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DESENVOLVIMENTO DO ENSINO, NA ÁREA DE SAODE
DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO
(1919-1966)
Heloisa Moreira Lima Leite
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DESENVOLVIMENTO DO ENSINO, NA AREA TIE SAODE
-DA UNIVERSI-DADE FEDERAL DO MARANHÃO
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(1919-196"6 )
Heloisa Moreira Lima Leite
Tese submetida como requisito parcial pa
ra obtenção do grau de Mestre em
Educa
-çao.
RIO DE JANEIRO
FUNDAÇÃO GETOLIO VARGAS
INSTITUTO DE ESTUDOS AVANÇADOS EM EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
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I
DESENVOLVIMENTO DO ENSINO NA ÂREA DE SACDE DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO MARANHÃO (1919-1966)
1. CONSIDERAÇÕES TEORICAS PRELI}1.INARES
2. DIAL~TICA UNIVERSITÂRIA
2.1. INTRODUÇÃO
2.2. EVOLUÇÃO POLITICA, SOCIO-ECONCMICA
pg.01
pg.07
pg.09
2.3. UMA PERSPECTIVA HISTORICA DAS UNIVERSIDADES pg.15
2.4. UNIVERSIDADE BRASILEIRA: UMA INSTITUIÇÃO A SERVIÇO DO PODER pg.24
3. POLITICA EDUCACIONAL BRASILEIRA
3.1. INTRODUÇÃO
3.2. RETROSPECTIVA HISTORICA
3.3. REFORMA FRANCISCO CAMPOS (19~O)
3.4. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP) (1934)
3.5. UNIVERSIDADE DO DISTRITO FEDERAL
3.6. REFORMA CAPANEMA (1942)
3.7. UNIVERSIDADE DE BRASILIA (1961)
3.8. LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL (1961)
3.9. POLITICA EDUCACIONAL APOS 1961
3.9.1. Considerações introdutórias
3.9.2. Acordo MEC-USAID
3.9.3. Relatório Meira Matos
pg.34
pg.39
pg.45
pg.51
pg.53
pg.55
pg.56
pg.58
pg.61
pg.63
pg.66
3.9.4. Relatório do Grupo de trabalho da Reforma
Universi-tária pg.68
3.10. EXPANSÃO DO ENSINO x HEGEMONIA ~DICA pg.73
4. POLITICA NACIONAL DE SAúDE
4.1. INTRODUÇÃO pg.80
4.2. DADOS HISTORICOS DAS POLITICAS DE SAúDE, NO S~CULO XX pg.85
4.3. POLITICA DE SAúDE 1960-1964 pg.90
4.4. POLITICA DE SAúDE 1968-1974 pg.94
5. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO
J
pg.100 5.3. AS PRIMEIRAS TENTATIVAS DO ENSINO SUPERIOR N~MARANHÃO,
POR GRUPOS PARTICULARES
5.3.1. Escola de Enfermagem, partos e farmácia pg.105 5.3.2. Escola de Farm~cia e Odontologia do Maranhão pg.112 5.3.3. Academia de Medicina - uma tentativa frustrada pg.121
5.4. FACULDADES FEDERAIS DE FARMÂCIA E ODONTOLOGIA DE SÃO LuIs pg.124 5.5. A IMPORTÂNCIA DA ARQUIDIOCESE NO ENSINO SUPERIOR DO
MARA-NHÃO pg.127
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS pg.144
•
A meus pais, com
•
aqueles que, de algum modo,
con-tribuiram para que este trabalho
•
RESUMO
Este trabalho originou-se de uma preocupaçao maior de
contribuir, com algo realmente significativo, para a Universidade
Federal do Maranhão. Para tantô, estabelecemos parâmetros, que nos
fornecessem subsídios na elaboração do objeto proposto.
Inicialmente, procuramos definir uma postura teórica
me-todológica que melhor se adaptasse, na compreensão dos interesses
de uma classe hegemônica.
No segundo capítulo fizemos uma retrospectiva histórica
dos acontecimentos que marcaram o Ensino Superior no Brasil, com o
cuidado de deixar bem claro o predomínio de uma classe dominante,
interferindo na constituição da Universidade brasileira. Não
te-mos a pretensão de esgotar todas as variáveis que atingiram direta
ou ind1retamente o ensino, mas acreditamos fornecer alguns
elemen-tos que, no futuro, servirão de base para uma maior reflexão em
torno de problemas tão significativos.
No terceiro capítulo, procuramos analisar a Política Edu
cacional Brasileira, selecionando alguns tópicos por considerarmos
mais adaptados ao nosso estudo. Esta escolha foi bastante criterio
sa, pelo volume de publicação existente, aliada a um conteúdo subs
tancioso.
No quarto capítulo, haja vista o nosso objetivo, utiliza
mos, também, como parâmetro, a política Nacional de Saúde, direcio
nada como tem sido até hoje, a atender uma população que a fortale
ça como classe dominante, ao mesmo tempo, selecionando mecanismos
_falaciosos para a manutenção do seu mercado de trabalho.
No quinto capítulo, procuramos reconstruir o surgimento
dos Cursos da Área de Saúde, da Universidade do Maranhão, tomando
como pano de fundo as contradições de uma instituição que busca en
contrar sua identidade, mas é limitada, a nível Nacional, a uma Po
lítica de Educação e Saúde e, a nível regional, a disputa pela
he-gemonia, tendo em vista os interesses de grupos e não de uma socie
dade •
Na última parte, a título de conclusão, procuramos
res-ponder as questões por nós levantadas no primeiro capítulo, após a
análise de todo conteúdo desenvolvido.
•
pítulo, as condições do contexto sócio-político-econômico do País,
em cada período analisado, proporcionando-nos uma visão dialética
SYMNOPSIS
This work had origin in a greater preocuppation to
con-tribute with something really significative for the Federal
Uni-versity of Maranhão. For tha~ we senttled parameters that would
supply subsidies in the elaboration of the purposes.
Initially we look for a definition for a theoretical
me-thodological position that in a better manner could be adapted in
the comprehension in behalf of a hegemonic class.
In the second chapter we made a historical retrospective
of the events (facts) that distinguished the Superior education un
Brazil, having in attention the predominance of a predominant class,
interfering in the organization (constitution) of the Brazilian
University. It is not our purpose to exhaust all the variants that
concerned direct or indirect the education but we believe we can
provide some of the elements (principles) that in the future will
act as basis for a greatest reflection about such significative p~
blems.
In the third chapter, we procure analyse the Brazilian
educational politics, selecting some topics which we consider more
adapted to our study. This Choice (selection) was enough judicious,
due to the existing volume to publication adjoining to a substantial
contento
In the fourth chapter, considering our purpose, we utili
zed also as parameter the National Poli tic of heal th, directed as it has
been us to this time, to attend a population that strengther i t as
predominant class in the same time selecting fallacious mechanism
for the maintenance of its work-markt.
In the fifth chapter we look for to reconstruct the appea
ring of Courses in the area of health in the University of Maranhão,
having as background the contradictions of a institution that tries
to meet its identity but is restrained in national level, to a
po-litic of Educational and health and in regional level, to the
dis-pute for its hegemony, having in view the interests of groups and
not of a community (society).
In the last part, as a conclusion, we try to answer to
the questions elaborated by ourselves in the first chapter after
the analysis of all the developed contento
tions of the Social-politic-econornical contextin the nation, in
1. CONSIDERAÇÕES TEORICAS PRELIMINARES
O objetivo deste trabalho é descrever e analisar alguns as
pectos relevantes que contribuíram para o surgimento dos Cursos da
Ârea de Saúde da Universidade Féderal do Maranhão, procurando dest~
car a realidade dos fatos e suas implicações ou reflexos no Ensino.
Outrossim, dando ênfase ao processo político das últimas décadas no
.,. - 1
Pals, na formaçao de uma hegemonia voltada exclusivamente para seus
interesses de classe. Tal orientação não é original, nem em uma or~
- 2
-entaçao marxista , nem em uma nao-marxista, como a weberiana, ou a
pesquisa de Foucault sobre as origens do Poder/Saber institucional.
O que é interessante e que, na realidade, não deixa de se
transfor-mar em um trabalho original, e saber utilizar a orientação
histori-cista na busca da análise de uma realidade concreta.
O problema, tal como o vemos, pode ser sumarizado nas
se-guintes perguntas:
Sendo a Universidade uma instituição de origem recente
no Brasil, porém muito antiga em outros países, como evoluiu
atra-vés dos tempos? E no Maranhão, como surgiu, e quais os cursos que
já,existiam e que foram incorporados a esta instituição?
. Como explicar o surgimento dos Cursos da Área de Saúde,
da UFMA, uma vez que grupos distintos3 se empenharam para a sua con
solidação?
Ve.n-<.Ywno.6 he.ge.Jr!oYl..ta, Ylu:te. btaba1.ho, c.omo pfW C. e..ó.6 o , palla .6ubünhall .6W c.aJtâ.:teJt
fU.6:tófÚC.O, .6e.mpJte. J..rtc.omple.:to; Jte.óe.ilo, Jte.c.ome.çado. PJtoc.e..ó.60 que. o bloc.o do
po-de.Jt aw rta. e. oJtgarU.za YlO .6 e..n.tido de. urU.veJt.6a1.izall .6e.u podeJt. Nu:te. pJtOC.U.60, a
he.ge.mort.<.a de. uma c.lM.6e. ou g/tUpo .6e. mocüMc.a C.OYl.6:ta.rt:te.mw:te.. A he.ge.monia, YlO
Yl0.6.60 :tJta.balho, MO .6e.Jz.ã. v-i,6;ta. c.omo -Únpo.6.ú;ão fU.6:tofÚc.ame.Yl:te. Jte.CLÜzada. da. ide..E.
log..ta domiYlart:te., mM c.omo pltOC.U.60 c.ort:tJtacUtófÚo,
e.m
que. uma c.la..6.6e. ou g/tUpoe..ó:ta.bue.c.e. .6W domZnio poútic.o-ide.olôgic.o, a.:tJtavú de. um C.OYljunto de. J..rt.6:tilU:!:
çõe..ó, a maioltia dUM, iYl.6:ti:tuÁ..çõ e..ó da. "c.ul:tU/ta.". EYl:te.Ylde.m0.6 aquÁ.., bM e.ad0.6
e.m
G/tam.6 c.i, in'-> :tiluiçõ u :tJta.clic.io n.a1m e.Yl:te.
"u
vi.6 ", mM pJtatic.a.me.Yl:te. :tão po.f.1ti c.a..6qua.rt:to 0.6 bta.clic.i{ma.i.6 "apa./te.lho.6" do E.6:tado: 0.6 c.oYljwi:to.6 e..óc.ola.Jte..ó, M
igJte.-jM, 0.6 mw.6 de. c.omunic.a.ção de. mM.6a, M in'->:ti:tuÁ..çõu méCÜc.M (ho.6pila.i.6 e. ~
C.OlM médic.M, .60 bJte.:tudo
J,
e.YlÓ.-im, :tOdM M iYl.6:ti:tuÁ..çõe..ó e.Ylc.a.JtJte.gada..6 da.e.la.bo-/taçã.o,
Jte.pJtodução e. btaYl.6mi.6.6ão do .6abe.n .6oc.ialme.rt:te. he.ge.mânic.o e. da..6 ÓOJtmMde. au:towade. e. hie.Jta.Jtqu..ta que. e..õ:te. .6abeJt .6Upõe. e. vuc.ula..
2 Ve. EYlgw e. LêrtJ..rt a GJtam.6u, uma aYlã.li.6e. W:tÔfÚC.o-cüalWc.a dM J..rt.6:tU.LU..çõe..õ
do E.6:tado
ve.m
.6wdo e.la.boJtada Yl.e..õ:te. .6e.Yl.ti.do.3 G/tUpO.6 di.6:tin:to.6, em Yl.0.6.60 btaba1.ho, .6igniÓic.a.: g/tUpo pa.Jt:tic.ula.Jt, g/tUpo
· Quais os aspectos estruturais e históricos que podem ex
plicar as diretrizes básicas de sua formação, considerando, para
tanto, os períodos pré-1964 e pós-1964, na construção de urna
polí-tica Nacional de Saúde que, automapolí-ticamente, viria a se
no Ensino?
refletir
· Que fatores mantêm e fazem aumentar a dependência dos
Cursos da Ârea de Saúde a urna Política Nacional de Ensino, quando,
na realidade, deveria existir maior autonomia destes cursos frente
as necessidades regionais?
· Em conseqüência do que foi acima mencionado, que tipo
de profissional médico estamos formando? Para atender a que
inte-resses? E esses interesses se relacionam com o do grupo dominante?
Convém ressaltar que, nos dois últimos anos,
multiplica-ram-se os estudos sobre instituições e práticas médicas, principal
mente a partir de 19744, embora já existissem publicações da ABEM
(Associação Brasileira de Educação Médica). Por outro lado, as co~
tradições do discurso institucional, dominante no aparelho
hegemô-nico, eclodem, a partir de 1975, nas políticas de Saúde, dando
en-fase
à
prática médica, tal corno é exercida na instituição que setornou o situs privilegiado da produção-reprodução do saber
médi-co: o hospital universitário, e, na faculdade, através "de ordens
de serviço, circulares, portarias, convênios, currículos etc., to
da urna extensa rede normatizadora, que tem corno efeito político bá
sico a transformação gradual e progressiva deste saber e
médicos"5.
prática
A análise destas instituições numa instância superior,qual
seja, a Política Nacional de Saúde e a Política Nacional de Ensino,
tendo-se em conta as transformações sociais ocorridas nos períodos
pré-1964 e pós-1964, constituir-se-á, durante todo o nosso
traba-lho, o pano de fundo explicativo, necessário para a análise de urna
realidade concreta, obscurecida pelos interesses do jogo do poder.
Corno se sabe, estas são questões bastante complexas, de
teoria e prática política. Não podem ser resolvidas dentro de urna
4. No 6.útal de. 1974 .6uJtge. o e..ót:.udo de. MaJU.a Ce.c1Li.a Vonnange1..o .6obJte. "O mé.cüc.o
e.
.6e.u meAc.ada de. .tJr..abalha", t:.e..óe. de. daut:.a.tr.ame.n.t:.o cU..nda em VeA.6ão mhne.og/ta6ada.
5 LUZ, Made1.. T eAe.z.útha. A.6 .út.6:tauiçõe..6 mé.cLi.C-a.ó no Btt.1L6il: .út.6:tauição
e.
3.
análise limitada, uma vez que suas implicações teóricas exigem um
esforço de reconstrução e recuperação, numa primeira instância, da
história social brasileira, para, em seguida, tentar observar o re
flexo destas influências a nível regional. Só recentemente este es
forço encontrou eco, procurando ~ver a história como resultado
tan-to dos movimentan-tos sociais que se tan-tornaram vitan-toriosos como dos que
fracassaram6, isto é, pelo sucesso ou pelo fracasso dos atores,
p~
ra transformar a sua vontade particular em uma força social que mo
difica a própria estrutura.
Desta forma, um estudo histórico-estrutural do tipo
webe-riano, que lida com categorias mais diretamente ligadas ao poder,
como autoridade, dominação, legitimação etc., é aparentemente mais
afim à análise de instituições. Isto significa que, dentro desta
perspectiva, é inteiramente impossível uma análise institucional
sob.o ponto de vista dialético, porque, na década de 60, intensif.!..
caram-se os modelos cibernéticos, tendo como pano de fundo os estu
dos estruturais funcionais de instituições, vistas como
subsiste-mas do Sistema Social. A presença de Weber e Parsons é constante
na adoção deste tipo de estratégia. Weber, por exemplo, so lida
com o aspecto estrutural, através das categorias ligadas ao Poder
e a sua natureza, esquecendo-se de mencionar a historicidade na
construção da realidade concreta. Aproveita-se, nele, apenas o
es-quema estrutural funcionalista, não sendo, portanto, oportuno para
o nosso estudo. Há, também, os estudos weberianos em sua dimensão
histórica, cujo exemplo mais recente é a obra reeditada de Raymun-7
do Faoro , como também os estudos estruturais de orientação marxis
ta, histórico-estrutural. Seguindo este esquema de análise, temos
á destacar os primeiros trabalhos traduzidos de Poulantzas, consti
tuindo-se o exemplo mais representativ08. liA linha histórico-estru
6 E.6.6e. e-6 notu;_o de. ne.c.oYL6tJw.ção da
~:tõ.tU.iL
.60 c..iafe.
de. ne.c.upe.nação do papel. da.6Ua.6.6e..6 .6ubaLte.nna...6 na pnodução de-6.6a ~:tõtU.a ne.c.e.be.u, ne. c.e.n.:tem
e.
nte. , um vil!!..ni0.60 hnpu.t6o de. au:tone-6 c.omo F. C. We.nnont.. Otvige.YL6 do Sincüc.a1...-L6mo PopuLL.6:ta,
E.6:tudo.6 CEBRAP, 4, 1973, Sincüc.a1..Mmo e. Poú:tic.a, :te..6 e. de. üvne. do c.ê.nUa
mt-me.o, FFLCH, USP, 1972.
7 FAORO, RaymlLVl.do. "0.6 Von0.6 do Pode.n", PoJLto Afe.gne., Gtobo,1958
e.
Gfobo/USP,1975.
8 No.6 :tnabafho.6 mai.6 ne.c.e.nte-6 :tnaduzido.6, A.6 Ua.6.6e-6 .60UaM no c.apila1..Mmo de.
de. hoje., Rio de. JanUno, Za.haJt, 1975, e.
O
E.6:tado em Cwe. kofe.:t.) , Rio de. JanUno, Gnaaf, 1977, o e..6;tnu;tlLttaÜ.6mo de. PoUlan.:tza.6 .6
e.
ame.wa em pnovwoele
uma in6fuê.núa da onie.ntação gttam.6Uana, nac.e. ao pnobfema da ação e. da
4.
tural, marxista em suas origens, mas tendendo, às vezes, a
encon-trar a orientação weberiana, pela acentuação excessiva dos
aspec-tos estruturais na análise de conjunturas políticas, vem tentando
sistematicamente estudar as instituições políticas centrais, isto
é,
os aparelhos de Estado, numa'perspectiva histórica, fugindo aabstração dos trabalhos estruturais
f~ncionais"9.
Até mesmo asca-tegorias althusserianas podem mostrar-se ricas, na análise de
as-pectos importantes do estudo do Estado e suas instituições em
con-junturas determinadas, se bem que incapazes de abranger urna
análi-se de conjuntura,na medida em que estão encrustadas no conceito
abstrato de Modo de Produção Social. Dentre elas, destacamos as de
contradição e sobredeterminação, conjuntura de modo de produção no
sentido de momento específico de urna estrutura, o conceito freudia
no de deslocamento (de contradições) aplicado à análise política etc.
:g oportuno que se faça urna crítica a esses trabalhos e oo!:
rentes. Em primeiro lugar, o conceito das contradições só é
empre-gado estruturalmente. As contradições, introduzidas pelas classes
e grupos (os conflitos, para usar, mais urna vez, a linguagem
fun-cional) , não ocupam lugar de importância na análise. Em segundo l~
gar, esses trabalhos não consideram as instituições corno núcleos
-de po-der central --significa dizer que os micro-po-deres ou sao
as-similados ao Estado, corno aparelhos, ou são simples reflexos do
a-parelho produtivo.
o
método funcionalista, ao fazer urna abordagem limitadado estudo das instituições, proporcionar-nos-ia urna visão destorci
da da realidade. Por este prisma, acaba-se tendo a visão dominante
das instituições, o discurso da Ordem.
O que pretendemos, com este trabalho é analisar,
à
luz dahistória, o seu movimento dialético. Torna-se necessário informar
que este tipo de análise.não está inspirado numa interpretação
me-canicista do marxismo, segundo a qual a relação entre a base econô
mica e a superestrutura é concebida de maneira formal e
não-dialé-tica. Pelo contrário, não se pode analisar um fenômeno social,
co-rno os de natureza política, sem levar em conta tanto os seus
parâ-metros estruturais, corno as relações existentes entre classes ou
9
LUZ, Made1. ThVte.zinha.
Á6 lYL6.t-.LtLúçõe..6Mêdic..a..6
YLO BJtMU:iYL6.t-.LtLúç.ã.o
e.5.
grupos, no tempo e no espaço, que produzem e constituem, a um ' so
tempo, esse fenômeno.
Talvez seja importante fazer referência a um problema de
ordem epistemológica, qual seja~ o objeto das ciências sociais do
ponto de vista marxista. A resposta"marxista mais genérica para a
questão do objeto das ciências sociais é o estudo científico do ho
por mem, isto é, da humanidade em seu processo de reprodução; ou,
outras palavras, a totalidade social que torna possível este
pro-cesso. Esta totalidade se constitui em um processo que so se
defi-ne em termos de seu movimentolO. O que vem a ser esta totalidade,
qual é a regularidade dos seus movimentos e em que condições eles
ocorrem? Em primeiro lugar, poderíamos cometer o erro de por e con
trapor estrutura e história; em outras palavras, a estrutura nos
daria a explicação do que é total~dade e a história nos daria a ex
plicação do seu movimento, com a sua regularidade, dada em circuns
tâncias particulares. Pode-se, contudo, inferir de imediato que a
t
totalidade de que estamos falando é tanto um resultado histórico,
isto é, dado pela ação humana, como e também estruturada. O ~ p~
tendemos salientar "é que a estrutura e o resultado da ação, da lu
ta social (produto histórico), da mesma maneira que ela própria se
constitui, por assim dizer, em um parâmetro dessa ação. Isto quer
dizer que a estrutura está em permanente mudança. ~ esta mudança,
que se manifesta nas formas novas que a estrutura gradativarrente as
h · - . ,,11 - d b t
sume, para o processo lstorlCO . Nao po emos conce er estru ura
como algo imutável e, muito menos, a história como o resultado das
escolhas, ao azar, de indivíduos ou grupos. O que pretendemos
res-saltar é que o processo histórico é o movimento real, responsável
por escolhas entre alternativas históricas possíveis, inerentes às
forças sociais que estão presentes na luta social. Isto significa
que a relação entre estrutura e história não é estática, mas dialé
tica. Daí dizer-se que o objeto das ciências sociais e humanas, i~
:_0 é, das relações que se expressam pela economia, política e ideo
logia, é a totalidade complexa e não simples, como e o caso das
ciências naturais. Assim, não podemos afirmar, sobre as sociedades
10
paJta uma di.6C1Ló.6M .6obJte. v.d.e. ponto -Únpofl-tante., ve.Jt Qu.ailiJ1, J. No:ta.6 .6obJte. o PJtOhtema do Md.odo e. do Obje.:to da.6 Ciênc..-i.tu Humana.6. Unive.Jt.6id11de. de. Sao Paulo, m-Úne.o., 1 96 8 , P . 4.
11 MOIStS,
JO.6é
ÁtvaJtO. GJte.ve. de. Ma.6.6a e. CJti.6e.PoLZti~a.
são Paulo,Po~,1978,
humanas, que seus diferentes aspectos são rner~s aparências de sua
realidade essencial, como no caso do átomo, por exemplo. Não
pode-mos também afirmar que as sociedades humanas constituem a
justapo-sição de diferentes componente~, tais como a família, a tradição,
,os modos de produção econômica etc. As sociedades humanas
consti-tuem uma unidade dialeticamente organizada por seus diferentes com
ponentes, a economia, a política e a ideologia.
Tendo em vista esta postura metodológica, teremos
condi-çoes de evitar o dogmatismo de uma explicação determinista, como e
o caso do economicismo, ou mesmo de cometermos erros metafísicos
de atribuir causas acidentais a fenômenos que se deseja
investi-gar. Desta forma, analisar o surgimento dos Cursos da Área de
Saú-de da UniversidaSaú-de FeSaú-deral do Maranhão e seus reflexos no Ensino,
sem levar em conta as condições estruturais de sua formação,
den-tro do quadro do capitalismo dependente, com todas as suas implic~
ções processuais, significa incorrer nos erros mecanicistas e nas
•
simplificações a que já nos referimos. Estas observações, apesar
de genéricas, representam as diretrizes a serem utilizadas em todo
o nosso trabalho.
Convém destacar que os procedimentos utilizados, na
cons-trução do nosso objeto de estudo basearam-se em fontes primárias
de documentação e entrevistas realizadas com docentes da
Universi-dade do Maranhão. Outrossim, utilizamos uma bibliografia bastante
consistente, por nós selecionada, procurando, desta forma, dar
7.
2. DIAL~TICA UNIVERSITARIA
2.1. INTRODUÇÃO
O tema Reforma Universitária, na década de 60, era obrig~
tório, quer nos ambientes intelectuais, quer nos ambientes
políti-cos do país. Problemas relacionados com a educação, que envolvessem
a escola pública, ensino religioso ou mesmo as características da
Lei das Diretrizes e Bases, constituíam assuntos palpitantes e de
força substantiva para despertar o interesse geral. "Já nos anos
20, a Sociedade Brasileira de Educação promovia conferências, deba
tes e levantava a bandeira da educação pública, universal e gratu~
ta, como caminho para livrar o país do atraso e do
subdesenvolvi-mento"l. Hoje, o assunto foi em parte esquecido. A ênfase dada ao
ensino universitário gira em torno dos problemas políticos,qual se ,
ja: uma corrente defende a tese de que estudantes devem só estudar
e professores só ensinar; e,de outro lado, há os que afirmam que
ambos, podem, e devem, fazer política.
são problemas reais, palpitantes e que merecem atenção,rnas
estão longe de tocar os problemas mais sérios existentes, como os
relacionados a nossa Universidade como instituição responsável
pe-lo ensino superior no Brasil. Examinar e analisar estas
institui-ções, estabelecer qual tem sido a experiência histórica brasileira,
procurando compará-la com outros países, ajudar-nos-á a entender
com maior clareza o objeto que nos propomos estudar. Adquiriremos
uma perspectiva melhor, a respeito do papel sócio-político da
Uni-versidade nestes países, em relação ao ensino, e, por conseguinte,
no Brasil, obtendo, desta forma, um estudo num nível mais alto que
, o~eramente histórico-descritivo.
Algumas questões podem ser levantadas, tendo em vista o
objeto de nosso estudo. Qual a relevância de um estudo das
Univer-sidades, no que diz respeito ao tema focalizado? Qual a relação
deste estudo com o nosso trabalho de pesquisa? Diremos, por uma
questão de ordem metodológica, que, ao tratarmos dos Cursos da
A-rea de Saúde, estamos nos referindo a unidades menores que fazem
1 SCHWARTZMAN, Simon.
Univ~~idad~,C~ência
~ Subd~~~nvolvim~nto.
Vado~.
~
d~
8. parte de um contexto maior que e a própria universidade. Desta for
ma, a medida que procuramos identificá-la no tempo e no espaço, cQ
mo urna instituição sócio-política cuja função precípua é o
exercí-cio do poder, teremos condições de entender melhor a temática que
-nos propomos analisar e descrever, levando-se em consideração,pri~
cipalmente no Brasil, o seu caráter histórico-cultural ligado à he
gemonia de urna classe.
o
aparecimento e o desenvolvimento histórico das Universidades no Brasil repousam sobre trés fatos fundamentais: em
primei-ro lugar, apesar de sua origem recente no Brasil, já existiam na ~
dade Média; em segundo lugar, encontram-se ligadas ao exame da
a-ção do Estado, corno Instituições sócio-políticas que são; e,em ter
ceiro lugar, acham-se estruturadas no exercício do poder. Pretende
mos, pois, analisar estas Instituições desde a Idade Média até o
seu surgimento no Brasil, não esquecendo de relacioná-las com as
mudanças ocorridas na estrutura global da sociedade ou, em termos
gramscianos, com sua situação num
determin~do
bloco histórico2; emseguida, analisaremos que influências marcaram o nosso sistema un~
versitário, e, finalmente, corno se apresenta, atualmente, o panor~
ma universitário brasileiro, haja vista todas essas influências.
Desta forma, para que possamos entender o processo
evolu-tivo universitário, não só na Idade Média corno aos séculos
seguin-tes, iniciaremos este trabalho, fazendo referência ao seu contexto
sócio-político-econômico, procurando destacar, neste contexto, a
formação de urna nova sociedade hegemônica cuja influência ainda ho
je estamos sentindo.
2 PalUl rwç.ã.o de. bloco h-i,ótõfL.i.c..o, e. -6e.LL6 e.leme.YI.t.o-6, VVL PORfELLI, H. GJr..am-6U e. o
9 .
2.2. EVOLUÇÃO POLITICA, SOCIO-ECONDMICA
A Universidade, como é_concebida no sentido moderno da
pa-lavra, surgiu na Idade Média.
Na Idade Média surgiram os primeiros movimentos que deram
origem à sociedade capitalista, liderados pelo liberalism03,que na
da mais foi que urna ideologia que apareceu para justificar uma
no-va sociedade econômica. O liberalismo - baseado nos princípios de
individualismo, liberdade, propriedade, igualdade e democracia - t i
nha por objetivo incitar as idéias renovadoras emanadas das prát!
cas sociais do final do período medieval, que expressavam o
esfor-ço para a libertação do proprietário dos instrumentos de produção,
para que fosse possível a plena exploração dos mesmos. Segundo o
liberalismo, "através das alterações produzidas nas pessoas, na
e-poca em que elas são susceptíveis de interiorização de hábitos,
du-radouros; pensa-se poder alterar as relações sociais, vale dizer,
construir uma sociedade nova,,4, em que todos tenham a
possibilida-de possibilida-de ascenpossibilida-der na hierarquia social.
A semente do capitalismo foi, pois, lançada na Idade
Mé-dia, tendo a ideologia liberal como suporte, embora ainda de forma
difusa, dado o predomínio pOlítico-religioso exercido pelas leis e
dogmas da Igreja. A autoridade temporal da Igreja expandiu-se pela
Europa, e, nestes territórios, o Direito Canônico era o Direito
a-ceito tanto pelos civis quanto pelo clero.
A uniformidade do pensamento medieval foi a sua caracterís
tica marcante, manifesta no social, no político, na fé religiosa,
na filosofia, no uso do latim como idioma comum, assim como no sen
tido unânime das expressões literárias e artísticas5.
3 O
Ub~mo
C.OYL6-ÚJ:te. num J.J..i..6:te.ma de. CJte.nçM e. c.onvic.çõu, -ÚJ:to e, numa ide.o logia. SobJte. o Ube.Jta.UJ.Jmo ve.Jt LASKI, Ha.JtOld J. "O Libe.Jta.UJ.Jmo EWWpe.u". Sa.o Paulo, Me.J.J:tJte. Jou, 7973.4 CUNHA, Lu-ÚJ Antonio. Educ.aç1io e. Ve.'->e.nvolvime.n:to Soc..ia.l no BtuL.6il. Rio de. Ja-ne..iJto, FJta.n~c.o Alvu, 7977, p. 20.
Desta forma, a uniformidade, da maneira como era
apresen-tada, fornecia ao homem uma visão da realidade, onde o bem estar so
cial se situava acima do individual, ao mesmo tempo em que o
inte-resse particular não era o fim a ser alcançado.
O controle era exercido pela igreja que utilizava padrões
não-econômicos, para impedir o florescimento do capitalismo. Assim,
o bem estar social estava ligado à salvação eterna, e, através des
ta máxima, a igreja evitava a competição entre os comerciantes -os
preços e juros estavam fixados, os dias santos eram feriados
obri-gatórios, salários e horas de trabalho estavam regulamentados - tu
do, enfim, sob a supervisão da igreja. Era a forma utilizada para
legitimar o seu poder.
Segundo Marx, surge no final da Idade Média a chamada
"a-cumulação primitiva,,6 pela expropriação de pequenos proprietários
do campo, dando início ao surgimento das classes proletárias e bu~
guesas: os camponeses se dirigem às cidades, em busca de melhores
situações de vida.
O jogo das classes dominantes começa a ser evidenciado,nos
modos de produção, e a força do trabalho se transforma em
mercado-ria a ser vendida e comprada no mercado.
A idéia de sociedade estática, do período feudal, foi sub~
tituída pela idéia de sociedade dinâmica, coerente com o princípio
da acumulação capitalista.
Dentro deste contexto, a sociedade liberal começa a
ques-tionar os princípios de moralidade impostos pela igreja, ao mesmo
tempo em que os considera inadequados à emergente sociedade de prQ
dução. A igreja, ao impor uma filosofia de vida onde a salvação
e-terna é um bem em si mesma, usufrui desta regalia em seu próprio
benefício. Tais regras impostas pela igreja serviram para aumentar
o seu tesouro, e o da Corte Papal em Roma.
Devemos lembrar que a Igreja era a maior proprietária de
terras descontínuas da Europa e que ela encarnava o princípio do
poder supranacional, por meio do Papado. A Igreja estava presente
praticamente em toda a Europa, desde que era parcela da classe
se-6 SobJtQ. e..ó:te Q..6.6U.n;to vefL MARX, KaJl1.. O CapdaL Mé:uc.o, FOMO de Cu1..tww.
lI.
nhorial, e o Papado buscava sobrepor-se aos poderes locais. A Igr~
ja foi, neste período, um importante segmento da classe senhorial
e desfrutava de verdadeira hegemonia no setor ideológico, por meio
da religião.
Desta forma, o capitalismo emergente começa a abrir os
o-lhos da população para as riquezas acumuladas pela Igreja e pela
nobreza secular, fatos que concorreram para que a Igreja fosse co~
testada e denunciada pelas arbitrariedades cometidas durante
sécu-los de dominação.
Paradoxalmente, a Igreja foi responsável pelo surgimento
do liberalismo capitalista -momento histórico, delineado por uma
nova concepção de vida: o homem quer participar na exploração do
potencial de riqueza, gradualmente descoberto nos séculos
seguin-tes. A "perseguição" da igreja será tarefa do liberalismo, na
nas-cente sociedade capitalista.
A nova sociedade dinâmica, que emerge no início da Idade
Moderna, será movida pela experimentação de novos métodos e
recur-sos necessários à busca de riquezas. A nova mentalidade social,
criada pelas idéias liberais, não mais espera que o mundo aconteça
por si, mas pelo contrário, está disposta a criá-lo e a transformá
-lo em seu próprio benefício.
Ao adotar tal posição, o liberalismo como ideologia enco~
trou apoio na Reforma7, tendo no protestantismo seu estandarte
maior. As tranformações, desta forma, começam a ser operadas na so
ciedade, e depois no próprio Estado. A Reforma~ ao quebrar a supr~
d · l~' 8 1 mb~
macia de Roma com novas outrlnas teo oglcas , a tera ta em o
po-der da Igreja que é substituído pelo do Estado. Já é o Estado, e
nao a Igreja, que sanciona a paz e a ordem, pelos seus novos
méto-dos de conduta.
A Reforma, como doutrina, exigiu reformulações das
Legis-lações, principalmente.quanto aos tributos eclesiásticos que
one-ravam o povo. Dada a omissão da Igreja, as novas idéias, lançadas
7 A Re.60fUna 60i um mov.-ime.n;to :te.o..f..õgic.o, de.6lag!tado po!t Ma~ho Lute.Jto, c.omo !te.
vo..e.:ta
ã
hegemonia. papa..f.., v~ando a !te.de..6c.obft..Úl. M c.ondiç.oe..6 da. vida. ~:ta.Se.M pJto:tago n.i.6:tM viam o Papa c.omo o
anti -
c.w:to e., potr.:tan.:to, a obe.die.n.c.iaao Papa c.omo peM.go paJl.a a .6a..f..vaç.ão de. .6uM almM. A e.manc.ipaç.~ do c.o n;tJto..f..e.
papa..f.. paJta e...f..e..6 pOMib~ que. .6e. :to!tnM.6e.m me...f..ho!te..6 UI..i..J.,;tao.6.
8
A nova :te.ologia, :tltazida pe...f..a Re.60Jtma, .6ub.6:ti:tui a au.:toltidade. pe...f..a ltazão,
12. pelo movimento reformista, foram decisivas para a cisão da Igreja,
sendo tarde demais a renovação proposta pelo Concílio de Trento em
15459 .
Na realidade, o que representou este movimento reformista em-relação à economia medieval?
Representou o desmoronamento da ordem econômica vigente
e, ao declarar guerra
à
Igreja, possibilitou a ascensão docapita-lismo. Por outro lado, as novas idéias lançadas pela Reforma,
re-sultaram numa nova concepção científica. são deste período as
i-déias de experimentação, a investigação cooperativa da natureza, o
abandono de preconceitos, o estabelecimento dos métodos corretos d e lnquerl o, o Je lvan o, como en atlzava Bacon ' - ' t b' t ' d f ' 10 ,converter a
pesquisa científica em princípio fundamental da política pública.
~ interessante associarmos estas idéias, dentro da propo~
ta do nosso trabalho, procurando identificar a Universidade, como
fruto de todos os movimentos sociais surgidos através dos tempos,
a fim de que possamos configurar a hegemonia dominante em cada ép~
ca, até chegarmos ao seu ponto áureo no momento presente.
A lição que podemos tirar do século XVI é a certeza de
uma nova classe, com uuma filosofia a ser definida na era seguinte
-uma classe que busca remodelar o homem e a sociedade em princípios
mais eficientes.
No século XVII, no campo econômico, o Estado passa a dar
prioridade ao comércio. A Inglaterra, nesta ocasião, passa a ver a
liberdade como forma de acumular riqueza. ~ a nova burguesia
nas-cente que começa a se impor. O protestantismo atinge também o
se-tor da Ciência, quando estabelece,
à
Ciência, a auto-suficiência deuma razão livre da necessidade de levar em conta os pressupostos
metafísicos sancionados pela Igreja. ~ o triunfo do capitalismo r~
cionalista.Esta revolução científica e uma expressão da
revolu-ção social em processo de descoberta de suas categorias de açaa.
Isto significa que as condições sociais estavam ligadas ao clima e
conômico, razão pela qual a Ciência passa a exigir precisa0,
expe-rimentação, audácia, enfim, a busca de autoridade nos próprios
fa-tos.
9
O
Con~de Tnento 60i um
mov~entode Contna-Re6onrna, eom o intuito de
a
Igneja necupenan
o
~eu p~~tZgio. P~tanto, ineentivou a
~çãode
o~de~10 netigio~~, d~tina~
ã edueação
dajuventude.
So~e ~~e ~~unto ve~
BACON,
F~n~.Novo
O~ganum. A6o~mo~ ~obnea
int~pnetação da Natuneza
e o Reino do Homem. Livno
I,
a6o~mo111, são Paulo,
13.
Ao finalizar o século XVII, os fundamentos de uma
filoso-fia liberall1 se tinham definido plenamente; porém, mais do quenun
ca, estes fundamentos estavam ligados à classe proprietária.
No século XVIII, a Revolução Francesa, que ocorre simulta
neamente ~om a Revolução IndustTial, marca o início do acesso da
burguesia ao poder político.
A crítica racionalista é utilizada pelos filósofos da
Re-volução, como um bem, ao proclamar a liberdade, e, um mal, às
res-trições a ela feita.
A revolução representou a ruptura de uma sociedade em cri
se, tendo como conseqüência maior a ascensão da burguesia à classe
dominante. A filosofia liberal passou à ideologia burguesa dominan
te, com a finalidade de dissimular a relação de dominação
existen-te nas sociedades capitalistas. Passando de ideologia burguesa
re-voluci6nári~ a ideologia dominante, penetrou nas instituições juri dicas, educacionais, religiosas e na organização da família, rejei
tando a herança ideológica pré-capitalista. Enquanto a sociedade ca
pitalista emergia, a religião protestante foi o mais forte apoio a
ideologia liberal. Os princípios propostos pelos liberais
começa-ram a ser questionados pela classe operária, não vendo, neles, a
solução para a ideologia global do modo de produção capitalista. A
classe operária, nascida ao mesmo tempo que a burguesia, luta pelos
seus direitos.
Enquanto o voto era restrito à classe proprietária, a coe
sao se manteve, mas, quando se instala o sufrágio democrático
uni-versal, a situação se agravou, desfazendo-se a coesão: o protest~
tismo perde seu prestígio; os liberais utilizam novos mecanismos,
que possibilitem à sua ideologia, conjugar liberalismo e
democra-cia; os meios de comunicação de massa, o ensino escolar e outros re
presentam os instrumentos de legitimação do capitalismo liberal e
o Estado busca, na ciência, seu novo apoio.
Rapidamente, os ideólogos liberais aprendem a conexao que
vincula o exercício do sufrágio, numa democracia, com uma plebe"e~
clarecida".
11 Oll 6undame.YLt0.6 da 6iloho6ia. we.Jr..a.t podem he.Jl. Mh-Ún nellUmidoh: O Ehtado he.C.U
laJt he.
ehtabe.le.c.e.; o Jtac.io~mo na c.iênc.iae.
na 6iloho6ia. não e.nc.ontJtavao
-'.
Os americanos vão buscar, na Alemanha, as idéias para
reforma educacional. Friedrich Froebel12 foi quem revolucionou
14.
a
o
ensino ao fazer a junção da educação, religião e ciência. Foi
con-siderado o reformador da democracia pelas suas idéias avançadas.
No início do século'XIX, na Inglaterra, um novo ponto de
vista científico revoluciona a sociedade. Trata-se do princípio da
seleção natural, proposto por Darwin no seu livro A Origem das
Es-pécies, como também, "a sobrevivência do mais apto" proposto por
Spencer. Ambos reforçam os princípios legitimadores da sociedade
capitalista liberal, propiciando a crença de que a relação classe
dominante e classe dominada é "natural".
Após esta visão de conjunto, de como se encontrava a
so-ciedade, não só no período medieval, mas nos séculos XVIII e XIX,
teremos condições de apreender as concepções de universidade que aí
se formaram, até chegarmos à un,iversidade brasileira; não esquece~
do que estas sociedades se formaram, tendo por base uma classe
he-gemônica e que esta mesma classe veio a exercer a sua influência em
nossa sociedade.
12 FJvÚ?.dJL.i..c.h FJtoe.be1., Yla.6c.i..do de. uma namUÁ..a de. pa.6:toJte..6 pM:te..ó:tavt:te..ó Yla
Mema-vtha Me.JÚcÜorr.at, .6UJtge. c.om a.6 id'ii..tu Ube.~ opoJLtUYla.6 ao mome.n:to
c.apdaLill-:ta da .6oc.ie.dade. amvU.c.avta: Jte.Ugio.6.úiade., Jte..6pe.ao
ã
.útcü.viduaUdade.,.út:te.-gJtaç.ão .6oc...tal, e.du.c.aç.ão
e.
ou.:tJta.6 id'ita.6 que. :tJtaYl.6nOJzmam a e.duc.aç.ão em um -<.Yl.615.
2.3. UMA PERSPECTIVA HISTORICA DAS UNIVERSIDADES
Na Europa, na Idade Média, as primeiras universidades se
organizaram, dentro do pensamento medieval, como agremiações de
pessoas interessadas em defender interesses comuns. Eram de início
- 13 14
corporaçoes de alunos a que depois se juntaram os lentes .
Pro-tegidas pela igreja, eram autônomas, no sentido de que defendiam
seus próprios interesses e eram universais, no que se refere à prQ
cedência e ao destino posterior de alunos e docentes; se havia uni
formidade, esta decorria da própria cultura, mas eram
profissio-nais e especializadas já que se formavam em torno de algumas
figu-ras. Assim, surgiram a Universidade de Paris (corporação de lentes,
dedicada à teologia, às artes e medicina), Bolonha (corporação de
alunos, dedicada ao direito), Montpellier e Salermo, na area de me
dicina.
Neste período, através de uma instituição denominada "stu
dim generale", a chamada cultura ocidental conseguiu unificar-se,
tendo em vista a conservação e a transmissão do conhecimento teóri
co, realizando durante três séculos um trabalho extraordinário. En
tretanto, no final do século XIV, mais precisamente do século XV ao
XVIII, esta estabilidade entra em choque, quando não consegue acom
15
-panhar, nem aceitar, o espírito do Renascimento e da Reforma . Du
rante estes séculos prosseguiu num extraordinário isolamento
den-tro da sociedade, preocupando-se única e exclusivamente com a trcms
missão de um saber, sem "acrescentar aos valores do passado as des
cobertas que estavam sendo feitas, nem realizar uma integração e
phegar a uma sintese dos conhecimentos estudados,,16. Não havia
ne-73 A c.otr.poJtaç.ao - e., - ante..6, a u/'Úa.o de. - to dO-6
-0-6 me.mbM-6 de. uma me..6ma pM
f/
.
.,6-6 ao:c.he.ne..6 e. -6uboJtcUn.ado-6, pa:tAÕe..6 e. ope.JtãJU...O-6, aqUÁ.., me..6;tJz.e..6 e. d~ e2pu1..OI.J .
14 "UrU.Ve.MilM -6 c.holaJtum e.:t
mag~;tJz.oJtum".
15 O Re.nMcA.me.nto pode. .6e.tr. c.onI.Jide.Jtado, de. um modo ge.Jta.t, c.omo o c.onjun:to
he.:te.-Mgê.ne.o dM marU.ne..6:taç.õe..6 na ptr.ãtic.a e..6:têüc.a (pltinc.ipafrne.n:te. nua, mM não
e.xc..tMivame.nte.), OOpiJtadM no.6 pJU.núpio.6 humarU..õ:tM. Com Ue. .6utr.ge.m o
de.-.6e.nvolvhne.nto dM atividade..6 c.ap~:tM, c.onI.Je.qliê.nc.ia da e.xpanI.Jão do.6
me.tr.-c.ado-6 (e.xpanI.Jão maJLl:U.ma e. c.ome.Jtc.ia.t). Ve. um modo ge.Jta.t, o c.ompotr.:tame.nto
hu-mano tr.e.Me.:te. o pJtÓpltio de..6e.nvolvime.n:to dM novM aUvidade..6. O butr.guê..6 c.aJtac.
:teM.zava--6e. pe.la .6ua c.apac.-úiade. de. ob:te.Jt luc.M.
-16 FÃVERO, MaJÚa de. LouMe..õ de. Atbuque.Jtque.. Re.6.te.xõe..6 -6obJte. a UMVe.Midade. na
nhum reflexo dessa universidade sobre a sociedade, uma vez que
es-tava toda debruçada sobre a análise do conhecimento existente, e,
muito menos, sobre a produção. Nem a produção, nem a economia, nem
a sociedade dependiam da universidade, antes, ela própria, a
uni-versidade, delas dependia. A função da universidade era o
aperfei-çoamento individual de cada um, transmitido pelos mais velhos. Os
ingleses chamavam-na "educação de gentleman"; Benjamin
"educação ornamental".
Franklin,
A velha universidade medieval luta contra as forças
exte-riores que pretendiam transformá-la. "Até aí a missao da
universi-dade era a da guarda e transmissão do saber, como condição para a
ordem e a civilização. Eminentemente seletiva, orgulhava-se de po~
cos alunos e da alta qualidade dos seus intelectuais e eruditos. E
ra a casa do intelecto, a torre de marfim de uma cultura fora do
tempo"l? Entretanto, essa universidade entra em decadência quando,
no final do século XVIII, a sociedade passa por uma fase de grande
transformação; embora este envolvimento tenha surgido no século ~,
o século XVIII representou a explosão característica desta
trans-formação. Foi essa universidade que começou a transformar-se com
as três revoluções do nosso tempo: revolução científica, a
revolu-ção industrial e a revolurevolu-ção democrática.
Na medida em que os estados se fortificam, há a substitui
-çao da tutela da Igreja, e a Universidade passa a agir mais em fun
ção dos limites nacionais. As mudanças do século XVI e XVIII, o r~
nascimento, o humanismo, a ciência experimental se fazem a margem
da universidade e, quando as escolas tecnológicas e as
institui-~ões de pesquisas surgem,o fazem fora dos limites universitários. A
"-~rolução Francesa não só fecha a universidade obsoleta da época
,,;;;t'dj eval, mas, sobretudo, através de Napoleão, cria novos cant}X)s cE
18
- -·.t'Sino superior na França ,com o objetivo de dar coesão
à
nacio-~~lidade, em nítida oposição aos velhos moldes de ensino
universi-t~rio; assim como as universidades de Oxford e Cambridge já quase tinham sido fechadas por Cromwell.
17 TEIXEIRA, An.L6i..o. A Uru..veJL6idade de onXem e de hoje. Rev..Lóta BfUL6uehta. de
E~tudo~ Pedagô9ieo~. Ri..o de Jan~o, (95): 28, jul.7~et. 1964.
18 A Emp/tua
/tev~io~ta
do~
en.uwped..LótM jã eOMideJtada eomo ptLime.iJta.17.
O ensino superior francês que Napoleão consolidou sob a
influência do pensamento dos encic.lopedistas, da revolução
indus-trial, do liberalismo burguês, teve um sentido nítido de substitui
-çao do ensino superior, que antes existia, corporativo, eclesiásti
co, bem nos moldes, enfim, da Idade Média.
"o
que surgiu, então, foi um conjunto de faculdadespro-fissionais integrantes do sistema estatal de ensino implantado na
França por Napoleão; urna organização de controle centralizado e
retrizes uniformizadas com o propósito de dar unidade política di
e
1 1 . -1 d ~. • ,,19
cu tura ao arqulpe ago e provlnclas do PalS . Logo, o
do que fora a universidade medieval, difusora em boa parte
ber revelado.
oposto
do
sa-Essa universidade desempenhou, nas décadas que sucederam
a reforma napoleônica, papéis socialmente de destaque cultural e
científico, evoluindo da base teológica e conservadora para a
im-plantação de urna cultura universitária menos fechada, "cultivando •
o humanismo científico, vinculada aos problemas nacionais,
cons-ciente dos direitos humanos"20.
- I VI I . I . , 21 t '
No secu o X I , na França, o 1 umlnlsmo procura
erml-nar com a universidade, mantendo escolas profissionais superiores
e academias para o desenvolvimento da ciência e da cultura, consti
tuindo o chamado modelo napoleônico.
A Revolução Industrial, na França, trouxe urna mudança de
mentalidade, isto porque as "inclinações normalmente humanistas do
passado foram substituídas por um novo humanismo fundamentado na
Ciência, comprometido com a problemática nacional, com a defesa dos
gireitos humanos e empenhado em absorver e difundir o novo saber
científico e tecnológico,,22. Entretanto, este desejo de mudança foi
substituído por urna burocracia nacional, que nada mais fez do que
19 CUNHA, Nádia FJtaYl.c.o da. A c.we. da e.du..c.aç.ão uc.olaft e. aó tafte.6aó da UvU..VVL6.-l
dade.. Re.vtita BJtaóile..úta de. E.6tu..do.6 Pe.dagõg.-lc.o.6. RW de. Jane.-iJw, (118):
-267, abJt.jju..n. 1970. 20
21
I b..úi eJn , p. 2 6 7 •
U.wn.-lrU/.Jmo, c.onju..n:to de. ptinc.Zp-W.6 .-lde.olõg.-lc.o.6 60Jtmu.ffido.6 baó.-lc.ame.nte. no .6~
c.u..lo XVI TI, qu..e., pa.Jz.:t.,i.ndo de. c.o nc.wo.6 9 e.JUÚ.6, ~c.a 6u..ndame.n.talme.n.te. o AÉ.
.6olu..:t.-l.6mo e. também a IgJte.ja, ma.-l!.> do qu..e. a Jte.üg.-lão.
22 RIBEIRO, Vaftc.y. Un.-lvVL6..úiade. Ne.c.U.6á.JU..a. RW de. Jane.-iJw, Paz e. TeJrJz.a, 1969,
prejudicar o florescimento de tão nobre ideal, sufocando a
criati-vidade e a flexibilidade indispensáveis
à
instituição universitária.Contra essa burocratização, surgiram institutos autônomos,
visando a maior flexibilidade
do
sistema, chegando-se, inclusive,ao desenvolvimento de carreiras científicas fora dos quadros
pro-priamente universitários.
No século XIX, a Universidade conserva algumas das cara~
terísticas que certos pensadores de nossos dias procuram preservar,
ou seja: é um lugar de ensino, mais preocupada em difundir o saber
que a pesquisa, tendo por finalidade a transmissão da cultura e do
saber.
A universidade alemã pode ser caracterizada corno
expres-sa0 de esforço deliberado da Alemanha, para unificar-se corno nação
e alcançar os estágios de desenvolvimento industrial, atingidos p~
la França e Inglaterra, pioneiras da Revolução Industrial. Com o
"advento da Revolução Industrial, ocorreu a divisão do mundo em
países centros do desenvolvimento, e em países periféricos,
rela-cionados uns e outros, seja pelo remanescente imperialismo
coloni-zador direto, seja pelo neocolonialismo da exploração do domínio do
saber tecnológico,,2 3. Daí o esforço da Alemanha para se integrar
no campo educacional, tendo o Estado corno baluarte deste esforço,
com o objetivo de se integrar autonomamente na nova civilização té~
nológica. Esses propósitos foram alcançados graças ao esforço de ~
conomistas, filósofos, cientistas corno Schelings, Fichte, Hurnboldt,
teóricos dessa nova universidade. Com ela inaugura-se a nova fase
da universidade contemporânea, voltando a ser o centro de busca da
verdade, de investigações e pesquisa, corno enfatiza Anísio
Teixei-ra, "não o comentário sobre o conhecimento existente, não a exeg~
se, a interpretação e a consolidação desse conhecimento, mas a cria
ção de um conhecimento novo. A sociedade estava se transformando,a
pesquisa ia voltar a essa Universidade, então debruçada toda sobre
o passado, jogando-a para o futuro. Ela ia descobrir o
conhecimen-to. Esta Universidade, de Hurnboldt, faz-se de tal modo a nova
uni-versidade que toda a Inglaterra vai à Alemanha buscar associar-se
" t " t"f" ,,24
ao renaSClmen o clen 1 lCO .
23 CUNHA,
N~
Fhanco da. op.
ciX., p. 270.
24
TEIXEIRA, AnLóio. Uma pVL6pec;tiva da Educaç.ão Su.peJU.oJt no BJta..6il. Revió-ta
19.
Entretanto, a Universidade alemã, dóci~ à ideologia
ofi-cial do Estado Absolutista, passou a funcionar em termos rigidamen
te elitistas, descompromissada em fazer uma revisão crítica em
re-lação à ordem social vigente, marginalizando a atuação de seus pe~
sadores, filósofos, sociólogos, economistas e cientistas, quando
empenhados em repensar criticamente essa estrutura social. Com a
Segunda Guerra Mundial, esta situação agravou-se. O nazismo exigiu
dela o endosso de seus postulados racistas e imperialistas,
expul-sando professores suspeitos de ascendência judaica. Foi a fase de
-regressao cultural.
Se a Universidade Alemã do século XIX apresentou estas
características, o mesmo não aconteceu com as Universidades de
Ox-ford e de Cambridge na mesma época, as quais, por sua vez, haviam
nascido da Universidade de Paris, que fora a grande Universidade
da Idade Média. Estas universidades atingiram um alto grau de sel~
tivismo acadêmico tradicional, tornando-se difícil a conciliação
da linha cultural clássica, aristocrática, com a linha
técnico-ci-entífica, desenvolvida pelos novos Colleges em contínuo
crescimen-to. Neste contexto, as Universidades de Oxford e Cambridge tentam
modernizar-se num esforço de acompanhar as transformações da socie
dade que vivia a revolução industrial, necessitando de
profissio-nais de alto nível.
Apesar da decadência do império britânico e da nobreza,e~
tas instituições "subsistem, mescladas embora, com as novas idéias 25
de novas universidades e Colleges of Advanced Technology" .
Os princípios e motivações que formaram e desenvolveram a
Universidade norte-americana são muitos diferentes daqueles da Un!
versidade da Europa Ocidental. Nos Estados Unidos procura-se
ensi-no de massa. ~ talvez, em território norte-americano, que se
mani-festa maior pluralismo: "há universidades que procuram contribuir
para a educação geral, e a Universidade de John Hopkins e Harvard
a partir de 1875, tentam imitar o modelo germânico, desenvolvendo
a pesquisa e o ensino pós-graduado; as leis Merrill, de 1862 em d!
ante, propiciam o aparecimento dos "land-grant colleges",
dedica-dos ao trabalho em artes mecânicas e ciências agrárias e
profunda-mente inseridos no contexto das comunidades locais; as pressoes s2
ciais por ensino superior permitem a criação múltipla de "junior
colleges"; as ciências pedagógicas atingem "status" universitário,
através dos "teacher colleges"; os "liberal arts co-Ileges" .. tanto se
dedicam ao primeiro ciclo de estudos, corno oferecem cursos
pós-gra-duados. Enfim, Kerr fala em mu~tiversidades, em oposição à
univer-sidade, e coloca~ corno ideal inatingível, a instituição que fosse
britânica pelo tratamento dispensado a seus alunos de cursos de
graduação; alemã, pela preocupação com a pesquisa e a
pós-gradua-ção; norte-americana pelo objetivo de servir ao público e tão
con-f usa quan o posslve t .. I para preservar o lnstave ' .. I equl ' l " b ' ,,26 1 rlo .
Tal inovação, segundo observadores do resto do mundo, "não
passava de urna caricatura da verdadeira universidade, quando na
realidade representava um avanço extraordinário em relação às
con-- .. - . . ,,27 ,
cepçoes aristocraticas dos padroes classicos . Dada a sua organ~
zação de estrutura diversificada e flexível, ao mesmo tempo em que
prepara cientistas" prepara trabalhadores comuns com terceiro
ní-vel. Esta é a maior originalidade de sua estrutura.
Enquanto a Universidade Francesa entra em retrocesso,co~
seqüência da burocratização, a Universidade americana
caracteriza--se pela ausência de burocracia; a autonomia didático-administrati
va, exercida pela atuação de "Boards" locais de composição
repre-sentativa da comunidade, é o oposto à subordinação a controles cen
tralizados.
Na opinião de Whitchead, teórico da Universidade america
na, "a Universidade é um centro de progresso baseado no ensino e
na pesquisa, mas sendo ambos orientados mais pàra a ação do que p~
ra o saber, corno pretendia Jaspers,,28.
A universidade americana é bem diversa da universidade in
-glesa. Isto porque nao surge corno uma corporaçao de professores,m~
corno um empreendimento social, sob o controle de um conselho
não-26 CASTRO,
cêLla.
Lú.cia. Monte-ÚtO de. 0.6 Me.ó:tJta.do.6 de Edueação na Gu.anabaJta.. Uyú-veMidade FedellfLt Ffumine.1't6 e. Nde.Jtoi, 197 5, p. 15 O.27 CUNHA, Nádia Fnaneo de. op. cit.,
p.
269.28 FÃVERO, MaJÚa. de LouJz..de.ó de Atbu.qu.eJtqu.e. Re6le.xõu .6obJte a UniveMidade. na
21.
f , ' 1 29 d ' "
--pro lSSlona , ten o em vlsta as contingencias de uma
socieda-de nova em processo socieda-de evolução sob o impacto da revolução democr~
tica e industrial do século XIX,,30. A Universidade americana trans
forma-se, desta forma, numa empresa formidável de produção de
co-nhecimento, de treinamento profissional e de pesquisa, confirmando
-se a relação imediata e direta desta instituição com a sociedade.
O fenômeno só ocorreu porque, estruturalmente, apresentou um
mode-lo diferente daquele proposto pela antiga universidade tradicional
-uma reunião de professores e alunos para estudarem. Assim, tendo
em vista as transformações sociais, os Estados Unidos passam a ela
borar e criar a sua cultura, e essa cultura deveria ser estudada
na universidade, para se tornar possível o seu ensino. Isto
repre-sentava, também, uma estratégia política na formação de uma nova
consciéncia nacional, ligada diretamente aos interesses de uma
so-ciedade hegemônica, ciosa de atingir o seu pleno desenvolvimento.
Ao assumir tal posição, não significa que tenha rompido com a
Uni-versidade alemã, pelo contrário, vai busc~r também novos rumos
na-quela Universidade, ai colhendo a inspiração para contituir a sua
verdadeira universidade moderna, que lembra a alemã, toda dedicada
a pesquisa e à descoberta do conhecimento científico.
Na Universidade de Dublin, o Cardeal Newman parte cb prin
cipio que, se o objetivo da Universidade fosse a pesquisa, nao
ha-veria necessidade de estudantes. Soube com mestria defini-la:
"PCVta que. e.x.wte. a un..-tve.Midade.? PCVta le.van
:taJt o :tônu.ó inte.le.c.:tual da .óoue.dade.; paJÜi c.uUivaJt o e..ópZtú;to pú.blic.o; paJta puJl.i6ic.aJt
o go.ó:to nauo nal; pCVta .óupJUJr.. O.ó
veJtdade.i-/W.ó ptr..inc.Zpio.ó que. de.veJYI Jte..óp.úuvz.. o
e.n:tu.ói-a.ómo populaJt e. o b j e.tivo.ó 6undame.n:tai.6 da.ó
a.ópiMç.Õe..ó populaJte..ó; pCVta .daJt laJtgue..óa e.
.óobJtie.dade. àJ:, idúa.ó da époc.a; pCVta
6ac.Ã..li-:taJt o e.xe.Jtuc.io do.ó pode.Jte..ó po~c.O.ó e.
pa-Jta ne.~inan o inteJtc.uMO .óoc.ial da vida
pJti-vada"
31 .
29 Na Un..-tve.Jt.óidade. napole.ônic.a e. na Unive.Midade. bna.ó ile.iJta , o Gove.nno me..ómo .óe.
ap/Wpwu da Un..-tve.Jt.óidade., c.omo óngão da .óoúe.dade.. Ma.ó, dada.ó a.ó oJtige.n.ó de.
moCJtáti.c.a.ó da .óoue.dade. anglo-.óaxônic.a, e.la não pÔ.ó o GoveJtno ~gindo a U-::
nive.Jt.óidade., ma.ó um Con.óe.lho Le.igo, não p/W 6.w.óio nal, alguma.ó ve.ze..ó e.lwo
pe.lo povo, ou:tJta.ó e..óc.o..ehido pe.lo Gove.nnadon do E.ótado ou pe.lo óngão 6undadon
ou ,!!an:te.ne.doJt da Unive.Jt.óidade. - c.ila
AnZ.óio
T e.ixe.iJta. Uma Pe.Jt.ó ye.c.tiva da Educ.aç.ao Supe.wJt
no
BJta.óil. Re.vi.ó:ta BJta.óile.iJta de. E.ó:tudo.ó Pe.dagogic.o.ó, Rioele
Jane.ino, (50): 41, jul./.óe.:t., 1968.
30 I bideJYI , p. 41.