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SILVANIA DAL BOSCO A REPRESENTAÇÃO DA MORTE NAS REPORTAGENS DE CAPA DA REVISTA VEJA

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Academic year: 2018

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SILVANIA DAL BOSCO

A REPRESENTAÇÃO DA MORTE NAS REPORTAGENS DE CAPA

DA REVISTA

VEJA

MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

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SILVANIA DAL BOSCO

A REPRESENTAÇÃO DA MORTE NAS REPORTAGENS DE CAPA

DA REVISTA

VEJA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como requisito parcial para a obtenção do título de MESTRE em Comunicação e Semiótica sob orientação do Professor Dr. José Luiz Aidar Prado, na Área de Concentração-Signo e Significação nas Mídias e Linha de Pesquisa - Análise das Mídias.

São Paulo

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BANCA EXAMINADORA

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Dedicatória

Ao Pedro e Edmundo e a todos aqueles que

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Epígrafe

E tolerar a vida continua a ser, afinal de contas, o primeiro dever de todos os seres vivos. A ilusão perde todo o seu valor quando nos obstrui esse enfrentamento. Lembremo-nos do velho ditado: Si vis pacem, para bellum. Se queres preservar a paz, arma-te para a guerra. Estaria de acordo com o tempo em que vivemos alterá-lo para: Si vis vitam, para mortem. Se queres suportar a vida, prepara-te para a morte.

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Agradecimentos

Ao meu filho Pedro, que nasceu em meio a esse trabalho e reforçou minha crença em viver bem cada momento, mesmo quando a vida mostra sua face mais escura.

Ao meu marido Edmundo pelo amor e parceria.

Ao meu orientador, Professor Dr. José Luiz Aidar Prado, pela sua dedicação, compreensão e estímulo que foram fundamentais para a realização desta pesquisa.

Aos Professores José Salvador Faro e Mayra Rodrigues Gomes, pelas valiosas contribuições que deram a este trabalho no exame de qualificação.

Aos professores, colegas e funcionários do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica, pela partilha de experiências académicas.

Aos amigos e colegas de trabalho, pela compreensão e colaboração incondicional.

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A pesquisa analisa os tipos de contratos comunicacionais construídos pelos enunciadores da revista Veja em suas reportagens de capa que tematizam a morte em diversas situações, com o intuito de se identificar os interesses implícitos ou explícitos que envolvem as estratégias de construção destes textos. Com base nos fundamentos teóricos de Ernesto Laclau e Norman Fairclough em suas teorias do discurso, busca-se compreender, de forma geral, a dinâmica das práticas discursivas na imprensa semanal, com ênfase nos procedimentos discursivos que

Veja mobiliza para estabelecer contratos comunicacionais (Patrick Charaudeau) com os seus leitores. A teoria do discurso oferece bases para a compreensão da relação intrínseca entre texto e contexto social no âmbito das relações sociais. Nesse horizonte, por um lado, a pesquisa parte dos conceitos centrais sustentados por esta teoria, como discurso, ponto nodal em suas conexões com os contratos comunicacionais, a teoria do agendamento e critérios de noticiabilidade (Mauro Wolf), que fazem parte das articulações discursivas que a revista empreende em sua atividade jornalística. Por outro, entende-se que não é possível analisar a morte sem abordar o Real traumático, que será sustentado pelos ensinamentos de Slavo Zïzëk. O estudo tem como bases metodológicas a análise do discurso, buscando investigar as formas de organização dos enunciados sobre a morte. Estas estratégias possibilitam a instauração de uma relação fiduciária entre enunciadores e enunciatários da revista, garantindo, dessa forma, a fidelização do leitor. O corpus

da pesquisa compreende as reportagens de capa de Veja cuja temática é a representação da morte, no período de janeiro de 2000 a dezembro de 2010. Os resultados da pesquisa indicam diferenciações no tratamento da morte do Mesmo e do Outro, no aqui e acolá, pelo enunciador. A forma de organização do discurso de

Veja é baseada em oposições que remetem ao leitor à percepção de que em cada tipo de morte existem causas e culpados. Esse recurso é materializado com base em dicotomias que são apresentadas em forma de duelo entre Bem e Mal; entre Mesmo e Outro; entre o Ocidente e Oriente; entre civilizado e bárbaro; entre o mundo desenvolvido e atrasado.

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The research analyzes the types of communicational contracts drafted by publishers of Veja magazine in their cover stories that had a death theme of various situations, in order to identify the interests that involve implicit or explicit strategies for building these texts. Based on the theoretical foundations of Ernesto Laclau and Norman Fairclough in their theories of discourse, seeks to understand generally, the dynamics of discursive practices in the weekly press, with emphasis on the discursive procedures that mobilizes Veja to establish communication contracts (Patrick Charaudeau ) with their readers. Discourse theory provides a foundation for understanding the intrinsic relationship between text and social context within social relations. In this horizon, on one hand, the research part of the central concepts supported by this theory, such as speech, nodal point in their connections with the communication contracts, which are part of the discursive articulations that the magazine embarks on its journalistic activity. On the other hand, it’s understood that it is not possible to analyze the death without addressing the real trauma, which will be supported by the teachings of Slavo Zizek. The study has methodological bases of the discourse analysis in order to investigate the forms of organization of statements about death. These strategies enable the establishment of a fiduciary relationship between speaker and magazine reader, thus ensuring their loyalty. The body of the research comprises of the cover stories of Veja whose theme is the representation of death in the period from January 2000 to December 2010. The survey results indicate differences in the treatment of death of the same and the other, here and there, by the publisher. The organizational form of speech is based on oppositions that give reader the perception that in each type of death there are causes and culprits. This feature is materialized based on dichotomies that are presented in a battle between good and evil; between Same and Other; between East and West, between civilized and barbarian, between the developed and under developed.

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AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida

CSI Crime Scene Investigation

EUA Estados Unidos da América

GOL Companhia Aérea do Brasil

IAMCR Associação lnternacional de Pesquisa em Mídia e Comunicação

IVC Instituto Verificador de Circulação

MBA Master of Business Administration (Mestrado em Administração de Empresas)

MTV Music Television

OCA Pavilhão de Exposições do Parque Ibirapuera em São Paulo

ONG Organização Não Governamental

ONU Organização das Nações Unidas

PMDB Partido do Movimento Democrático do Brasil

PSDB Partido da Social Democracia Brasileira

PT Partido dos Trabalhadores

UNESCO Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura

UTI Unidade de Terapia Intensiva

TAM Companhia Aérea do Brasil

LISTA DE GRÁFICOS

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Introdução ... 11

1. Corpus, delimitação da temática e justificativa ... 14

2. Justificativa e metodologia da pesquisa ... 16

Capitulo 1:Fundamentação teórica e principais conceitos da pesquisa ... 22

1.1. Os contratos de comunicação e a lógica no discurso de Veja sobre o tema da morte ... 22

1.2. Do ponto nodal à articulação discursiva nas reportagens de capa ... 31

Capítulo 2:Formas de representação da morte do Mesmo e do Outro no Aqui e Acolá ... 34

2.1. Regimes de visibilidade e afirmação de valores ideológicos em Veja ... 34

2.2. Agendamentos temáticos, enquadramentos e critérios de noticiabilidade ... 36

2.3. A morte hoje ... 42

2.4. A morte na sociedade ... 45

2.5. A morte na mídia e as diferentes formas de abordagem ... 50

Capítulo 3: Da construção da morte às mortes em Veja ... 60

3.1. O perfil editorial de Veja e constituição da identidade ... 60

3.2. Análise das reportagens por eixos temáticos ... 63

3.2.1. Morte de autoridades/celebridades... 63

3.2.1.1. Conclusão do eixo das capas de Covas, Jackson e Eller... 80

3.2.1.2. A presentificação da dor do papa João Paulo II... 81

3.2.1.3. Conclusão sobre a morte do papa... 85

3.2.1.4. Conclusão do eixo temático sobre morte de autoridades/ celebridades... 86

3.2.2. Morte por assassinato... 87

3.2.2.1. As fotos mostram os rostos dos bandidos... 92

3.2.2.2. O caso Isabella Nardoni... 94

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3.2.3.2. As imagens da tragédia no Brasil e no exterior... 118 3.2.3.3. Conclusão do eixo temático de morte por desastres naturais... 124 3.2.4. Morte por acidentes tecnológicos... 126 3.2.4.1. As imagens dos acidentes... 138 3.2.4.2. Conclusão do eixo temático de morte por acidentes tecnológicos... 141 3.2.5. Morte por guerras e terrorismo... 144

3.2.5.1. Conclusão do eixo temático de morte por guerras e terrorismo... 156 3.2.6. Configuração plástica, visual e sincretismo de linguagem nas capas... 159

(12)

Introdução

O objetivo principal deste estudo é examinar o tipo de contratos comunicacionais que a principal revista de opinião do país, Veja, estabelece com os seus leitores para tratar do tema da morte. Busca-se compreender como esse assunto é construído e reconstruído, tematizado e figurativizado pelos meios de comunicação, mais especificamente nas reportagens de capa1 da revista, considerando-se o contexto particular do período em estudo, de 2000 a 2010, marcado por grandes transformações políticas, econômicas e sociais no mundo e, especialmente, no Brasil.

O contrato de comunicação possibilita a fidelização dos leitores, uma vez que estes se mantêm ligados à revista por meio da relação de confiança que se estabelece entre os interlocutores do discurso. É fundamental, portanto, desvendar como o tema da morte é enunciado por Veja, pois, por um lado, a forma como o enunciador aborda o assunto pode revelar o seu posicionamento político em relação aos eventos, enquanto por outro, pode também fazer com que a “vivência” da morte relatada seja mais ou menos intensa, respeitosa ou sofrida.

Ao mobilizar as mais diversas estratégias discursivas, o enunciador de Veja

pretende imprimir no leitor as marcas do seu discurso, deixando pistas ou direcionamentos de interpretação para o enunciatário. O objetivo desse procedimento é provocar efeitos de sentido com a finalidade de conduzir o olhar e a atenção do leitor para as suas (do enunciador) convicções ou para os interesses da empresa que ele representa. Essas marcas são recursos usados pelos meios para fidelizar seus leitores e conquistar novos públicos.

Quando as pessoas compram uma revista, jornal ou televisão, elas não estão comprando “textos” para se informar, mas para se enquadrar ao se informar, para se localizar, para ter narrativas de enquadramento no mundo, para saber qual é o seu espaço no mundo, como ele funciona, como se pode pertencer melhor a esse que já é o meu mundo. Que realidade é essa à qual pertenço e devo pertencer como ser, como me transformar para melhor ser esse que gostaria de ser? Essas questões são exemplo de modalizações de ser, de saber, de fazer, de poder que a mídia de forma estratégica se utiliza para captar a atenção do leitor (PRADO, 2009)2.

1 É a matéria central da revista antecipada na capa. Trata-se do tema central de cada edição. 2

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A conquista do leitor de Veja se dá por um regime de veridicção que, diferentemente de um valor de verdade, se baseia na convicção de um grupo ao qual se pretende oferecer um saber de opinião e que só pode ser apreendida empiricamente, por meio dos textos portadores de juízos. O efeito de verdade não existe, pois, fora de um dispositivo enunciativo de veridicção que busca exercer influência psicossocial, no qual cada um dos parceiros da troca verbal tenta fazer com que o outro dê sua adesão a seu universo de pensamento e de verdade. O que está em causa, aqui, não é tanto a busca de uma verdade em si, mas a busca de “credibilidade”, isto é, aquilo que determina o “direito a palavra” dos seres que comunicam, e as condições de validade da palavra emitida (CHARAUDEAU, 2009, p.49). Daí se falar em regimes de veridicção.

Com a análise dessas reportagens, pretende-se também compreender as significações e implicações sociais que as diversas abordagens sobre o tema sugerem aos enunciatários, bem como identificar os interesses “ideológicos” implícitos ou explícitos envolvidos nas estratégias de construção dos textos sincréticos (notícia, fotografia, espaços ocupados, cores, símbolos, grafia) referentes à morte.

Os objetivos específicos desta pesquisa são: (1) compreender os regimes de sentido e regimes de visibilidade construídos em torno das figuras do Mesmo e do Outro nas reportagens de capa; (2) analisar como o enunciador apresenta o Real traumático causado pelo corte da morte diante de um discurso euforizado levando o leitor a se espelhar em arquétipos de sucesso, de beleza, de bem estar, e como conduz o seu enunciatário a compreender essa visão de mundo; (3) examinar os agendamentos temáticos e os tipos de enquadramentos recorrentes nas reportagens de capa, para detectar se apresentam um padrão, se seguem uma receita ou sevariam de acordo com o tipo de “morte” representada em cada reportagem; (4) em termos de visualidade e espacialidade pretende-se desvendar como o enunciador apresenta para o enunciatário as mortes que são próximas, em território brasileiro, e as que estão acolá, em território estrangeiro (distante e próximo).

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da figura do Mesmo, dependendo da agenda temática das mídias” (PRADO e BAIRON, 2007).Chama-se ‘Outro’ às séries de paisagens culturais e políticas frente às quais a mídia estabelece distâncias relativas, calculadas, homólogas ao afastamento mantidos por seus públicos. Assim sendo,

frente ao ‘Outro’ é preciso resguardar-se, qualificando-o de exótico, ao exibi-lo para o display, mas em outros casos, é preciso ocultá-lo do holofote, deixá-lo às margens, assim, ele pode ser assimilado, admitido ou segregado (conf. Landowski, 2003); em certos casos, será necessário inscrevê-lo como inimigo, excluindo-o (PRADO e BAIRON, 2007).

Para a pesquisa, trabalhou-se com as seguintes hipóteses:

1. Veja tematiza em suas capas a representação da morte do “aqui” de forma diferente do “lá/acolá”, ou seja, nos eventos com morte ocorridos dentro do país não são evidenciados os elementos que tratam do Real, entendido aqui no conceito de Žižek, como um núcleo duro, algo traumático impossível de ser simbolizado por palavras. Nas reportagens sobre acontecimentos com mortes em outras partes do mundo são escancaradas fotografias com corpos sem vida, ensanguentados, e isso cria certa curiosidade por parte do leitor pelo interesse em relação ao chocante;

2. Em suas capas, Veja valoriza o regime de visibilidade do Mesmo (vitorioso, saudável, bem-sucedido) que funciona como um dispositivo de diferenciação social, dando a ver ao leitor figuras do seu mundo constituído por pessoas da chamada classe média alta brasileira, com instrução e formadora de opinião, como a própria revista revela em suas pesquisas na conquista de anunciantes. No caso das mortes, o enunciador propõe ao enunciatário que assuma junto com ele uma causa política e/ou social que vai além da morte física ocorrida dentro e fora do país.

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No primeiro capítulo, será apresentada a fundamentação teórica e discussões sobre os principais conceitos norteadores da pesquisa, tais como contrato de comunicação, discurso, articulação discursiva e ponto nodal, com intuito de compreender a ligação entre o objeto de pesquisa e o arcabouço teórico de Ernesto Laclau, Norman Fairclough, Patrick Charaudeau e Slavoj Žižek .

No segundo capítulo, serão discutidas as formas de representação da morte do Mesmo e do Outro, aqui e acolá, que os enunciadores mobilizam a fim de “capturar” a atenção dos enunciatários. Serão abordados também os agendamentos temáticos, os enquadramentos, além dos critérios de noticiabilidade que orientam a atividade jornalística da revista.

No terceiro capítulo, será desvelado o corpus com base na análise do discurso, com aporte de alguns elementos da psicanálise com o objetivo de se compreender as escolhas do enunciador de Veja para a organização do discurso sobre a morte, nos contextos e situações específicas ligadas ao Mesmo e Outro, aqui e acolá.

É importante compreender os procedimentos discursivos de organização dos enunciados para identificar os efeitos de sentido produzidos pelos textos propostos pelo enunciador de Veja. Analisar a enunciação implica compreender o discurso como resultante da conversão de estruturas narrativas em estruturas discursivas: ato de um enunciador que faz uma série de escolhas, como de pessoa, de tempo, de espaço, de figuras e “conta ou passa a narrativa, transformando-a em discurso”, como explica Barros (1990, p. 53).

1. Corpus, delimitação da temática e justificativa

O corpus desta pesquisa é constituído por reportagens de capa da revista Veja,

cuja temática é a morte e suas representações. O período selecionado compreende o início do mês de janeiro de 2000 até o final de dezembro de 2010. A escolha das edições desse período se deu por tratar-se da primeira década do século XXI, época em que ocorreram grandes tragédias pelo mundo. A virada do ano 2000 foi marcada por algumas incertezas típicas dos tempos atuais. Período marcado pela rapidez da

informação, veiculada em abundância para o mundo acirrando cada vez mais a

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velocidade e da concorrência e, por essas razões, há o imperativo do refinamento das estratégias discursivas para capturar o interesse do público-alvo.

Circulava na internet, e chegou a ser assunto em outros veículos de comunicação, que um vírus potente invadiria os computadores ceifando dados pessoais, podendo desestabilizar os grandes sistemas de segurança e causar mortes com queda de aviões, em plataformas de operação no mar e em operações de segurança. Nada disso aconteceu naquele momento e, provavelmente, tratava-se de mais uma das tantas ameaças apocalípticas próprias do período. Porém, essas notícias, relidas anos depois, suscitaram o questionamento de como e quais foram as mortes retratadas na mídia nos primeiros 10 anos do novo século.

Por um lado, a escolha da revista Veja se dá em razão de ser um dos principais veículos de comunicação do país, por outro, pelo fato do seu enunciador assumir um posicionamento político claro em relação aos problemas levantados na maioria de suas reportagens.

Mesmo sabendo não haver respostas e explicações sobre o fim da vida, a morte é algo que preocupa todo o ser humano. Assim, a revista Veja tem se constituído como referência e espaço privilegiado de circulação de informações ao produzir suas versões sobre os acontecimentos visando influenciar a maneira de o enunciador viver e perceber a morte.

Aoassumir posicionamento claro na opinião que emite, o enunciador de Veja se diferencia do das demais revistas, tornando-se protagonista na construção de suas “verdades” evitando pautar-se pela imparcialidade, uma das exigências da atividade jornalística. É nessa perspectiva que se escolheu Veja. Por ela possuir características dicotômicas e moralizadoras, que modalizam certo e errado. Para Orlandi (2003, p. 42 e 43), o sentido não existe em si, mas é determinado pelas posições ideológicas colocadas em jogo no processo sócio-histórico em que as palavras são produzidas. As palavras mudam de sentido segundo as posições daqueles que as empregam e segundo os contextos discursivos conflituais, em que posições antagônicas disputam a validade dos sentidos.

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As capas são “janelas” que se abrem para as reportagens das revistas, que, por sua vez, pontuam e organizam, de acordo com seus princípios, as maneiras pelas quais a recepção deve olhar aquilo a que é remetido (Fausto Neto, 1991, p. 19). Por este motivo, as capas terão um peso grande na avaliação, mas as reportagens também serão objeto de análise para possibilitar a identificação das posições políticas, econômicas e sociais assumidas pelo veículo em seus textos.

Analisadas de forma mercadológica, embora a maioria das cerca de um milhão e 200 mil revistas impressas semanalmente chegue aos leitores por meio de assinaturas, vários autores entendem que as reportagens de capa devem seduzir os seus leitores/consumidores de tal forma que eles venham a querer consumir o “produto” revista. As capas são espaços híbridos entre a publicidade e o jornalismo, pois não se reduzem a somente informar (pressuposto do jornalismo de revista) – mesmo que este seja o intuito – ao passo que anunciam (pressuposto da publicidade) o conteúdo da revista (CARDOSO, 2007). É suposto que o assinante de Veja foi seduzido pela revista, ou por suas capas, ao ponto de firmar um contrato semanal de recebê-la em casa, sem confrontá-la com a concorrência.

O estudo transita na interface entre comunicação e psicanálise. E, embora a morte seja motivo de angústia, perseguindo o homem, consciente ou inconscientemente, durante toda a sua existência, não há maneira de conhecer o ser humano sem pensar nas complexidades envolvidas em sua morte, pois, de acordo com Morin (1997, p. 10 e 11), é na postura diante da finitude que o indivíduo compreende a consciência de si mesmo e de seu papel no mundo e a sociedade só se constitui na e com a morte.

2. Justificativa e metodologia da pesquisa

Para a realização do estudo, adotou-se o método de análise do discurso, pois o objetivo era compreender os tipos de contratos comunicacionais e os regimes de visibilidade construídos pelos enunciadores de Veja com intenção de garantir credibilidade e fidelidade por parte dos seus leitores quando o tema é morte.

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compreendidas para que daí se consiga um entendimento maior da sociedade, na sua transformação (1993, p. 26); assim, o objeto de estudo desse trabalho são as estratégias discursivas de construção do tema da morte e os modos pelos quais é tematizada e representada na atualidade nos meios de comunicação (em particular, em

Veja) com a intenção de entender que papel tem a morte na sociedade.

Mesmo que o leitor de Veja represente uma parcela pequena da população e um grupo abastado (nem todos), esse grupo é considerado como potencial formador de opinião, portanto, dele haverá reverberação de pensamento e posição para outros setores da sociedade.

A pesquisa privilegiou também outros aspectos relevantes merecedores de análise, como questões ligadas à visualidade, espacialidade e plasticidade das capas, o tamanho da foto e seus traços, por exemplo, podem ser ou não ser mostrados em close. O uso dos recursos visuais permite ao enunciador provocar efeitos de sentido nos interlocutores, pois ajuda na tarefa de transmitir credibilidade aos conteúdos.

Para a análise imagética do texto e dos percursos discursivos o estudo buscou o suporte da semiótica discursiva, especialmente por meio dos textos de autores como Vicente Pietroforte (2004), Diana Barros (1994), Eric Landowski (2002) e Ana Claudia Oliveira (2004), que seguem os princípios de Algirdas Julien Greimas. Além desses autores, a pesquisa valeu-se também das contribuições de Diana Barros para examinar os processos de enunciação dos textos a partir de sua organização em planos de expressão e planos de conteúdo nas referidas reportagens.

A pesquisa foi desenvolvida em etapas. A revisão de literatura foi o processo inicial para a realização deste trabalho, tendo imprimido maior conhecimento sobre o tema, sobre o corpus e, especialmente, sobre a fundamentação teórica, base essencial para qualificar essa produção. Nesta etapa, realizou-se vasta pesquisa sobre o estado da arte da temática e foram encontrados diversos trabalhos, como de Ernest Becker (2007), Susan Sontag (2003), Folker Hanusch (2010), Ariès Philippe (1977a; 1977b), José Barros e Félix Neto (2004), Mayra Rodrigues Gomes (2008), Tereza Oliveira (2001), John Bowlby (2002a; 2006), Žižek Slavoj (2003), Oscar Cesarotto (1999) que serviram de suporte teórico da pesquisa.

Algumas teses foram relevantes para a compreensão do objeto de pesquisa, como a que analisa a representação da morte nas capas das revistas semanais (Veja e

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Universidade de Taubaté, que aborda o uso mercadológico da imagem infantil e o julgamento sumário em duas capas da revista Veja sobre o caso Isabella Nardoni; e a tese de José Carlos Marques, da Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP), com foco na morte de João Paulo II nas capas de veículos de referência brasileira.

Outras teses são as que analisam a morte de Cássia Eller, Mário Covas e os ataques de 11 de setembro, entre várias, porém, a maioria delas ou analisava um recorte muito curto, um único caso de morte ou fazia estudo comparativo entre Veja e outras revistas de circulação nacional, também por pequenos períodos.

A revisão da literatura trouxe maior conhecimento e profundidade de como o enunciador de Veja dá a ver esse tema ao seu enunciatário e em que tipo de estratégias discursivas investe na construção de seus textos.

A escolha de um período mais longo, uma década, englobando a análise de diversos casos de morte reportados por Veja, objetiva aprofundar a compreensão sobre o tema na principal revista do país.

O fato de a revista ter destinado apenas 5% de suas capas para o tema morte suscitou a curiosidade para se entender melhor a visão de mundo criada pelo enunciador. Nos últimos 43 anos (completados no dia 11 de setembro de 2012), foram publicadas 2.322 edições (até 22 de maio de 2013) e, se consideradas as capas que reportam guerras, desastres, assassinatos e mortes de personalidades, chega-se a pouco mais de uma centena, ou seja, 5% do total de assuntos abordados. Os números evidenciam não haver uma pré-disposição editorial acentuada para o assunto. Por esse motivo, questionam-se as possíveis motivações de Veja em reportar a morte e a forma como a revista propõe este assunto aos seus leitores.

Considera-se o tema morte bastante relevante tanto na vida das pessoas como na vida em sociedade, por isso, por si só justificaria este estudo. Sobre a morte, é importante considerar que em uma sociedade líquida (BAUMAN, 2001), dromocrática (VIRILÍO, 1996) ou pós-moderna (BAUDRILLARD, 1991), o homem perdeu os antigos parâmetros e vive em um sistema estruturado para que não perca tempo com devaneios sobre a existência e sobre a morte, muito menos sobre a própria morte.

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produzindo determinados efeitos de sentido sobre o significado da morte. Além dessas ações, nesta etapa foram feitas a seleção e coleta das capas a serem averiguadas a partir do acervo digital do site da revista, no qual são disponibilizadas todas as publicações desde o seu lançamento em 1968.

Na segunda etapa, foi investigado o discurso dos meios de comunicação e, mais especificamente, o discurso de Veja sobre a cobertura do tema morte. Vale ressaltar que não se trata de analisar apenas as representações da morte, pois se busca também compreender a ação da linguagem do enunciador no ato de fazer crer o enunciatário.

Em sua atividade como veículo de comunicação, Veja segue uma rotina de trabalho jornalístico que envolve não só a cultura organizacional, mas, também, as tarefas de apuração dos fatos, coleta e consolidação das informações, edição e divulgação da notícia. No processo, de acordo com os critérios de noticiabilidade, são escolhidos os temas a serem desenvolvidos e oferecidos ao leitor. A morte, algumas vezes, ganha espaço na revista com diferentes abordagens de acordo com as circunstâncias em que ocorre. Nesse sentido é importante desvendar quais mortes são dadas a ver nas reportagens de Veja e porque esses temas tornaram-se, por decisão editorial, assunto de capa.

Além da tematização, o enunciador de Veja também se faz valer do procedimento de figurativização que se insere na dimensão da visibilidade midiática. Nesse contexto, considera-se interessante explorar quais figuras são dadas a ver nas capas e reportagens de Veja? De quais regimes de visibilidade a revista lança mão?

Na terceira etapa, foram analisadas as reportagens de capa com base no método de análise do discurso. A classificação das reportagens foi feita em função do eixo temático, de acordo com a natureza e as causas das mortes construídas na revista. A tipificação foi fundamental para a compreensão do objeto (a morte), pois é uma forma de sistematizar o estudo para seu amplo entendimento. Assim, foi construída a seguinte classificação temática:

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2. Morte por Assassinato – são analisadas as capas do assassinato de João Hélio, 6 anos, cometido por jovens da classe média (fevereiro de 2007) e da menina Isabella Nardoni, também de 6 anos, efetuado pelo pai e pela madrasta (abril de 2008).

3. Morte por Desastres Naturais – são investigadas as reportagens de capa sobre o tsunami no Índico (janeiro de 2005), a tragédia com o alagamento em Santa Catarina (dezembro de 2010) e as duas capas sobre o terremoto no Haiti (ambas em janeiro de 2010);

4. Morte por Desastres Tecnológicos – são averiguados os acidentes com o submarino russo Kursk (agosto de 2000), a queda do avião da TAM (julho de 2007), duas capas da queda do Air France (ambas em julho de 2009) e a queda do avião de João Paulo Diniz (agosto de 2001);

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O gráfico abaixo sintetiza o corpus analisado:

Gráfico 1: Classificação do corpus por eixos temáticos Fonte: adaptação da autora, 2013.

O objetivo primordial foi compreender a organização do discurso de Veja, as formas de figurativização e tematização da morte nas reportagens de capa. Por fim, relatam-se as conclusões com os resultados da pesquisa.

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Capítulo 1

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E PRINCIPAIS CONCEITOS DA PESQUISA

1.1. Os contratos de comunicação e a lógica do discurso de Veja sobre o tema da morte

Neste capítulo, serão discutidos os contratos de comunicação construídos por

Veja, um dos principais periódicos semanais do Brasil. O interesse é entender como, ao longo de sua existência, a revista tem construído em suas reportagens de capa a temática da morte, um assunto que assombra o cotidiano das pessoas. Embora o ser humano saiba de sua finitude, sempre que o assunto está em voga, ele o trata como se a morte só ocorresse com os outros, nunca com ele mesmo. Mas é na coragem de encarar a própria morte como parte da vida ou mesmo a finitude como algo inevitável que o indivíduo toma consciência de si mesmo e de seu papel no mundo e na sociedade, como muito bem pontua Morin (1997, p. 10). Sob essa perspectiva

acredita-se que falar da morte, tratar da morte é também falar da vida, tratar da vida. Com a consciência de que apenas o momento presente pertence ao homem e a morte está sempre à espreita é possível aproveitar melhor cada momento que se tem para viver.

Os contratos de comunicação foram analisados a partir dos textos de Patrick Charaudeau (2009) e de José Luiz Aidar Prado (2006). Há contrato quando um enunciador apresenta a um público um texto no qual certas modalizações são propostas para que o leitor se informe, se capacite e se transforme a partir do que se aventa no texto. Uma vez examinadas as várias totalizações, é possível entender que "mortes" são efetivamente construídas em cada tipo de contrato, dado nas capas e reportagens de Veja:

o sentido nunca é dado antecipadamente. Ele é construído pela ação linguageira do homem em situação de troca social. O sentido só é perceptível através de formas. Toda a forma remete a sentido, todo sentido remete a forma. O sentido se constrói ao término de um duplo processo de semiotização: de transformação e de transação (CHARAUDEAU, 2009, p.67).

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especificas da situação de troca na qual surge. A situação de comunicação constitui um quadro de referência ao qual se reportam os indivíduos de uma comunidade social quando iniciam uma comunicação. Como poderiam trocar palavras, influenciar-se, agredir-se, seduzir-se se não existisse um quadro de referência?

O mesmo acontece com todo interlocutor ou leitor de um texto. Ele deve supor que aquele que se dirige a ele tem consciência dessas restrições. Assim se constrói o que os filósofos da linguagem designam por “co-intencionalidade”: toda troca linguageira se realiza num quadro de co-intecionalidade, cuja garantia são as restrições da situação de comunicação.

A modalização tem o papel de exprimir a posição do enunciador em relação àquilo que diz (FIORIN, 2000, p.1). Para Charaudeau (1990), modalização é o sustentáculo da enunciação na medida em que ela permite explicitar as posições do sujeito falante em relação a seu interlocutor, a ele mesmo e a seu propósito. É a marca que o sujeito deixa no seu discurso. As expressões modalizadoras são elementos linguísticos diretamente ligados ao evento de produção do enunciado, funcionando como indicadores de intenções, sentimentos e atitudes do locutor com relação a seu discurso e, ao mesmo tempo, revelam o grau de engajamento do falante em relação ao conteúdo proposicional veiculado. Para Barros (2003, p. 88), modalizações ou modalidades são a “determinação que modifica a relação do sujeito com os valores (modalização do ser) ou que qualifica a relação do sujeito com o seu fazer (modalização do fazer) dentro da narrativa textual”.

O processo de mudança consiste em transformar o “mundo a significar” em “mundo significado”, estruturando-o segundo certo número de categorias que são próprias, expressas por formas. Toda a forma, de acordo com Charaudeau (2009, p. 41), remete a sentido e todo sentido remete a forma, numa relação de troca. O sentido é construído quando há um duplo processo de semiotização, o de transformação e de transação.

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O ato de informar está inserido no processo pela circunstância de que deve descrever, identificar e qualificar os fatos, contar o que aconteceu e explicar porque os mesmos aconteceram:

o processo de transação consiste, para o sujeito que produz um ato de linguagem, em dar uma significação psicossocial a seu ato, isto é, atribuir-lhe um objetivo em função de um certo número de parâmetros: as hipóteses sobre a identidade do outro, o destinatário-receptor, quanto ao seu saber, sua posição social, seu estado psicológico, suas aptidões, seus interesses etc..; o efeito que pretende produzir nesse outro; o tipo de relação que pretende instaurar com esse outro; o tipo de regulação que prevê em função dos parâmetros precedentes. O ato de informar participa desse processo de transação, fazendo circular entre os parceiros um objeto de saber que, em principio, um possui e o outro não, estando um deles encarregado de transmitir e o outro de receber, compreender, interpretar sofrendo ao mesmo tempo uma modificação com relação a seu estado inicial de acontecimento (CHARAUDEAU, 2009, p.41).

O necessário reconhecimento recíproco das restrições da situação pelos parceiros da troca linguageira leva a dizer que estes estão ligados por uma espécie de acordo prévio sobre os dados desse quadro de referência. Eles se encontram na situação de dever subscrever, antes de qualquer intenção e estratégia particular, a um contrato de reconhecimento das condições de realização da troca linguageira em que estão envolvidos: um contrato de comunicação (CHARAUDEAU, 2009, p. 68). Este resulta das características próprias à situação de troca, os dados externos, e das características discursivas decorrentes, os dados internos:

cada texto midiático traz um contrato de comunicação proposto, em que o enunciador se dirige a um enunciatário, criado por meio de uma interpelação discursiva, em que uma modalização é proposta. Dizendo de modo mais simples: todo texto oferece ao potencial leitor algo em termos de direção à ação, para que ele se transforme, se informe para aprender, melhorar sua existência, consuma, tenha sucesso, se divirta, ou tudo isso em conjunto. Existe em cada texto uma proposição performática do tipo imperativo: faça isso para ser aquilo (consuma cremes de quinta geração para ser jovem até os cem anos, por exemplo) (PRADO, 2011, CD Regime de visibilidade em revistas).

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O contrato de comunicação possibilita a fidelização dos leitores, uma vez que estes se mantêm ligados à revista por meio dessa relação de confiança estabelecida entre os interlocutores do discurso, no caso, entre enunciadores e leitores de Veja.

Na visão de Baccega (1995, p.10), “os discursos são a base na qual se assentam os meios de comunicação social. São vozes e pontos de vista escolhidos para a divulgação, que nos dão a base para nos inserirmos no mundo”. A autora defende a ideia de que a comunicação é uma das instituições que “levam a pensar”, sobretudo pela aura de conhecimento agregada à informação.

Esse ponto de vista é reforçado por Crato (1992, p.163), para quem a notícia não é um reflexo puro do acontecimento, mas uma “representação comunicada ao público, é ao mesmo tempo objetiva e subjetiva. É objetiva, na medida em que traduz o acontecimento, e necessariamente subjetiva na medida em que o representa e codifica segundo normas sociais de comunicação”.

Em semiótica discursiva, o conjunto dessas estratégias desenhadas pela imprensa na divulgação deste programa constitui o contrato de comunicação, também designado contrato de veridicção ou de leitura ou fiduciário. É por meio deste contrato que o enunciador estabelece uma relação de confiança e de credibilidade com seus enunciatários. De acordo com Verón op cit (FERREIRA, 2002) apud (FRANÇA, 2002, p. 269), a noção de contrato evidencia as condições que unem a mídia aos seus consumidores, por isso, o objetivo do contrato nada mais é do que a busca de preservação do hábito de consumo, neste caso, do consumo de um suporte de imprensa.

O contrato de comunicação torna-se efetivo a partir da articulação do discurso cuja finalidade é informar, convencer, mas, ao mesmo tempo, precisa captar o interesse e a atenção do leitor, seduzi-lo a acreditar no discurso posto como verdadeiro.

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serviço da comunicação sistêmica. Ela atua por meio de uma racionalidade estratégica-instrumental, contruindo pacotes discursivos tecnologizados formados por especialistas (ou peritos) com o fim de atingir públicos específicos. Tal racionalidade constitui regimes de signos (ou de sentidos) que orientam a construção semiótica dos textos, estabelecendo contratos de comunicação entre enunciadores e enunciatários, sejam espectadores, ouvintes, leitores ou internautas.

As modalizações ocorrem por meio dos percursos passionais, entendidos como meios para se fazer identificar pelo afeto, pelo sensível do corpo. A grande maioria dos textos midiáticos produz a aproximação, via interpelação, a partir de estratégias como nos mapas cognitivos do sucesso e da qualidade de vida, com imagens eufóricas. A passionalização pode ser construída a partir de inúmeros sentimentos como o medo, a alegria e a esperança. O homem utiliza a estratégia simbólica para elaborar suas crises, seus medos, e se informa para tentar superar a sua impotência ou seu sentir-se impotente. Os enunciadores atuam nessa direção, de trazer informação para o sujeito auto-superar-se.

Ainda tratando-se de visibilidade, Veja, como a maioria dos veículos de comunicação, tem espaço para as representações e figurativizações de pessoas e grupos sociais com os quais ela estabelece uma relação de afinidade, de identificação. São entendidas como figuras do Mesmo, “as séries de paisagens socioculturais e políticas construídas (de modo euforizado) pelas mídias e homólogas a valorização média de seus públicos” (PRADO, 2006, p. 4). Na figura do Mesmo há uma identificação, uma aproximação pelas características que levam os leitores a se identificar, admirar ou aprender. Isso faz o leitor sentir-se parte do grupo ou querer pertencer a ele. Essas são as figuras que têm destaque na mídia, não apenas em Veja.

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De toda forma, as cenas trazidas pelas revistas interferem diretamente na vida das pessoas, seja pela identificação/projeção, seja por pautar os assuntos que farão parte das discussões em determinado momento. As revistas têm a capacidade de informar e formar o seu público alvo.

Já as representações e figurativizações do Outro são dadas para se falar de certos grupos sociais e suas séries de paisagens culturais e políticas frente às quais a mídia estabelece distâncias relativas e homologa o afastamento que seus públicos mantêm frente ao Outro, pois desse é preciso resguardar-se, marcando-o como exótico, ocultando-o do holofote midiático ou mesmo deixando-o às margens do sistema, assim ele pode ser assimilado, admitido ou segregado; em certos casos, ele é inscrito como inimigo e excluído. Na construção simbólica do Mesmo, o significante da vitória é sempre construído nas revistas a partir da apresentação de figuras de sucesso no mundo do dinheiro, empresários, artistas, desportistas. Raramente tornam-se visível nas capas do Outro, modelos de vitória e sucesso. Desta forma, quando o discurso midiático se refere ao Outro há uma carga de desvirtudes, assim a mídia procura construí-lo reduzindo-o ao Mesmo, ou seja, as imagens aceitas no imaginário da classe média; é o empresário homossexual ou o empresário de sucesso; a bissexual que diz ser desnecessário levantar bandeiras. Não faz parte da agenda a discussão sobre esses movimentos, a luta, a atuação coletiva; não se mostra o pobre que por esforço próprio conseguiu melhorar suas condições de vida e é um exemplo para os demais. Porque melhorou sua vida, mas continua pobre e o imaginário não aceita menos que rico ou milionário (PRADO, 2009, CD).

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Lula-Outro marca a alteridade estabelecida na construção de oposições entre Mesmo e Outro, entendidos como espaços materializadores dos valores de classes médias (o Mesmo) e pobres (o Outro).

Ainda de acordo com a pesquisa realizada pelo Grupo de Mídia Impressa, falar em regime de visibilidade de revistas implica em considerar que os enunciadores constroem cenários e narrativas materializados em encenações, embebidos em fortes percursos passionais para situar seus contratos de comunicação. Em tais regimes, certas figuras e temas alcançam o primeiro plano e não outros, permanecendo invisíveis ou em segundo plano.

Este estudo teve ainda a fundamentação teórica ancorada nos postulados de Ernesto Laclau (1985) e Norman Fairclough (2001), cujo argumento é de que o discurso não deve ser entendido como o simples reflexo de conjuntos de textos. Discurso é uma categoria que une palavras e ações, tem natureza material e não mental e/ou ideal. Discurso é prática – daí a ideia de prática discursiva – uma vez que quaisquer ações empreendidas por sujeitos, identidades ou grupos sociais são ações significativas. O social, portanto, é um social significativo, hermenêutico. Não aparece como algo a ser simplesmente desvendado, desvelado, mas compreendido a partir de sua miríade de formas, das várias possibilidades de se alcançar múltiplas verdades, sempre contingentes e precárias.

Ainda seguindo os postulados de Laclau, em termos analíticos mais precisos, um discurso ou uma totalidade estruturada relacional é o resultado de uma prática articulatória que constitui e organiza as relações sociais. A prática articulatória, por sua vez, consiste na articulação de elementos num sistema discursivo a partir de um ponto nodal – um ponto discursivo privilegiado – que fixa parcialmente os sentidos desse sistema (LACLAU e MOUFFE, 2004, p.154). É a partir desse ponto nodal ou palavra de ordem (DELEUZE e GUATTARI, 1995, p.16) que uma totalização discursiva parcial se constitui, criando uma visão de algo do mundo, que será abordado no capítulo de análise do objeto de estudos não apenas para desvendá-lo, mas para entendê-lo como propõe o autor.

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pela mídia. Nesse caso, os ensinamentos de Mauro Wolf (2006), encontrados especialmente em seu livro Teorias da Comunicação, serão importantes para a análise. As notícias publicadas não necessariamente conseguem fazer o leitor assumir o pensamento do enunciador, mas são eficazes em determinar o cardápio de temas sobre os quais o leitor poderá pensar. A mídia, nesse sentido, dita a pauta dos assuntos a serem discutidos, prioriza os mais importantes, os urgentes, os necessários, os irrelevantes, e a tendência de seu público é seguir esse agendamento.

Em consequência da ação dos jornais, da televisão e dos outros meios de informação o público sabe ou ignora, presta atenção ou descura, realça ou negligencia elementos específicos dos cenários públicos. As pessoas têm tendência para incluir ou excluir dos seus próprios conhecimentos aquilo que os mass media incluem ou excluem do seu próprio conteúdo. Além disso, o público tende a atribuir àquilo que esse conteúdo inclui uma importância que reflete de perto a ênfase atribuída pelos mass media aos acontecimentos, aos problemas, ás pessoas (SHAW, 1979, p.76) (WOLF, 2006, p. 144).

O jornalista tem, ainda, a tarefa de eleger, em meio a milhares de sugestões de matérias que surgem diariamente nas redações, quais delas serão de fato publicadas e se tornarão notícias. Wolf (2006, p.177 a 197) definiu seis critérios que auxiliam os profissionais a decidir quais acontecimentos serão notícia: proximidade, atualidade, identificação social, intensidade, ineditismo e identificação humana. Além disso, Rosa e Cunha (1999) apontam que é necessário clareza, precisão, objetividade e rapidez, cuja meta maior é integração entre a instituição e seu público.

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Ainda, por ser o tema estudado a morte, não é possível fazer a análise sem falar do Real traumático, do corte provocado pela perda que não é recuperada. Todo o sistema leva o ser humano a viver sem pensar na morte e também na própria vida. A velocidade (sociedade dromocrática) em que se vive coloca as pessoas sempre em atraso em relação às informações, às atualizações, aos aprendizados e, por estarem sempre “devendo”, sem tempo, não pensam na morte e quando o fazem é sempre na do outro. Como vários autores já abordaram, inclusive os citados, a “espuma” midiática distrai o ser humano da realidade, do Real.

Para abordar esse aspecto, serão utilizados alguns dos conceitos da psicanálise sob a ótica de Slavoj Žižek (2003). É preciso ter presente certos aspectos (pontos indeterminados) relacionados com o antagonismo social, a vida, a morte e a sexualidade. Na visão de Žižek, o Real não é nenhuma espécie de realidade atrás da realidade, mas sim o vazio que deixa a própria realidade incompleta e inconsistente:

o real não é o abismo da Coisa que escapa para sempre à nossa apreensão e que faz com que toda a simbolização do Real seja parcial e inapropriada; é antes aquele obstáculo invisível, aquele ecrã deformador que ‘falsifica’ sempre o nosso acesso a realidade exterior, aquela ‘espinha na garganta’ que imprime uma vertente patológica a toda a simbolização, ou seja, devido ao qual toda a simbolização falha o seu objeto (ŽIŽEK, 2006, p. 84).

É comum pensar que a psicanálise tem como pressuposto libertar as pessoas dos seus fantasmas, permitindo-as confrontar-se com a realidade como ela é. Nada é mais errado, pois de acordo como Žižek (2006), Lacan pretendia, pelo contrário, dar a ver como a existência cotidiana encontra-se imersa na realidade, estruturada e sustentada pelo fantasma (ou fantasia), sendo esta imersão perturbada pelos sintomas que testemunham o fato de outro nível da psique humana, reprimido, resistente a essa imersão. Atravessar o fantasma significa, então, paradoxalmente, identificar-se completamente com ele, isto é, com esse fantasma estruturador do excesso que resiste à plena imersão na realidade cotidiana e distinguir claramente o que é realidade do que é “a nossa ficção, o nosso fantasma”. “Temos de conseguir distinguir, naquilo que apreendemos como ficção, o núcleo sólido do Real, que só podemos enfrentar se o ‘ficcionarmos’ (ŽIŽEK, 2003)”. Para o autor,

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suportar se o transformarmos em ficção. (...) É necessário ter a capacidade de distinguir qual parte da realidade é ‘transfuncionalizada’ pela fantasia de forma que, apesar de ser parte da realidade, seja percebida num modo ficcional. Muito mais difícil do que denunciar ou desmascarar como ficção (o que parece ser) a realidade é reconhecer a parte da ficção na realidade ‘real’ (ŽIŽEK, 2003, p. 34).

1.2. Do ponto nodal à articulação discursiva nas reportagens de capa

Os meios de comunicação tornaram-se referenciais de mundo, servindo de parâmetro de valores e de comportamentos para os indivíduos. Na atualidade, configuram-se como espaço e dispositivos comunicacionais privilegiados de articulação dos campos sociais, onde os mais variados discursos buscam visibilidade.

Compreender as formas de articulação dos discursos sociais na e pela mídia é uma necessidade fundamental cuja dimensão é equiparada à importância do processo comunicacional na sociedade contemporânea. Por isso, para se entender a amplitude do conceito de discurso é preciso voltar a atenção para a relação dos mesmos com a ideologia e os pontos nodais a que estão intimamente ligados.

A articulação se inscreve no interior do contrato de comunicação, levando em consideração a instância de produção (emissor ou enunciador), a instância de recepção (receptor ou enunciatário) e o produto final (a notícia). Discurso é prática – daí a ideia de prática discursiva – uma vez que quaisquer ações empreendidas por sujeitos, identidades, grupos sociais são ações significativas. O social, portanto, é significativo, hermenêutico. Não aparece como algo a ser simplesmente desvendado, desvelado, mas compreendido, a partir de sua miríade de formas, das várias possibilidades de se alcançar múltiplas verdades, sempre contingentes e precárias.

No entender de Laclau (1985) “os discursos lutam por estabelecer verdades e por excluírem do campo da significação outros significados”. Assim, o trabalho de significação pressupõe três noções fundamentais: a de elemento, a de momento e a de prática articulatória. O texto fundador da teoria:

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elementos qualquer diferença que não seja discursivamente articulada (LACLAU e MOUFFE, 1985, p. 105).

Para Fairclough, qualquer prática discursiva envolve processos de produção, distribuição e consumo textual, e a natureza desses processos varia entre diferentes tipos de discurso de acordo com os fatores sociais. Esse pensamento também se apresenta em Greimas para quem o sentido de qualquer texto dá-se na sociedade através da cultura. Em outras palavras, “o texto encontra seu lugar entre os objetos culturais, inserido numa sociedade (de classes) e determinado por formações ideológicas específicas” (BARROS, 2005 p. 7).

Ao observar a construção das reportagens é possível perceber como os textos são construídos a partir da articulação dos significantes ao redor do ponto nodal. Para Laclau (1985, p. 113),

a prática da articulação, portanto, consiste na construção de pontos nodais que parcialmente fixam significados, e o caráter parcial desta fixação procede da abertura do social, um resultado, por sua vez, do constante transbordamento de todo o discurso pela infinitude do campo da discursividade.

Assim, a articulação discursiva é uma prática estabelecida entre elementos que, em um primeiro momento, não estão articulados entre si. Nesse sentido, Žižek (1991) identifica o ponto nodal como “elemento-Um que totaliza os outros, que os “desdobra” e faz com que sofram uma espécie de “transubstanciação”, começando a funcionar como expressão de um Princípio subjacente...”. Em outro aporte, Žižek (idem), designa o ponto nodal de ponto de basta ou basteamento como ponto de fechamento de um determinado discurso ou ideologia. “O basteamento é um ato essencialmente contingente pelo qual o campo ideológico-simbólico determina retroativamente suas “razões”, sua necessidade”.

Ao definir o discurso como uma totalidade estruturada pela prática articulatória, Laclau e Mouffe (1985 p.107) reconhecem que é uma tentativa de dominar o campo da discursividade: “se contingência e articulação são possíveis, isto ocorre porque nenhuma formação discursiva é totalmente saturada e a transformação de elementos em momentos nunca é completa”.

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de Laclau sobre esse tema, diz que “a operação de fechamento é impossível, mas ao mesmo tempo necessária; impossível devido ao deslocamento constitutivo que há no coração de qualquer arranjo estrutural, e, necessária, porque sem essa fixação fictícia do sentido não haveria nenhum sentido”.

Fairclough (2001), ao analisar o discurso em relação ao poder e à ideologia, o situa numa perspectiva de hegemonia, na qual se entendem as relações de poder como lutas hegemônicas. No caso de Veja, a luta é por estabelecer de forma hegemônica os sentidos relacionados à construção da realidade cotidiana e é assim que a noção de ideologia assume formas complexas na estrutura social. É nesse sentido que é importante desvendar como Veja busca dominar o campo do discurso por meio de suas reportagens para pautar a conversa dos leitores nos seus contextos de convivência.

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Capítulo 2

FORMAS DE REPRESENTAÇÃO DA MORTE DO MESMO E DO OUTRO NO AQUI E ACOLÁ

2.1. Regimes de visibilidade e afirmação de valores ideológicos em Veja

A revista Veja tem representado a morte de várias formas. Por um lado, a diversidade em termos de construção discursiva visa a provocar efeitos de sentido de proximidade do leitor com o tema e o objetivo último é captar o interesse do enunciatário de forma a levá-lo a acreditar no discurso do enunciador da revista. Por outro, a diversidade tem a ver com a caracterização do Mesmo e do Outro e, também, da localização de ambos no aqui e acolá, ou seja, em uma localização próxima ou distante do leitor.

A construção das capas, com todos os recursos discursivos, passa pela compreensão da lógica que guia o mercado dos veículos de comunicação. Há necessidade de as mesmas serem capazes de “capturar” a atenção e o interesse dos leitores. Essas são exigências da visibilidade, ou seja, a revista precisa ser vista e ser adquirida (consumida).

De acordo com Trivinho (2007), “visibilidade midiática diz respeito a tudo o que é visível, que comparece na esfera pública, que é percebido pelo público e produz sentido capaz de ser compartilhado entre os diversos interlocutores que têm acesso à mídia”. Portanto, é a visibilidade midiática que possibilita o compartilhamento de sentido no âmbito da experiência coletiva que produz o efeito de inclusão.

Ainda na visão de Trivinho, visibilidade midiática é, na atualidade, uma das estratégias fundamentais dos meios de comunicação de massa. Por meio dela marca-se premarca-sença ou ausência de certos acontecimentos, de determinados produtos, de mapas de consumo, de personagens, quer individuais ou coletivos, cuja presença ou ausência no espaço público, em um primeiro instante, fala por si mesma e gera repercussões na sociedade. Na mesma linha de pensamento, Mayra Rodrigues Gomes (2003, p. 103) argumenta que

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mantenedoras de escalas de valores, como vigilante. Temos que pensá-las em seu duplo papel: aquele pelo qual ela expõe, a todo o momento, os conflitos é também aquele pelo qual ela define a esfera de equilíbrio em que esses conflitos se diluiriam. Enquanto mostra, ela disciplina pela maneira do mostrar, enquanto mostra, ela controla pelo próprio mostrar. É em relação à disciplina que se diz que se não passou pela mídia não há poder de reivindicação; é em relação a controle que se diz que se não passou pelas mídias não existe.

Ao avaliar alguns procedimentos jornalísticos compreende-se como isso opera no cotidiano das redações. A começar pelas escolhas textuais dos assuntos retratados, Adriano Rodrigues afirma que os títulos da imprensa representam manifestações constantes do trabalho plástico da linguagem no mundo moderno.

O arranjo gráfico da página do jornal associa-se, aliás, à disposição fonética, sintática e semântica das formas linguísticas para constituírem em conjunto uma manifestação particularmente complexa, ao mesmo tempo estética e estratégica, assegurando uma multiplicidade de funções comunicacionais, nomeadamente poéticas, fáticas, referenciais, apelativas e metalingüísticas (RODRIGUES, 1990, p. 108).

Isso fica patente nos títulos de várias edições de Veja. Algumas palavras, expressões e/ou verbos são apelativos, pois convocam o leitor a um movimento, a uma ação, a um julgamento, a uma conclusão.

Os títulos podem ser considerados o grande dispositivo de nomeação do mundo moderno, de acordo com Rodrigues, “(...) a manifestação e a significação acabam, assim, por servir de âncora neste trabalho generalizado da nomeação, subordinando-lhe estrategicamente as outras dimensões discursivas”. Para o autor, entre as estratégias de subordinação destacam-se os processos da citação ou de relato do discurso de outrem identificados, muitas vezes, por marcas supra-segmentais como aspas (de distanciamento ou de simples sinalização), os dois pontos, os sublinhados ou a distinção de caracteres tipográficos.

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2.2. Agendamentos temáticos, enquadramentos e critérios de noticiabilidade

A hipótese de Agenda Setting faz parte de uma corrente de estudos desenvolvida pelo norte-americano McCombs na década de 60 e sustenta a tese de que “os meios de comunicação de massa não dizem ao público o que pensar, mas dizem sobre o que pensar”, ou seja, quanto maior a ênfase da mídia sobre um tema, maior será o incremento da importância atribuída pelos membros da audiência aos temas enquanto orientadores da atenção pública.

A teoria se constituiu em uma ferramenta de estudos das relações da mídia, sobretudo da televisão com o poder político, em especial na época de eleições. Apesar do viés político que a hipótese de Agenda Setting adquiriu inicialmente, com o passar do tempo, constatou-se que o fenômeno de agendamento também acontece em outros temas considerados importantes para a formação da opinião pública.

As matérias jornalísticas são um meio importante para o agendamento do público a respeito de assuntos considerados de relevância social. É por meio delas que alguns temas passam a compor os principais debates na esfera pública. No caso de

Veja, além de propor o agendamento, a revista cria um significado para os eventos, oferecendo certas formas de interpretação.

Na visão de Shaw apud Wolf (2003, p. 96), a hipótese de Agenda Setting

enfatiza os efeitos da mídia no público-alvo. Em consequência da ação dos jornais, da televisão e dos outros meios de informação, o público é ciente ou ignora, dá atenção ou descuida, enfatiza ou negligencia elementos específicos dos cenários públicos. As pessoas tendem a incluir ou a excluir do próprio conhecimento o que a mídia inclui ou exclui no seu conteúdo. Além disso, o público tende a conferir ao que ele inclui em seu conhecimento uma importância, que reflete de perto a ênfase atribuída pelos meios de comunicação de massa aos acontecimentos, aos problemas, às pessoas.

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O enquadramento ou frame é uma das estratégias discursivas cujo início deu-se nos trabalhos de Goffman apud Wolf (2003) sendo definido como conjunto de “construções mentais que permitem aos seus utilizadores localizar, perceber, identificar e catalogar um número infinito de ocorrências concretas”. Considera-se, assim, que a vida pública é organizada por meio de frames através dos quais as pessoas percebem os eventos ao seu redor.

No entender de Porto (2004, p. 78), enquadramentos “são marcos interpretativos mais gerais construídos socialmente que permitem as pessoas fazer sentido dos eventos e das situações sociais”. Na prática jornalística, um enquadramento é construído por meio de procedimentos como seleção, exclusão ou ênfase de determinados aspectos e informações, de forma a compor perspectivas gerais pelas quais os acontecimentos e situações do dia são dados a conhecer. Trata-se de uma ideia central que organiza a realidade dentro de determinados eixos de apreciação e entendimento, e envolvem, entre outros recursos, o uso de expressões, estereótipos, sintagmas.

Ao investigar as reportagens de capa de Veja é importante compreender algumas de suas características específicas. Uma delas é a disputa pelo público leitor. Essa disputa determina as condições de suas produções simbólicas, em virtude de a imprensa estar inserida em um mercado no qual a concorrência entre o que é produzido dentro e fora do país é grande. Outra característica é o fato de a revista constituir-se em espaço privilegiado de visibilidade de opiniões, de pessoas e de grupos diversos cujos interesses são variados. Nos espaços também circulam modelos de identificação que influenciam os modos de compreensão da realidade. Esses aspectos fazem os temas das reportagens funcionarem, muitas vezes, como agentes propagadores de ideias, possibilitando a articulação discursiva por meio de debate público de temas variados, por razões e circunstâncias diversas, como é o caso da morte.

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sociedade, o jornalismo edita o mundo, agenda temas e entra no processo permanente de produção de significado em todas as suas manifestações. O jornalismo é capaz de concentrar e orientar a atenção do público leitor para determinados temas.

De acordo Mauro Wolf (2009), uma das críticas à teoria de Agenda Setting, ou, simplesmente, teoria do agendamento, era o fato de a mesma se limitar à análise dos aspectos que incluiriam determinada notícia na agenda do público. A teoria do enquadramento complementa esses estudos ao observar como o jornalismo pauta a maneira da audiência refletir sobre o tema, delimitando-o, recortando-o. O autor afirma que com o enquadramento é possível atuar politicamente, definir problemas, diagnosticar causas, fazer um julgamento moral e sugerir remediações.

Os critérios de noticiabilidade, enquanto critérios de valoração do que é suscetível de se tornar notícia, ajudam a desvelar os elementos que influenciaram o agendamento das capas. Foram consideradas situações como importância, oportunidade, atualidade, novidade, frequência, interesse dos leitores, interesse público, impacto, consequências e repercussão, controvérsias, conflitos, negatividade, dramatização, crise, desvio, sensacionalismo, emoção, proeminência das pessoas envolvidas e excentricidade, entre outros (WOLF, 2006).

O agendamento temático é relevante na imprensa. Nas capas de Veja, percebe-se que são privilegiadas as notícias mais recentes e importantes, também consideradas, por decisão editorial, as que terão maior repercussão entre os leitores.

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Outro vetor de sustentação de capas da revista é a saúde, não apenas como ideal de beleza, mas para se manter o corpo saudável e poder viver mais e com melhor qualidade de vida. As novas descobertas da medicina, seguidas por uma bem montada “receita” de como viver bem, também fazem parte desse imaginário ideal construído e proposto pela revista.

As temáticas mais presentes nas capas de Veja, nos seus 43 anos de existência, falam de riqueza, de milhões e bilhões ganhos por personalidades dos mais diversos mundos, além das reportagens que propõem aos leitores formas de vida que levam ao sucesso ou a ganhar dinheiro.

Como está no próprio nome, Veja é um enunciador imperativo, julgador e manipulador que, a exemplo de outros meios de comunicação, se utiliza de programas modalizadores para fazer seu leitor saber o que os outros não sabem, saber fazer melhor do que todos e agindo assim estarão em consonância com os valores e crenças da sociedade atual e farão parte de um grupo especial: o “dos mais bem informados” e “melhor posicionados”.

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tendências das ações das mulheres, dos governos, da globalização) (PRADO, 2006).

Em contraposição ao exposto, o tema da morte não é euforizado nos meios de comunicação, nem na revista, indo na contramão dos ideais de Veja em termos de vitória e sucesso. Por esse motivo, será importante analisar como a revista trata o assunto.

Não pensar na morte é possível até que o Real se imponha e a morte se faça presente, seja pela ameaça da própria vida ou pela morte de uma pessoa próxima. A partir desse momento, é impossível negá-la, mesmo que esse seja o primeiro impulso. Nega-se a morte pelo desejo de viver e de não tomar consciência de que cada dia vivido é um passo em direção ao fim físico. Alguns pensadores afirmam que tentar negar a morte faz parte do “conseguir viver”, pois, na lucidez total, não se teria motivação suficiente para seguir adiante. “Eu acredito que têm razão, absoluta razão, aqueles que acham que uma plena compreensão da condição humana levaria o homem à loucura” (BECKER, 2007, p. 49).

A angústia gerada pela consciência da própria morte induz o homem, na maioria das vezes, a se defender e agir como se ela não existisse. A impotência é um fator que leva os seres humanos a vê-la como um acidente que acontece no percurso do “outro”. Sigmund Freud lembra que o homem vive como se a sua própria morte não estivesse presente em suas relações, somente a morte do outro. Negar a mortalidade, atualmente, é viver como se ela não existisse” (FREIRE, 2006, p. 28).

O medo da morte, presente em praticamente todas as sociedades, se apresenta de maneira diferente em cada época, mas tentar dissimulá-la, com frequência, compromete a autonomia do individuo, de acordo com Wolf (2006, p. 17),

Imagem

Gráfico 1: Classificação do corpus por eixos temáticos              Fonte: adaptação da autora, 2013

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