LEDA MARQUES DE OLIVEIRA-BARROS
Avaliação histológica e imunoistoquímica da inervação
intestinal em cães portadores de intussuscepção
submetidos a enterectomia
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Clínica Cirúrgica
Veterinária da Faculdade de Medicina
Veterinária e Zootecnia da Universidade de
São Paulo para obtenção do título de Mestre
em Medicina Veterinária
Departamento:
Cirurgia
Área de concentração: Clínica Cirúrgica Veterinária
Orientador:
Profa. Dra. Julia Maria Matera
São Paulo
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO-NA-PUBLICAÇÃO
(Biblioteca Virginie Buff D’Ápice da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo)
T.2028 Oliveira-Barros, Leda Marques de
FMVZ Avaliação histológica e imunoistoquímica da inervação intestinal em cães portadores de intussuscepção submetidos a enterectomia / Leda Marques de Oliveira-Barros. – São Paulo : L. M. Oliveira-Barros, 2008. 114 f. : il.
Dissertação (mestrado) - Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia. Departamento de Cirurgia, 2008. Programa de Pós-Graduação: Clínica Cirúrgica Veterinária. Área de concentração: Clínica Cirúrgica Veterinária. Orientador: Profa. Dra. Julia Maria Matera.
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome: OLIVEIRA-BARROS, Leda Marques de
Título: Avaliação histológica e imunoistoquímica da inervação intestinal em cães portadores de intussuscepção submetidos à enterectomia
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Clínica Cirúrgica
Veterinária da Faculdade de Medicina
Veterinária e Zootecnia da Universidade de
São Paulo para obtenção do título de Mestre
em Medicina Veterinária
Data:____/____/____
Banca Examinadora
Prof. Dr. _________________________ Instituição: __________________
Assinatura: _________________________ Julgamento: _________________
Prof. Dr. _________________________ Instituição: __________________
Assinatura: _________________________ Julgamento: _________________
Prof. Dr. _________________________ Instituição: __________________
Ao Luiz Felipe, porque o amo mais que tudo. Por tanto companheirismo, apoio,
incentivo, dedicação, paciência e amor.
Aos meus pais Roberto e Silvia, por serem tão especiais e terem dedicado suas
vidas à minha formação.
A toda minha família, meu porto-seguro, por serem o alicerce da minha vida e
sempre acreditarem na minha capacidade.
Aos meus sogros Silvia e Paulo Sérgio, pelo incentivo e exemplo.
À Thais Andrade Costa Casagrande, por ter sido muito mais do que uma amiga e
muito mais do que uma companheira.
Ao Thunder, amigo fiel e leal.
“Nenhum caminho é longo demais quando estamos com quem amamos”
AGRADECIMENTOS
À Profª. Drª. Julia Maria Matera, pela orientação, confiança e por ser um exemplo de
integridade moral e ética. Tenho muito orgulho de ser sua orientada.
Aos amigos de pós-graduação Ayne, Sam, Carol, Kelly, Leandro e Marcos, pela
companhia valiosa e por dividirem momentos tão especiais.
Ao Bruno Cogliatti, pelos “ensinamentos imunoistoquímicos” e por tanta paciência e
disponibilidade.
Ao Heidge Fukumasu, pela amizade e por tantas ajudas valiosas.
À Profª. Drª. Maria Lucia Zaidan Dagli por disponibilizar a infra-estrutura para a
execução do trabalho e à Marguite pela suporte durante as imunoistoquímicas.
Ao Prof. Dr. José Luiz Catão-Dias por ser um amigo tão especial e presente.
À Profª. Drª. Silvia Renata Gaido Cortopassi e seus pós-graduandos, por cuidarem
sempre tão bem dos animais na UTI.
Às médicas veterinárias do Serviço de Cirurgia e aos médicos veterinários do
Serviço de Anestesia, pelo convívio prazeroso e pelos conhecimentos transmitidos.
Aos enfermeiros Lélis, Jesus, Otavio e Miron, com os quais sempre pude contar.
Ao Ney e a Alessandra, pelas inúmeras ajudas e favores.
Às bibliotecárias, em especial a Elza, pela formatação da tese.
À Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo
À CAPES e à FAPESP pelo suporte financeiro durante o período do mestrado.
Aos proprietários e aos animais que contribuíram com este estudo, meus sinceros
agradecimentos e respeito.
A todas as outras pessoas que de alguma forma contribuíram para o
RESUMO
OLIVEIRA-BARROS, L. M. Avaliação histológica e imunoistoquímica da inervação intestinal em cães portadores de intussuscepção submetidos à enterectomia. [Histologic and immunohistochemical evaluation of intestinal innervation in dogs with intussusceptions submitted to enterectomy]. 2008. 114 f. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária) – Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
O objetivo do presente trabalho foi avaliar a preservação da inervação de porções
intestinais macroscopicamente viáveis em cães portadores de intussuscepções.
Para tanto, realizou-se comparação entre segmento intestinal proveniente deste
grupo de animais (G1) e segmentos intestinais de animais sem qualquer distúrbio do
aparelho digestório (G2). Avaliações histológicas e imunoistoquímicas foram
realizadas em sistema computadorizado (Image Pro-Plus®) além da avaliação tardia
da qualidade de vida e função digestiva. As variáveis analisadas foram: densidade
média das camadas musculares circular e longitudinal, relação entre as camadas
musculares, número média de plexos mioentéricos, densidade celular média dos
plexos mioentéricos, grau de degeneração neuronal nos plexos mioentéricos,
imunoreatividade à sinaptofisina e ao NSE além de existência de distúrbios de
defecação. Com exceção da densidade celular média da camada longitudinal,
relação entre as camadas musculares e imunoreatividade à sinatpofisina, todos os
demais parâmetros apresentaram diferença estatisticamente significativas entre os
grupos testados. Foram observadas correlações entre densidade celular média dos
plexos mioentéricos e densidade celular média da camada muscular circular; grau de
vacuolização dos plexos mioentéricos e imunoreatividade ao NSE; além de grau de
vacuolização dos plexos mioentéricos e densidade celular média dos plexos
mioentéricos. Quanto aos anticorpos utilizados, o NSE apresentou melhor padrão de
marcação quando comparado à sinaptofisina. Dos 13 cães pertencentes ao G1, três
foram a óbito no pós-operatório inicial. No período pós-operatório tardio, três cães
apresentaram alterações de consistência e freqüência de defecação, além de
episódios diarréicos agudos intermitentes. O tempo de segmento foi de 6 meses
intestinais macroscopicamente viáveis podem apresentar lesões de inervação
eventualmente traduzidas em sintomatologia clínica futura. Assim sendo, deve-se
avaliar de maneira cuidadosa a margem cirúrgica preservada durante o
procedimento de enterectomia/enteroanastomose bem como realizar
acompanhamento da função digestória tardia.
Palavras-chave: Intussuscepção. Cães. Histologia (avaliação). Imunoistoquímica
ABSTRACT
OLIVEIRA-BARROS, L. M. Histologic and immunohistochemical evaluation of intestinal innervation in dogs with intussusceptions submitted to enterectomy
[Avaliação histológica e imunoistoquímica da inervação intestinal em cães portadores de intussuscepção submetidos à enterectomia]. 2008. 114 f. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária) – Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
The purpose of this study was to evaluate the preservation of the innervation of
macroscopically viable bowel segments of dogs with intussusceptions. This group
(G1) was compared to bowel segment of normal dogs (G2). Histological and
immunohistochemical analysis were performed using computed system (Image
Pro-Plus®). Late assessment of the quality of life and digestive function were also
evaluated. Analyzed variables included: mean density of circular and longitudinal
muscular layers cells, ratio between muscular layers, mean of myenteric plexuses,
mean density of myenteric cells, neuronal degeneration degree in myenteric plexus,
synaptophysin and NSE immunoreactivity and defecatory disorders. All tested
parameters, except mean density of longitudinal muscular layers cells, ratio between
muscular layers and synaptophysin immunoreactivity, showed statistical differences
when group G1 was compared with group G2. Correlations between mean density of
myenteric cells and mean density of circular muscular layers cells; neuronal
degeneration degree in myenteric plexus and NSE immunoreactivity; neuronal
degeneration degree in myenteric plexus and mean density of myenteric cells were
observed. Regarding the immunohistochemical antibodies, NSE showed better
staining pattern than synaptophysin. Three animals of G1 (n=13) died during the
initial post-operative period. During the late post-operative period, three animals
presented disorders in fecal consistency, frequency of defecation and acute
intermittent diarrheal episodes. The follow-up time was 6 months. These findings
showed that macroscopically viable bowel segments can present innervation damage
eventually translated in clinical symptoms in the future. So, a careful evaluation of the
preserved surgical margin during enterectomy and enteroanastomosis must be
Keywords: Intussusception. Dogs. Histology (evaluation). Immunohistochemical
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
eNOS óxido nítrico sintetase endotelial
FMVZ/USP Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da
Universidade de São Paulo
G1 grupo um
G1A grupo de animais portadores de intussuscepções e localização
anterior à obstrução
G1P grupo de animais portadores de intussuscepções e localização
posterior à obstrução
G1D animais do grupo um com alterações no período pós-operatório
tardio
G1O animais do grupo um não avaliados no período pós-operatório
tardio
G1S animais do grupo um sem alterações no período pós-operatório
tardio
G2 grupo dois
GFAP proteína glial fibrilar ácida
GIST tumor estromal do aparelho gastrointestinal
GNDF fator neurotrófico derivado da glia
H2O2 água oxigenada
IC intervalo de confiança
IL-6 interleucina tipo 6
iNOS óxido nítrico sintetase indutível
mg miligramas
mm milímetro
mm2 milímetro quadrado
MMC complexo motor migratório
MSE enolase músculo-específico
n número de amostras
NGF fator de crescimento de neurônios
NNE enolase não-neuronal
NO óxido nítrico
NOS óxido nítrico sintetase
NSE enolase neurônio-específica
PBS tampão fosfato salino
pCO2 pressão parcial de CO2
pH potencial hidrogeniônico
RNA ácido ribonucléico
SMT S-methylisothiourea
TNF- α fator de necrose tumoral alfa
VIP peptídeo intestinal vasoativo
µl mililitro
µm micrômetro
LISTA DE SÍMBOLOS
% porcentagem
x vezes
α alfa
beta
gama
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Quadro 1 – Descrição dos parâmetros clínicos e cirúrgicos dos animais acometidos por intussuscepção - FMVZ/USP. São Paulo, 2008 ... 68
Gráfico 1 – Representação gráfica da média e desvio-padrão da densidade celular da camada muscular circular - FMVZ/USP. São Paulo, 2008... 70
Gráfico 2 – Representação gráfica da média e desvio-padrão da densidade celular da camada muscular circular por subgrupo (quanto à localização) – FMVZ/USP. São Paulo, 2008 ... 71
Gráfico 3 – Representação gráfica da média e desvio-padrão da densidade celular da camada muscular longitudinal - FMVZ/USP. São Paulo,
2008... 72
Gráfico 4 – Representação gráfica da média e desvio-padrão da camada muscular longitudinal por subgrupo (quanto à localização) - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 72
Gráfico 5 – Representação gráfica da relação média entre as camadas musculares - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 74
Gráfico 6 – Representação gráfica da relação média entre as camadas musculares por subgrupo - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 74
Gráfico 7 – Representação gráfica da média e desvio-padrão do número médio de plexos mioentéricos - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 75
Gráfico 8 – Representação gráfica da média e desvio-padrão da densidade celular dos plexos miontéricos (mm2) - FMVZ/USP. São Paulo –
2008... 77
Gráfico 9 – Representação gráfica da distribuição do grau de vacuolização
dos plexos mioentéricos - FMVZ/USP. São Paulo – 2008... 78
Gráfico 10 – Representação gráfica da distribuição de escores de quantificação de imunoreatividade à sinaptofisina nos plexos mioentéricos - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 80
Gráfico 11 – Representação gráfica da distribuição de escores de quantificação de plexos mioentéricos imunoreativos à sinaptofisina - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 80
Gráfico 13 – Representação gráfica da distribuição de escores de quantificação de plexos mioentéricos imunoreativos ao NSE - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 83
Gráfico 14 – Representação gráfica da densidade celular da camada muscular longitudinal nos subgrupos quanto à avaliação tardia - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 87
Gráfico 15 – Representação gráfica da ausência de correlação linear entre o número de plexos mioentéricos e densidade celular dos plexos
mioentéricos - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 88
Gráfico 16 – Representação gráfica da ausência de correlação linear entre número de plexos mioentéricos e escore de imunoreatividade ao
NSE nos plexos mioentéricos - FMVZ/USP. São Paulo – 2008... 88
Gráfico 17 – Representação gráfica da correlação linear entre densidade celular dos plexos mioentéricos e densidade celular da camada
muscular circular - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 89
Gráfico 18 – Representação gráfica da correlação linear entre grau de vacuolização dos plexos mioentéricos e escore de imunoreatividade ao NSE nos plexos mioentéricos - FMVZ/USP.
São Paulo – 2008 ... 89
Gráfico 19 – Representação gráfica da correlação linear entre grau de vacuolização dos plexos mioentéricos e densidade celular dos plexos mioentéricos - FMVZ/USP. São Paulo – 2008... 90
Figura 1 – Fotomicrografia obtida por meio de microscópio de luz de plexos
mioentéricos - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 76
Figura 2 – Fotomicrografia obtida por meio de microscópio de luz, de plexos mioentéricos imunoreativos à sinaptofisina de acordo com escore
estabelecido - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 81
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Média, desvio-padrão, intervalo de confiança, valores mínimo e máximo da densidade celular da camada muscular circular - FMVZ/USP. São Paulo, 2008 ... 70
Tabela 2 – Média, desvio-padrão, intervalo de confiança, valores mínimo e máximo da densidade celular da camada muscular circular por
subgrupo (quanto a localização) – FMVZ/USP. São Paulo, 2008... 70
Tabela 3 – Média, desvio-padrão, intervalo de confiança, valores mínimo e máximo da densidade celular da camada muscular longitudinal -
FMVZ/USP. São Paulo, 2008 ... 71
Tabela 4 – Média, desvio-padrão, intervalo de confiança, valores mínimo e máximo da densidade celular da camada muscular longitudinal por subgrupo (quanto a localização) - FMVZ/USP. São Paulo –
2008... 71
Tabela 5 – Média, desvio-padrão, intervalo de confiança, valores mínimo e máximo da relação média entre camadas musculares - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 73
Tabela 6 – Média, desvio-padrão, intervalo de confiança, valores mínimo e máximo da relação média entre camadas musculares por subgrupo - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 73
Tabela 7 – Média, desvio-padrão, intervalo de confiança, valores mínimo e máximo do número médio de plexos mioentéricos - FMVZ/USP.
São Paulo – 2008 ... 75
Tabela 8 – Média, desvio-padrão, intervalo de confiança, valores mínimo e máximo da densidade celular dos plexos miontéricos (mm2) - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 77
Tabela 9 – Distribuição do grau de vacuolização dos plexos mioentéricos -
FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 78
Tabela 10 – Distribuição de escores de quantificação de imunoreatividade à sinaptofisina nos plexos mioentéricos - FMVZ/USP. São Paulo –
2008... 79
Tabela 11 – Distribuição de escores de quantificação de plexos mioentéricos
imunoreativos à sinaptofisina - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 80
Tabela 12 – Distribuição de escores de quantificação de imunoreatividade ao
Tabela 13 – Distribuição de escores de quantificação de plexos mioentéricos
imunoreativos ao NSE - FMVZ/USP. São Paulo – 2008... 83
Tabela 14 – Média e desvio-padrão de variáveis por subgrupo quanto à avaliação tardia - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 86
Tabela 15 – Distribuição das porcentagens de imunoreatividade ao NSE e sinaptofisina nos subgrupos quanto à avaliação tardia - FMVZ/USP. São Paulo – 2008 ... 86
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO... 22
2 REVISÃO DE LITERATURA... 25
2.1 Anatomia do aparelho digestório... 26
2.2 Histologia do aparelho digestório... 26
2.2.1 Intestino Delgado ... 28
2.2.2 Intestino Grosso ... 29
2.3 Inervação Intestinal... 29
2.4 Motilidade Intestinal... 30
2.5 Doenças Obstrutivas em cães... 35
2.6 Intussuscepção... 37
2.7 Avaliação da viabilidade intestinal... 44
2.8 Avaliação da viabilidade da inervação intestinal... 45
2.9 Imunoistoquímica... 51
2.9.1 Sinaptofisina... 52
2.9.2 Enolase Neurônio-Específica ... 53
3 OBJETIVO... 56
4 MATERIAL E MÉTODO... 58
4.1 Seleção dos animais... 59
4.2 Critério de exclusão... 59
4.3 Delineamento experimental... 60
4.4 Coleta de material... 60
4.5 Processamento do material... 61
4.5.2 Processamento imunoistoquímico... 61
4.6 Avaliação do material... 62
4.6.1 Avaliação histológica... 62
4.6.1.1 Mensuração das camadas musculares ...62
4.6.1.2 Quantificação do número de plexos mioentéricos...63
4.6.1.3 Mensuração da densidade celular dos plexos mioentéricos ...63
4.6.1.4 Determinação do grau de degeneração neuronal nos plexos mioentéricos...... 63
4.6.2 Avaliação imunoistoquímica ... 64
4.7 Avaliação pós-operatória tardia dos animais submetidos a enterectomia e enteroanastomose... 64
4.8 Análise estatística... 65
5 RESULTADOS... 66
5.1 Resultados histológico... 69
5.1.1 Mensuração das camadas musculares ... 69
5.1.1.1 Densidade celular das camadas musculares...69
5.1.1.2 Relação entre as camadas musculares...73
5.1.2 Quantificação do número de plexos mioentéricos... 75
5.1.3 Mensuração da densidade celular dos plexos mioentéricos ... 77
5.1.4 Determinação do grau de degeneração neuronal nos plexos mioentéricos ... 78
5.2 Resultados imunoistoquímicos... 79
5.2.1 Imunoreatividade à Sinaptofisina ... 79
5.3 Avaliação pós-operatória tardia dos animais submetidos enterectomia e enteroanastomose... 85
5.4 Correlação entre as variáveis analisadas... 87 6 DISCUSSÃO... 91
7 CONCLUSÃO... 101
1 INTRODUÇÃO
As afecções gastrointestinais são bastante freqüentes na clínica de pequenos
animais. Dentre estas, os quadros obstrutivos são considerados emergências
cirúrgicas e são responsáveis por altos índices de morbidade e mortalidade. A
intussuscepção é uma afecção importante no que diz respeito ao número de
pacientes afetados e ao risco inerente de morte. Além disso, busca-se não apenas
sua correção como também a completa recuperação da função intestinal.
A avaliação da viabilidade intestinal é ainda hoje um grande desafio para a
medicina humana e veterinária. Sua sub ou superestimação podem levar a
conseqüências desastrosas em um paciente, e devem ser cautelosamente
analisadas (ORLAND et al., 1993; BEILER et al., 2004). Embora existam diversos
métodos disponíveis para estimar a extensão de lesão tecidual, a análise
trans-cirúrgica ainda é discutida. A avaliação da inervação é ainda mais complexa e
eventualmente resulta em distúrbios motores pós-operatórios. Estudos sobre a
motilidade gastrointestinal iniciaram-se em 1833 por Beaumont que observou,
através de fistula gastrocutânea secundária a ferimentos, efeitos sobre o aparelho
digestivo de um militar ferido em combate. Em 1899, Bayliss e Starling descreveram
pela primeira vez a existência de movimentos peristálticos no intestino delgado. Na
medicina veterinária, este movimento foi observado em gatos apenas no ano de
1911 por Canon, com auxílio de fluoroscópio. Só em 1922 foi reportada a existência
de atividade elétrica digestiva (LOPASSO, 2004). Desde então, a contínua
observação deste aparelho tem mostrado seu comportamento fisiológico e permitido
a identificação de alterações patológicas, o que cresceu geometricamente com a
neurofisiologia, bioquímica celular e descoberta de neuro-hormônios (VIEBIG, 2006).
Atualmente, a comunidade científica tem pleno conhecimento da atividade
neuromotora intestinal, através da identificação de atividade elétrica e mensuração
de contrações intestinais. Porém, estas não são técnicas de simples execução e
ficam limitadas em algumas situações. O registro mioelétrico da função intestinal é
possível através de eletrodos implantados via laparotomia ou laparoscopia e não
necessitam de nova operação para sua retirada. Entretanto, necessitam de um
principalmente para a medicina veterinária. O mesmo ocorre com a utilização de
eletrodos via sondas nasoentéricas longas. Exatamente por apresentarem baixa
aplicabilidade, estes métodos não apresentam padronização e estão sujeitos a
interpretações controversas (ORLAND et al., 1993; LOPASSO, 2004).
O único método que permanecer clinicamente operacional é a observação de
motilidade intestinal por meio da progressão de coluna baritada. Entretanto, este
exame fornece apenas dados qualitativos e fragmentários. Mesmo os marcadores
radioisótopos, de tecnologia avançada, apresentam limitações quanto à imprecisão
na identificação do segmento intestinal em que ele se encontra (LOPASSO, 2004).
A busca por métodos alternativos inclui a utilização de avaliação histológica e
imunoistoquímica, com a finalidade de alcançar métodos mais quantitativos e desta
forma, evitar o aparecimento de alterações de motilidade intestinal.
2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 Anatomia do aparelho digestório
O aparelho digestório dos cães é composto por um aparelho segmentado em
cavidade oral, esôfago, estômago, intestino delgado e grosso, reto e ânus, e por
glândulas anexas: salivares, fígado e pâncreas (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004).
Relativamente longo, o intestino delgado se estende do piloro até o orifício
íleo-cólico. Engloba duodeno (porção relativamente fixa e curta), jejuno (porção
longa e móvel) e íleo (porção curta e terminal) (OLIVEIRA, 1995).
O intestino grosso por sua vez é subdividido em ceco, cólon e reto. Inicia-se
na porção ileocecal, estende-se até o ânus e apresenta diâmetro superior ao
delgado em toda a sua extensão. O ceco é um segmento intestinal curto de fundo
cego, com conexão apenas ao cólon imediatamente além da junção ileo-cólica. O
cólon pode ser dividido em três porções, de acordo com seu posicionamento
anatômico: cólon ascendente, transverso e descendente.
A principal função do aparelho digestório é obter moléculas necessárias para
o crescimento, manutenção e demais capacidades energéticas do organismo
através dos alimentos ingeridos. Para tal, são necessários processos como a
digestão, absorção e secreção de substâncias. Além disso, o aparelho
gastrointestinal tem relevante função imunológica, uma vez que constitui importante
barreira protetora entre meio externo (lúmen intestinal) e meio interno (JUNQUEIRA;
CARNEIRO, 2004).
2.2 Histologia do aparelho digestório
Todo o aparelho digestório apresenta características estruturais comuns.
Trata-se de um tubo oco composto por luz ou lúmen de diâmetro variável,
muscular e serosa (COOLMAN; EHRHART; MARRETTA, 2000; JUNQUEIRA;
CARNEIRO, 2004; PATRICIO; LANZONI, 2004).
A camada mucosa, mais interna, pode ser subdividida em revestimento
epitelial, lâmina própria de tecido conjuntivo frouxo, rico em vasos sanguíneos,
linfáticos e células musculares lisas, além da muscular da mucosa. Esta tem como
função promover a movimentação da mucosa independentemente de outros
movimentos do trato, aumentando assim o contato do órgão com o alimento
(COOLMAN; EHRHART; MARRETTA, 2000; JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004).
Na submucosa, encontra-se o plexo nervoso submucoso ou plexo de
Meissner além de vasos sanguíneos, linfáticos, glândulas e tecido linfóide
(COOLMAN; EHRHART; MARRETTA, 2000; JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004).
A camada muscular é composta por células musculares lisas orientadas em
espiral divididas em subcamada interna circular e externa longitudinal. A camada
circular propicia a segmentação e mistura da ingesta, enquanto a longitudinal, a
propulsão do conteúdo luminal (COOLMAN; EHRHART; MARRETTA, 2000). Entre
as camadas musculares encontra-se o plexo nervoso mioentérico ou plexo de
Auerbach além de tecido conjuntivo, vasos sanguíneos e linfáticos. Este plexo é
formado por agregados de células nervosas formadoras de gânglios e extensa rede
de fibras neuronais que possibilitam a comunicação interganglionar. Esta
composição nervosa é responsável pela geração e coordenação de impulsos
elétricos que controlam a contração muscular. Ao longo do aparelho digestório,
existe variação do numero de gânglios, sendo mais numerosos em regiões com
maior motilidade. A deficiência ou inexistência de controle nervoso acaba por gerar
perturbações da motilidade intestinal (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004).
A camada mais externa do aparelho digestório é chamada de serosa e é
constituída por tecido conjuntivo frouxo, tecido adiposo, vasos sanguíneos e grande
quantidade de vasos linfáticos. É revestida por epitélio pavimentoso simples,
denominado mesotélio.
A renovação intestinal por descamação é constante e baseia-se na divisão de
células-tronco presentes em varias porções intestinais. No intestino delgado, as
células morrem por apoptose no topo das vilosidades, de onde são descamadas
2.2.1 Intestino Delgado
Com a finalidade de aumentar a superfície de contato e conseqüentemente, o
poder de absorção, o intestino apresenta projeções alongadas de mucosa
(compostas por epitélio e lâmina própria) em direção ao lúmen, denominadas de
vilosidades intestinais. No duodeno, apresentam forma de folha e gradualmente
assumem forma de dedos em direção ao íleo. Entre os vilos, existem aberturas de
glândulas intestinais ou Glândulas de Lieberkühn denominadas criptas. As glândulas
intestinais possuem células-tronco, células enteroendócrinas, células absortivas,
células caliciformes (produtoras de muco protetor), células de Paneth. Estas últimas
apresentam ação antibacteriana, uma vez que são capazes de digerir lisozima,
constituinte da parede de microorganismos (PATRICIO; LANZONI, 2004). No jejuno,
porém não exclusivamente nesta porção, encontram-se as plicaes circularis ou
válvulas de Kerckring, pregas permanentes de mucosa e submucosa com funções
semelhantes às vilosidades (PATRICIO; LANZONI, 2004). A movimentação da
camada muscular da mucosa, em comunicação com a da lâmina própria de todos os
vilos, é responsável pela movimentação rítmica das vilosidades, importante no
processo de absorção de nutrientes (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004).
A camada submucosa da porção inicial do duodeno apresenta um grupo de
glândulas tubulares enoveladas que se abrem em glândulas intestinais,
denominadas glândulas de Brünner ou glândulas duodenais. O produto de sua
secreção é alcalino (pH 8,1-9,3), o que propicia proteção da mucosa duodenal
contra os efeitos do suco gástrico e neutraliza o quimo para a ação de enzimas
pancreáticas (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004).
Importantes componentes do tecido linfóide, as Placas de Peyer são nódulos
linfáticos agregados, presentes na lâmina própria e submucosa do delgado. Nesta
2.2.2 Intestino Grosso
O intestino grosso apresenta camada mucosa sem vilosidades e sem pregas,
com exceção do reto. As glândulas intestinais são longas e apresentam grande
número de células caliciformes e absortivas, além de pequeno grupo de células
enteroendócrinas. Em virtude da abundância da população bacteriana nesta região,
a lâmina própria está repleta de células e nódulos linfóides. Semelhante ao intestino
delgado, a camada muscular é formada por porção circular interna e longitudinal
externa. Porém, as fibras da camada longitudinal externa se unem para formar três
bandas longitudinais espessas, denominadas tênias do cólon (JUNQUEIRA;
CARNEIRO, 2004).
Na região anal é possível a identificação de colunas retais ou de Morgagni,
definidas como uma série de dobras longitudinais formadas a partir da mucosa.
Próxima à abertura anal, a mucosa intestinal é substituída por epitélio pavimentoso
estratificado e a lâmina própria contém plexo de veias de grande calibre
(JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004).
2.3 Inervação Intestinal
A inervação intestinal é formada por um componente intrínseco e um
extrínseco. A inervação intrínseca, também denominada Sistema Nervoso Entérico,
é composta pelo Plexo Nervoso Mioentérico ou Plexo de Auerbach e pelo Plexo
Submucoso ou de Meissner. O primeiro e mais importante está localizado entre as
camadas musculares externas (ou longitudinais) e internas (ou circulares), enquanto
o segundo, na camada submucosa. A regulação da motilidade intestinal é atribuída
principalmente ao plexo de Auerbach, enquanto o de Meissner assegura o controle
de secreções e absorções do órgão (KHEN et al., 2004). Estes plexos contêm
neurônios efetores e neurônios sensoriais que recebem informações de terminações
nervosas quanto ao conteúdo (quimiorreceptores) e distensão da parede intestinal
autônomo, é formada por fibras colinérgicas parassimpáticas que estimulam a
musculatura lisa intestinal e por fibras adrenérgicas simpáticas, atenuantes da
atividade desta musculatura (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004).
O sistema intrínseco é responsável pela contração intestinal independente do
sistema extrínseco (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2004). As funções motoras dos
segmentos intestinais são executadas pelas camadas musculares. O quimo é
impulsionado poucos centímetros à frente por movimentos segmentares e pequenas
contrações peristálticas. Raramente uma onda percorre toda a extensão intestinal
(LOPASSO, 2004). Estas contrações rítmicas sincronizadas das camadas
musculares caracterizam o peristaltismo, impelindo o conteúdo intestinal para a
porção distal.
As células de Cajal são um grupo de células de origem mesenquimal do
aparelho gastrointestinal, inicialmente descritas por Santiago Ramón e Cajal em
meados do século XX. Estas células encontram-se em importante associação com
as camadas musculares e demais células nervosas. Elas são consideradas os
marcapassos intestinais através da geração de impulsos rítmicos, traduzidos em
ondas lentas. Funções adicionais incluem mediação de neurotransmissores e
participação na propagação ativa de eventos elétricos intestinais (HUDSON et al.,
1999; FINTL et al., 2004; KUBOTA et al., 2005). São identificadas em diferentes
espécies e em diferentes sítios histológicos, como plexo mioentérico, camada
muscular circular e submucosa (HUDSON et al., 1999; FINTL et al., 2004).
Alterações neste grupo celular podem levar ao desenvolvimento de tumores
estromais do aparelho gastrointestinal, conhecidos como GIST (JAIN et al., 2003)
2.4 Motilidade intestinal
O padrão de motilidade observado no intestino delgado é formado em
movimentos segmentais de mistura do conteúdo luminal e movimentos peristálticos
responsáveis pela propulsão do bolo. Ambos favorecem o contato do conteúdo com
secreções intestinais e a superfície de absorção (KOHN, 1992; OLIVEIRA, 1995). As
longo do intestino, determinando anéis de constrição que propulsionam o conteúdo
alimentar para segmentos distais. Os movimentos de segmentação são
representados por contrações concêntricas do lúmen espaçadas por poucos
centímetros, simultâneas e de curta duração, fazendo com que o bolo alimentar
misture-se com secreções do aparelho digestório. Finalmente, os movimentos
pendulares consistem de contração e relaxamento da musculatura longitudinal do
intestino. Os movimentos pendulares são de difícil avaliação, ao contrário dos dois
primeiros, passíveis de estudo por eletromiografia (OLIVEIRA, 1995; RASSLAN,
2007a).
Associados às contrações, observam-se dois tipos de atividades elétricas.
Originadas dos marcapassos intestinais localizados na camada longitudinal da
musculatura intestinal do duodeno proximal, as ondas lentas “slow waves” são
propagadas aboral ao longo da musculatura, porém não são responsáveis por
contrações propriamente ditas. Estas contrações dependem da despolarização
muscular decorrente das ondas lentas, mas são na eletromiografia associadas a
descargas de pico “spike bursts”, sobrepostas às primeiras. Desta forma, as ondas
lentas são responsáveis pela sincronização das contrações, enquanto as descargas
de pico são efetivamente as causadoras de contrações. O duodeno é responsável
pela descarga de aproximadamente 15 ondas lentas por minuto, número
ligeiramente reduzido no íleo (KOHN, 1992; LIN et al., 2002; BROWN, 2003;
GARCIA-CASADO; MARTINEZ-DE-JUAN; PONCE, 2005). As ondas lentas
chamadas “ondas marcapassos” e o ritmo básico determinam o tempo e a
freqüência máxima de contrações, que diminuem gradualmente do duodeno para o
íleo terminal (RASSLAN, 2007a).
Normalmente, o intestino delgado exibe uma alternância cíclica entre períodos
de atividade “spike bursts” e quiescência. Durante o jejum, o intestino encontra-se
relativamente quiescente, embora ocorram contrações para mover secreções, debrís
celulares e bactérias. Estas contrações, chamadas de Complexos Mioelétricos
Migratórios (MMC) são propagadas por todo o intestino delgado, automaticamente,
no período “interdigestivos” (LOPASSO, 2004). Desta forma, a continuidade
intestinal é fundamental para a propagação das MMCs. Em locais de anastomoses,
observa-se uma interrupção da propagação da MMC e reinício de complexos na
sobrepondo o estado de quiescência, o que está associado ao aumento da
motilidade e subseqüente digestão e transporte de ingestas (KOHN, 1992). Code e
Marlett (1975) realizaram a divisão do complexo motor migratório do aparelho
digestório em quatro fases. Na fase I, dita quiescência, observam-se ondas lentas
com potenciais de ação ocasional. Durante a fase II, os potenciais de ação
apresentam-se irregulares em freqüência e intensidade. A fase III é caracterizada
por potenciais de ação de alta amplitude superposta na sua quase totalidade por
ondas lentas. Na fase IV, a freqüência e a intensidade das potenciais de ação
diminuem rapidamente até iniciar-se um novo ciclo (RASSLAN, 2007a).
Já no intestino grosso, vêem-se dois padrões básicos de atividade elétrica
intestinal: pequenas descargas em pico com durações menores que 5 segundos e
usualmente localizadas, além de longas descargas em pico, com durações entre 10
e 20 segundos e que se propagam tanto oral quanto aboral. A proporção entre
longas e pequenas descargas em pico são responsáveis pelo tempo médio de
retenção da ingesta no intestino grosso, influenciando de forma considerável a
absorção de nutrientes e eliminação de fezes (RUCKEBUSCH, 1981).
Os marcapassos intestinais são essenciais para a perfeita motilidade
intestinal. É atribuído a este grupo celular a geração de atividade de ondas lentas,
fundamental para a coordenação do movimento. Acredita-se que a deficiência em
número ou função destas células acabem por gerar desordens motoras ou disritmias
digestivas (HUDSON et al., 1999; KUBOTA et al., 2005) e que esta disritmia na
geração de ondas lentas cause disfunção peristáltica e aumento no tempo de
trânsito alimentar (HUDSON et al., 1999). Este fato pode ser observado tanto em
doenças congênitas como adquiridas, entre elas aganglionoses intestinais, doença
de Hirschsprung, megacólon, doença de Crohn, constipações, estenose pilórica
hipertrófica, colite ulcerativa e pseudo-obstrução intestinal idiopática crônica
(HUDSON et al., 1999; WANG et al., 2000; KUBOTA et al., 2005; MATSUDA et al.,
2006; NEUNLIST et al., 2007). Alem disso, doenças sistêmicas como disautonomias
e miopatias além da administração de determinadas drogas também podem
ocasionar disfunções entéricas por alterações nas células de Cajal (AROCH et al.,
1997; KUBOTA et al., 2005).
O estudo do envolvimento das células de Cajal na motilidade intestinal sofreu
c-kit codificadores do receptor transmembrânico tirosina-quinase. O uso de
anticorpos anti c-kit passou a representar uma das formas mais objetivas de
avaliação dos marcapassos intestinais (HUDSON et al., 1999; FINTL et al., 2004).
Acredita-se que a musculatura intestinal apresente tônus inerente e atividade
rítmica espontânea sem participação da inervação intrínseca e extrínseca (NEELY;
CATCHPOLE, 1967). Além disso, as ondas lentas e MMCs são geradas
independentemente da inervação extrínseca e mesmo na ausência desta inervação,
pode-se observar peristaltismo. O único pré-requisito para a motilidade organizada é
a integridade de plexos nervosos mioentéricos de Auerbach e Meissner
(RUCKEBUSCH, 1981).
A motilidade intestinal depende da preservação da função de músculos,
junções neuromusculares, controle endócrino e neural. Disfunções de um ou mais
destes componentes pode levar a perda do controle, diminuição ou atividade
aberrante (AROCH et al., 1997).
Diversos são os fatores moduladores da atividade mioelétrica intestinal,
incluíndo presença de alimento, atividade hormonal, ativação simpática e
parassimpática além de lesões ou destruições das células envolvidas, tanto
musculares quanto nervosas.
Sabe-se que após alimentação, a distensão intestinal com quimo estimula
receptores miontéricos locais que estimulam a motilidade proximal ao quimo e
inibem motilidade distal a ele, resultando em peristaltismo.
A inervação extrínseca, composta pelo sistema nervoso simpático e
parassimpático, modula os plexos nervosos mioentéricos através de efeitos
inibitórios e excitatórios, interferindo desta forma na motilidade intestinal. Os efeitos
inibitórios simpáticos são mediados por nervos esplâncnicos, gânglios
paravertebrais, cordão espinal ou combinações entre eles. Quanto ao reflexo
parassimpático excitatório, as vias aferentes incluem receptores de tensão na
musculatura sensíveis a estímulos mecânicos como distensão moderada e
contração, e receptores da mucosa que respondem a estímulos táteis e químicos. A
via parassimpática eferente utiliza os nervos vago e pélvico (KOHN, 1992).
Deve-se ainda contar com a interferência de substâncias endógenas que
contribuem na manutenção da homeostase da motilidade intestinal. Dentre as
colecistoquinina e o glucagon, sendo que este último age apenas na musculatura
colônica. A secretina, o peptídeo gástrico inibitório e o peptídeo intestinal vasoativo
(VIP) contribuem para a diminuição da movimentação do intestino. A motilina
peptídica intestinal estimula a motilidade de porções anteriores do intestino delgado
e cólon, além de deflagrar MMCs observados no período entre digestões. Esta
substância aumenta a atividade mioelétrica e miomecânica do jejuno e íleo, além de
reduzir o tempo de trânsito de fluídos entre estômago e ceco de pôneis (KOHN,
1992). Drogas como a eritromicina atuam de forma semelhante a motilina,
aumentando o esvaziamento gástrico (AROCH et al., 1997).
Outra substância envolvida é a dopamina, um importante neurotransmissor
inibitório de musculatura lisa. Desta forma, a utilização de drogas
antidopaminérgicas (parassimpatomiméticas) pode contribuir na restituição ou
manutenção da motilidade intestinal. Um destes exemplos é a metoclopramida, que
estimula e coordena atividade motora gástrica, pilórica e duodenal além de acelerar
o esvaziamento gástrico e diminuir o tempo de trânsito do intestino delgado. A
neostigmina também é classificada como droga parassimpatomimética inibidora de
acetilcolinesterase (AROCH et al., 1997). Em cães, pode ser utilizada na dose de
0,5mg pela via intramuscular, com previsão de defecação após 20 minutos de sua
administração (AROCH et al., 1997).
As prostaglandinas não têm sua via de ação totalmente elucidada, porém
sabe-se que sua liberação está relacionada à contração muscular e que está
presente tanto em intestino delgado quanto grosso. Em geral, prostaglandinas E e F
contraem a porção muscular longitudinal, enquanto o subtipo E relaxa e o F contrai a
porção circular. Esta droga despertou a atenção de diversos pesquisadores quanto à
possibilidade de reverter ou minimizar o íleo paralítico. Entretanto, existe uma
variação tecidual da ação das prostaglandinas em musculatura lisa ainda pouco
definida (WILSON; KAYMAKCALAN, 1981). Acredita-se que o subtipo PGE1 possa
diminuir a motilidade de intestino delgado em cães (SHEHADEH; PRICE;
JACOBSON, 1969).
A substância P é um peptídeo encontrado não somente em cérebro, mas
também em outros tecidos como o intestino, agindo como biotransmissor neste
O óxido nítrico (NO), inicialmente identificado como um fator relaxante
derivado do endotélio tem sido reconhecido como importante neurotransmissor
inibitório não adrenérgico, não colinérgico no intestino, interferindo na motilidade e
contração muscular (WANG et al., 2000; SUNG et al., 2006). A enzima óxido nítrico
sintetase (NOS), responsável pela síntese de NO, apresentam três isoformas:
indutível (iNOS), endotelial (eNOS) e neuronal (nNOS). As nNOS, expressas
constitutivamente em baixos níveis, são encontradas nos plexos mioentéricos. As
indutíveis, usualmente ausentes, podem ser expressas em situações de inflamações
e endotoxemia bacteriana (WANG et al., 2000). Acredita-se que o NO participe em
diversas enteropatias que cursem com alterações motoras, uma vez que neurônios
inibitórios não adrenérgicos não colinérgicos são reguladores da fase de
relaxamento do peristaltismo (WANG et al., 2000; SUNG et al., 2006). Na vigência
de processos inflamatórios, tem-se a elevação sistêmica de NO e NOS associado ao
aumento de demais mediadores inflamatórios, podendo resultar em alteração do
padrão de motilidade e maior incidência de intussuscepções. A administração de
inibidores da cicloxigenase podem contribuir para a normalização da motilidade
intestinal, bem como a utilização de inibidores específicos da enzima óxido nítrico
sintetase (WANG et al., 2000; TÜRKYILMAZ et al., 2004; SUNG et al., 2006).
2.5 Doenças obstrutivas em cães
Haymond (1935) define a gravidade dos quadros obstrutivos e suas
possibilidades terapêuticas como
[...] Frente a um doente portador de necrose intestinal
extensa, tem o cirurgião duas opções: deixar o doente morrer ou
tentar salvá-lo em esforço heróico, praticando a ressecção... Criando
um grande “enterectomizado” com todas as suas conseqüências
As afecções do aparelho gastrointestinal têm ocorrência freqüente na clinica
de pequenos animais. Dentre as enfermidades que acometem o intestino delgado ou
grosso, tem-se especial relevância as classificadas como obstrutivas, nas quais
existe uma impossibilidade total ou parcial de progressão do conteúdo intestinal. São
mais freqüentes e preocupantes quando no intestino delgado pelo seu diâmetro
diminuto quando comparado com o grosso (KOHN, 1992).
As obstruções intestinais podem decorrer de diversas causas, classificadas
como mecânicas ou funcionais. Nas primeiras, existe uma barreira física
comprometendo a manutenção do aparelho digestório e incluem-se corpos
estranhos, presença de massas intraluminais ou intramurais, compressões
extramurais abdominais e as intussuscepções, com importância pela sua urgência
em resolução, uma vez que ameaça a vida do paciente (KOHN, 1992; PASSOS;
VALLE; NETTO, 2001).
As alterações de motilidade, distúrbios funcionais da força propulsora da
musculatura do intestino ou lesões da inervação intestinal compreendem as
alterações obstrutivas funcionais. O íleo paralítico pode se apresentar de três
formas: íleo adinâmico, em que a ineficiência é resultante do relaxamento da
musculatura; íleo dinâmico, em que se observa espasmo desta musculatura e íleo
da oclusão vascular, caracterizado pela incapacidade de coordenação motora em
conseqüência de morte celular resultante de isquemia. O íleo adinâmico é o mais
comum e freqüentemente ocorre após cirurgias abdominais. Em todos os casos, a
luz intestinal encontra-se pérvia, porém não existem ondas peristálticas e a
auscultação revela silêncio abdominal (KOHN, 1992; PASSOS; VALLE; NETTO,
2001; POGGETTI; PORTA; FONTES, 2004).
Além da classificação etiológica, ainda podemos definir a obstrução quanto ao
comprometimento da vascularização do segmento intestinal envolvido, sendo
simples, sem comprometimento vascular, ou com estrangulamento (KOHN, 1992;
PASSOS; VALLE; NETTO, 2001).
Outra classificação importante, principalmente para a terapêutica do paciente,
é quanto à localização do intestino envolvido: obstrução alta de intestino delgado,
baixa de intestino delgado e de intestino grosso. A determinação da porção
porém o diagnóstico definitivo só será alcançado com a visualização da alça
envolvida e grau de comprometimento (PASSOS; VALLE; NETTO, 2001).
A causa da obstrução não deve ser o alvo da investigação inicial. O
diagnóstico da obstrução é mais importante que o diagnóstico de sua causa. Este é
sempre clínico, porem deve contar com a ajuda de exames de imagem e/ou
laboratoriais para o seu sucesso. A atenção para o diagnostico precoce e instituição
do tratamento adequado reduz os índices de mortalidade e morbidade dos animais
acometidos. Hérnias, aderências, massas abdominais, corpos estranhos e
intussuscepções são causas freqüentes de obstrução. Porém, estes dados podem
variar com relação à localização geográfica, raça, idade e manejo do animal
(PASSOS; VALLE; NETTO, 2001).
2.6 Intussuscepção
Intussuscepção é definida como a invaginação de uma porção do aparelho
gastrointestinal, chamada de intussusceptum, sobre o lúmen da porção adjacente,
denominada intussuscepiens (LAMB; MANTIS,1998; HEDLUNG, 2002; MACPHAIL,
2002). Freqüentemente e observada na porção normógrada, ou seja, no sentido
peristáltico, porem existem relatos na direção retrograda ou também denominada de
oral. (LEWIS; ELLISON,1987; APPLEWHITE; HAWTHORNE; CORNELL, 2001;
PATSIKAS et al., 2005). Outra classificação passível de ser utilizada é quanto ao
numero de intussuscepções, podendo estas serem únicas, múltiplas ou compostas
(LEWIS; ELLISON, 1987).
Sua fisiopatologia ainda não esta totalmente elucidada, porém sugere-se
estar relacionada a alterações da atividade motora nos segmentos acometidos, o
que resultaria na descontinuidade intestinal, com porções apresentando maior
flacidez ou rigidez em comparação às adjacentes. As maiores conseqüências
citadas da intussuscepção são obstrução parcial ou total, isquemia, necrose e
ruptura intestinal (LEVITT; BAUER, 1992). Normalmente assume forma curva e de
Segundo Barker, Van Dreumal e Palmer (1993) o tamanho limite observado em cães
é de aproximadamente 12 centímetros.
Eventos desencadeados pelo processo de invaginação intestinal podem ser
classificados quanto ao curso da doença. Inicialmente ocorre estrangulamento do
retorno venoso com dilatação e congestão. Estágios mais avançados apresentam
exsudação de fibrina da superfície serosa, responsável pela aderência intestinal. A
obstrução permanente dos vasos esta relacionada com isquemia e necrose, fatores
determinantes para o desenvolvimento de perfurações e rupturas intestinais tardias
(PATSIKAS et al., 2005).
Todas as porções de intestino podem ser acometidas, entretanto, observa-se
maior incidência no segmento ileo-cólico tanto em animais quanto em humanos
(LEVITT; BAUER, 1992; LAMB; MANTIS, 1998; APPLEWHITE; HAWTHORNE;
CORNELL, 2001; MACPHAIL, 2002). Não existe predisposição sexual e racial
descritas na literatura. Quanto à distribuição etária, parece haver um maior
acometimento de animais jovens (até um ano de idade), provavelmente relacionado
a grande incidência de gastroenterites/enterites infecciosas. Guilford e Strombeck
(1996) sugerem que cerca de 80% dos casos sejam representados por esta faixa
etária. A ocorrência em animais idosos geralmente esta relacionada a processos
neoplásicos, o que também é relatado na literatura medica (BILELLO; PETERSON,
2005; DRASKOVIC et al., 2005; JAREMKO; RAWAT, 2005; KAMO et al., 2005).
Dentre os fatores predisponentes deve-se ressaltar as alterações de dieta,
presença de corpos estranhos, granulomas ou massas gastrointestinais,
gastroenterites/enterites infecciosas ou não, parasitismo intestinal e cirurgias
previas, alem da forma idiopática, freqüente nos cães (GUILFORD; STROMBECK,
1996; MEYER, 1996; APPLEWHITE; HAWTHORNE; CORNELL, 2001; MACPHAIL,
2002). Relatos verificam ocorrência de intussuscepções após cirurgias abdominais
como transplantes renais (DU TOIT et al., 1981). A indução de mediadores
inflamatórios como prostaglandinas e óxido nítrico são relacionados com quadros de
intussuscepções, uma vez que apresentam importância na manutenção da
motilidade intestinal (TÜRKYILMAZ et al., 2004). As intussuscepções após quadros
de intoxicação por carbamatos são pouco relatadas na literatura, porém passível de
ocorrência. Corfield et al. (2008) descrevem a ocorrência em três cães com intervalo
fisiopatologia relacionada a hipermotilidade gastrointestinal decorrente da maior
estimulação de receptores muscarínicos parassimpáticos.
Diversos são os sinais clínicos que cursam com esta enfermidade, desde
alterações inespecíficas como anorexia, disorexia, depressão, letargia, perda de
peso, êmese, diarréia por vezes hemorrágica, sensibilidade e distensão abdominal.
Estes últimos resultantes da obstrução intestinal, supercrescimento bacteriano,
isquemia e infarto da porção acometida além de peritonite focal ou difusa
(GUILFORD; STROMBECK, 1996; MEYER, 1996; LAMB; MANTIS, 1998;
ARONSON; BROCKMAN; BROWN, 2000; MACPHAIL, 2002).
Muitos dos quadros de intussuscepção podem ser diagnosticados através da
palpação abdominal, localizando e delimitando estrutura tubular firme, que deve ser
diferenciada de conteúdo fecal ou corpos estranhos (GUILFORD; STROMBECK,
1996). Em estudo realizado com nove gatos e 36 cães, 53% dos animais
apresentaram palpação abdominal compatível com o quadro (LEVITT; BAUER,
1992). Para o diagnóstico definitivo, pode-se valer do uso de técnicas de imagem,
das quais o ultra-som apresenta maior acurácia, sensibilidade e especificidade. O
raio-X simples e contrastado, endoscopia e colonoscopia também apresentam
utilidade. Dos exames radiográficos contrastados, utiliza-se com maior freqüência o
enema de bário pela localização preferencial das porções acometidas. O trânsito
gastrointestinal pode fornecer o mesmo resultado necessitando de maior tempo de
exame.
Na avaliação radiográfica, freqüentemente encontra-se anormalidade da
distribuição de alças no abdômen, dilatação intestinal, presença de variável
quantidade de líquido e gás em região cranial a obstrução até a observação de
estrutura de radiopacidade água (intussuscepção propriamente dita). No exame
contrastado, podem-se observar dilatações intestinais além da dificuldade ou
impossibilidade da progressão do marcador. As características ultra-sonográficas
normalmente ressaltadas são múltiplas linhas paralelas em cortes longitudinais e
múltiplos anéis concêntricos hiperecóicos e hipoecóicos ao redor de centro
hiperecóico em cortes transversais, comumente correlacionados as imagens de
alvos ou olhos de bois (LAMB; MANTIS, 1998; PATSIKAS et al., 2003; PATSIKAS et
al., 2004; PATSIKAS et al., 2005). São citadas como vantagens da técnica
tempo de exame, avaliação de estruturas adjacentes como linfonodos e, de forma
mais importante, avaliação da viabilidade intestinal e redutibilidade da
intussuscepção com o auxilio do modo Doppler (LAMB; MANTIS, 1998; PATSIKAS
et al., 2005). Seu uso tem sido extensamente descrito em humanos, nos quais são
utilizadas com muita freqüência técnicas de redução pneumática ou hidrostática,
sem a necessidade de submeter o paciente à intervenção cirúrgica. Para os animais,
esta contribuição mostra-se de grande valia para o planejamento cirúrgico e
prognostico. A ausência de fluxo sanguíneo ao exame esta intimamente relacionada
com impossibilidade na redução da intussuscepção e presença de aderências,
desvitalização de tecido e perfurações. Patsikas et al. (2005) avaliaram pelo modo Doppler, 15 animais jovens da espécie canina com quadro de intussuscepção. Três
animais não apresentavam fluxo sanguíneo nas intussuscepções que, ao
procedimento cirúrgico, mostraram-se irredutíveis. Dos animais com fluxo
preservado, 75% tiveram suas lesões reduzidas manualmente e apenas três
necessitaram de enterectomias.
Na medicina veterinária, o tratamento de escolha ainda é o cirúrgico, no qual
podem ser realizadas técnicas de redução manual, ressecção da porção acometida
associada a enteroanastomose e uso de enteroplicações (HEDLUNG, 2002;
MACPHAIL, 2002; BROWN, 2003). A escolha da técnica depende da viabilidade e
grau de lesão intestinal (MACPHAIL, 2002). Os quadros recentes podem ser
reduzidos mecanicamente, através de uma leve tração das porções adjacentes às
acometidas (ARONSON; BROCKMAN; BROWN, 2000). Em contra partida,
intussuscepções crônicas freqüentemente necessitam de enterectomias devido a
lesões irreversíveis do tecido ou irredutibilidade da intussuscepção. Applewhite,
Hawthorne e Cornell (2001) relataram necessidade de ressecção e
enteroanastomose em 27 dos 35 casos avaliados (77%). O emprego de técnicas
fechadas de redução, como a pneumática ou a hidrostática, fica limitado na
veterinária pela maior incidência de casos crônicos. Abasiyanik et al. (1997)
realizaram a técnica de redução pneumática com auxílio de laparoscopia em 27
cães, obtendo sucesso em 96% e taxas de recorrência e perfuração intestinal após
procedimento de 4% cada. O intervalo de tempo entre o desenvolvimento da
As complicações mais observadas no pós-operatório são recorrência do
quadro, íleo paralítico, deiscência da anastomose, obstrução intestinal, peritonite e
síndrome do intestino curto, sendo as duas primeiras as mais freqüentes
(APPLEWHITE; HAWTHORNE; CORNELL, 2001; MACPHAIL, 2002). A literatura
cita cerca de 11 a 20 % de recorrência, sendo maior a recidiva em casos tratados
com a redução manual (25%) quando comparado com animais que sofreram
enterectomia da porção acometida (19%).
Estudos relacionam diminuição de reincidências em animais tratados com
derivados de opióides, durante o trans ou pós-operatório. O mecanismo não está
totalmente esclarecido, porém discute-se um possível aumento do tônus muscular
intestinal (APPLEWHITE; HAWTHORNE; CORNELL, 2001). McAnulty, Southhard e
Belzer (1989) descrevem redução de 17% para 3% de intussuscepções em animais
previamente submetidos à transplantação renal experimental com o uso de morfina,
o que esta de acordo com o resultado encontrado por Klinger, Cooper e McCabe
(1990) com o uso de butorfanol. Por outro lado, o largo emprego de opióides pode
contribuir para o retardo do trânsito gastrointestinal e para o desenvolvimento ou
agravamento do íleo paralítico.
Procedimentos cirúrgicos recomendados para a prevenção de recidivas
baseiam-se na criação de aderências permanentes entre as curvas intestinais,
chamadas de enteroplicações (NASH; BELLENGER, 1998; ARONSON;
BROCKMAN; BROWN, 2000). A literatura é controversa com relação à eficácia
destas técnicas. Alguns autores citam benefícios enquanto outros mostram não
haver diferença estatisticamente significativa entre os grupos testados (LEWIS;
ELLISON,1987; LEVITT; BAUER, 1992; KYLES; SCHNEIDER; CLARE, 1998;
ARONSON; BROCKMAN; BROWN, 2000; APPLEWHITE; HAWTHORNE;
CORNELL, 2001; MACPHAIL, 2002). Alem disto, complicações decorrentes desta
técnica como estrangulamento e obstrução intestinal torna necessária nova
intervenção cirúrgica para correção da afecção desenvolvida (KYLES; SCHNEIDER;
CLARE, 1998; APPLEWHITE; HAWTHORNE; CORNELL, 2001; MACPHAIL, 2002).
Diversos estudos apresentam o íleo paralítico pós-operatório como condição
relativamente comum em cirurgias abdominais, principalmente nas intestinais.
Trata-se de uma alteração transitória e reversível, na qual ocorre disfunção ou inibição da
supercrescimento bacteriano, que exacerba os sinais clínicos já observados
(WASHABAU, 2003). Pode acometer tanto estômago, intestino delgado quanto
grosso (WASHABAU, 2003). Clinicamente, observa-se anorexia, êmese, distensão
abdominal e sensibilidade dolorosa difusa relacionada ao acúmulo de gases pela
hipomotilidade intestinal além de alterações do trânsito intestinal como aquesia ou
episódios diarréicos. Quando afetados de forma crônica, os animais podem
apresentar mudanças da condição corpórea, como perda de peso. Sua patogenia
ainda é discutida, porém estudos revelam possível dissociação eletromecânica
influenciada por fatores humorais, neurais e metabólicos ainda não claramente
definidos. Isto parece ser resultante da ativação de um reflexo neural inibitório por
inervação simpática e ativação de processos inflamatórios, nos quais o óxido nítrico
está fortemente envolvido, porém sem via de ação totalmente esclarecida
(TÜRKYILMAZ et al., 2004). A severidade da injúria é diretamente proporcional à
magnitude da resposta inflamatória e ao grau de acometimento clínico (KALFF et al.,
1998). O grau de lesão tecidual e a manipulação cirúrgica podem ser relacionados à
intensidade da estimulação simpática e conseqüentemente, à estase intestinal
pós-operatória (BROWN, 2003).
A resolução do quadro de íleo paralítico ocorre com a restauração da função
intestinal, o que pode ser alcançado apenas com a eliminação da injúria intestinal.
Em alguns casos, faz-se necessário o uso de agentes procinéticos e reguladores
intestinais sintéticos ou naturais.
Semelhantemente as apresentações clínicas do íleo paralítico, as disfunções
motoras decorrentes de lesões nervosas são relatadas, porém de maneira
permanente. O funcionamento errôneo do aparelho gastrointestinal acaba por
prejudicar processos de digestão, absorção e eliminação. É relatada a ocorrência de
acúmulo de conteúdo fecal resultando em processos obstrutivos e alterações na
absorção de nutrientes, influenciando na condição corporal e qualidade de vida do
paciente.
Estudos recentes buscam utilizar inibidores de NO como bloqueadores desta
cascata inflamatória e evitando o desenvolvimento do íleo paralítico. Uenoyama et
al. (2004) utilizaram sulfato de S-methylisothiourea (SMT), inibidor do óxido nítrico
sintetase, em animais com injúrias intestinais iatrogênicas e encontraram alterações
de nitrito e nitrato produzidos e expressão de RNAs de NO quando comparado com
grupo controle.
Outra complicação passível de ocorrer após tratamento de intussuscepção é
a síndrome do intestino curto, distúrbio relacionado às extensas ressecções
intestinais, principalmente na região referente ao cólon. Sabe-se que o cão é capaz
de manter funções digestivas normais com cerca de 30 a 40 centímetros de intestino
delgado (BARKER; VAN DREUMAL; PALMER, 1993). Entretanto, nem sempre estas
adaptações são suficientes para a homeostase intestinal, o que resulta em má
digestão, má absorção, perda de peso e diarréias intermitentes ou contínuas. Nestes
casos, os animais necessitam de suporte nutricional agressivo, inclusive na forma
parenteral durante a fase inicial. O uso de fibras e medicamentos que retardam o
esvaziamento gastrointestinal pode ser associado a alimentos de alta digestibilidade.
Opções cirúrgicas têm sido utilizadas em medicina humana como a criação de
válvulas intestinais e esfíncteres artificiais, alongamento e afilamento intestinal ou o
transplante de porções intestinais (GUILFORD; STROMBECK, 1996; RASSLAN,
2007a, b, c).
Rasslan (2007b) descreve a ocorrência de inúmeras alterações
gastrointestinais após ressecções intestinais extensas, com o intuído de adaptar o
organismo ao novo comprimento do órgão. Sabe-se que o encurtamento do intestino
acaba por gerar menor tempo de trânsito alimentar, principalmente se há o
envolvimento da válvula íleo-ceco-colica. Além de alterações microscópicas, como a
hiperplasia e hipertrofia de segmentos intestinais remanescentes e “delgadização”
do intestino grosso, ocorrem alterações do comportamento do trânsito alimentar com
estase gástrica e retardo na eliminação de ingestas através de alterações de
motilidade. Esta alteração de motilidade tem por finalidade propiciar maior tempo de
contato entre intestino e conteúdo luminal, a fim de permitir absorção adequada de
nutrientes e evitar o desenvolvimento de síndromes de má absorção, espoliação
metabólica, desnutrição, anemia e perda de massa muscular e gordurosa.
Presume-se que o retardo no esvaziamento gástrico ocorra por ação dos freios intestinais,
acionados mais precoce e intensamente em decorrência do intestino reduzido e da
concentração aumentada de nutrientes no íleo. Quanto ao trânsito intestinal, o
peristálticos são mais lentos, estabelecendo um mecanismo compensatório
(RASSLAN, 2007a, b).
2.7 Avaliação da viabilidade intestinal
A determinação da viabilidade intestinal é ainda hoje estudada, tanto na
medicina humana quanto na veterinária (DENOBILE; GUZZETTA; PATTERSON,
1990; ORLAND, 1993; TOLLEFSON et al., 1995; TURKYILMAZ et al., 1997; LA HEI;
SHUN, 2001; BROWN, 2003; ERIKOGLU et al., 2005). Isto porque apresenta
elevada importância no alcance do sucesso cirúrgico e por se tratar de um evento de
grande complexidade, pois normalmente utilizam-se critérios clínicos convencionais
considerados subjetivos e pouco confiáveis. Estes critérios subjetivos podem levar a
super ou subestimação, ou seja, ressecar um segmento viável ou preservar uma
alça isquêmica cuja permanência pode ser responsável por complicações (LEWIS;
ELLISON, 1987; BROWN, 2003; ROCHA; DINIZ; CLEMENTE, 2004). Dentre os
métodos consagrados, utiliza-se à observação da coloração do segmento intestinal,
presença de pulsação vascular dos vasos mesentéricos e sangramento à secção da
alça, além da presença de peristaltismo na porção envolvida (ORLAND, 1993;
BROWN, 2003). Em casos duvidosos, estes critérios costumam falhar em
porcentagem considerável, razão pela qual muito se pesquisa métodos auxiliares de
determinação de viabilidade (ROCHA; DINIZ; CLEMENTE, 2004). A presença de
peristaltismo não é uma medida segura de avaliação, visto que podem ser
observadas contrações em tecidos desvitalizados, conhecidas como espasmo
anóxico (ROCHA; DINIZ; CLEMENTE, 2004).
A observação de aspectos normais dos tecidos analisados não garante
adequada cicatrização nem tampouco adequada atividade intestinal pós-operatória.
Em modelos experimentais em cães, não foram observadas correlações entre estes
critérios, o comprometimento histológico intestinal nem à sobrevida animal (BROLIN
et al.,1989). Estes métodos não permitem a avaliação de edema e hemorragia