foram largamente utilizados por arquitetos do brutalismo paulista, principalmente os dos móveis de concreto, pois com eles certas características no ambiente não podiam ser modificadas. Com isso, eles perdem a aura de flexibilidade, despojamento e leveza, para se tornarem imóveis, parte da construção.

Os mobiliários “fixos” podiam ser mesas, bancos, lareiras, até a estrutura de sofás e camas, enquanto que os “móveis” eram as cadeiras, poltronas, mesas de centro e laterais, já os que podiam se encaixar em ambos os casos eram as luminárias (fixas e móveis), equipamentos elétricos (fogão, geladeira) e objetos de decoração e pessoais.

Nas figuras 12 e 13, podem ser vistas as ambientações das salas de estar e jantar. Em ambas, o arquiteto Ohtake procurou contrabalancear a rudeza do concreto armado e a leveza dos móveis, todos com perfis finos de aço e até mesmo poltronas

17

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que sugerem informalidade ao sentar, como é o caso da poltrona “Mole”, projetada por Sérgio Rodrigues, de couro com detalhes em capitonê.

Figuras 12 e 13 - Residência Tomie Ohtake. Fonte: Acrópole n°361, 1969, p. 39.

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1.2 Cozinhas, banheiros e áreas de serviço: a busca por higiene e limpeza.

Pode-se notar, pela leitura das revistas da época, em especial as edições da revista Acrópole, que, desde a década de 1930, outros cômodos da residência passaram a ganhar relevância e receber mais atenção, como é o caso da cozinha e dos banheiros. A gradual mudança desses espaços de serviço deve-se ao crescimento da classe média e à diminuição da presença de empregados, e também porque esses ambientes passam por profundas transformações culturais, pois deveriam harmonizar-se com as premissas da casa moderna, que teria de ser higiênica e asséptica, ou seja, assumindo que “a principal função da casa era ser uma fonte de bem estar físico e de saúde”.18

Figura 14 - Cozinha Planejada. Fonte: Acrópole n° 5 , 1938, p. 10.

Assim, enquanto os ambientes sociais mantinham a decoração e arranjo mais tradicionais, os ambientes de serviço e higiene se “modernizaram” mais rapidamente.

18

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Em 1938, já se encontra na Acrópole a propaganda de uma cozinha planejada (fig. 15). O desenho está de acordo com as exigências da cozinha moderna: os armários brancos, de cantos arredondados e aberturas para ventilação, com pés que permitiam a limpeza do chão; a geladeira (uma novidade) também branca, e ainda não elétrica; as paredes revestidas de azulejo; o piso revestido de cerâmica; a luminosidade proporcionada pela janela mais ampla, com um vaso de plantas no peitoril, indicando um local fresco e arejado, onde também há uma cortina e uma persiana; e o relógio na parede, acima da geladeira, que não é muito alta, assim como o outro armário. Esta composição mostra um ambiente limpo, higiênico, arejado, prático, funcional e claro.

Em uma edição da Acrópole n° 3 de 1938, há um artig o publicado por Henrique Mindlin, intitulado “Organização racional da Cozinha”, em que o arquiteto afirma a importância da organização eficiente da cozinha de uma residência:

No projeto geral da casa, o objetivo é de atingir as três condições fundamentais da habitação moderna: - muita luz, muito ar, e circulação fácil, clara, entre as peças cujas funções se relacionem. No da cozinha o fim colimado (sic) é a disposição de todos os aparelhos, armários, etc., de modo a estarem, no momento de sua utilização, no lugar mais cômodo para a pessoa que trabalha.19

No decorrer do texto, Mindlin discorre sobre como deve ser o projeto da cozinha e como os “centros de trabalho”20 devem ser dispostos (fig. 16). Ele afirma que há três centros de trabalho, o de “armazenagem e preparação dos alimentos”, o de “lavagem e limpeza” e o “fogão e o lugar onde são dispostos os pratos a serem servidos”. E, nesta organização dos três centros, ele os subdivide de acordo com as funções de cada um. O primeiro centro se comporia da geladeira, armário-despensa e, sobre o armário, uma “superfície de trabalho para a preparação dos alimentos que

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devem ir ao fogão. A pia, portanto, deve estar perto, pois a água é necessária em muitas operações”. Também os utensílios deveriam se encontrar perto para facilitar o serviço. O segundo centro se comporia da pia, um “despejo” e armário para utensílios de limpeza, na parte inferior, que “deve ser localizado em frente à janela e entre os dois outros centros”. O terceiro consiste “no fogão, que deve ter, de um lado, uma superfície complementar para a preparação dos alimentos e, de outro, um lugar onde os pratos a serem servidos possam ser arrumados”. Neste centro, ficariam armazenados os pães, biscoitos, “e se deve encontrar a tábua de cortar pão”.

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Figura 15 - Planta racional e vistas da cozinha proposta por Mindlin. Fonte: Acrópole n° 3, 1938, p. 26.

Mais adiante, o autor afirma que é preciso um estudo das capacidades necessárias para o dimensionamento da cozinha e dos centros de trabalho. Isto poderia ser feito de acordo com o número de utensílios e seria importante não pelo número de pessoas as quais se destina a casa, mas “ao número máximo de leitos admissível, de acordo com a planta”, ou seja, a dimensão deveria prever uma “folga de grande importância, que não só atende à possibilidade de crescimento da família, como também à eventualidade de venda da propriedade a uma família mais numerosa”.21

Mindlin continua seu artigo descrevendo como deveria ser a planta ideal para a cozinha, em L ou em U, sendo a última preferível, “pois é a que proporciona um arranjo mais compacto das várias partes, reduzindo as distâncias ao mínimo possível”.22 A primeira disposição, em L, seria somente para cozinhas muito pequenas. Ele coloca um esquema da planta ideal como exemplo, ilustrando como a circulação seria racionalizada e prática se estivesse de acordo com o desenho (fig. 15).

Este texto tem importância fundamental para a formação do pensamento moderno sobre uma cozinha. São diretrizes, como as propostas por Mindlin, que irão consolidar o modelo de cozinha moderna nas residências, perdurando por muitas décadas depois.

Em uma edição da Acrópole n°11 de 1939, foi publica da uma reportagem de uma residência de autoria do arquiteto Eduardo Knesse de Mello, que mostra mais imagens dos banheiros e da cozinha funcionais do que de outros cômodos da residência. A ambientação interna da casa é moderna, como podemos ver pela

21

Idem, p. 25.

22

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ambientação da sala de estar (fig. 16), que não possui ornamentos exagerados, bem como poucos móveis, de desenho quadrado, e os tapetes de cores claras. Mas a cozinha é um exemplo de modernidade e funcionalidade (figs.17 e 18), pois é espaçosa, repleta de armários planejados embutidos, com espaços planejados para a geladeira, o fogão e as bancadas de trabalho, com alturas e proporções ideais. Um projeto racionalizado, como Mindlin havia propagado anteriormente.

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Figuras 17 e 18 - Imagens da cozinha da residência. Fonte: Acrópole, n°11, 1939, p. 15.

A partir de 1944, podemos notar como a cozinha e o banheiro foram ganhando mais importância nas publicações, devido ao número de propagandas encontradas em cada edição. Inúmeros equipamentos para a cozinha e para os banheiros foram sendo lançados: os chamados “gabinetes de aço”, fabricados em série, além de serem econômicos, simbolizavam a eficiência na limpeza doméstica. Se a cozinha já vinha sofrendo significativas mudanças desde a década de 1930, a partir dos anos de 1950 as ofertas de diferentes materiais, como azulejos, pias de inox, equipamentos elétricos de cozinha e tipos de armários aumentaram significativamente.

A partir da década de 1950, nota-se nas publicações que os equipamentos para os banheiros, na revista Acrópole, agora também têm o intuído de “sofisticar” esse ambiente, e o mesmo acontecia com a cozinha. Começaram a ser produzidos equipamentos coloridos, como pias, vasos sanitários e banheiras, marcando a década de 50 como a dos banheiros de diversas cores. Havia também várias opções de azulejos decorados surgindo no mercado, e os banheiros que antes eram somente brancos foram ganhando outros tons. A referência de eficiência a partir dessa época não era mais apenas a utilização de peças e revestimentos brancos, mas as superfícies fáceis de limpar. A cor começava a ser associada à moda, acompanhando e harmonizando-se com aquelas utilizadas nas paredes da residência, nos estofados e nos tecidos que compunham as ambientações.

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Também em outras lindas e modernas tonalidades. Fabricados com primorosa perfeição técnica, em linhas modernas e nas cores mais encantadoras, os conjuntos sanitários CELITE definem tendências e são indispensáveis nos ambientes de requintado bom gosto.23

23

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Figura 19 - Anúncio de Conjuntos Sanitários Coloridos da Celite. Fonte: Acrópole n° 205, 1955, p. 12.

O mesmo acontecia com as cozinhas, como podemos ver na figura n° 20, propaganda da “Fiel-Copa”, marca que estava disponibilizando gabinetes de cozinha em aço, modulares, nas cores: branco, “creme”, “verde mar” e “azul marinho”, que declara:

Concentra as tarefas da Dona de Casa numa pequena área, poupando energias e acelerando o trabalho. Mais bela, higiênica e durável. Permite maior aproveitamento da cozinha.24

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Figura 20 - Propaganda de uma fabricante de gabinetes para cozinha. Acrópole n° 205, 1955, p. 23.

Anos mais tarde, a Celite (fig. 21) também começava a produzir pias para cozinhas, feitas de porcelana “cozidas a mais de 1.000 graus”. A importância de instalar essas pias se dava porque, segundo a propaganda, “não riscam, resistem ao atrito e à água fervendo e são imunes aos ácidos. Fabricados em 4 tamanhos, em todas as cores CELITE”25. A mistura de diferentes cores na cozinha proposta para esta propaganda é característica da época, começo dos anos 1960.

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Figura 21 - Anúncio de pias para cozinha da Celite. Fonte: Acrópole n°263, 1960, p. 17.

Podemos notar diante de todas essas imagens como os banheiros e as cozinhas tem sua modernização aceita de forma mais rápida do que as propostas de modernização de outros cômodos da residência. Enquanto os objetos de decoração, móveis e equipamentos para a casa vão se modernizando gradativamente, já desde a década de 1930, e com muito mais força a partir dos anos 1950, as cozinhas e os banheiros tomam a dianteira do moderno e, partir da década de 1950, já eram tão bem aceitas que as indústrias começam a introduzir variações de cores e diferentes acabamentos e texturas.

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Segundo Capítulo: Casas Paulistas Modernas

Este capítulo irá apresentar as análises de obras de dois arquitetos contemporâneos a Artigas: Gregory Warchavchik, escolhido por sua idéia precursora de projeto da Casa Modernista da Rua Itápolis em 1930, na qual ele apresenta os interiores arquitetônicos de forma inédita para a época, unindo arquitetura e arte, ao promover a exposição que marcaria o começo da divulgação da casa e as ambientações modernas; e Lina Bo Bardi, arquiteta que escreveu significativos textos sobre a obra de Artigas, além de ter trabalhado em conjunto com o arquiteto na fabricação de alguns móveis desenhados por ele e pelo estúdio Arte Palma, e escolhida também por sua Casa de Vidro, uma das mais significativas obras que exemplificam a arquitetura da década de 50, com seus interiores repletos de misturas de elementos, texturas e móveis de variados estilos.

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2.1 Gregory Warchavchik e a inauguração da casa modernista em São Paulo.

Gregory Warchavchik, em 1930, promoveu uma atitude pioneira: abrir uma casa modernista para exposição, uma casa-manifesto. Arquiteto ucraniano, nascido em Odessa, em 1896, e radicado no Brasil desde 1923, foi um dos precursores da arquitetura moderna no Brasil, trazendo referências da arquitetura moderna da Europa, da Bauhaus, e de mestres como Walter Gropius e Mies Van der Rohe. Segundo Agnaldo Farias, Warchavchik

Construiu e divulgou, sempre de forma sistemática, um mosaico de idéias amplo e eclético, constituído por fragmentos de temas gestados na nova ordem industrial [...] Warchavchik montou com todo o rigor que lhe seria uma marca característica, um painel e um corpo de idéias particulares.26

É importante observar que, enquanto a casa moderna presente na matriz das vanguardas européias queria definir o espaço da existência mínima e destinar-se à classe operária, a casa moderna, na vanguarda arquitetônica brasileira, antecede a modernidade européia do pós-guerra ao mostrar sua outra face, tão relevante quanto aquela: o morar da classe média, os responsáveis pela consolidação do morar moderno após 1950, como já foi dito anteriormente.

Artigas teve contato com Warchavchik em 1939, por ocasião do concurso para o Novo Paço Municipal. Antes, Artigas já tinha conhecimento da linguagem racionalista de Warchavchik, por ele ter se tornado um dos principais arquitetos na instauração da arquitetura modernista em São Paulo.

É por ser uma figura importante para a arquitetura moderna e por causa da relevância de seu trabalho sobre o tema que Warchavchik está aqui referenciado.

26

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Sua Casa Modernista (fig. 22), localizada na Rua Itápolis, no bairro do Pacaembu, na cidade de São Paulo, apresentou em 1930 um pioneirismo de fachada, mostrando-se híbrida quando se consideram as “formas de viver” que suas ambientações interiores sugerem ou preconizam.

De acordo com as afirmações de Iñaki Ábalos sobre a casa positivista, a residência da Rua Itápolis, com sua fachada austera e impessoal, representa uma

[...] estrita moralidade calvinista, que interpreta o progresso material como uma consequência direta da sua moralidade e como um destino, o da felicidade material que virá a culminar em um futuro já próximo, tal como promete o programa positivista, ao qual se sacrifica, em parte, presente. Para chegar a esse futuro de progresso é necessário submeter o indivíduo. (Para Comte, fundados da sociologia, o individual é algo abstrato – na Unidade de tudo e de todos). 27

Figura 22 - Residência na Rua Itápolis. Fonte: Acervo da Família Warchavchik.

Esta residência não foi, a princípio, destinada a um cliente definido, sendo inaugurada como uma exposição artística de si mesma, para dar testemunho da nova fé moderna, exibindo-se num filme cujos fotogramas mostravam a visitação dos melhores representantes da sociedade da época.

27

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Ninguém morava na casa da Rua Itápolis na ocasião da inauguração da exposição, em 1930, ,noticiada em jornais impressos e no cinema, causando furor na sociedade, além de opiniões prós e contras sobre sua arquitetura. Tal impacto era exatamente o que Warchavchik queria: tornar a casa um manifesto em prol da arquitetura moderna e, por meio dela, divulgar o novo espírito à sociedade paulistana e brasileira.

Assim, embora a fachada da casa de Warchavchik adeque-se à ausência de ornamentos e limpeza das linhas arquitetônicas, consequência do plano racional da distribuição interna e características dos preceitos modernos na composição da ambientação dos interiores, isso muda, pois elas representariam a “alma” da casa, como explicava seu autor:

A beleza da fachada tem que resultar da racionalidade do plano da disposição interior, como a forma da máquina é determinada pelo mecanismo que é sua alma. 28

Estas ambientações se manifestaram em contraponto às linhas puras e limpeza do desenho da fachada, numa menor austeridade; enquanto o exterior se revelava racional, exibindo o progresso e os tempos atuais (da época), os interiores mostravam valores atemporais, acolhendo e conciliando variadas tradições. Sobre os detalhes desses interiores, entende Marta Peixoto que o objetivo da casa era demonstrar “o que era a nova obra de arte total”, assim descrevendo-os:

Ao invés de apresentar a todos a casa vazia, [Warchavchik] abriu espaço para a participação de seus colegas modernistas. Era possível visitar o interior da casa e as obras da literatura, aquarelas, postais, esculturas, tapetes, colchas, almofadas e luminárias de artistas modernos, que estão lá dentro. [...] Havia peças de coleções particulares, um bronze de Lipschitz, almofadas de Sonia Delaunay e Dominique, um tapete da Bauhaus, molduras de Pierre Legrain, além de peças de Tarsila, Lasar Segall, Gomide,

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Di Cavalcanti, Cícero Dias, Anita Malfatti, Celso Antonio, Brecheret, entre outros. Ainda havia os livros de escritores como Manuel Bandeira, Graça Aranha, Augusto Meyer, Álvaro Moreyra, Mario de Andrade e Menotti del Picchia.29

Como a casa de Warchavchik não foi projetada e construída para um cliente específico, tampouco possuía traços particulares de moradia, bastando-se ao papel de casa-manifesto. Era uma residência impessoal, uma maquete em escala 1:1, que seria habitada por alguém que se dispunha a aceitar o modo de vida que ela pretendia conter; para pessoas que quisessem se engajar no pensamento do progresso e que valorizassem as artes novas (literatura, música e obras de arte).

Ao se observar a composição de móveis e objetos da casa de Warchavchik, pode-se perceber que a sala de estar tampouco parece ser para descanso, pois os cômodos foram ambientados para serem vistos, não vividos.

A cozinha de Warchavchik é um ambiente reduzido, racionalizado e proposto a ser eficiente, equipado com fogão e geladeira disponíveis no mercado e com móveis embutidos de desenho simples e pintados de branco.

A casa-manifesto de Warchavchik pode também ser referenciada como impessoal pela ausência de materiais particulares, por isso ela pode ser comparada à casa positivista que Ábalos menciona:

Toda memória tem uma qualidade inferior: assim como estão proibidas as lembranças dos antepassados, está proibido qualquer mobiliário que evoque alguma memória – observemos os interiores das casas positivistas mais ortodoxas divulgadas pelos meios de comunicação – está proibida a construção com materiais que não possuam, em si mesmos, uma condição moderna. 30

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Dos materiais mais empregados, pode-se notar que o vidro, com sua transparência, e o aço eram os mais preconizados. O vidro, por ser um material industrial, produzido em série, e por permitir a passagem da radiação solar, foi um dos materiais símbolo da modernidade. Com ele, permitiu-se que os ambientes se integrassem, o dentro e o fora podiam ser vistos, além de fazerem parte um do outro.

Ao se reparar nas propagandas direcionadas à casa modernista, é possível se perguntar por que, sendo moderna, esta casa se proclamava localizada em um bairro “fidalgo” – já que o bairro estava, até então, praticamente virgem, e aquela seria uma das primeiras casas a serem construídas. Propagar um bairro como “fidalgo”, ou seja, para pessoas abastadas, é uma forma de tentar dar maior importância a ele, portanto, de dizer que a casa, além de sua arquitetura modelo, estava localizada num bairro que seria símbolo de prestígio para quem viesse a construir nele.

Mas, apesar da aparente “fidalguia”, tratava-se de uma casa compacta para os padrões da época; este fator e sua excessiva limpeza formal eram os pontos de maior debate nas opiniões (contrastantes) dos visitantes e críticos. Se alguns a consideravam “tumular”, como Christiano das Neves, outros, como Menotti del Picchia, a acharam uma pequena maravilha:

“Sua fachada geométrica é de uma eloqüente beleza dentro da rigorosa e absoluta simplicidade de suas linhas. Suas acomodações interiores são esplêndidas. A impressão que dá é de higiene, conforto e bom gosto”. 31

Há uma busca de harmonia nos interiores de Warchavchik que visa caracterizar o espírito da época, afinado com a crença positivista do progresso maquinista e industrial, permeando todos os campos, inclusive a casa – comparada a uma máquina de morar por Le Corbusier.

31

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Porém, a casa de 1930 de Warchavchik é plenamente, mas não homogeneamente, moderna. Apesar do rigor formal das fachadas, os interiores se configuram com menos austeridade. Embora Warchavchik procurasse se apoiar no rigor da então recém nascida ortodoxia moderna, os interiores são singularmente mais ousados, lançando mão de uma paleta de cores, objetos, obras de arte, materiais e tecidos. Talvez neles resida a importância maior desta casa, pois sua distribuição interna não trazia “inovações significativas” (fig. 23), como afirma Marta Peixoto:

Sua organização espacial, porém, continua não trazendo inovações significativas. Sua planta coincide com o arranjo típico dos sobrados da classe média, largamente difundidos em São Paulo. Sua importância é consequência do fato de ter sediado a exposição, e da decorrente demonstração do princípio da integração entre arquitetura, artes plásticas e artes aplicadas.32

O projeto arquitetônico se distribuiu da seguinte forma: a porta principal de entrada situa-se na lateral direita da residência, juntamente com a passagem dos carros para a garagem. Ao entrar por esta porta principal, o visitante se depara com um hall de circulação, à esquerda o living e a sala de estar. À direita encontra-se uma porta para um banheiro e a porta de acesso à cozinha. Logo à frente está a escada que leva ao pavimento superior. Na sala de estar, há uma porta de correr de vidro que se abre para uma varanda e para o jardim externo, do lado oposto encontra-se a sala de jantar, na qual também há uma porta que a conecta à cozinha, também há uma porta de correr de vidro ampla que se abre para a outra varanda, dos fundos, por onde é possível ir ao jardim externo ou à edícula com a garagem aos fundos. A edícula abriga, além da garagem, um dormitório de empregados.

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No pavimento superior há três dormitórios, um banheiro e o acesso a uma varanda, que é a cobertura da porta de entrada localizada no pavimento térreo.

Figura 23 - Planta do pavimento térreo e primeiro pavimento da casa da Rua Itápolis. Fonte: Ferraz

Alguns móveis que compunham o interior da casa eram de autoria de Warchavchik. Da mesma forma, Le Corbusier realizava a composição dos ambientes de suas casas, onde os móveis eram escolhidos ou desenhados”33 por ele. Se, na condição ideal, a casa moderna devia valer-se de materiais e objetos industriais, inclusive para o mobiliário, estes ainda eram inexistentes ou insuficientes, de

33

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maneira que, para materializar a casa – pensando no futuro, positivamente – Warchavchik precisou aproveitar os materiais e a mão-de-obra disponíveis e convencionais, sempre que possível atribuindo-lhes um papel que lhes excedia; buscou atender ao ideal estético e funcional do projeto ao regular a luminosidade e compor formalmente o espaço; utilizou os recursos que tinha para fabricar os móveis, as janelas e as luminárias, tendo montado uma oficina somente para este fim específico.

Marta Peixoto constata que os interiores de casas modernas do começo do século XX frequentemente eram ecléticos. O mesmo poderia ser dito da Rua Itápolis, que provavelmente pode ser chamada de eclética por ser sua descrição muito parecida a que Marta Peixoto realizou ao estudar uma casa de Le Corbusier:

A maneira de compor o ambiente interno é criar uma constelação de objetos, obras de arte e algumas peças de artesanato, e colocá-las ocupando o espaço central, contra um fundo colorido, como se fossem modelos numa foto posada, ou em um quadro de natureza morta.34

Sobre a “constelação de objetos” da casa da Rua Itápolis, na sala de estar “os móveis eram prateados à duco, de formas inéditas. O quadro dos fundos é de Tarsila do Amaral, e o da direita a “Colina Vermelha”, de Lasar Segall. O tapete é um original das oficinas do “Bauhaus” de Dessau, Alemanha”.35 Todas as paredes dos

interiores tinham cor. A casa era branca somente por fora, mas por dentro se mostrava um arsenal de referências. A sala de estar tinha as paredes de cor verde claro e teto branco; a parede que separa a sala da escada é vermelha.

Pela foto (fig. 24) podem ser observadas: duas poltronas com estrutura de madeira, pintadas de branco e estofado mais escuro, talvez veludo; uma mesa redonda no centro das duas poltronas, também com estrutura de madeira, pintada de

34

Idem, p. 82

35

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cor prateada com um tampo de vidro e alguns objetos sobre ela; as luminárias de formas geométricas no canto direito da foto; ao fundo, um sofá de três lugares, com o mesmo desenho das poltronas; uma mesa lateral ao lado do sofá, com um vaso de plantas e uma escultura sobre ela; os quadros de pintores modernistas nas paredes e na passagem entre a sala de estar e a de jantar uma cortina, de cor mais escura, que talvez fosse de veludo.

A maioria dos móveis não era de embutir, e sim solto, seus desenhos compunham formas geométricas. No lado oposto da sala de estar, há o living, à esquerda da entrada – ambos ambientes se diferenciam apenas pela disposição dos móveis. Segundo Ferraz, o living tinha:

Suas paredes verde claro e fôrro branco marfim. Os móveis prateados, os estofos de veludo violeta, em tapete original do “Bauhaus” de Dessau, um quadro de Anita Malfatti, um bronze de Menotti del Picchia, uma escultura de mármore negro Victor Brecheret. Todos os móveis foram desenhados por Warchavchik e executados em suas oficinas.36

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Figura 24 - Sala de Estar da residência da Rua Itápolis. Fonte: Acervo Família Warchavchik, cedido por Camila de Oliveira.

Na foto da sala de jantar (fig. 25), outro espaço é organizado em função de seu caráter expositivo, ambientando-o como sala de leitura:

Sala de jantar. Paredes revestidas de placas de madeira compensada, embúia natural, polido à boneca. Cortinas em tons alaranjados. À direita, sôbre a prateleira, o busto de Graça Aranha por Celso Antônio. A sala, durante a exposição, foi transformada em sala de leitura, com as obras dos autores modernos da época, espalhadas sôbre os móveis e nas prateleiras.37

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Nesta sala há uma mesa com quatro cadeiras de madeira, ao lado um aparador com uma escultura sobre ele; uma cadeira ao fundo; a luminária pendente, com um desenho parecido com o da mesa de apoio que está na sala de estar, entre as poltronas, (fig. 24); uma cortina encobrindo a porta de correr de vidro e revestimentos de madeira nas paredes.

Figura 25 - Sala de Jantar. Fonte: Ferraz, 1965, p. 97.

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Dormitório do casal. Móveis de imbuia polida, paredes lilás claro, colcha de veludo pintada por Regina Graz. Na parede um quadro de Tarsila do Amaral.38

Figura 26 - Dormitório do casal. Fonte: Ferraz, 1965, p. 97.

Compostos por uma complexa reunião de materiais escolhidos por Warchavchik, as ambientações dos cômodos da residência conciliavam móveis, objetos, obras de arte, tecidos e cores, que compunham uma paleta específica do arquiteto e que, posteriormente, se repetiu em vários outros projetos.

Alguns móveis fabricados por Warchavchik eram pintados com tinta prateada. Muitos móveis modernos da Europa, da Bauhaus, de Mies Van der Rohe, eram de aço, portanto um material carregado da essência moderna. Nesta época,

(64)

aqui no Brasil, ainda não havia indústrias que fabricassem este tipo de móvel com certo grau de sofisticação, então precisavam ser importados. A importação fazia com que o valor dos móveis subisse muito, fator que tornava difícil a compra destes pela maioria das pessoas. Talvez por esse motivo Warchavchik decidiu fabricar seus móveis, ou ainda, pelo desejo de poder desenhá-los originalmente e poder mostrar seu trabalho de forma completa. Acima de tudo, o desejo de expor uma casa moderna por fora e por dentro foi mais forte; a imagem que se desejava transmitir era de progresso e modernidade, que não obstante permitia uma mistura eclética de sofisticação tecnológica e objetos artesanais.

(65)

2.2 Lina Bo Bardi, o Studio de Arte Palma e a Casa de Vidro.

Lina Bo Bardi formou-se na Escola Superior de Roma em 1939 e veio da Itália para o Brasil em 1946. Aqui, a arquiteta também atuou e contribuiu significativamente para a consolidação do morar moderno, porém com outro foco em seu trabalho, pois ela aliava o design de móveis com objetos artesanais ao criar ambientações modernas que ela própria iria divulgar na Revista Habitat, pela qual foi pioneira na construção da crítica da arquitetura moderna. No Brasil, Lina soube valorizar o artesanato nacional, ao mesmo tempo em que buscou a introdução e divulgação dos móveis modernos de fabricação brasileira nas ambientações modernas das residências.

Lina estabeleceu, aqui no Brasil, um diálogo com as artes entre as décadas de 1950 e 1960, juntamente com os artistas que começavam a se destacar, como Lygia Clarck, Hélio Oiticica, Glauber Rocha, José Celso Martinez e Flávio Império, pois “sua obra extrapola os limites da arquitetura para atingir outros domínios disciplinares tal como o das artes, da filosofia, da antropologia, da literatura”.39

Ao articular as inúmeras facetas das artes, Lina incorporou a arquitetura e a cultura brasileiras na busca pelo artesanato local, pelo design de móveis e pela ambientação de interiores, não só residenciais, mas também de museus e espaços cenográficos.

Em 1948, ela inaugura, junto com Pietro M. Bardi e Giancarlo Palanti, o Studio de Arte Palma e a fábrica de móveis Pau Brasil Ltda, diante da necessidade de criar móveis e objetos que acompanhassem a rápida ascensão da construção moderna no Brasil. De acordo com Maria Cecília Santos,

No Studio de Arte Palma foi feita uma tentativa de produção manufatureira de móveis de madeira compensada, cortada em pé, não

39

Imagem

Figura 2 - Sala de Jantar de uma residência. Fonte: Acrópole n°11 de 1939, São Paulo: Edições  técnicas brasileiras, p
Figura 6 - Propaganda da loja Studio Casa e Jardim. Fonte: Acrópole n° 12, 1939, p. 30
Figura 8- Decorações pelo Prof. Dinucci - sala de jantar. Fonte: Acrópole n°93, 1946, p
Figura 16 - Residência projetada por Eduardo Knesse de Mello – Sala de Estar. Fonte:
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Referências

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