QUALIDADE SANITÁRIA DE SEMENTES DE AVEIA-PRETA
Revista Brasileira de Sementes, vol. 24, nº 1, p.1-4, 2002 1
QUALIDADE SANITÁRIA DE SEMENTES DE AVEIA-PRETA (
Avena strigosa
Schreb.)
PRODUZIDAS NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, SAFRA 1999/2000
11Aceito para publicação em 22.12.2001.
2Bolsista de Iniciação Científica do CNPq Acadêmica de Agronomia -UFPel/FAEM.
3Prof. Adjunto do Depto. de Fitotecnia, FAEM/UFPel, Cx. Postal 354, 96010-900, Pelotas-RS; e-mail: luccaf@ufpel.tche.br
4Prof. Titular do Depto. de Fitossanidade FAEM/UFPel. 5Doutorando em Fitossanidade - FAEM/UFPel.
CÂNDIDA RENATA JACOBSEN FARIAS2, ORLANDO ANTONIO LUCCA-FILHO3, CARLOS ROBERTO PIEROBOM4
E EMERSON MEDEIROS DEL PONTE5
RESUMO - Este trabalho teve como objetivo avaliar a qualidade sanitária de sementes de aveia-preta (Avena strigosa Schreb.) produzidas no Estado do Rio Grande do Sul. Foram avaliados 81
lotes de sementes oriundos de 16 municípios de diferentes regiões fisiográficas. Utilizou-se o método do substrato papel, com 400 sementes por lote. Foram detectados os fungos Alternaria
sp., Chaetomium sp.,Cladosporium sp., Colletotrichum sp., Curvularia sp., Epicoccum sp., Nigrospora sp., Colletotrichum sp., Fusarium sp. e os fungos de armazenamento Aspergillus sp.
e Penicillium sp.A maior incidência média foi dos fungos Phoma sp.e Bipolaris spp., com 18,4
e 22,4% respectivamente. Pode-se concluir que deve haver um melhor manejo da cultura da aveia-preta, visando diminuir a contaminação das sementes por fungos, principalmente, nas regiões típicas produtoras de cereais de inverno.
Termos para indexação: fungos, sementes, forrageiras.
HEALTH QUALITY OF BLACK OAT (Avena strigosa Schreb.) SEEDS PRUDUCED
IN RIO GRANDE DO SUL STATET
ABSTRACT - This work aimed to evaluate the health quality of black oat seeds (Avena strigosa
Schreb.) produced in the Rio Grande do Sul State, Brazil. 81 seed lots from 16 different countries were evaluated. Blotter test was used based with 400 seeds by lot. The fungi detected in the seeds were: Alternaria sp., Chaetomium sp., Cladosporium sp., Colletotrichum sp., Curvularia sp., Epicoccum sp., Nigrospora sp., Colletotrichum sp., Fusarium sp. and the storage fungi Aspergillus
sp.and Penicillium sp. were detected. The highest mean incidence was observed to Phoma sp.
and Bipolaris spp. with 18.4 and 22.4%, respectively. It was concluded that it must be taken a best
management of this forage to reduce seed contamination. Index terms: fungi, seed, forage.
INTRODUÇÃO
O período de inverno no Estado do Rio Grande do Sul (RS) constitui-se em um fator limitante tanto na pecuária de corte como na leiteira. A estacionalidade na produção de for-ragem, devido ao crestamento da pastagem nativa provocada pelas freqüentes geadas, leva a insuficiência na produção de forragem em quantidade e em qualidade. Neste sentido, a
aveia-preta (Avena strigosa Schreb.), juntamente com o
azevém-anual (Lolium multiflorum Lam.), são as espécies
forrageiras de inverno mais cultivadas e de maior importân-cia econômica no Estado do Rio Grande do Sul.
A aveia-preta é limitada à produção de massa verde, en-quanto que a aveia-branca (Avena sativa L.) e a
aveia-amare-la (Avena byzantina C.Koch.), fornecem forragem verde e
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de patógenos importantes, como os causadores de helmin-tosporioses, tiveram influência direta na germinação das se-mentes e no estabelecimento da pastagem (Bevilaqua & Pierobom, 1995).
Existe um número elevado de espécies fúngicas associa-das às espécies de aveia, sendo as principais pertencentes aos gêneros Fusarium, Drechslera, Colletotrichum, Phoma, Curvularia e Stagonospora. Especificamente na aveia-preta,
poucas são as informações disponíveis, em especial ao que diz respeito à microflora presente nas sementes e seu efeito no estabelecimento da pastagem.
Considerando o exposto, faz-se necessário o monito-ramento da qualidade sanitária das sementes de aveia-preta produzidas no RS, que permita conhecer as características do material distribuído ao produtor e alertar para o uso eficaz de estratégias que visem melhorias no aspecto sanitário, dimi-nuição da disseminação de patógenos pelas sementes e a con-seqüente introdução de patógenos em áreas livres.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram analisados 81 lotes beneficiados (pelos produto-res) de sementes fiscalizadas de aveia-preta, produzidos na safra 1999/2000, através de amostras médias obtidas junto a produtores localizados em diferentes regiões fisiográficas do Estado do Rio Grande do Sul. Essas amostras, com peso mí-nimo de 800 gramas e acondicionadas em caixas de papelão, foram armazenadas por dois meses, em câmara com tempe-ratura de 20oC e 40% de umidade relativa, tempo necessário
para realizar as análises. As diferentes procedências e núme-ro de lotes avaliados por município podem ser visualizados na Figura 1.
A análise sanitária foi realizada no Laboratório de Pato-logia de Sementes do Departamento de Fitossanidade da Fa-culdade de Agronomia “Eliseu Maciel”, Universidade Fede-ral de Pelotas, Pelotas/RS, utilizando-se o teste substrato de papel (Neergaard, 1979). As amostras médias foram homogeneizadas e divididas, com a utilização do divisor gamet (centrífugo), segundo Brasil (1992), para obtenção das amostras de trabalho. Estas foram submetidas ao teste de sa-nidade, utilizando-se 400 sementes por amostra, distribuídas em 16 sub-amostras de 25 sementes; o substrato com três folhas de papel filtro, umedecidas com água destilada e colo-cadas em caixa plástica do tipo gerbox; incubação em câma-ra de crescimento por sete dias, a tempecâma-ratucâma-ra de 25°C, com regime de luminosidade de 12 horas de luz e 12 horas de escuro. Após o período de incubação, as sementes foram
in-dividualmente examinadas e os gêneros de fungos identifica-dos com auxílio de microscópio estereoscópico, sendo os re-sultados expressos em percentagem de incidência por região fisiográfica. Não foi realizada análise estatística dos resulta-dos, sendo os mesmos apresentados em valores absolutos. FIG. 1. Procedência e número de lotes de aveia-preta de
diferentes regiões fisiográficas do Estado do Rio Grande do Sul: DP = Dom Pedrito (4); CA = Cruz Alta (11); PJ = Pejussara (1); FV = Fortaleza dos Valos (1); BA = Bagé (1); VA = Vacaria (3); IJ = Ijuí (5); SA = Sananduva (1); ER = Erechim (1); MA = Marau (15); PA = Panambi (1); SL = São Luiz Gonzaga (10); PF = Passo Fundo (11); CH = Chiapeta (4); IB = Ibiraiaras (2); TU = Tupanciretã (10).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nos 81 lotes analisados, observou-se a presença de di-versos fungos. Todos os lotes, independente da procedência, apresentaram-se contaminados, observando-se variação tan-to na freqüência de ocorrência, como do fungo associado. A Tabela 1 apresenta a freqüência nos municípios, incidência média, máxima e mínima dos fungos detectados.
Os fungos encontrados com maior incidência média nos lotes foram Bipolaris spp. (22,4%) e Phoma sp. (18,4%).
Espécies de Bipolaris tiveram as maiores incidências médias
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lotes procedentes de Bagé, Dom Pedrito e Vacaria. Da mes-ma formes-ma, Phoma sp. teve maior incidência média (>20%)
em Tupanciretã, Ijuí, Pejussara, São Luiz Gonzaga, Chiapeta, Passo Fundo, Fortaleza dos Valos e Cruz Alta. As menores incidências médias de Phoma sp. (<10%), novamente foram
detectadas em Bagé e Dom Pedrito e no município de Sananduva (Figura 2).
A maior incidência de Bipolaris sp. na região do
planal-to médio pode estar relacionada com o extenso cultivo de cereais de inverno, hospedeiros de fungos causadores de helmintosporioses. Este fato contribui para o incremento do inóculo de fungos necrotróficos que sobrevivem nos restos de cultura da região. Em regiões tipicamente não produtoras de cereais de inverno como Bagé e Dom Pedrito, na metade sul do Estado, a presença de Bipolaris sp. situou-se abaixo de
5% de incidência, bem como na região de Vacaria, onde a condição de baixa umidade relativa na estação de cultivo está relacionada com a menor incidência de doenças.
Quanto aos fungos de armazenamento, amostras do mu-nicípio de Vacaria destacaram-se com alta incidência de
Aspergillus sp. e Penicillium sp., 33,9 e 21,9%,
respectiva-mente. As amostras de Dom Pedrito, Cruz Alta, Panambi e Marau, apresentaram incidência média variando entre 10 a 15% para Aspergillus sp. Nas demais regiões, a incidência
média de Aspergillus sp. situou-se abaixo de 5% (Figura 3).
A presença de fungos de armazenamento associado às sementes está relacionada com o manejo da colheita e pós-colheita, bem como, à umidade relativa do ar durante o armazenamento. Isso explica a variabilidade observada na incidência desses fungos entre diferentes procedências dos lotes. Produtores de sementes com experiência no cultivo de cereais de inverno utilizam técnicas apropriadas, o que con-tribui para a redução da incidência dos fungos de armaze-namento. Por outro lado, a alta incidência de Aspergillus sp.
em Vacaria pode estar relacionado com a alta umidade relati-TABELA 1. Freqüência nos municípios, incidência
mé-dia, incidência máxima e mínima de fungos encontrados em lotes de sementes de aveia-preta provenientes de 16 municípios de dife-rentes regiões fisiográficas do Estado do Rio Grande do Sul.
Fungos (%)Fr Ime(%) (%)Imi Ima(%)
Alternaria sp. 75,0 1,4 0,3 4,0
Chaetomium sp. 56,3 0,6 0,3 1,1
Cladosporium sp. 81,3 1,4 0,3 5,5
Colletotrichum sp. 68,8 1,3 0,3 2,5
Curvularia sp. 56,3 0,8 0,3 1,8
Bipolaris sp. 100,0 22,3 3,8 37,9
Epicoccum sp. 25,0 0,8 0,3 2,0
Fusarium sp. 31,3 1,0 0,5 1,5
Nigrospora sp. 31,3 0,5 0,3 0,8
Phoma sp. 100,0 18,4 2,8 31,7
Aspergillus sp. 100,0 7,0 1,0 33,8
Penicillium sp. 93,8 4,5 0,5 21,9
FR = frequência; Ime = incidência média; Imi = incidência mínima; Ima = incidência máxima.
FIG. 2. Incidência de fungos dos gêneros Bipolaris e Phoma
nos lotes de sementes de aveia-preta oriundas de diferentes municípios do Rio Grande do Sul: DP = Dom Pedrito; CA = Cruz Alta; PJ = Pejussara; FV = Fortaleza dos Valos; BA = Bagé; VA = Vacaria; IJ = Ijuí; SA = Sananduva; ER = Erexim; MA = Marau; PA = Panambi; SL = São Luiz Gonzaga; PF = Passo Fundo; CH = Chiapeta; IB = Ibiraiaras; TU = Tupanciretã. 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
DP CA PJ FV BA VA IJ SA ER MA PA SL PF CH IB TU
Municípios do RS
In ci dê nc ia (%) B ipolaris Phoma
FIG. 3. Incidência de fungos dos gêneros Aspergillus e
Penicillium nos lotes de sementes de aveia-preta
oriundas de diferentes municípios do Rio Grande do Sul: DP = Dom Pedrito; CA = Cruz Alta; PJ = Pejussara; FV = Fortaleza dos Valos; BA = Bagé; VA = Vacaria; IJ = Ijuí; SA = Sananduva; ER = Erexim; MA = Marau; PA = Panambi; SL = São Luiz Gonzaga; PF = Passo Fundo; CH = Chiapeta; IB = Ibiraiaras; TU = Tupanciretã.
0 5 10 15 20 25 30 35 40
DP CA PJ FV BA VA IJ SA ER MA PA SL PF CH IB TU
Municípios do RS
C.R.J. FARIAS et al.
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va do ar, observada durante o período de armazenamento na-quela região.
Trabalhos visando obter informações sobre a qualidade de sementes de forrageiras são incipientes. Fonseca et al. (1996) verificaram perdas decorrentes do mau manejo nas fases de colheita e pós-colheita de azevém-anual, resultando em 20% de redução na disponibilidade dos lotes de sementes. Quanto à sanidade, Lucca-Filho (1999) relacionou a baixa germinação e o estabelecimento do azevém-anual, ao alto per-centual de espécies fitopatogênicas associadas às sementes.
Os resultados obtidos no presente trabalho concordam com o trabalho de Bevilaqua & Pierobom (1995) que anali-saram lotes de sementes de aveia-preta provenientes da re-gião sul do Rio Grande do Sul e, também, observaram uma alta incidência de espécies de fungos causadores de helmintosporioses, correlacionando esta alta incidência a pre-juízos na emergência das plântulas.
O presente trabalho alerta para o melhor manejo que deve ser despendido à cultura da aveia-preta no Estado do Rio Grande do Sul. Esta forrageira apresenta importância estraté-gica no contexto da produção de pastagem no período de in-verno, conseqüentemente toda e qualquer prática que vise melhorar a qualidade fisiológica e sanitária das sementes con-tribui para a obtenção de maiores rendimentos, para as pecu-árias de corte e leiteira. Além disto, fungos causadores de helmintosporioses podem ser introduzidos em áreas livres através de sementes infectadas ou mesmo contribuir para o aumento do inóculo na região.
CONCLUSÕES
Diversos fungos foram encontrados em sementes fisca-lizadas de aveia-preta, sendo que Bipolaris spp., Phoma sp., Penicillium sp. e Aspergillus sp. apresentaram maior
freqüên-cia e incidênfreqüên-cia. Sementes oriundas de regiões tradicional-mente produtoras de cereais de inverno apresentaram alta in-cidência de Bipolaris.
REFERÊNCIAS
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FONSECA, M.G.; MAIA, M.S. & LUCCA-FILHO, O.A. Avaliação da qualidade de sementes de azevém-anual (Lolium multiflorum
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LUCCA-FILHO, O.A.; PORTO, M.D.M. & MAIA, M.S. Fungos em sementes de azevém-anual (Lolium multiflorum Lam) e seus
efeitos no estabelecimento da pastagem. Revista Brasileira de Sementes, Brasília, v.21, n.2, p.142-147, 1999.
NEERGARD, P. Seed pathology. London: The MacMillan, 1979. v.1, 839p.