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Quem paga o tributo? Repercussão econômica e restituição do indébito tributário : uma conexão possível?

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Academic year: 2017

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(1)

FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

ESCOLA DE DIREITO DE SÃO PAULO

PAULO EMÍLIO DERENUSSON

QUEM PAGA O TRIBUTO?

Repercussão econômica e a restituição do indébito tributário: uma conexão possível?

SÃO PAULO

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PAULO EMÍLIO DERENUSSON

QUEM PAGA O TRIBUTO?

Repercussão econômica e a restituição do indébito tributário: uma conexão possível?

Dissertação apresentada à Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, como requisito para obtenção do título de Mestre em Direito e Desenvolvimento, na área de Direito Tributário, sob orientação do Professor Doutor Roberto Quiroga Mosquera.

SÃO PAULO

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Derenusson, Paulo Emílio.

Quem paga o tributo? Repercussão econômica e restituição do indébito tributário – Uma conexão possível? / Paulo Emílio Derenusson. - 2015. 94 f.

Orientador: Roberto Quiroga Mosquera

Dissertação (mestrado) - Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas.

1. Direito tributário - Brasil. 2. Indébito tributário. 3. Compensação

(Direito). I. Mosquera, Roberto Quiroga. II. Dissertação (mestrado) - Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas. III. Título.

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PAULO EMÍLIO DERENUSSON

QUEM PAGA O TRIBUTO?

Repercussão econômica e a restituição do indébito tributário: uma conexão possível?

Dissertação apresentada à Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, como requisito para obtenção do título de Mestre em Direito e Desenvolvimento, na área de Direito Tributário, sob orientação do Professor Doutor Roberto Quiroga Mosquera.

Data de Aprovação:

____ / ____ / ____

Banca Examinadora:

____________________________

Professor:

Instituição:

____________________________

Professor:

Instituição:

____________________________

Professor:

Instituição:

____________________________

Professor:

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AGRADECIMENTOS

Chegar ao fim de uma jornada muitas vezes significa chegar ao ponto de partida de um

novo caminho. Fazer parte da primeira turma do Mestrado Profissional do curso de Direito da

Fundação Getúlio Vargas foi uma grande experiência de vida, encontrei aqui um terreno fértil

para a discussão e pesquisa do Direito, sendo recebido com o acolhimento típico daqueles que

recebem as ideias e não as pessoas.

Quero agradecer a Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas por fazer possível a

realização de diversos sonhos e conquistas, que solidificam a instituição como pioneira e

vanguardista. Desde os funcionários de apoio e administrativos até a Direção da Escola

merecem aqui meu agradecimento pelos momentos únicos vividos neste espaço acadêmico.

O meu muito obrigado aos Professores Roberto Quiroga Mosquera, Tathiane Piscitelli,

Rafael Mafei, Bruno Salama, Elidie Palma Bifano, Wanderley Fernandes, Viviane Muller

Prado, Juliana Furtado Costa Araújo, Emerson Ribeiro Fabiani e Roberto França

Vasconcellos pelas lições que jamais serão esquecidas.

Aos todos os colegas da primeira turma do Mestrado Profissional por iluminarem uns

aos outros nesta jornada, em especial aos amigos André Cardozo, Armênio Correa, Christiano

Xavier, Eduardo Salusse, Octávio Ustra, Rodrigo Dias, Ronaldo Medeiros e Tomas Cormino

pela convivência e amizade.

(7)

Ninguém caminha sem aprender a caminhar, sem

aprender a fazer o caminho caminhando, refazendo e

retocando o sonho pelo qual se pôs a caminhar.

(8)

RESUMO

DERENUSSON, Paulo Emílio. Quem paga o tributo? Repercussão econômica e restituição do indébito tributário: uma conexão possível? Dissertação de Mestrado – Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2015.

A repetição do indébito visa a restituir ao estado anterior aquele que sofreu redução

patrimonial de forma indevida, representando uma norma de equidade. Os pedidos de

restituição de tributos indevidamente pagos foram objeto de tratamento desigual pela

jurisprudência, que influenciou a edição do Código Tributário Nacional ao eleger regramento

próprio para os tributos indevidamente pagos, condicionando a legitimidade do contribuinte à

prova de que não transferiu o respectivo ônus financeiro ou está autorizado por aquele que

recebeu a translação do tributo a pleitear a restituição. A adoção desse racional econômico é

motivo de grande controvérsia tanto na doutrina quanto na jurisprudência, em que se pergunta

se, ao conectar a legitimidade para pleitear a restituição ao racional econômico da não

transferência, a medida de igualdade sofreu uma sensível redução. Com vistas a confirmar

essa hipótese, o presente trabalho busca identificar nas raízes históricas da edição do Código

Tributário Nacional e na jurisprudência administrativa e judicial da época uma fonte de

influência a esse desenho normativo. Passo seguinte, em um diálogo entre o Direito e a

Economia, vamos demonstrar como o tributo repercute economicamente, buscando investigar

como o contribuinte pode transferir seu encargo a terceiros, quem são estes, sob quais

condições isso pode ocorrer e, se pela natureza dos tributos, cabe ou não a translação.

Superada essa etapa, com apoio na jurisprudência dos Tribunais Superiores, identificaremos

os principais avanços e desafios da jurisprudência sobre a repercussão econômica do tributo e

os pedidos de restituição. Após essa investigação, busca-se concluir se a conexão entre a

repercussão econômica e a repetição do indébito tributário foi um vetor de equidade ou se

esse ponto de intersecção merece ser abolido.

Palavras-chave: Repercussão econômica do tributo. Restituição do indébito tributário. Transferência do encargo financeiro. Translação econômica. Incidência econômica.

(9)

ABSTRACT

DERENUSSON, Paulo Emilio. Who pays tribute? Economic repercussions and restitution of tax overpayments - A possible connection? 2015 97 f. Thesis (Master of Law) - Law School of São Paulo's Getulio Vargas Foundation, São Paulo, 2015.

The repetition of overpayment aims to restore the previous state that suffered asset

reduction improperly, representing a rule of equity. Applications for refund of unduly paid

taxes were subject to unequal treatment in the case law, which influenced the edition of the

National Tax Code to elect rule own to unduly paid taxes, affecting the legitimacy of the

contributors to the evidence that did not transfer their financial burden or is authorized by the

one who received the translation of the tribute to claim the refund. The adoption of this

rational economic motive is highly controversial both in doctrine and case law, where it is

asked that by linking the legitimacy to claim the refund to the economic rationale of not

transfer, the measure of equality suffered a significant reduction. In order to confirm this

hypothesis, this study seeks to identify the historical roots of the issue of the tax code and the

administrative and judicial jurisprudence of time a source of influence to this normative

design. Next step we will demonstrate how the tax affects economically, in a dialogue

between law and economics in order to investigate how the taxpayer can transfer their charge

to third parties, who are these, what conditions this can occur and, by the nature of taxes, it

the translation or not. Overcome this stage, with support in the case law of the Superior

Courts will identify the main advances and challenges of case law on the economic impact of

the tax and the refund applications. After this research, we seek to complete the connection

between the economic impact and the repetition of the tax overpayment was a vector of equity

or if the intersection point deserves to be abolished.

(10)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11

2 ESTRUTURA DO TRABALHO ... 16

3 JUSTIFICATIVA HISTÓRICA – EQUIDADE, JUSTIÇA, PAGAMENTO INDEVIDO E O DIREITO À RESTITUIÇÃO ... 18

3.1 Pagamento indevido e o direito à restituição como regra de justiça ... 18

3.2 Ressarcimento do pagamento indevido no Direito positivo brasileiro e nas jurisprudências administrativa e judicial antes da edição do CTN ... 19

3.3 Conclusão parcial ... 27

4 A REFORMA TRIBUTÁRIA E A EDIÇÃO DO ARTIGO 166 DO CTN ... 29

4.1 A Comissão Especial do Código Tributário Nacional ... 29

4.2 A Reforma Tributária Nacional e a Emenda Constitucional nº 18 de 1° de dezembro de 1965 ... 30

4.3 A proposta da para a restituição dos tributos indevidamente pagos no anteprojeto de Rubens Gomes de Sousa ... 32

4.4 O resultado dos trabalhos da Comissão Especial do Código Tributário Nacional para restituição dos tributos indevidamente pagos ... 33

4.5 A proposta para restituição de tributos indevidamente pagos pelo anteprojeto da Lei Orgânica do Processo Tributário elaborado por Gilberto Ulhôa Canto ... 35

4.6. Revisão da Súmula 71 pelo STF por meio do verbete sumular 546 ... 36

4.7 A publicação do CTN e o artigo 166 em sua redação final ... 38

4.8 Dois pesos duas medidas: no que difere a restituição do indébito fiscal da restituição do indébito? ... 45

4.9 Conclusões parciais ... 46

5 REPERCUSSÃO ECONÔMICA DO TRIBUTO ... 48

5.1 Considerações iniciais ... 48

5.2 Translação econômica do tributo – incidência tributária e incidência econômica 49 5.3 Microeconomia e a Teoria do Mercado ... 51

5.4 Repercussão econômica do tributo entre consumidores e/ou fatores de produção 53 5.5 Fatores que influenciam a transferência do tributo ... 56

5.5.1 Quanto ao bem comercializado ... 57

(11)

5.5.3 Ramo de atividade ... 60

5.5.4 Localização geográfica ... 61

5.5.5 Forma jurídica ... 61

5.5.6 Conjuntura econômica ... 62

5.5.7 Mercados não competitivos ... 62

5.5.8 Outros fatores que podem influenciar a translação dos tributos ... 64

5.6 Tributos repercutem por sua natureza? ... 65

5.7 No que interessa ao Direito Tributário a repercussão do tributo? ... 67

5.8 Pluralidade de fatores e uma única certeza – a incerteza! ... 69

6 AVANÇOS E DESAFIOS DA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES – CONEXÃO OU DESCONEXÃO ? ... 71

6.1 Recurso Especial nº 1.110.550 e a extensão da incidência do artigo 166 do CTN aos pedidos de compensação tributária ... 72

6.2 O impedimento do contribuinte de fato ou econômico de se buscar o pedido de restituição – os avanços do Recurso Especial nº 903.394 ... 75

6.3 O Recurso Especial. nº 1.125.550 e a inaplicabilidade aos tributos diretos – a decisão pela presunção ... 77

6.4 A legitimidade do contribuinte de fato nos pedidos de repetição de indébito referente à demanda contratada de energia elétrica no Recurso Especial nº 1.299.303 – a restituição por meio da teoria do desequilíbrio econômico financeiro do contrato administrativo ... 79

6.5 O REsp. 1.377.781/MG e o depósito administrativo do tributo e seu levantamento. Exigência ou não a prova do art. 166 do CTN? ... 81

6.6 As balizas da jurisprudência em recurso repetitivo do Superior Tribunal de Justiça ... 82

7. AFINAL, IMPORTA QUEM PAGA O TRIBUTO PARA RESTITUIR O INDÉBITO TRIBUTÁRIO? ... 84

8. PROPOSTA DE ALTERAÇÃO DO ARTIGO 166 DO CTN ... 86

8.1 Quais requisitos são importantes no novo desenho normativo? ... 86

8.2 O projeto de Lei nº 167/2012 em trâmite pelo Congresso Nacional visando a alterar o artigo 166 do CTN ... 87

9 CONCLUSÃO ... 89

(12)

1 INTRODUÇÃO

Em uma sociedade em que a justiça é um princípio almejado por todos, as instituições

devem promover de forma adequada a distribuição dos benefícios e encargos da vida social.

As instituições têm por obrigação dotar seus atos por uma concepção de justiça,

quando tal medida é aceita pela maioria da coletividade.

Sobre a Teoria da Justiça, Rawls (2008, p. 5) ensina que

Uma sociedade é bem ordenada não apenas quando está planejada para promover o bem de seus membros, mas quando é também efetivamente regulada por uma concepção pública de justiça. Isto é, trata-se de uma sociedade na qual (1) todos aceitam e sabem que os outros aceitam os mesmos princípios de justiça, e (2) as instituições sociais básicas geralmente satisfazem, e geralmente se sabe que satisfazem, esses princípios.

A Constituição Federal de 1988 – CF/88 informa que o objetivo da República

Federativa do Brasil é construir uma sociedade livre, justa e solidária.

O pagamento indevido sempre foi tratado como um direito infringido, uma patologia a

ser combatida, devendo-se restabelecer o status quo ante como medida de justiça e equidade.

Cabe às instituições materializar o princípio de justiça, seja editando normas que

assegurem ao credor o efetivo recebimento do devedor, bem como proferindo decisões

(administrativas e judiciais) que efetivamente assegurem de modo justo a proteção do bem

jurídico violado.

O enriquecimento ilícito é entendido pelo Direito como todo aumento patrimonial que

ocorre sem causa jurídica, ou tudo que se perde sem uma causa legítima. Diante do indébito,

nasce a relação entre o solvens (devedor) e o accipiens (credor), em que este tem direito à

repetição em relação àquele, sob pena de enriquecimento sem causa.

Situação intrigante e polêmica se dá quando a figura do devedor encontra-se no

próprio Estado, representado por suas instituições, e o credor, um de seus membros da

sociedade, representado por um cidadão, ou seja, quando um de seus membros abre mão de

seu patrimônio em detrimento da sociedade. Uma vez extrapolado o limite de sua

contribuição, nasce a obrigação da restituição do valor pago indevidamente pelo Estado a um

de seus membros.

Nada mais justo do que aguardar do Estado, que representa todos os cidadãos, o

(13)

havendo como imaginar que o Estado locupletar-se-ia do patrimônio do particular sem justo

motivo.

Partindo do princípio de Justiça, na relação entre Estado e contribuinte, uma vez

existindo o pagamento indevido do tributo, nada mais justo que sua pronta restituição.

Dada a peculiaridade da relação tributária, em que se busca equilibrar a necessidade

estatal com as garantias dos contribuintes, uma forma justa de garantir a restituição em casos

de pagamento indevido é a edição de uma norma jurídica que assegure ao contribuinte a

restituição nos casos de pagamento indevido, tendo em vista que somente existia a previsão na

regra geral da repetição do indébito no Código Civil de 1916.

Grande dificuldade surgiria na medida em que alguns tributos incidem sobre uma

determinada operação, envolvendo mais de um contribuinte, uma vez que determinados

tributos submetem-se ao princípio da não cumulatividade, compensando o valor pago nas

operações anteriores à atual, o que importaria em existir mais de um contribuinte em

determinada operação. A doutrina classificou tais tributos como “tributos indiretos”,

suscitando dúvidas quanto à correta identificação do accipiens.

Antes mesmo da edição de uma norma que assegure essa garantia ao contribuinte, o

Poder Judiciário, por sua mais alta Corte de justiça, o Supremo Tribunal Federal – STF,

julgando pedido de restituição de “tributo indireto”, negou o direito à restituição e editou a

Súmula 71 sobre o tema, em 13 de dezembro de 1963, com o seguinte teor: “Embora pago

indevidamente, não cabe restituição do tributo indireto”.

Tal verbete reconhece que, mesmo com o pagamento indevido, nos tributos indiretos

não cabe restituição, não se arriscando em legitimar quem deva receber do Estado aquilo que

pagou indevidamente, diante da ausência de uma regra específica sobre o tema no Direito

positivo então vigente.

Alguns anos após o referido julgamento, foi designada por ato do Senhor Ministro da

Fazenda comissão especial para apresentar o projeto do Código Tributário Nacional – CTN,

norma geral em matéria tributária.

Para evitar o enriquecimento sem causa do Estado, provavelmente influenciada pela

decisão proferida pelo STF na edição da Súmula 71, a comissão especial do CTN, visando a

implementar uma regra de equidade na identificação de quem de fato suportou o ônus da

incidência tributária, propôs o artigo 166 do Código Tributário Nacional, publicado em 25 de

outubro de 1966, com a seguinte redação:

(14)

do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-lo.

Conforme se extrai da norma contida no artigo citado, nos casos de pagamento

indevido de tributo que, por sua natureza, comporte a transferência do encargo financeiro,

somente aquele que provar que sofreu a diminuição patrimonial do tributo indevido estará

legitimado a ser restituído e, ainda, se transferiu a terceiros, estiver por estes autorizado a

requerer a restituição.

A regra de equidade do artigo citado quer devolver a quem suportou o ônus da

tributação a titularidade para pleitear a restituição do tributo pago indevidamente. Para atingir

tal fim, elegeu a regra da teoria da incidência econômica para identificar quem de fato

suportou o tributo, não necessariamente aquele que pagou ao Estado.

Assim, a teoria da incidência econômica busca identificar se aquele que suportou o

ônus do tributo é o mesmo que legalmente detém a obrigação de pagá-lo ao governo, ou seja,

que sofre a incidência jurídica da tributação.

Ao adotar a racionalidade econômica como regra da identificação do accipiens que

busca ser ressarcido pelo Estado do tributo pago indevidamente, a comissão especial do CTN

adotou uma regra justa, tudo com vistas a evitar que aquele que não suportou o ônus da

tributação possa recuperar tributo pago indevidamente.

O Prêmio Nobel de Economia de 2001, Joseph E. Stiglitz (1999, p. 48), questiona:

O que se entende pela incidência de um imposto? Por que é que aqueles que, em última análise, arcam com o ônus de um imposto, podem diferir significativamente daqueles sobre os quais o imposto decorre de uma imposição legal? O que determina quem tem o ônus de impostos? Como depende da elasticidade da demanda e da oferta? Sobre se os mercados são competitivos ou não? Por que pode variar entre o curto e o longo prazo? (tradução do autor)1

O Direito, ao escolher o racional econômico para identificar quem suportou o ônus do

tributo, não levou em conta que, para a Economia, nem sempre o que preenche o cheque para

o governo é o mesmo que suporta a incidência econômica do tributo, e que a transferência do

encargo financeiro é questão que envolve uma série de fatores, de difícil ou quase impossível

demonstração.

No entanto, ao propor um diálogo entre o Direito e a Economia para se identificar

      

1

(15)

quem de fato suportou o ônus financeiro do tributo, os membros da comissão especial do

CTN não imaginavam as possibilidades em que o tributo pode ser transferido nas relações

entre o sujeito passivo do tributo e outros atores econômicos (transferência para frente

(forward), para trás (backward), ou em ambos os sentidos).

Como identificar quais tributos admitem a transferência do encargo financeiro a

terceiros e que estariam sujeitos à regra do artigo 166 do CTN? Após 50 anos da edição da

referida norma jurídica, não se tem uma solução normativa para essa questão.

Com o vazio normativo para identificar a quais tributos o mencionado artigo diz

respeito, foi delegado ao intérprete edificar, por meio da jurisprudência, quais seriam os

tributos que podem transferir o encargo ao “contribuinte econômico” e quais não se

sujeitariam à regra do artigo 166 do CTN.

Aqui, a primeira questão focal do presente trabalho, sob o aspecto da justiça, se

colocarmos o véu da ignorância proposto por Rawls (2008, p. 15), o artigo 166 do CTN, ao

escolher a racionalidade econômica para legitimar quem deve buscar do Estado o tributo pago

indevidamente, é uma norma justa? Vale dizer, ao trazer um requisito até então inexistente

como condição de legitimidade – prova do não repasse econômico a terceiros, distinguindo-se

sobremaneira da repetição do indébito fundada em relação privada, cuidou o legislador de

trazer uma norma justa?

Avançando sobre a norma posta do artigo 166 do CTN, o passo seguinte foi o

Supremo Tribunal Federal editar a Súmula 546, em 03 de dezembro de 1969, assim redigida:

“Cabe a restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido por decisão, que o

contribuinte “de jure” não recuperou do contribuinte ‘de facto’ o quantum respectivo”. Esta

acabou por revogar a então Súmula 71 do mesmo Tribunal.

A partir daí, coube à jurisprudência complementar a regra do artigo 166 do CTN com

sua interpretação, identificando quais seriam os tributos e quando os contribuintes “de fato” e

“de direito” seriam partes legítimas para pleitear o indébito tributário.

A segunda questão do presente trabalho é se a jurisprudência do Superior Tribunal de

Justiça, que cuidou de suprir o vazio normativo na interpretação de quais tributos estariam

sujeitos ao artigo 166 do CTN, bem como quem detém legitimidade para pleitear entre o

contribuinte “de fato” e “de direito”, proferiu decisões justas sob o ponto de vista da justiça?

Aplicar uma regra de difícil interpretação não é missão fácil quando o assunto é suprir

eventuais vazios normativos como quais tributos por sua natureza admitem a translação,

sendo, portanto, um grande desafio.

(16)

pode ser substituída por uma norma que traga segurança jurídica aos contribuintes em caso de

pagamento indevido. Mesmo a sujeição passiva incidindo sobre mais de um contribuinte, é

possível uma norma jurídica dizer quem detém a titularidade do pedido de restituição do

indébito tributário nos casos de pagamento indevido, independentemente da translação dos

efeitos do tributo?

Nesse ponto, importante analisar o alcance da proposta de revisão do artigo 166 do

CTN por meio do Projeto de Lei nº 167/2012 de autoria do deputado federal Carlos Bezerra,

que suprimiu o racional econômico como condição de legitimidade para buscar a repetição do

indébito.

A partir desse mosaico de fatos e possibilidades, o presente trabalho apresenta uma

proposta de alteração do artigo 166 do CTN que possa atender o justo, sem criar condições

inexequíveis aos contribuintes, trazendo segurança jurídica e previsibilidade nos casos de

(17)

2 ESTRUTURA DO TRABALHO

As teorias existentes a respeito da restituição dos tributos indiretos buscam confrontar

a norma do artigo 166 do CTN com a Constituição Federal, buscando verificar se a norma

legal é com esta compatível. O que se propõe no presente trabalho é analisar as razões que

levaram à conexão entre a racionalidade econômica e a repetição do indébito tributário na

edição do CTN e se essa ligação resulta em uma garantia de justiça ao contribuinte.

Nos dois primeiros capítulos, buscam-se as origens históricas da repetição do indébito

tributário, desde os primeiros julgados encontrados versando sobre o tema, até a via peregrina

de edição do CTN e a instituição do seu artigo 166. Interessa ao trabalho buscar quais os

elementos que identificaram a racionalidade econômica como um caminho seguro para

legitimar o contribuinte que persegue ser restituído do tributo indevidamente pago.

No terceiro capítulo, propõe-se um diálogo entre Direito e Economia para verificar em

quais situações a repercussão do tributo acontece, se a natureza do tributo difere para fins de

repercussão e quais fatores podem influenciar a translação do custo tributário, ou seja, como a

regra econômica traz balizas seguras para identificar a translação.

No quarto capítulo, busca-se uma análise da jurisprudência dos Tribunais Superiores,

de caráter especial, julgados em recursos repetitivos e com repercussão geral, em que se

investigará se a jurisprudência sobre a repetição do tributo indireto induz um caminho seguro

aos contribuintes que irão pleitear a repetição. Quais avanços e quais desafios ainda existem

na jurisprudência do STJ e STF?

A partir do pagamento indevido de tributos que, por sua natureza, possibilitam a

transferência do encargo financeiro, nasce o direito a pleitear sua restituição. Diante do artigo

166 do CTN, que elegeu a incidência econômica como fator decisivo para atribuir a

legitimidade do contribuinte ao buscar a restituição e da Jurisprudência dos Tribunais

Superiores, pode-se dizer que a regra para restituição de tais tributos encerra em si uma norma

justa?

Caminha-se para a conclusão do trabalho, opinando pelo acerto normativo do artigo

166 do CTN ou do patente equívoco de vincular uma regra jurídica a um racional econômico,

não sendo essa conexão um vetor de equidade.

No quinto capítulo, apresenta-se um panorama normativo sobre o tema, com a

(18)

se é viável a referida proposta para dar segurança jurídica aos contribuintes, bem como trazer

(19)

3 JUSTIFICATIVA HISTÓRICA – EQUIDADE, JUSTIÇA, PAGAMENTO INDEVIDO E O DIREITO À RESTITUIÇÃO

   

3.1 Pagamento indevido e o direito à restituição como regra de justiça

A ideia de justiça é o ponto de partida para se construir uma sociedade organizada,

buscando harmonizar todos os atos posteriores por esse princípio. A justiça é a virtude

primeira nas instituições sociais, sendo que as leis e instituições, por mais eficientes que

sejam, devem ser reformuladas ou abolidas se forem injustas (RAWLS, 2008, p. 2).

Muito embora a dinâmica da sociedade exija ajustes para fazer frente às novas

demandas sociais, algumas normas ou decisões necessitam ser cotejadas sob o prisma da

justiça, buscando sempre manter sua compatibilidade. Ou seja, é importante indagar se se está

diante de uma lei justa, uma decisão judicial justa, principalmente para se verificar se o

objetivo de atingir o justo foi cumprido.

Para Rawls (2008, p. 8), essa estrutura básica de sociedade, sob o fundamento da

justiça, importa em uma cooperação social:

Diz-se que muitos tipos de coisas são justos e injustos: não só leis, instituições e sistemas sociais, mas diversos tipos de atividades, entre elas decisões, julgamentos e atribuições de culpa. Também rotulamos de justas ou injustas as opiniões e as disposições de pessoas, bem como as próprias pessoas. Nosso tema, porém, é o da justiça social. Para nós, o objeto principal da justiça é a estrutura básica da sociedade, ou, mais precisamente, o modo como as principais instituições sociais distribuem os direitos e deveres fundamentais e determinam a divisão das vantagens decorrentes da cooperação social.

Na busca de uma regra justa, ou uma decisão justa, ao isolar da condição de

interessado, veste-se o véu da ignorância, o princípio de justiça que guiará a edição de novas

normas jurídicas, ou ainda decisões judiciais, é a equidade (RAWLS, 2008, p. 15).

A igualdade é um princípio de justiça, sendo que as normas jurídicas devem obedecer

ao justo em sua concepção, buscando tratar igualmente aqueles que se sujeitarão à sua

(20)

Como regra de equidade, tem-se que a vedação ao enriquecimento sem causa é um

princípio a ser observado como regra geral, princípio de equidade entre aqueles que sofrem

algum tipo de redução patrimonial sem justo motivo.

Com efeito, garantir ao contribuinte o tratamento isonômico não só na imposição de

uma obrigação tributária, mas nos casos de pagamento indevido, visando a seu pronto

ressarcimento, é assegurar a este uma regra justa e previsível.

Não se atinge a finalidade da justiça estar diante de uma norma inaplicável por sua

complexidade, ou uma norma aplicada de maneira injusta, ou seja, tão importante quanto ser a

norma compatível é ser de simples aplicabilidade.

Posto isto, resta indagar se a restituição do tributo indevidamente pago antes da edição

do CTN e após a instituição da regra geral de direito tributário são regras justas e decisões

judiciais fundadas no princípio de justiça e igualdade.

 

 

3.2 Ressarcimento do pagamento indevido no Direito positivo brasileiro e nas jurisprudências administrativa e judicial antes da edição do CTN

 

Restituir-se aquilo que recebeu indevidamente é fundamental na noção de justiça,

principalmente quando, além de um comando moral, existe norma jurídica determinando

expressamente a repetitio indebiti.

O Código Civil de 1916 trouxe a previsão do ressarcimento nos casos de pagamento

indevido, impondo àquele que recebeu o que não lhe era devido a obrigação de restituir, em

seu artigo 964: “Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir”.

Mais que um artigo isolado no Código Civil, a regra era um princípio geral que se

aplicava não somente às relações de direito privado, diante da ausência de norma especial

tratando do tema nas outras áreas do direito, como o tributário.

Conforme Alvim (1957, p. 3), o combate ao enriquecimento sem causa é princípio

geral de direito: “Por outro lado, é inquestionável que a condenação do enriquecimento

injustificado é princípio geral de direito, porque, com maior ou menor extensão, ela tem sido

(21)

Como princípio geral de Direito, a regra de restituir-se o que se indevidamente

recebeu não deveria sofrer nenhum tipo de limitação, caminhando bem no artigo 964 do

Código Civil brasileiro nesse sentido.

Orlando Gomes (1972, p. 289) traça os requisitos para se deparar com o pagamento

indevido e a obrigação de restituir:

Há enriquecimento ilícito quando alguém, a expensas de outrem, obtém vantagem patrimonial sem causa, isto é, sem que a tal vantagem se funde em dispositivo de lei ou em negócio jurídico anterior. São necessários seguintes elementos: a. o enriquecimento de alguém; b. o empobrecimento de outrem; c. o nexo de causalidade entre o enriquecimento e o empobrecimento; d. a falta de causa justa.

Parece não haver dúvidas de que não cabem condições para se exercer o pedido de

restituição em casos de pagamento indevido. Se houve enriquecimento sem causa de um lado,

empobrecimento de outro lado sem justo motivo, é imperativa a restituição do indébito.

Chama atenção não haver nenhuma outra condição no direito privado para o exercício

da restituição. Se houve pagamento sem causa, que seja restituído a quem pagou. Ou seja,

aquele que recebeu o que não deveria possui o dever de restituir, moral ou juridicamente.

Mesmo com a previsão legal no Código Civil, a peculiaridade da relação

jurídico-tributária suscitou um grande debate sobre a titularidade do pedido de ressarcimento do

pagamento indevido nos casos de tributos sobre consumo perante autoridades administrativas

e judiciais.

A grande controvérsia instaurou-se para identificar se o contribuinte do tributo sobre o

consumo teria legitimidade para pleitear a restituição em caso de pagamento indevido.

O principal argumento em desfavor dessa legitimidade era que o contribuinte repassou

o custo do tributo no produto comercializado, tendo sido suportado pelo consumidor, não

sendo justo, portanto, repetir o pagamento àquele que não sofreu a diminuição patrimonial.

A repercussão econômica do tributo incidente sobre o consumo foi o racional adotado

na época pelos julgadores administrativos e judiciais em relação aos pedidos de restituição

pelo pagamento indevido, mesmo existindo fundamento legal para que os valores pagos

fossem ressarcidos no Código Civil de 1916 em seu artigo 964.

O mais inusitado é que o argumento de que houve a transferência do encargo a

terceiros no tributo sobre o consumo foi lançado desprovido de qualquer prova nesse sentido,

simplesmente sustentado pelo fisco.

Na esfera administrativa, o parecer proferido pelo Procurador Geral da Fazenda

(22)

denegar os pedidos de restituição dos tributos indiretos com fundamento na repercussão

econômica.

Gomes de Sousa (1950, p. 26) narra que a decisão proferida no processo

administrativo nº 121.019/1946 reafirmava a posição do Governo Federal em relação aos

pedidos de restituição dos tributos indiretos:

A doutrina do Tesouro é a constante do processo 18.771/44, que assim resolveu: ‘Com relação à restituição do imposto sobre consumo, na ausência de dispositivo legal que a permita, prevalece a doutrina deste Ministério, em reiteradas decisões do Sr. Ministro, no sentido de que o valor do imposto, quando a mercadoria já tenha entrado em consumo, foi incorporado ao seu preço, gravando o consumidor, não sendo, assim, devida a restituição a quem não arcou com o ônus do tributo’.

Ainda no referido processo, em complemento à decisão acima transcrita, a Diretoria

Geral da Fazenda Nacional deixou claro que: “Ainda mesmo que no caso, como se alega,

tenha o imposto de consumo incidido sobre mercadoria empregada como matéria prima, é

evidente a incorporação do montante do imposto ao preço da mercadoria dada, afinal, a

consumo” (1946, p. 620).

Em outro importante julgamento administrativo citado por Gomes de Sousa (1950, p.

27), ratificou-se o entendimento anterior:

A conclusão, portanto, é que o contribuinte de fato e de direito é, em última análise, o consumidor, de quem é cobrado o imposto e que, por efeito da translação operada

ex-leges paga afinal o imposto. O consumidor, portanto, é o sujeito passivo da obrigação tributária e, reciprocamente, o titular do direito de reaver o que o Fisco cobrou indevidamente.

Também em uma decisão do Conselho de Contribuintes (1946, p. 621) decidiu-se no

sentido de negar a restituição do tributo indireto, sob o pretexto de que os contribuintes são

“simples intermediários entre o Poder Público e a massa dos consumidores, nada mais fazem

do que adiantar aos cofres públicos os tributos correspondentes, para reavê-los em seguida

com o preço da coisa vendida”.

A jurisprudência administrativa era firme no sentido de se negar o pedido de

restituição do tributo indireto pago indevidamente, fundamentando-se na racionalidade

econômica, uma vez que o contribuinte transferiu o custo tributário no preço da mercadoria,

que foi suportada pelo consumidor, não havendo espaço para o ressarcimento pretendido.

O que se parece é que a recusa dos órgãos fazendários buscava evitar o desembolso da

(23)

pedido de restituição ao Poder Judiciário serviria como meio de ganhar tempo para devolver

aquilo que irregularmente recebeu.

Tal entendimento sedimentou-se no âmbito administrativo como um dogma, não

sendo dado ao contribuinte sequer provar que a transferência do tributo não ocorreu. Fica

claro que a negativa da restituição de forma peremptória remeteu ao Poder Judiciário o

deslinde da questão.

De certa forma, as decisões administrativas influenciaram as decisões judiciais,

principalmente por limitar a discussão sobre a restituição do tributo indireto sob a ótica da

repercussão econômica para atribuir legitimidade aos que buscavam a restituição.

Julgamentos proferidos pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, no sentido de se negar a

restituição com fundamento na repercussão econômica e outros afastando a racionalidade

econômica para se admitir a restituição, iniciaram-se na década de 19402, com fundamentos a

favor e contra a restituição dos tributos.

No sentido de se rejeitar o argumento econômico para fechar a porta da repetição ao

contribuinte, destaca-se o voto do desembargador Antão de Morais (1939, p. 77), em

julgamento proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, cujo pano de fundo era a

discussão sobre o imposto estadual sobre capital particular empregado em empréstimos, em

que se pretendia a restituição ao credor, mesmo existindo nos autos contrato de mútuo com

cláusula expressa de transferir o ônus a terceiro:

O fato do mutuante transferir para o mutuário o ônus dos impostos que recaiam sobre o mútuo não tira ao primeiro a qualidade de demandar a restituição quando o imposto pago seja indevido. Primeiro, porque a obrigação legal de pagar o imposto é do credor e não do devedor; este é terceiro na relação entre fisco e o credor. Segundo, porque a transferência do ônus do imposto representa uma vantagem a mais que o credor, além dos juros, exige do devedor. Ora, se a obrigação perante o fisco é do credor e não do devedor; e se o correspondente pagamento que este faz aquele representa uma obrigação que livremente se consentiu, não se vê porque o fisco, estranho a esses laços contratuais, possa arguir que o credor é parte ilegítima para obter a restituição do imposto que pagou. Não é sem propósito abrir neste ponto um parêntese para indicar desde logo que seria improcedente a objeção que dissesse que a segunda parte do raciocínio que estamos reproduzindo é aplicável somente às hipóteses em que a translação do imposto decorra de convenção particular entre o contribuinte legal e um terceiro, mas não às hipóteses em que decorra de disposição expressa de lei, como é o caso do imposto de consumo. É princípio incontroverso, em direito tributário, o de que o fisco é terceiro em relação às convenções particulares sujeitas à tributação; uma das consequências desse princípio é a de que o fisco exige o tributo da pessoa designada pela lei como obrigada ao seu pagamento, ignorando as convenções particulares porventura tendentes a deslocar a incidência daquela pessoa para outra, operando tais convenções exclusivamente entre as partes. O princípio pode ser portanto sintetizado dizendo-se que o fisco só toma conhecimento do contribuinte legal, isto é, da pessoa expressamente designada

      

2

(24)

pela lei como obrigada ao pagamento do tributo. Ora, se assim é em matéria de cobrança do tributo, tudo indica que assim também deva ser em matéria de restituição, por outras palavras, se o fisco não admite que a translação lhe seja oposta como defesa por ocasião da cobrança, tão pouco lhe caberá opô-la, ele próprio, como defesa quando pedida a restituição. E pouco importa a esta conclusão que a translação invocada, num ou noutro caso, tenha decorrido de convenção particular ou de dispositivo expresso de lei; o fundamento da conclusão é tão somente o fato de que o fisco só conhece o contribuinte legal, e esse fato permanece constante em ambas as hipóteses.

Da citação se extrai que os fundamentos adotados pelo desembargador Antão de

Morais, conclui-se de imediato a principal colaboração histórica daquele julgamento, que

concluiu que o fato de o contribuinte transferir o ônus do tributo a terceiros não importa ao

direito tributário, que é estranho às convenções particulares, seja para cobrar os tributos, seja

para restituir os tributos indevidamente pagos.

Avançou mais ainda ao concluir pela vinculação do fisco ao contribuinte legal, não

havendo que se falar em relação daquele com o contribuinte econômico ou terceiro que

convencionou com o sujeito passivo da obrigação tributária.

Concorda-se que, diante da inexistência de norma específica, admitindo-se a

repercussão econômica como condição para o exercício do pedido de restituição, seria um

verdadeiro absurdo criar uma condição sem previsão legal a limitar o princípio geral da

restituição do pagamento indevido.

Gomes de Sousa (1950, p. 32) comenta que o assunto chegou ao Supremo Tribunal

Federal ainda na década de quarenta, em dois julgamentos relatados pelo ministro Otávio

Kelly, que afastaram de uma vez o argumento fazendário da repercussão econômica:

Embora se denomine de consumo o tributo, é desde logo pago pelo fabricante e, sem o respectivo pagamento, a mercadoria não poderá sair do seu estabelecimento, devendo as fórmulas acompanhá-la, ao negociante revendedor. É um ônus da fabricação, que, como todas as despesas desta, até o centro de consumo, terá de ser computado no preço do produto, mas nem por isso pode ser considerado, ainda quando esta já esteja em mãos do consumidor, crédito a ser por este reclamado, provado que tenha sido indevidamente exigido, ou cobrado pelo fisco. Somente poderia repeti-lo quem pagou, e este, na espécie, foi a fabricante, autora na causa.

Com efeito, a racionalidade econômica parece ter ficado em segundo plano na medida

em que os julgamentos da época limitavam-se à relação entre credor e devedor, no caso entre

fisco e contribuinte.

Não poderiam ser diferentes as decisões proferidas pelo STF, uma vez que o raciocínio

(25)

ingrediente de insegurança jurídica, as decisões proferidas a partir daí tomaram um sentido

totalmente contrário dos precedentes acima citados.

O forte argumento jurídico de que a repercussão não interessava ao direito tributário

foi aos poucos cedendo espaço à transferência do tributo a terceiros como elemento a ser

cotejado nos julgamentos posteriores.

Em 26 de abril de 1949, o Tribunal Federal de Recursos julgou pedido de restituição

de tributo indireto, em que a adoção da racionalidade econômica na identificação do

contribuinte legitimado a requerer o ressarcimento deu início a um novo entendimento.

A tese da fazenda começou a ter repercussão no Poder Judiciário a partir desse

julgamento, em que, pela primeira vez, o Tribunal Federal de Recursos – TFR, recém-criado

pela Constituição Federal de 1946, assim decidiu:

IMPOSTOS INDIRETOS – RESTITUIÇÃO – Os impostos indiretos não se restituem a quem os pagou, porque este já se terá embolsado do respectivo montante através da repercussão do tributo.

A repercussão do tributo é o fundamento da nova jurisprudência que surgia no TFR. O

fundamento econômico da repercussão serviu de esteio para a negativa do pedido de

restituição pelo Poder Judiciário.

Mesmo não existindo nenhuma norma no sentido de se limitar o exercício da

restituição à prova da não repercussão, o Tribunal Federal de Recursos adotou o entendimento

fazendário de se presumir que o custo tributário foi suportado pelo consumidor, inovando na

Jurisprudência até então pacífica e iniciando um longo processo de adoção da racionalidade

econômica como meio de se atribuir legitimidade aos pedidos de restituição.

Acredita-se que a influência dos argumentos fazendários foi decisiva para o resultado

do julgamento, até então desprovido de fundamento legal.

Gomes de Sousa (1950, p. 40), ao comentar o julgamento do TFR, assim concluiu:

(26)

deslocamento daquela legitimidade, da pessoa definida como contribuinte legal para a pessoa indiscriminada do consumidor.

Comunga-se das críticas de Gomes de Sousa ao apontar a incerteza e inadequação da

adoção do racional econômico nesse julgamento, principalmente por entender que o Judiciário

não estava adotando um raciocínio jurídico ao decidir a questão.

Já em 10 de janeiro de 1961, a questão foi decidida pelo STF, julgando o Recurso

Extraordinário – RE nº 46.450. O STF seguiu o TRF e veio a adotar a racionalidade

econômica, negando ao recorrente o direito de ser restituído, cotejando elementos de justiça e

equidade em suas razões:

Trata-se, como bem explicou o Senhor Ministro relator, de repetição de imposto indireto, reclamada por contribuinte comerciante, que já incorporou o seu valor ao preço da mercadoria vendida a terceiros. É o problema que se conhece, em ciência das finanças, como repercussão, translação ou transferência do imposto. Em tais casos, o verdadeiro contribuinte é o consumidor, que suporta efetivamente o encargo [...]. Seria menos justo proporcionar-lhe um sobrelucro sem causa, para seu proveito pessoal, do que deixar esse valor em poder do Estado, que presumivelmente já o terá aplicado na manutenção dos serviços públicos e na satisfação dos encargos diversos que oneram o Tesouro em benefício da coletividade. Se o dilema é sancionar um enriquecimento sem causa, quer em favor do Estado, com a carência ou improcedência da ação, quer em favor do contribuinte, se for julgado procedente o pedido, não há que se hesitar; impõe-se a primeira alternativa, pois o Estado representa, por definição, o interesse coletivo, a cuja promoção se destina, no conjunto da receita pública, a importância reclamada pelo particular, para sua fruição pessoal. Esta solução é que corresponde à equidade, fundamento básico da ação proposta.

Veja que aquele Tribunal faz uma verdadeira “escolha de Sofia”3 para dizer quem

deve ficar com o produto do pagamento indevido – aquele que recebeu indevidamente, mas

representa o “interesse coletivo”, ou o contribuinte, apontando que essa escolha foi fruto da

equidade.

Não foi razoável nem fundamentada a decisão. O STF afastou uma norma jurídica que

disciplinava a questão, bem como um princípio geral do Direito para buscar em um

argumento divorciado de qualquer racionalidade invocado pela fazenda como meio de se

esquivar da restituição do tributo.

O argumento de que se deve negar o pedido de restituição para não causar um

sobrelucro sem causa e garantir que esse valor permaneça nas mãos do Estado para aplicar-lhe

em serviços públicos é uma construção do voto do Ministro do STF, sendo a escolha que

melhor lhe pareceu ao caso.

      

3 Trata do dilema de “Sofia”, uma mãe polonesa, filha de pai antissemita, presa em um campo de

(27)

O argumento da repercussão econômica é um argumento de autoridade, uma

verdadeira zona de autarquia4, conforme Rodrigues (2013, p. 69), decidindo pela qualidade

das partes e desprovido de qualquer racionalidade jurídica, ao afirmar que, entre o

contribuinte e o Estado, melhor que fique nas mãos do Estado o valor a ser ressarcido, mesmo

reconhecendo-se que o pagamento foi indevido.

O argumento fazendário ecoou pelo Poder Judiciário desde então. O precedente acima

foi seguido por diversos outros julgados nesse período, sem que houvesse uma norma a

respeito da restituição condicionada à não transferência do encargo a outrem.

Brindando da mesma taça os REs nº 46.450, nº 44.115 e nº 45.678, em que o STF

decidiu editar súmula com o conteúdo dos julgados, consolidando o entendimento esposado

no julgamento dos recursos, com o seguinte teor: “Embora pago indevidamente, não cabe

restituição do tributo indireto”.

Tal decisão consolidada veio para reconhecer a impossibilidade de se restituir o tributo

indevidamente pago, presumindo-se que o respectivo ônus tributário fora repassado ao

consumidor no preço do produto, fechando-se a porta para os pedidos de restituição.

Totalmente desproporcional a jurisprudência consolidada pelo STF. Reconheceu-se a

racionalidade econômica como caminho seguro para se negar o pedido de restituição como

uma presunção hominis de que o custo do tributo foi repercutido, bem como seria injusto

repetir àquele que pagou o tributo ao fisco.

Com isso, no período que antecede a reforma tributária e a edição do CTN, a

jurisprudência sobre a restituição dos tributos indiretos já consagrava a racionalidade

econômica como fundamento para negar aos contribuintes o pedido de restituição dos tributos

indevidamente pagos.

Ulhôa Canto (1961, p. 372) faz um resumo do avanço da teoria econômica na

jurisprudência administrativa para influenciar as decisões judiciais:

Recentemente, porém, a pertinaz recusa dos órgãos administrativos de deferirem pedidos de restituição de impostos indiretos, já reiterada, sistematicamente em um sem número de processos, encontrou ressonância em decisões judiciais, que têm acolhido a tese de que tais impostos, sendo transferidos pelo contribuinte de direito (solvens) ao contribuinte de fato, pelo processo da translação, só este teria qualidade para repetir, sob pena de, em se reconhecendo legitimidade àquele, permitir-se enriquecimento sem causa.

      

4 Rodrigues denomina como zona de autarquia “o espaço institucional em que as decisões não estão fundadas em

(28)

Diferentemente de qualquer restituição de pagamento decorrente de relação privada

em que o contribuinte pudesse se envolver (pagamento indevido de um contrato de

fornecimento de matéria-prima, pagamento indevido a título de energia elétrica, uma relação

locatícia, bancária, entre outras), a jurisprudência da época quis atribuir ao tributo incidente

sobre a atividade do comércio a repercussão econômica para se negar o pedido de restituição,

mesmo ausente uma norma específica sobre a situação em julgamento.

É de intuitiva percepção que as decisões administrativas e judiciais proferidas na

época encontravam-se no âmbito da escolha do mal menor, não se aprofundando no debate do

tema, muito menos no afastamento da norma geral do Código Civil do artigo 964. O que se

observava era um “samba de uma nota só” repetidamente afirmando que o valor do tributo

repercutiu no custo do produto, não detendo legitimidade aquele que pagou ao fisco de buscar

a devolução do custo tributário.

3.3 Conclusão parcial  

O período que antecedeu a reforma tributária e a edição do CTN foi marcado pelo

surgimento da jurisprudência sobre a restituição de tributos pelos Tribunais Superiores,

fortemente influenciada pelas decisões administrativas e argumentos fazendários que já

elencavam a transferência do tributo a terceiros como obstáculo para o pedido de restituição.

No início da década de 1940, a racionalidade econômica perdeu força, sendo o

argumento fazendário rechaçado em diversos julgamentos inclusive do STF, cujo argumento

principal foi de que o direito tributário não admite relação com terceiros e quem pagou o

tributo é a parte legítima para demandar sua restituição, caso o pagamento seja indevido.

A partir da metade da década de 1940, a racionalidade econômica conseguiu se

consolidar como principal elemento da justificação judicial nas referidas decisões, escolhendo

o modelo econômico para negar ao contribuinte a repetição do pagamento indevido, tendo seu

ápice na edição da Súmula 71 do STF em 1961.

Partiu-se também de argumentos de autoridade na justificação judicial das decisões

adotadas pelos Tribunais Superiores, decidindo ser mais justo o produto do tributo pago

(29)

escolha às cegas entre quem deveria ficar com o produto do tributo indevidamente pago.

Trata-se, pois, de verdadeira zona de autarquia, conforme Rodrigues (2013, p. 69).

A existência de duas relações jurídicas, a primeira entre solvens (contribuinte) e

accipiens (fisco) e a segunda relação jurídica da repercussão entre contribuinte de direito e

contribuinte de fato e, consequentemente, a confusão entre as duas relações nas decisões

administrativas e judiciais, marcaram o período narrado acima.

O principal desafio desde então era, com base nesse mosaico de decisões e

argumentos, surgir uma norma jurídica capaz de solucionar o impasse até então existente, que

pudesse dar um alicerce seguro ao intérprete nas decisões judiciais e administrativas dos

(30)

4 A REFORMA TRIBUTÁRIA E A EDIÇÃO DO ARTIGO 166 DO CTN

4.1 A Comissão Especial do Código Tributário Nacional

O Brasil do início da década de 1950 vivia um momento político e econômico que

necessitava da edição de uma norma geral em matéria tributária, dilema típico de países

federativos, em que se exigia a edição de uma norma que disciplinasse o funcionamento

orgânico do sistema tributário nacional.

Visando a equacionar a distribuição das fontes de receita tributária e a indesejável

sobreposição de incidências tributária sobre a mesma base, tudo isso sem afetar a autonomia

dos entes federados, o momento era propício para a discussão de uma reforma tributária

nacional, com vistas à criação de um Código Tributário Nacional, que era uma necessidade

para o Brasil que se esperava nas décadas seguintes.

É certo que a necessidade de uma norma geral ficou mais forte e evidente após a

instituição da alínea “b” do inciso XV do art. 5° da Constituição de 1946, que atribuiu à

União competência para legislar sobre normas gerais de direito financeiro.

Com esse espírito, o então Ministro da Fazenda, Osvaldo Euclides de Souza Aranha,

instituiu, em agosto de 1953, comissão especial por ele presidida e composta por Rubens

Gomes de Sousa e pelos técnicos do Ministério da Fazenda Afonso Almiro Ribeiro da Costa,

Pedro Teixeira Soares Júnior, Gerson Augusto da Silva e Romeu Gibson, tomando-se por

base o anteprojeto elaborado pelo primeiro, para, conjuntamente, receber sugestões oriundas

de toda a sociedade, seja da administração pública ou não, visando a elaborar um projeto de

Código Tributário Nacional a ser encaminhado ao Poder Legislativo.

O anteprojeto inicial de Rubens Gomes de Sousa foi publicado no diário oficial da

União e amplamente divulgado em todo o território nacional, sucedendo-se 70 reuniões para

discutir um a um cada artigo do anteprojeto em um período de oito meses de trabalho.

Foram apresentadas 1152 sugestões ao anteprojeto, que foram discutidas e votadas

pela comissão especial, chegando-se ao texto definitivo do projeto do Código Tributário

Nacional em maio de 1954.

A pluralidade de atores que fomentaram o projeto acabou por propiciar um intenso

debate em torno de seu texto, com a liberdade de se criar uma norma geral nova, que guiaria

(31)

Desde a realização dos trabalhos pela Comissão Especial do CTN em 1954 até sua

votação pelas duas casas legislativas e sanção presidencial em outubro de 1966, houve um

importante capítulo da história brasileira com a Edição da Emenda Constitucional nº 18, de 1°

de dezembro de 1965, que foi a reforma tributária na Constituição Federal.

4.2 A Reforma Tributária Nacional e a Emenda Constitucional nº 18 de 1° de dezembro de 1965

Em 1963, a Fundação Getúlio Vargas – FGV foi responsável pela tarefa de elaborar

uma proposta de reforma tributária por meio da delegação da Portaria Ministerial GB-30, de

27 de janeiro de 1965, expedida pelos Ministros da Fazenda e do Planejamento do Governo

Federal.

Os trabalhos da comissão iniciaram após o referido ato administrativo, tendo o

presidente da FGV, Luiz Simões Lopes, designado uma comissão de especialistas para essa

missão, sendo composta por Rubens Gomes de Sousa como relator; Gerson Augusto da Silva

como secretário-executivo; Sebastião Santana e Silva, Gilberto Ulhôa Canto e Mário

Henrique Simonsen.

Conforme relata o Senador da República Francisco Dornelles5 (2014, p. 2), os

trabalhos da comissão possuíam como escopo:

Os objetivos daquela reforma eram grandiosos: criar um sistema tributário realmente integrado, harmônico e de caráter nacional, compatibilizando, ainda, a competência tributária com as responsabilidades da União relativamente à política econômica social; reduzir o número dos impostos e fundar os repetitivos fatos geradores em realidades econômicas para tentar evitar distorções e fatores de ineficiência; estruturar mecanismos adequados à utilização dos impostos para finalidades extrafiscais, vale dizer, como instrumentos de política econômica e social; racionalizar a arrecadação dos tributos, centralizando a legislação e a administração quanto a impostos, na esfera federal, mas estabelecendo mecanismos automáticos de distribuição do produto para as outras duas esferas; e remodelar determinados

      

5 Conforme o Senador da República Francisco Dorneles: “Esta reforma se baseou em três premissas: em

(32)

impostos, principalmente o de renda e o incidente sobre a produção industrial, de modo a permitir um aumento da progressividade global do sistema tributário, viabilizando uma mais justa divisão da carga tributária da sociedade.

Após um exaustivo trabalho, a comissão concluiu seu objetivo, apresentando ao

Ministro da Fazenda Octávio Gouveia de Bulhões a proposta de Emenda Constitucional a ser

enviada ao Poder Legislativo, o que foi feito em 18 de junho de 1965.

Discutida e aprovada nas duas casas legislativas, a Emenda Constitucional nº 18 foi

publicada em 1° de dezembro de 1965, sendo um importante marco na instituição do sistema

tributário nacional.

Também fruto do trabalho da comissão de reforma tributária, incumbiu a Gilberto

Ulhôa Canto a elaboração do projeto de Lei Orgânica do Processo Tributário, cujo relatório

foi entregue ao Ministério da Fazenda em 1964, nunca tendo sido submetido ao Congresso

Nacional pelo Poder Executivo.

A Emenda Constitucional nº 18/65 era a base do Sistema Tributário Nacional, ou seja,

era a raiz constitucional que serviria de base para a edição da nova norma geral tributária, já

pronta para votação e discussão, que era o Código Tributário Nacional.

Após 12 anos, em 15 de setembro de 1966, foi publicado no Diário Oficial da União o

Código Tributário Nacional, cuja exposição de motivos justificava sua necessidade:

A instituição de normas gerais é reclamada de longa data pelos juristas, pelos estudiosos de finanças e pelos técnicos de administração. O que se reclama é um sistema de normas gerais aplicáveis a todos os tributos, ou seja um texto básico disciplinador do exercício do poder de tributar. Esta disciplina é especialmente necessária no Brasil, país de organização federativa onde é frequente a adoção de critérios diferentes em situações econômica e juridicamente idênticas.

A reforma tributária foi um grande passo ao fortalecimento da República Federativa

do Brasil, sendo inegável a contribuição da comissão especial e daqueles que de alguma

forma buscaram lapidar o anteprojeto original até sua concepção final.

Da mesma forma, o anteprojeto da Lei Orgânica do Processo Tributário, apesar de

nunca ter deixado de ser um rascunho de um projeto de lei, foi um trabalho técnico que muito

influenciou a redação final do CTN e outras normas processuais tributárias que vieram após a

sua conclusão.

Como norma geral de direito tributário, o CTN veio a disciplinar as relações

(33)

Estado-fisco, para que se tenha uma imposição tributária que atenda aos princípios gerais de

Direito Tributário6.

O que interessa mais de perto no presente trabalho é o artigo 166 do CTN, que cuida

da restituição dos tributos, em especial os motivos que levaram à comissão especial a chegar a

sua redação definitiva.

De outra sorte, também preocupa mais de perto o tratamento disposto no anteprojeto

da Lei Orgânica do Processo Tributário, que tratou a restituição de tributos indiretos de forma

distinta da concepção final do CTN.

4.3 A proposta da para a restituição dos tributos indevidamente pagos no anteprojeto de Rubens Gomes de Sousa

O anteprojeto apresentado por Rubens Gomes de Sousa era de grande densidade

temática, incluindo seis capítulos que tratavam sobre a competência tributária, dos tributos em

espécie, da legislação tributária, da obrigação tributária, do crédito tributário e da

administração tributária.

No referido trabalho inicial de Gomes de Sousa (BRASIL, 1954, p. 316), o pagamento

indevido e o direito à restituição foram tratados no artigo 201, não distinguindo a natureza dos

tributos e mantendo a relação entre o Estado/devedor e o contribuinte/credor, este o titular do

pagamento indevido, conforme a redação a seguir.

Artigo 201 – Observado o disposto no artigo 209, o contribuinte terá direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo pago, seja qual for a sua natureza ou a modalidade do seu pagamento, nos seguintes casos: I – Inconstitucionalidade da legislação tributária ou do ato administrativo em que se tenha fundado a cobrança, declarada por decisão judicial definitiva e passada em julgado, ainda que posterior ao pagamento;

II – Cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que devido em face da legislação tributária aplicável e da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido.

III – Erro na autoridade administrativa na identificação do contribuinte, no cálculo da alíquota ou da verba, ou na extração ou conferência da guia de pagamento. IV – Cobrança de crédito tributário prescrito;

      

6 Lei nº 5.172/66 – Código Tributário Nacional, em seu artigo primeiro: “Art. 1o Esta Lei regula, com

(34)

V – Reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão administrativa ou judicial condenatória;

VI – Na hipótese prevista nos arts. 136 e 137 parágrafo único, observado o disposto no art. 209.

Parágrafo único – A restituição total ou parcial do tributo dará lugar à restituição, na mesma proporção, dos juros de mora e das penalidades pecuniárias, salvo as referentes a infrações de caráter formal.

Veja que a previsão legal de restituição dos tributos indevidamente pagos é direito do

contribuinte seja qual for a sua natureza ou modalidade. Aqui, o autor do anteprojeto fez

questão de simplificar a relação entre credor e devedor do pagamento indevido nas figuras do

contribuinte e do Estado.

Não cuidou o autor do anteprojeto da chamada “relação jurídica da repercussão”,

desprezando o “contribuinte econômico”, mantendo-se nos limites basilares da relação

jurídico-tributária.

Agiu com acerto o autor da proposta ao limitar o pedido aos limites da relação

tributária, principalmente por ser um caminho seguro a atingir a finalidade da equidade na

restituição do tributo.

Buscou também consagrar o que já sustentava quando comentou o primeiro

julgamento do pedido da restituição dos tributos indiretos pelo TFR, conforme artigo acima

mencionado.

Rememorando o anteprojeto do CTN, o texto proposto por Rubens foi o início para

uma série de considerações e críticas nas diversas reuniões realizadas com vistas a

democratizar o processo de construção do CTN.

4.4 O resultado dos trabalhos da Comissão Especial do Código Tributário Nacional para restituição dos tributos indevidamente pagos

A proposta inicial foi alterada diante da interface com diversos atores quando da

aprovação de um texto que servisse de proposta para a criação de um CTN, a ser enviado ao

Congresso pela União Federal.

Como o ato de lapidar um diamante, o anteprojeto de Rubens foi recebendo ajustes e

decotes visando a atender os diversos pontos de vista dos membros da referida comissão

(35)

Com o interesse de resguardar o direito do contribuinte ao ressarcimento do

pagamento indevido, bem como da correta identificação do accipiens na relação do indébito

tributário, o artigo elaborado por Rubens Gomes de Sousa foi alterado pela Comissão

Especial do Código Tributário Nacional, incluindo em seu texto no artigo 131, cuja redação

final foi a seguinte (BRASIL, 1954, p. 58):

Art. 131 – Existindo disposição legal expressa que determine ou faculte ao contribuinte a transferência do tributo a terceiro, o direito referido no artigo anterior fica subordinado à prova de que a transferência não ocorreu efetivamente, por impossibilidade material ou jurídica, em face das circunstâncias do caso.

Parágrafo único – O terceiro que faça prova de lhe haver sido transferido o tributo pelo contribuinte nos termos deste artigo, sub-roga-se no direito daquele à respectiva restituição.

O primeiro elemento que merece destaque no citado artigo é a transferência do tributo

a terceiro existindo disposição legal expressa que determine ou faculte, ou seja, a

transferência deveria obedecer ou ser autorizada pela Lei.

Veja que a jurisprudência chegou a travar essa discussão, indagando se a natureza da

repercussão econômica era determinada por lei ou convencionada pelas partes, sendo este um

dos argumentos desafiados pelo Desembargador Antão de Morais na decisão anteriormente

citada.

Na realidade, o fenômeno da repercussão econômica dependeria de uma autorização

ou imposição legal, sendo este um ponto de partida para transformar o fato econômico em

fato jurídico.

Segundo elemento que merece destaque é a prova negativa da repercussão como meio

de legitimar o contribuinte, esclarecendo o artigo se a repercussão não ocorreu por

impossibilidade material ou jurídica, em face das circunstâncias do caso.

Sem embargo da imprecisão da expressão “impossibilidade material ou jurídica, em

face das circunstâncias do caso”, ao que parece que a solução apontada pela comissão foi de

resguardar o pagamento ao solvens desde que este prove que não transferiu a terceiros o ônus

do tributo.

Mesmo que se admita que tal prova seja simples de se fazer em juízo, aqui está a

primeira proposta de incursão no direito positivo da relação jurídica da repercussão, da

translação econômica dos tributos.

Por fim, em seu parágrafo único, o mencionado artigo instituiu a sub-rogação do

direito ao ressarcimento ao contribuinte de fato, desde que este faça a prova que o

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