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Música e Identidade: relatos de autobiografias musicais em pacientes com esclerose múltipla.

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Academic year: 2017

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Música e Identidade: relatos de

autobiografias musicais em pacientes com

esclerose múltipla

Cecilia Cavalieri França

(UFMG, Belo Horizonte)

contato@ceciliacavalierifranca.com.br; poemasmusicais@terra.com.br

Shirlene Vianna Moreira

(CIEM; UFMG, Belo Horizonte)

shirmoreira@uol.com.br; shirvianna@bol.com.br

Marco Aurélio Lana-Peixoto

(CIEM; UFMG, Belo Horizonte)

lanapma@uol.com.br

Marcos Aurélio Moreira

(CIEM; UFMG, Belo Horizonte)

drmarcosmoreira@uol.com.br

Resumo: Autobiografias musicais constituem um recurso terapêutico eloqüente a respeito de como os indivíduos definem a si mesmos, auxiliando a (re)construção da identidade e contribuindo para a melhoria da qualidade de vida de portadores de Esclerose Múltipla. Oito pacientes adultos sob acompanhamento no Centro de Investigação em Esclerose Múltipla (CIEM) – UFMG, selecionaram entre 10 a 15 músicas significativas em sua vida, a respeito das quais discorreram em entrevista aberta. Os dados foram analisados qualitativamente segundo categorias criadas pelo musicoterapeuta norueguês Even RUDD (1998), que visam revelar como o indivíduo expressa suas identidades pessoal, social, temporal e transpessoal. Submetidos a tratamento quantitativo, os dados indicaram que, através da sua história

musical, os pacientes aumentaram a percepção dos sentimentos e sensações corporais, expressaram-se de maneiras alternativas e ativaram memórias afetivas, contextualizando-as e adquirindo um senso de continuidade da vida.

Palavras-chave: musicoterapia, esclerose múltipla, identidade, identidade musical.

Music and identity: musical autobiographies in multiple sclerosis patients

Abstract: Musical autobiographies consist a powerful therapeutic tool through which individuals define themselves, helping in the (re)construction of their identities and in enhancing quality of life of Multiple Sclerosis patients. Eight adult patients under treatment in the Research Centre for Multiple Sclerosis (CIEM) – UFMG, selected 10 to 15 significant pieces of music in their lives, after which they narrated in open interview. The data collected were submitted to the music therapist Even RUDD (1998) categories, which reveal how the person expresses his personal, social, temporal and transpersonal identities. The quantitative treatment indicate that, through their musical history, patients could better the perception of their feelings and body awareness, they could express themselves through alternative ways and activated affective memories, contextualizing them and achieving a sense of continuity of life.

Keywords: music therapy, multiple sclerosis, identity, musical identity.

1 - A esclerose múltipla

A esclerose múltipla é uma doença neurodegenerativa inflamatória do Sistema Nervoso Central (SNC). A doença acomete a bainha de mielina, uma substância gordurosa e protéica que envolve e protege as fibras nervosas do SNC, tornando possível a condução dos impulsos nervosos. O processo de desmielinização em diversas regiões do SNC causa os sintomas experimentados pelos portadores, sendo mais freqüentes as lesões no quiasma e nervos ópticos, cérebro, tronco encefálico, cerebelo e medula espinhal.

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100.000 habitantes na população. Este fato pode ocorrer devido a seus colonizadores serem oriundos da Noruega, Dinamarca, Islândia, Suécia e Irlanda (CALLEGARO, 2005, p.16). A natureza tri-híbrida da população brasileira (ameríndia, africana e européia) e sua distribuição irregular pelo país dificultam a elaboração de um estudo epidemiológico nacional (CALLEGARO, 2005, p.27). Estudos por regiões registram a prevalência de 15 casos para 100.000 habitantes em São Paulo e 18 casos para 100.000 em Minas Gerais.

A esclerose múltipla não é hereditária. A causa da doença é desconhecida, podendo ocorrer por interferência dos fatores genéticos, étnicos, ambientais, exposição a agentes infecciosos não específicos, alimentação, estresse físico ou psíquico (MENDES, 2004, p.24). A esclerose múltipla é a enfermidade neurológica crônica mais freqüente em adultos jovens, sendo mais prevalente em mulheres na proporção aproximada de 2:1. O início dos sintomas é geralmente entre 20 e 40 anos, embora possa ocorrer em outras faixas etárias (LUBLIN, 1996, p.908).

A esclerose múltipla não é considerada uma doença fatal, pois um grande número de pacientes leva uma vida normal. Porém, a doença possui uma característica de imprevisibilidade, podendo tornar-se incapacitante e interferindo na vida cotidiana do paciente. A evolução do quadro clínico da esclerose múltipla é variável, com períodos de surtos e estabilidade. O déficit neurológico do paciente é avaliado a partir de uma escala padronizada na literatura médica chamada EDSS (expanded disability status scale) descrita por Kurtzke (1983). Estabelecido

o diagnóstico, o médico neurologista classifica o déficit neurológico do paciente a partir desta escala. Em português, ela é comumente chamada de Escala de Incapacidade Funcional Expandida, e tem sido o método mais amplamente utilizado de avaliação clínica em esclerose múltipla. No EDSS, o paciente recebe escores apropriados de acordo com seu sistema funcional e habilidades para andar. O escore do EDSS varia de 0 a 10, admitindo variações de 0,5 ponto a partir do EDSS 1,0 (MOREIRA, 2004, p.61). Dessa forma, os pacientes também são avaliados de acordo com sua história clínica e a partir do exame neurológico (TILBERY, 2005, p.58). Essa escala permite a avaliação periódica da evolução clínica da doença (KURTZKE, 1983, p.144).

Dentre os principais problemas neurológicos e clínicos que são avaliados e tratados na esclerose múltipla ocorrem: depressão; dor; fadiga; espasticidade (aumento do tônus muscular); tremor; alterações urinárias; alterações da função intestinal; alterações sexuais; ineficiência respiratória; hipernasalidade vocal; voz fraca, soprosa, rouca ou monótona; déficit articulatório; alterações no processo da deglutição; alterações da visão podendo ocorrer comprometimento na distinção de cores, borramento visual, perda parcial ou completa do campo de visão e visão dupla (FERREIRA, 2004, p.39-42). A esclerose múltipla provoca perda das funções motoras normais, mudança de humor e gradual perda

das habilidades cognitivas. Esses problemas podem piorar durante o curso e estágios da doença causando um impacto sobre as relações sociais do portador (MAGEE, 2004, p.180). A esclerose múltipla exige do paciente e do seu cuidador um processo contínuo de adequação às condições impostas pela doença. Um surto pode mudar o quadro sintomático exigindo do portador um ajuste à nova condição física, podendo causar perdas nas atividades sociais, profissionais e psicológicas influenciando sua auto-imagem, autoconfiança e liberdade (VIEIRA, 2004, p.55).

Além dos tratamentos médicos convencionais, pacientes têm recorrido a tratamentos alternativos como a acupuntura e a musicoterapia. Esta última, como coadjuvante no tratamento da esclerose múltipla, tem como objetivo auxiliar pacientes a realizarem uma grande variedade de tarefas que foram comprometidas pela doença. Ela oferece um conjunto de atividades específicas dirigidas às necessidades de reabilitação do paciente, sendo as atividades musicais adaptadas ao nível de dificuldade cognitiva e motora do mesmo. Em busca realizada em 10/10/2008 no sistema MEDLINE, encontramos apenas dez estudos associados ao emprego da musicoterapia em pacientes portadores de esclerose múltipla. A maioria dos estudos são qualitativos e não randomizados. A presente pesquisa investigou como os pacientes percebem sua identidade por meio da música, pesquisa pioneira no campo da musicoterapia no Brasil.

2. Identidade musical e esclerose múltipla

O conceito de identidade vem sendo submetido a críticas nas suas várias propostas de definição. Porém, compreender a concepção de identidade permite apresentar um sujeito que toma iniciativas de toda a ordem durante sua vida. Segundo Ruud (1998, p.46), a questão da identidade desempenha um papel importante no esforço para compreender o indivíduo. Para este autor a identidade apresenta-se no discurso do indivíduo, quando sua consciência está monitorando suas próprias memórias, atividades e fantasias (RUUD, 1998, p.36). A identidade pode ser definida de forma geral como a consciência da posição do sujeito no mundo a partir de sua subjetividade.

A música desempenha um papel importante na construção da identidade porque ela nos acompanha em diversas fases e contextos da vida. O efeito da música na identidade vem sendo explorado por alguns autores nesta última década. Segundo Hargreaves, a música pode ser usada como um meio pelo qual formulamos e expressamos nossas identidades individuais. Neste contexto investigam-se como os indivíduos narram suas histórias de vida a partir de um referencial musical (HARGREAVES, 2004, p.1). A psicologia social da música é um campo que investiga a influência desta sobre o comportamento e situações da vida cotidiana (HARGREAVES, 2004, p.4) e, portanto, sobre a construção da identidade do indivíduo. Hargreaves distingue dois aspectos da identidade com relação à música: música na identidade e identidade na música. O

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música é utilizada como meio ou recurso para desenvolver aspectos da identidade pessoal (HARGREAVES, 2004, p.4). A identidade na música é definida pelos papéis sociais e

culturais que os indivíduos representam com relação a ela (HARGREAVES, 2004, p.12). A música desempenha um papel importante na construção da identidade, preenchendo funções cognitivas, emocionais e sociais ao influenciar comportamentos (HARGREAVES, 2005, p.31). A música pode servir como referencial para o indivíduo posicionar-se dentro da cultura tornando explícita sua origem étnica, o seu gênero sexual e a sua classe. É utilizada para regular humores e comportamentos cotidianos e para se apresentar às pessoas da maneira como preferida (HARGREAVES, 2004, p.1)

A maneira como cada indivíduo responde emocionalmente às alterações decorrentes da esclerose múltipla leva a mudanças fundamentais na sua identidade (MAGEE, 2004, p.180). Mudanças cognitivas e físicas alteram a maneira como o indivíduo se percebe e como compreende e interage com o ambiente e os indivíduos que o cercam. Segundo Silva (2004, p.23), a doença crônica pode provocar uma ruptura biográfica na vida do portador, produzindo um impacto nos planos físico, socioeconômico e temporal. A recomposição da identidade dos pacientes com esclerose múltipla permite a aceitação da doença na vida cotidiana.

A música pode auxiliar o paciente no resgate da sua identidade, pois ela pode desempenhar um papel de suporte em relação à sua história. As músicas trazidas pelos pacientes para as sessões de musicoterapia fazem parte da trilha sonora de suas vidas particulares. Seus relatos autobiográficos musicais proporcionam um retrocesso no tempo a partir do qual o terapeuta tem a oportunidade de perceber como este se vê diante do mundo. Ouvir músicas relacionadas com sua vida pessoal contribui para a percepção de si mesmo, assim como de sentimentos e lembranças.

O musicoterapeuta norueguês Even Ruud estudou a conexão entre a música e identidade, ou seja, a forma como as pessoas se observam e se apresentam. Este autor coletou mais de 1000 experiências musicais ou narrativas, autobiografias musicais de estudantes de musicoterapia (RUUD, 1998, p.32). A partir desses dados empíricos, o autor desenvolveu uma teoria de identidade musical, segundo a qual o ponto de formação de uma identidade resulta na maneira como os indivíduos narram suas histórias de vida. “Extraindo memórias de eventos significantes da vida como elas foram experimentadas por meio da música, os indivíduos planejam enredos que organizam os eventos de sua vida em narrativas coerentes” (RUUD, 1998, p.66). A partir da análise dos dados, o autor criou quatro categorias relacionando música e identidade: espaço pessoal, espaço social, o espaço de tempo e lugar e espaço transpessoal

(RUUD, 1998, p.33). Cada categoria é dividida em várias subcategorias. Estas são dadas no Ex.1.

3. Método

Esta pesquisa teve como objetivo investigar como portadores de esclerose múltipla expressam suas identidades pessoal, social, temporal e transpessoal

através da música. Devido ao número reduzido de participantes e outras limitações da amostra preferimos considerá-la como um estudo piloto. Este se caracteriza como de delineamento descritivo (GIL, 1996, p.46) e utiliza o método qualitativo de análise de conteúdo utilizando as categorias fechadas elaboradas por Even Ruud (1998) e adaptadas para esta pesquisa. O resultado das análises qualitativas foi submetido a uma análise quantitativa para revelar a incidência de cada categoria.

A amostra foi selecionada por critério de tipicidade (LAVILLE, DIONE, 1999, p.170). Foram envolvidos oito pacientes do Centro de Investigação em Esclerose Múltipla (CIEM) da Universidade Federal de Minas Gerais, sendo cinco do sexo masculino e três do sexo feminino. A idade variou entre 22 e 58 anos, com EDSS de 0 a 5,0. A idade de início da doença variou de 12 a 43 anos e o tempo de diagnóstico, entre 2 e 34 anos. O motivo de encaminhamento à musicoterapia também era variável. Um resumo do perfil da amostra é dado no Ex.2.

Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre esclarecido. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG- COEP , parecer número 501/05. Inicialmente, todos os pacientes foram avaliados prospectivamente pela pesquisadora a partir de um questionário de avaliação inicial em musicoterapia identificando variáveis basais; diagnóstico; motivo do encaminhamento; antecedentes sonoros e musicais; cultura musical; elementos extra-musicais; ambiente sonoro atual; tratamentos utilizados; escalas neuropsicológicas aplicadas; conduta musicoterapêutica; planejamento do tratamento e encaminhamentos para outras especialidades (VIANNA, 2004, p.32). Após a avaliação inicial o paciente foi convidado a participar do estudo sobre identidade musical. A cada sujeito foi solicitado que selecionasse de dez a quinze músicas significativas em sua vida e fizesse um comentário sobre elas. Este número de músicas foi baseado no estudo de identidade musical realizado por Even Ruud (1998, p.32). Os entrevistados passaram por entrevistas abertas não estruturadas que visavam coletar informações sobre o que sentiam quando escutavam as músicas. Os dados foram coletados entre julho de 2005 e junho de 2006.

4. Resultados

4.1- Análise qualitativa

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Ex.1 - Tabela de categorias e subcategorias de análise sobre Música e Identidade

ESPAÇO PESSOAL – aspectos individuais e pessoais

1 Primeiras relações Músicas que pais ou cuidadores cantavam para a criança. 2 Confiança básica Músicas que ancoravam lembranças primordiais de segurança. 3 Ser visto, confirmado O indivíduo tem a atenção de pessoas devido à situação musical. 4 Consciência emocional Habilidade de experimentar, tolerar, refletir e nomear as emoções. 5 Consciência corporal Reações e sensações corporais e fisiológicas a música.

6 Mestria Habilidade de executar música.

7 Espaço privado Escutar ou tocar música leva à consciência de um espaço individual. 8 Autenticidade A experiência musical parece autêntica, verdadeira (não comercial).

ESPAÇO SOCIAL – aspectos interpessoais da identidade

1 Experiência emergente de individualidade

Capacidade de comparar o próprio gosto musical com os dos grupos sociais.

2 Rompendo com identificações Consciência do gosto musical diferente de outra pessoa. 3 Identificação Uso de ídolos musicais para adquirir sua identidade. 4 Pertencimento grupal Percepção de ser parte de um grupo social.

5 Conformidade X independência Percepção de música de consumo X música como transformador da realidade. 6 Gênero sexual A música ajuda a identificar-se com um gênero.

7 Relação com o outro A escolha musical simboliza o valor de ligação com uma pessoa. 8 Etnia A música simboliza o pertencimento étnico.

ESPAÇO DE TEMPO E LUGAR – aspectos relacionados a eventos da vida de onde venho e à época vivida.

1 Calendário Pessoal Experiências musicais que ajudam a traçar a vida. 2 Momentos Significativos Momentos importantes .

3 Rituais Cotidianos Experiências do dia a dia. 4 Celebrações Épocas festivas.

5 Fases da vida Experiências musicais ligadas à transição de uma fase de vida para outra. 6 Época do tempo Período da vida.

7 Tempo Histórico Acontecimentos musicais que se tornaram parte da história oficial assim como da história pessoal.

8 Pertencimento Regional e

Nacionalidade Ligações com raízes musicais e tradições. ESPAÇO

TRANSPESSOAL – experiências musicais que estão além da linguagem, produzindo estados alterados da consciência.

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4.2- Caso

Perfil: homem, brasileiro, com 51 anos, pardo, casado, com curso superior. Diagnosticado com esclerose múltipla recorrente remitente e EDSS igual a 1. Os dados coletados a respeito dos antecedentes sonoros musicais e da cultura musical do paciente revelam que ele estudou piano dos sete aos 14 anos; gosta de piano e órgão de tubos; escuta música diariamente e prefere os estilos: rock’n roll, new age, internacional, pop internacional e música erudita.

4.2.1- Análise da entrevista de um caso

O entrevistado selecionou 11 músicas para sua autobiografia musical. Foram realizadas quatro entrevistas, com uma média de uma hora de gravação. A análise das transcrições revelou 26 referências às categorias de análise:

A) Categoria espaço pessoal - foram encontradas 10 referências a esta categoria, com ocorrências nas seguintes subcategorias:

(A.4) consciência emocional: “Tem uma coisa assim de alegria”;

(A.5) consciência corporal: “E vem uma música aberta, toda saltitante, toda viva, vida”;

(A.6) mestria: “Uma das primeiras músicas que comecei a tocar”;

(A. 8) autenticidade: “Muito introspectiva. Esta música é muito louca. Esta música é calma, mas ao mesmo tempo você fica divagando. Liberdade, como vou dizer, é uma música que você fica pensando e acha uma solução.”

B) Categoria espaço social: foram encontradas oito ocorrências nas subcategorias:

(B.1) experiência emergente de individualidade: “Este tipo de música na época hoje seria New Age. Enquanto as pessoas curtiam carnaval, eu gostava desta música”; (B.3) identificação: “Eu me identificava muito com Beethoven”;

Ex.2 – Tabela de caracterização da amostra

CATEGORIAS Caso1 Caso2 Caso3 Caso4 Caso5 Caso6 Caso7 Caso8

EDSS 0 1 3 5,0 0 3 1 3.0

Idade de início da

doença 25 anos 18 anos 12 anos 41 anos 43 anos 19 anos 42 anos 35 anos Tempo de doença 7 anos 33 anos 34 anos 13 anos 2 anos 3 anos 16 anos 8 anos Encaminhamento

(motivo do paciente) Ansiedade Depressão Canto canto

musico

terapia pesquisa

canto (demanda

própria)

canto

Ex.3 - Tabela de síntese das ocorrências

A) Espaço

Pessoal B) Espaço social C)Tempo/ Lugar

D) Espaço Transpessoal A.1 Primeiras

Relações 00

B.1 Experiência emergente

de indi vidualidade 01 C.1 Calendário Pessoal 02

D.1 Experiência

Religiosa 01 A.2 Confiança

Básica 00

B.2 Rompendo

identificações 00 C.2 Momentos significativos 01 D.2 Culminâncias 00 A.3 Ser visto 00 B.3 Identificações 01 C.3 RituaisCotidianos 00 D.3 Extinção do Ego 00 A.4 Consciência

Emocional 03 B.4 Pertencimento grupal 01 C.4 Celebrações 01 D.4 “Maior do que” 00 A.5 Consciência

corporal 03

B.5 Conformidade X

independência 00

C.5 Fases da

Vida 00 A.6 Mestria 01 B.6 GêneroSexual 02 C.6 Época doTempo 03 A.7 Espaço

Privado 00

B.7 Relação com

o outro 03 C.7 Tempo Histó rico 00 A.8 Autenticidade 03 B.8 Etnia 00

C.8 Pertencimento Regional e Nacionalidade

00

(6)

(B.4) pertencimento grupal: “Eu fiz amizades que até

hoje permanecem”;

(B.6) gênero sexual: “Eu me reúno com amigos da

faculdade”;

(B.7) relação com o outro: “Foi justamente quando eu

comecei a conhecer esta garota [...] Ela não saía da minha cabeça”.

C) Categoria tempo e lugar: foram encontradas sete referências às subcategorias:

(C.1) calendário pessoal: “Começo a sair de casa. Fui

para a [...]”;

(C.2) momentos significativos: “[...] marcou muito

esta música”;

(C.4) celebrações: “No meu aniversário fazia questão

de assistir a missa lá, que era toda em latim”; (C.6) época do tempo: “Esta música me lembra a

época que minha mãe melhorou, começou a andar de cadeiras de roda. É mais ou menos esta época. Eu senti uma melhora nela”.

D) Categoria transpessoal foi encontrada uma ocorrência na subcategoria:

(D.1) experiências religiosas: “Aquele clima de mistério,

de você não saber o que está acontecendo, o que houve, aquele mistério eu achava muito interessante e me identificava com isso. Então esta música tem muito a ver com a Igreja... Você já entra e se sente pequenino você não é nada, você é somente uma parte daquele monumento todo. Esta música era tocada por um padre no Grande Órgão”.

As freqüências das subcategorias para este caso são sintetizadas no Ex.3 e totalizadas no Ex.4.

Ex.4 - Figura da distribuição das categorias de identidade e número de ocorrências

4.2- Análise das subcategorias de identidade referente aos oito casos

Após a análise das entrevistas dos oito participantes, foram computadas as freqüências de todas as subcategorias. As subcategorias de maior incidência da categoria espaço pessoal foram: consciência emocional (39,47%), consciência corporal e autenticidade, como mostra o Ex. 5.

Ex.5- Gráfico de barras do número de ocorrências em subcategorias no espaço pessoal

Na categoria espaço social, a subcategoria relação com o outro se destacou com 38,29%. A subcategoria pertencimento grupal apresentou 26,59% e a subcategoria identificação apresentou 17,02%. Estes dados podem ser

visualizados no Ex.6.

Ex.6 - Gráfico de barras do número de ocorrências em subcategorias no espaço social

A categoria tempo e lugar apresentou maior incidência na subcategoria época do tempo. As subcategorias fases da vida, momentos significativos e calendário pessoal

também são representativas, como observados no Ex.7.

(7)

Esses dados podem ser visualizados no Ex.9, abaixo. A análise quantitativa dos dados mostra que há uma diferença significativa entre a categoria transpessoal e as demais categorias de identidade. O Ex.10 apresenta a tabela de distribuição e intervalos de confianças para cada categoria, também dados no Ex.11.

Alguns casos apresentam diferenças estatisticamente significativas (valor-p<0,01) em relação ao grupo total, a saber: dois casos na categoria espaço pessoal; dois casos na categoria espaço social e um caso na categoria tempo e lugar. Estes dados aparecem no Ex.12.

O Ex.13 a seguir mostra um resumo da Tabela acima, ilustrando o percentual de ocorrência em cada categoria por caso e no grupo total.

Ex.9- Tabela da síntese das subcategorias dos casos

A) Espaço Pessoal B) Espaço social C) Tempo / Lugar D) Espaço Transpessoal A.1 Primeiras relações 01 B.1 Experiência emergente de indi vidualidade 01 C.1 Calendário Pessoal 14 D.1 Experiência Religiosa 03 A.2 Confiança Básica 06 B.2 Rompendo identificações 01 C.2 Momentos significativos 18 D.2 Culminâncias 01 A.3 Ser visto 02 B.3 Identificações 16 C.3 Rituais Cotidianos 09 D.3 Extinção do Ego 00 A.4 Consciência emocional 60 B.4 Pertencimento grupal 25 C.4 Celebrações 08 D.4 “Maior do que” 03 A.5 Consciência corporal 36 B.5 Conformidade X independência 07 C.5 Fases da Vida 19

A.6 Mestria 11 B.6 Gênero Sexual 08 C.6 Época do Tempo 43 A.7 Espaço Privado 06 B.7 Relação com O outro 36 C.7 Tempo Histó rico 04 A.8 Autenticidade 30 B.8 Etnia 00 C.8 Pertencimento Regional e Nacionalidade 01

Total de ocorrências 152 Total de ocorrências 94 Total de ocorrências 116 Total de ocorrências 07

Ex.10- Tabela da proporção de cada categoria

CATEGORIAS Incidências Porcentagem IC 95%

Espaço Pessoal 152 41% [36%; 45%]

Espaço Social 94 25% [21%; 30%]

Tempo/Lugar 116 31% [27%; 36%]

Transpessoal 07 2% [1%; 4%]

Total 369 100%

Na categoria transpessoal, as subcategorias mais relevantes foram experiências religiosas e “maior que”

onde estão concentradas 85,7% das ocorrências, como percebido no Ex.8.

(8)

Ex.12- Percentual de cada caso nas categorias, com valor-p do teste Qui-quadrado*

Caso Espaço Pessoal Espaço Social Tempo/Lugar Transpessoal

1 30% (0,13*) 30% (0,49*) 40% (0,22*) 0% (0,99**)

2 38% (0,78*) 31% (0,55*) 27% (0,63*) 4% (0,42**)

3 41% (0,69*) 17% (0,12*) 39% (0,19*) 3% (0,64**)

4 17% (0,01*) 30% (0,59*) 53% (0,01*) 0% (0,58**)

5 53% (0,11*) 22% (0,64*) 22% (0,20*) 2% (0,99**)

6 32% (0,22*) 53% (<0,01*) 15% (0,02*) 0% (0,99**)

7 47% (0,38*) 21% (0,47*) 32% (0,98*) 0% (0,60**)

8 64% (0,01*) 5% (<0,01*) 23% (0,28*) 8% (0,06**)

Total 41% 25% 31% 2%

Espaço pessoal

Espaço social

Tempo/espaço

Transpessoal

1

4

7 10 13 16 19 22 25 28 31 34 37 40 43 46

Proporções de intervalos de confiança

(9)

5. Discussão

Observamos nos casos estudados que a categoria que ocorreu com maior proporção foi a espaço pessoal, com freqüência de 41%, e dentro desta categoria a subcategoria

consciência emocional foi a mais citada, com um índice de

39,47%. Isto ocorreu devido à compreensão da qualidade emocional das experiências musicais vividas pela maioria dos entrevistados. Para Even Ruud (1998), todas as memórias significantes da música parecem ter certa qualidade de “presença afetiva”. A subcategoria consciência corporal apresentou um índice elevado, com 23,68%.

Esta subcategoria demonstra que a música é fortemente percebida pelos entrevistados como uma sensação corporal. A consciência dos sentimentos e as sensações corporais é uma parte importante da autoconsciência (RUUD, 1998, p.39). Estes exercícios emocionais em musicoterapia esclarecem os sentimentos relatados auxiliando o sujeito a se expressar de diferentes formas.

Na categoria espaço social as subcategorias que mais se destacaram neste estudo foram relação com o outro (38,29%)

e pertencimento grupal (26,59%). As relações sociais são de

importância para o desenvolvimento da identidade do sujeito. Segundo Ruud (1998) reconhecer os aspectos interpessoais da identidade “conduz a uma grande consciência sobre o papel de um contexto cultural maior, onde a identidade toma forma” (RUUD, 1998, p.41). A influência do contexto social na vida pessoal dos entrevistados mostra-se como um fator importante de análise.

Na categoria espaço de tempo e lugar a identidade musical está relacionada ao lugar que o indivíduo tem como referência e à época que ele está contextualizado. Nesta categoria observamos que houve uma maior relevância nas subcategorias época do tempo com 37,06%, e fases da vida que representou 16,37% das ocorrências.

Algumas vezes, experiências musicais são percebidas pelos sujeitos como uma coisa “indefinida e indescritível, alguma coisa além dos limites da linguagem” (RUUD, 1998, p.46). Esta sensação foi percebida por alguns dos entrevistados, que relataram em suas autobiografias estados alterados de consciência ao escutar música. Porém, a categoria

transpessoal não foi representativa em nossos estudos. Esta categoria mostrou-se estatisticamente significante em relação às outras categorias, pois os intervalos de confiança não se sobrepõem. Situações que envolvem estados alterados da consciência dificilmente são expressos em linguagem, o que pode ter levado ao índice

de apenas 2% das ocorrências nesta categoria.

Todos os entrevistados relataram mudanças positivas em sua vida. Na análise da entrevista do caso 1, ele enfatizou a saudade do seu passado, do que ele tinha sido e de uma determinada época de sua vida. Ele apresentava-se muito queixoso sobre o seu momento presente e a falta de perspectiva futura, devido à condição de sua doença e poucas possibilidades interpessoais e profissionais. Na entrevista final, após relato de sua autobiografia musical, o paciente trouxe o violão e fez planos para o futuro, como cantar no coral, procurar um emprego, desejar uma namorada e sair com os amigos. O entrevistado 2 relatou que antes das entrevistas tinha dificuldades de lembrar de músicas relacionadas à sua infância. O entrevistado 3 relatou que achou muito bom fazer a sua auto-biografia musical, porque “as coisas vão ficando represadas com o passar do tempo”. Ele relatou que tinha dificuldades em se expressar e que, em cada música, voltou àquela época, induzindo os sentimentos que passou em detalhes. O caso 4 teve dificuldades de selecionar 10 músicas significativas em sua vida. Porém, ao ouvir as músicas, conseguia se lembrar de fatos relacionados principalmente a subcategoria época do tempo que foi a mais enfatizada nos seus relatos.

Observamos que as experiências musicais podem auxiliar o paciente no resgate de momentos importantes de sua vida. No final das entrevistas, o caso 5 afirmou ter sido uma experiência nova o fato de relacionar a música com os momentos da sua vida. Diz ter achado muito interessante, pois a música grava um período que “mexeu muito”. Falava das suas lembranças destes períodos e do momento presente, afirmando que é tudo muito novo. Afirma que se sente bem “desenvolvendo este outro lado”. O entrevistado 6 não fez referência às músicas de sua infância. Após as entrevistas, apresentou demanda para atendimento psicoterapêutico e foi, em seguida, encaminhado. O entrevistado 7 relatou no final das entrevistas que foi muito bom, pois teve a oportunidade de “desabafar algumas coisas que estava segurando”. Disse que em algumas músicas chorou e outras trouxeram momentos de alegria. O entrevistado 8 relatou no fim das entrevistas o benefício de “colocar para fora” as memórias relativas às suas experiências musicais.

(10)

Referências bibliográficas

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Cecília Cavalieri França é Doutora e Mestre em Educação Musical pela University of London. Pianista formada pela Escola de Música da UFMG e Especialista em Educação Musical pela UFMG. Autora das obras Para fazer música (Editora

UFMG), Feito à mão: criação e performance para o pianista iniciante (Halt Gráfica e Editora), Poemas Musicais, que inclui

o Cd e respectivo livro de partituras Poemas Musicais: ondas, meninas, estrelas e bichos, finalista do Prêmio Tim 2004,

e o Cd Toda Cor. Co-autora do livro Jogos Pedagógicos para Educação Musical (2005) e da obra Matemúsica, material

pedagógico original para o ensino dos compassos. Atua como professora e pesquisadora na Escola de Música da UFMG.

Shirlene Vianna Moreira é Mestre em Música pela Escola de Música da UFMG, psicóloga pela UFJF e musicoterapeuta. Tem fellowship em musicoterapia no Centre Hopitalier Georges Mazurelle na França e foi pioneira no estudo de pacientes com esclerose múltipla através da musicoterapia no Brasil.

Referências

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