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A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA GLOSA UNILATERAL DE CRÉDITOS DE ICMS EM OPERAÇÕES COMERCIAIS ORIUNDAS DE ESTADOS COM BENEFÍCIOS NÃO AUTORIZADOS MEDIANTE CONVÊNIO DO CONFAZ

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Academic year: 2018

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(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

FACULDADE DE DIREITO

WIRLON NEVES DUTRA

A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA GLOSA UNILATERAL DE

CRÉDITOS DE ICMS EM OPERAÇÕES COMERCIAIS ORIUNDAS DE

ESTADOS COM BENEFÍCIOS NÃO AUTORIZADOS MEDIANTE

CONVÊNIO DO CONFAZ

(2)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

WIRLON NEVES DUTRA

A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA GLOSA UNILATERAL DE

CRÉDITOS DE ICMS EM OPERAÇÕES COMERCIAIS ORIUNDAS DE

ESTADOS COM BENEFÍCIOS NÃO AUTORIZADOS MEDIANTE

CONVÊNIO DO CONFAZ

Projeto de Pesquisa de Monografia apresentado como exigência parcial para obtenção do título de Bacharel em Ciências

Jurídicas à Banca Examinadora da

Faculdade de Direito.

Orientação: Prof. Carlos César Cintra

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WIRLON NEVES DUTRA

A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA GLOSA UNILATERAL DE

CRÉDITOS DE ICMS EM OPERAÇÕES COMERCIAIS ORIUNDAS DE

ESTADOS COM BENEFÍCIOS NÃO AUTORIZADOS MEDIANTE

CONVÊNIO DO CONFAZ

Trabalho de graduação aprovado como requisito parcial para a conclusão do Curso de Direito, na Universidade Federal do Ceará, pela comissão formada pelos professores:

Orientador: Prof. Carlos César Cintra

Departamento Acadêmico de Direito Público, UFC

Prof. André Studart

Departamento Acadêmico de Direito Público, UFC

Prof.ª Fernanda Cláudia Araújo

Departamento Acadêmico de Direito Público, UFC

(4)

AGRADECIMENTOS

(5)

DEDICATÓRIA

(6)

SUMÁRIO

1. Noções Introdutórias ... 1

1.1. O Sistema Jurídico Tributário ... 2

1.2. As normas-princípios tributárias ... 3

1.2.1. Os princípios jurídicos constitucionais brasileiros ... 4

1.2.2. Os princípios jurídicos tributários brasileiros ... 4

1.2.2.1 O Princípio Republicano ... 4

1.2.2.2 O Princípio Federativo e a autonomia dos entes federados... 5

1.2.2.3 O Princípio da Legalidade ... 6

1.2.2.4 O Princípio da Igualdade ... 8

1.2.2.5 Princípio da segurança jurídica ... 10

1.3. A competência tributária brasileira e o tributo ... 10

1.3.1. Definições e características ... 12

1.3.1.1. Privatividade ... 12

1.3.1.2. Indelegabilidade ... 13

1.3.1.3. Incaducabilidade ... 15

1.3.1.4. Inalterabilidade ... 15

1.3.2. Tributo ... 16

1.3.2.1. Definição ... 16

2. ICMS ... 17

2.1. Singelo histórico e o contexto do ICMS da CF/88 ... 17

2.2. Principais características ... 21

2.2.1. Extrafiscalidade na Atração de Incentivos Fiscais ... 21

2.2.2. Hipóteses de Incidência ... 22

(7)

2.2.4. Base de Cálculo e Alíquotas ... 24

2.3. O Princípio da Não-cumulatividade do ICMS ... 25

2.3.1. Noções gerais ... 25

2.3.2. O mecanismo das deduções, o direito ao crédito e a efetiva cobrança nas operações anteriores ... 27

2.3.3. Exceções ao Princípio da Não-cumulatividade ... 31

3. Benefícios Fiscais mediante convênio e a “Guerra Fiscal” do ICMS ... 35

3.1. Aferições iniciais ... 35

3.2. Prerrogativas para Concessão de Benefícios Fiscais ... 39

3.3. Benefícios Fiscais e Financeiros. Há diferença prática? ... 42

3.4. Tipos de Benefícios Fiscais ... 45

3.4.1. Isenções ... 46

3.4.2. Redução de alíquota e redução da base de cálculo ... 47

3.4.3. Diferimento ... 48

3.4.4. Anistia ... 49

3.4.5. Crédito presumido ou crédito outorgado ... 49

3.5. A inconstitucionalidade dos benefícios fiscais concedidos a margem da LC nº 24/75 ... 51

3.5.1. Desobediência ao art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal ... 54

3.5.2. A glosa dos créditos de ICMS, como reação ao benefício fiscal outorgado de forma unilateral ... 56

3.5.3. Do controle da validade da norma jurídica concessora de benefício fiscal ... 58

(8)

3.5.5. Sobre o direito ao crédito de incentivo declarado inconstitucional ... 67

(9)

1. Noções Introdutórias

O estado brasileiro, possuidor de dimensões geográficas continentais, traz consigo problemas inerentes a países com extensões gigantescas. Dentre tantas dificuldades, pode-se aventar a forte desigualdade social advinda de uma colonização típica de exploração, cuja acabou privilegiando certas regiões em detrimento de tantas outras, convergindo em uma das maiores concentrações de renda nas mãos de poucos do planeta.

Os sucessivos governos acabam por herdar uma situação bastante séria, tão forte que somente uma reestruturação de toda a organização administrativa do estado para conseguir colocá-lo no rumo do crescimento sustentável, que acabe por privilegiar as camadas mais pobres e desabastadas.

Dentre tantas atitudes a se iniciarem, a reforma tributária a cada dia adquire uma carga de importância tamanha que exsurge como mais do que uma vontade, uma real necessidade que importa numa série de mudanças estruturais.

Ponto de grande atenção, com grande apelo da sociedade, é justamente a busca do fim da Guerra Fiscal entre os Estados, o DF e os Municípios, que traz tantos prejuízos à nação simplesmente por, sobre a escusa de fomentar a economia local e diminuir a tão forte e já comentada desigualdade social, procederem eles uma busca quase que predatória por investimentos privados de corporações empresariais para instalarem em seus territórios unidades produtivas, com o pretexto de girar um determinado setor da economia que demanda de mais atenção pelo governo temporal.

(10)

de incentivos fiscais, principalmente usando o ICMS, imposto de competência estadual e do DF, mas com características eminentemente nacionais.

Essa busca desenfreada por investimentos à margem das normatizações legais e constitucionais serão devidamente estudadas e analisadas no presente trabalho até culminar na outra ponta dessa Guerra Fiscal, qual seja a glosa (anulação) de créditos de ICMS pelos Estados destinatários de mercadorias oriundas de Estados com benefícios fiscais ilegais.

Com esse objetivo, inicialmente, este estudo começará esmiuçando o Sistema Jurídico Tributário.

1.1. O Sistema Jurídico Tributário

O Direito Tributário, ramo autônomo da ciência jurídica, recebe destaque especial no capítulo I, do Título VI da Constituição Federal de Brasil de 1988, desde o artigo 145 até o artigo 162.

Vários são os mandamentos que a carta magna dispõe sobre o sistema jurídico tributário, todavia o foco deste trabalho é justamente aqueles que se referem ao arquétipo necessário para a compreensão do ICMS.

Fernanda Maia Salomão Alves em artigo sobre os “Limites Constitucionais à Concessão e Revogação de Incentivos Fiscais relacionados ao ICMS” demonstra

algumas particularidades do subsistema constitucional tributário brasileiro se comparado com Constituições estrangeiras:

(i) “Dispõe sobre diversas espécies tributárias, atribuindo regimes jurídicos diferentes para a criação de cada uma delas;

(11)

(iii) Atribui às pessoas políticas a competência para tributar sobre determinadas matérias;

(iv) Confere ao legislador complementar da União o papel de expedir normas gerais tributárias, aplicáveis a todas as pessoas políticas; (v) Reparte entre as pessoas políticas o produto da arrecadação de

alguns tributos, como manifestação de um federalismo cooperativo.”1

E todo o estudo demanda de embasamento dos pilares constitucionais mais sólidos que irão sustentar os principais argumentos trabalhados nessa pesquisa.

1.2. As normas-princípios tributárias

As normas-princípios erigem os pilares do sistema jurídico brasileiro, fornecendo o arcabouço de determinações hierárquicas que se dão à importância de serem consideradas o topo de todo o ordenamento jurídico nacional.

Noberto Bobbio doutrinou acerca do tema, conforme citação no trabalho do professor Klaus Eduardo Marques:

“Os princípios gerais são, a meu ver, normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais.”2

Portanto, a primeira fase em qualquer estudo jurídico é a identificação e a definição dos princípios constitucionais que emprestam juridicidade ao tema que se quer aprofundar.

1

Alves, Fernanda Maia Salomão. Limites Constitucionais à Concessão e Revogação de Incentivos Fiscais relacionados ao ICMS. MARTINS, Ives Gandra da Silva. ELALI, André. Peixoto, Marcelo Magalhães. (coords). Incentivos Fiscais: questões pontuais nas esferas federal, estadual e municipal. São Paulo: MP Ed, 2007. p. 163

2

(12)

1.2.1. Os princípios jurídicos constitucionais brasileiros

Salientando esta função fundamental dos princípios no ordenamento jurídico brasileiro, constante no topo da “pirâmide jurídica Kelsiana”, nem seria preciso comentar que qualquer afronta a algum destes princípios implicaria em profundo desrespeito ao sucesso deste sistema.

Ricardo Alexandre nos ensina mais sobre o tema:

“É somente com a compreensão do conteúdo e do alcance dos princípios que se consegue atender as diversas normas integrantes de um determinado ramo de direito e, por conseguinte, o todo, formado pelo ordenamento jurídico.”3

O Brasil, como não poderia deixar de ser, esquematizou toda a sua organização jurídica no mesmo objetivo, acarretando que qualquer tentativa de afronta a este pressuposto de validade normativa será devidamente rechaçado pela justiça pátria.

1.2.2. Os princípios jurídicos tributários brasileiros

Dos princípios gerais estabelecidos pela Constituição Federal brasileira de 1988, alguns tem implicação direta no ordenamento tributário, outros, por sua vez, trazem regramentos mais específicos.

Desta feita, comentaremos alguns que suportam o nosso estudo.

1.2.2.1. O Princípio Republicano

O texto maior de 1988 determinou logo em seu artigo 1º:

3

(13)

“Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático e tem como fundamento: (...).”

Carrazza conceitua república como:

“Um tipo de governo que tem como alicerce a igualdade formal das pessoas, as quais detêm a coisa pública, (res publica) e exercem o poder por meio de seus representantes, devidamente escolhido por eleição direta.”4

Todavia vale ressaltar que este princípio não está mais eleito como cláusula pétrea, visto que a forma de governo pode sofrer alteração mediante emenda constitucional à CF/88.

1.2.2.2. O Princípio Federativo e a autonomia dos entes federados

Como forma de Estado, agora sim, temos uma cláusula pétrea que em hipótese nenhuma pode ser alterada, conforme versa o art. 60, § 4º, I, da CF/88:

“Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: (...)

§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

(...)

I - a forma federativa de Estado; (...)”

Mais uma vez o professor Carrazza nos ensina que:

“Federalismo é um sistema de composição de forças, interesses e objetivos que podem variar, no tempo e no espaço, de acordo com as características, as necessidades e os sentimentos do povo”.5

4

Curso de Direito Constitucional Tributário. 17ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p. 48. 5

(14)

Entretanto não há um conceito uniforme para o Federalismo. Nossa Constituição, por exemplo, dá aos Municípios um papel altamente destacado na nossa federação, fazendo com que eles componham o pacto federativo.

O fato é que o Brasil se constitui numa República Federativa que destaca como membros federados a União, os Estados, o DF e os Municípios, todos com gozo de autonomia política, legislativa e financeira, indicando que a nenhum ente é lícito provocar qualquer gerência em outro, salvo nos casos em que a própria Constituição ressalvar.

Para clarificarmos mais ainda, valemo-nos do comentário de Leon Victor de Queiroz Barbosa em seu artigo sobre a “Guerra Fiscal”:

“Nessa forma de Estado, os estamos-membros gozam de certa autonomia, porém, não pode haver extremismos. Se há demasiada autonomia volta-se a uma confederação e, se há mais centralização, volta-se ao estado unitário onde o Governo Central detém o poder administrativo de todo o território nacional”.6

1.2.2.3. O Princípio da Legalidade

O princípio da Legalidade prescreve no inciso II do artigo 5º da CF/88 que

“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de

lei”.

Mais especificamente no aspecto material tributário, o art. 150, I, traz o

princípio da legalidade tributária ou da estrita legalidade:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

6

(15)

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; (...)”

É notória a preocupação do legislador quanto à possibilidade de instituição de tributos ou a sua majoração sem previsão anterior de lei autorizando. Note a exigência específica de lei em sentido estrito, não sendo aceitas, nesta perspectiva, normas infra legais que aumentem a carga tributária senão em virtude de lei.

Sobre esse tema escreveu o professor Luciano Amaro:

“O princípio é informado pelos ideais de justiça e de segurança jurídica, valores que poderiam ser solapados se à administração pública fosse permitido, livremente, decidir quando, como e de quem cobrar tributos.”7

É o que se pode chamar de reserva absoluta de lei. Ou “tipo tributário fechado” ou “tipicidade cerrada” como atenta Cassone, “no sentido de que a lei instituidora do

tributo deve conter todos os aspectos (ou elementos) do fato gerador” porque

enquanto a constituição fixa a regra-matriz da incidência, e a Lei Complementar

estabelece normas gerais, a Lei Ordinária institui o tributo, e, para tanto, deve prever

todos os aspectos do fato gerador”.8

Mister e necessária a consideração também do princípio do Paralelismo das Normas, conforme relata o professor Ricardo Alexandre:

“Tal princípio impõe que se um instituto jurídico foi criado por meio de uma regra jurídica de determinada hierarquia, para promover sua alteração ou extinção é necessária a edição de um ato de hierarquia igual ou superior.”9

7

AMARO, Luciano.Direito Tributário brasileiro. 14ª ed. São Paulo: SARAIVA, 2008. p. 111 8

Direito Tributário. 17ª ed. São Paulo: ATLAS, 2006. p. 146 9

(16)

Portanto se uma determinada lei criou ou modificou um determinado tributo, somente uma norma jurídica de hierarquia igual ou superior, ou seja, outra lei ou lei complementar poderão extingui-la.

Esta regra comporta algumas exceções, a saber:

 O art. 97 da CTN, que versa sobre alguns casos não abrangidos pelo

princípio da Legalidade, conforme já decidido pelo STF;

 Alguns impostos especificamente destacados na constituição como, por exemplo, as alíquotas do imposto de importação (II), de exportação (IE), sobre produtos industrializados (IPI) e sobre aplicações financeiras (IOF), devido à carga de extra-fiscalidade que os referidos possuem.

1.2.2.4. O Princípio da Igualdade

Este é um princípio destacado como direito fundamental individual de todos em nossa nação, conforme escorre o caput do artigo 5º:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza

(...)”

O professor Luciano Amaro defende que o princípio da Igualdade é “uma

garantia do indivíduo e não do Estado”, como desdobramento, o eminente jurista

ensina que “não pode a analogia ser invocada pela administração para exigir o

tributo na situação não prevista (CTN, art. 108, § 1º)”.10

Já Cassone ensina da seguinte forma:

“A igualdade serve para comparar situações iguais e desiguais, e não se confunde com a „capacidade contributiva‟. O instituto da capacidade contributiva serve para examinar e adequar a densidade da tributação. Se a

10

(17)

tributação for irrazoável ou desproporcional, superando a capacidade contributiva, o excesso, conforme o caso, pode ser vedado”.11

Em matéria tributária, o legislador constituinte de 1988 optou por ratificar ainda mais o princípio no artigo 150, II:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(...)

II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

(...)”

Esse mandamento destina-se propriamente ao legislador, visto que veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir tratamento desigual aos contribuintes equivalentes.

Relevante lembrar a relativização da aplicação do princípio diante da equidade nos casos em concreto que demandem a diferenciação aos diferentes, na medida de suas desigualdades. Podemos dizer que há um subprincípio dentro do princípio da Igualdade, o Princípio da Isonomia.

Ricardo Alexandre defende duas acepções para o princípio da Isonomia, uma

horizontal referente “às pessoas que estão niveladas, na mesma situação e que,

portanto, devem ser tratadas da mesma forma” e outra acepção vertical relativa “às

pessoas que se encontram em situações distintas e que, justamente por isso, devem ser tratadas de maneira diferenciada na medida em si diferenciam”.12

11

Direito Tributário. p. 163 12

(18)

1.2.2.5. O Princípio da Segurança Jurídica

Este é um princípio que não está explícito na Constituição, mas que pode ser extraído em uma leitura sistemática de seu texto, principalmente quanto aos princípios da legalidade, da garantia à coisa julgada, do direito adquirido, do ato jurídico perfeito, da igualdade, entre outros.

Ele visa dar estabilidade à ordem jurídica e garantir à sociedade a aplicação do direito posto, garantindo a expectativa do cidadão de ver materialização deste direito.

Como desdobramento deste princípio, principalmente no Direito Tributário, podemos destacar o princípio da Não-Surpresa, pois como assevera Ricardo Alexandre:

“Em matéria tributária, o princípio ganha um colorido especial, pois, para o contribuinte, não basta a segurança com relação aos fatos passados (irretroatividade da lei), também se faz necessário um mínimo de previsibilidade quanto ao futuro próximo” 13

O nobre autor deseja nos repassar a idéia de que mais do que segurança jurídica em si, tão necessária, também, é a garantia de que possíveis modificações em tributos tenham um período para adaptação dos contribuintes a esta nova realidade.

1.3. A competência tributária brasileira e o tributo

Em matéria tributária, o legislador constituinte original optou por descrever, de modo exaustivo, o campo de ação de cada ente federado e político, instituindo, para tanto, suas competências.

13

(19)

Esta é mais uma característica do nosso sistema jurídico, dividir minuciosamente cada responsabilidade e área de atuação com o flagrante intuito de dirimir possíveis questionamentos entre os participantes do pacto federativo, excedendo os ditames tradicionais expostos perante uma carta de Estado.

Daniel Monteiro Peixoto define a competência em seu artigo sobre a “Guerra

Fiscal do ICMS” como sendo:

“Em termos jurídicos, a habilidade para praticar atos (tomar decisões) cujo resultado é a criação de normas válidas, ou, em outras palavras, é a aptidão para provocar alterações no status normativo do ordenamento. Sem competência não se introduzem novas regras, da mesma forma que, sem competência, não se revogam (em sentido amplo) as regras já pertencentes ao direito positivo.”14

Carrazza mais uma vez nos empresta os seus ensinamentos:

“[...] os entes políticos só podem atuar dentro dos estritos termos de competência tributária que lhes foi outorgada pela Constituição Federal, uma vez que dela recebem não o poder tributário, mas, sim, uma parcela deste poder, bastante limitada pelas normas que disciplinam seu exercício.”15

O eminente jurista disseca mais um pouco o seu posicionamento:

“Poder tributário tinha a Assembléia Nacional Constituinte, que era soberana. Ela, realmente, tudo podia, inclusive em matéria tributária. A partir do momento, porém, em que foi promulgada a Constituição Federal, o poder tributário retornou ao povo (detentor da soberania). O que passou a existir, em seu lugar, foram as competências tributárias, que a mesma Constituição Federal repartiu entre a União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal.”16

14

Incentivos Fiscais: questões pontuais nas esferas federal, estadual e municipal. p. 69. 15

ICMS. 13ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 29. 16

(20)

1.3.1. Definições e características

Pedimos emprestado o conceito léxico de competência como sendo “a idéia de

capacidade, habilidade, aptidão, idoneidade ou, ainda, qualidade de quem é capaz

de apreciar e resolver certo assunto, fazer determinada coisa”.17

Do conceito acima exposto, podemos desdobrá-lo para a seara tributária como sendo a faculdade, a aptidão que é repassada a determinada pessoa política para criarem tributos.

Vitorio Cassone define singelamente a competência tributária como sendo “a parcela de poder tributário, que a Constituição dá às pessoas políticas”.18

Luciano Amaro complementa afirmando que:

“[...] a competência engloba, portanto, um amplo poder político no que

respeita a decisões sobre a própria criação do tributo e sobre a amplitude da incidência, não obstante o legislador esteja submetido a vários balizamentos”.19

Definindo o conceito de Competência Tributário passaremos agora às suas características, conforme didática de Carrazza.20

1.3.1.1. Privatividade

A primeira característica de Competência Tributária é que ela privada, ou seja, o ente político que a recebe a tem exclusivamente, negando, logicamente, tal faculdade aos demais.

17

HOLANDA, Aurélio Buarque de. Dicionário Aurélio – versão eletrônica. 18

Direito Tributário. p. 145. 19

Direito Tributário brasileiro. p. 93. 20

(21)

Digamos que ela está ligada diretamente à exclusividade do poder de instituir tributos por determinados entes.

Nesse talante, recorreremos à lição de Geraldo Ataliba:

“Quem diz privativa, diz exclusiva, quer dizer: excludente de todas as demais pessoas; que priva de seu uso todas as demais pessoas. A exclusividade da competência de uma pessoa implica proibição peremptória, erga omnes, para exploração desse campo.”21

Não entraremos aqui nas possibilidades residuais que a União tem para tributar sobre determinadas matérias ainda previstas, nem na competência comum relativa às taxas e às contribuições de melhorias atribuídas a todos os entes federados, visto que nosso foco se destina ao ICMS, cujo comentaremos mais acintosamente em capítulo a parte.

1.3.1.2. Indelegabilidade

O legislador constituinte ao repartir as competências tributárias entre os entes políticos elencados na carta magna garantiu a estes a faculdade de instituir tributos, não podendo transferir tais poderes para outra pessoa.

Carrazza corrobora tal entendimento afirmando que “é próprio da competência concedida pela Constituição o atributo da indelegabilidade. Noutros termos, o titular

de uma competência, seja qual for, inclusive a tributária, não a pode transferir, quer

no todo, quer em parte, ainda que por meio de lei”.22

21

A guerra fiscal do ICMS: uma análise crítica sobre as glosas de crédito. Cit. p. 51 22

(22)

Sendo faculdade, poderá até não exercê-lo, mas não delegá-lo, fato que não ocorre com o ICMS. Essa é a tese defendida por juristas como Roque Antonio Carrazza, Paulo de Barros Carvalho e Klaus Eduardo Rodrigues Marques.23

Defendem eles embasados no art. 155, § 2º, XII, “g”, da carta magna:

“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

§ 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (...)

XII - cabe à lei complementar: (...)

g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.”

Como já comentado brevemente, a LC nº 24/75 já disciplinou o tema instituindo a obrigatoriedade de autorização anterior do CONFAZ – Conselho Nacional de Política Fazendária. Portanto, qualquer intenção no sentido de abster de cobrança do ICMS, deve ser devidamente aprovada pelos Estados e Distrito Federal de forma unânime.

Desta feita iremos destacar a brilhante lição do professor Paulo de Barros Carvalho:

“Por sua índole eminentemente nacional, não é dado a qualquer Estado-membro ou ao Distrito Federal operar por omissão, deixando de legislar sobre gravame. Caso houvesse uma só unidade da federação que empreendesse tal procedimento, o sistema do ICMS perderia consistência, abrindo-se ao acaso das manipulações episódicas, tentadas com tanta frequência naquele clima que conhecemos por “guerra fiscal”. Seria efetivamente um desastre para a sistemática impositiva da exação que mais

23

(23)

recursos carreia para o erário do país. O ICMS deixaria, paulatinamente, de existir.”24

1.3.1.3. Incaducabilidade

A competência tributária estatuída pela constituição é plena, no sentido que o não uso pelo ente recebedor não o desabilita para exercê-la no momento que lhe convier.

Vislumbra-se com tal assertiva que existe uma incaducabilidade das competências.

Daniel Monteiro Peixoto em artigo sobre o tema assevera:

“[...] implica que seu não-exercício, ainda que prolongado no tempo, não tem o condão de impedir que a pessoa política, querendo, venha a criar, por meio de lei, os tributos que lhe foram constitucionalmente deferidos.”25

1.3.1.4. Inalterabilidade

Como o conteúdo da competência foi determinado mediante confecção do texto constitucional, somente o próprio legislador constituinte pode alterá-lo, seja originário ou derivado.

Melhor explicando tal afirmação, socorremos à lição do professor Klaus Eduardo:

“Não se está aqui afirmando que é vedada toda e qualquer alteração no campo da competência legislativo-tributária. A impossibilidade se restringe, tão somente, ao plano infraconstitucional.”26

24

A guerra fiscal do ICMS: uma análise crítica sobre as glosas de crédito. Cit. p. 57. 25

SANTI, Eurico Marcos Diniz (coord). Curso de Direito Tributário e finanças públicas. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 1087

26

(24)

1.3.2. Tributo

1.3.2.1. Definição

A definição mais clássica é a retirada da Lei nº 5.172/66, comumente chamada de Código Tributário, que foi devidamente recepcionada pela atual constituição, em seu artigo 3º:

“Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato lícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”

Portanto, podemos dissecar essa definição para melhor compreensão:

 Prestação pecuniária: deve ser expressada sob um valor econômico;

 Compulsória: demonstra o elemento da obrigatoriedade;

 Não é sanção de ato lícito: a obrigação do contribuinte de pagar tributos difere da cobrança de multas;

 Instituída em Lei: neste caso temos a necessidade de instituição mediante lei formal;

 Cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada: esta característica afasta qualquer tipo de discricionariedade na cobrança, estando intimamente ligada com o princípio da Indisponibilidade dos Bens Públicos.

Para Luciano Amaro, “tributo é a prestação pecuniária não sancionatória de ato ilícito, instituída em lei e devida ao Estado ou a entidades não estatais de fins de

interesse público”.27

27

(25)

2. ICMS

2.1. Histórico e o contexto do ICMS da CF/88

O ICMS, sobre o lay out que conhecemos atualmente, foi finalmente desenhado pela atual Constituição, todavia para chegarmos ao temos hoje nesta exação, um grande caminho foi traçado.

A Constituição imperial (1824), bem como a primeira republicana (1891), por exemplo, restringiram-se a instituir tributos sobre o patrimônio.

A legislação que principiou a versar sobre o consumo, sendo, portanto, uma peça embrionária do que temos hoje como ICMS, foi a Lei nº 4.625, de 31 de dezembro de 1922, que criou o “Imposto sobre as Vendas Mercantis”. Este imposto,

criado pela União, exigia um percentual de 0,3% (zero vírgula três por cento) das vendas realizadas pelos comerciantes que emitissem duplicatas contra seus devedores. Foi, portanto, um imposto criado quase que simultaneamente às duplicatas.

As consignações mercantis passaram a abranger o campo de incidência deste imposto com o advento da Constituição de 1934, criando o que passou a ser

conhecido com o “Imposto sobre Vendas e Consignações Mercantis”, o IVC.

Com o IVC, os valores eram arrecadados pela União, mas o produto de cobrança era considerado receita dos Estados-membros, sendo já a maior fonte de arrecadação dos Estados.

(26)

principais características do ICMS atual foi adicionada ao IVC, o advento da não-cumulatividade.

O IVC era um imposto cobrado em cascata, trazendo com isso uma série de prejuízos à cadeia produtiva, sendo um caminho sem volta a sua transformação para o que a moderna tributação utilizava, seguindo fortes tendência européias, principalmente da França, onde a técnica da não-cumulatividade foi estabelecida.

É nessa temática que surge o “Imposto sobre a Circulação de Mercadorias –

ICM”, imposto que trouxe a apuração para efeito de pagamento, admitindo o crédito fiscal nas compras de produtos a seus fornecedores em confronto com os seus débitos advindos de suas vendas.

Mesmo a edição da Constituição de 1967, onde se iniciará o período denominado como os “Anos de Chumbo”, justamente no governo militar, toda a estrutura do que fora estabelecido pela Emenda nº 18 foi mantida.

Em 1969 foi editada uma emenda que criou duas exceções ao princípio da não-cumulatividade, cujas estão mantidas até hoje, com a Constituição de 1988, que foram a isenção e a não incidência.

Com a promulgação da atual Carta Constitucional, afora a circulação de mercadorias, foram adicionadas ao campo de incidência do ICMS a prestação de serviços de comunicação e de transporte interestadual e intermunicipal.

(27)

Lei Complementar a definição dos critérios da regra-matriz de sua incidência, como as hipóteses de incidência, as alíquotas, a base de cálculo, os sujeitos, etc.

Sobre este assunto discorreu Ricardo Alexandre:

“Não foi por outro motivo que o ICMS foi o tributo mais comtemplado com regras estatuídas diretamente no texto constitucional. A esperança do legislador era justamente conferir algo de uniformidade entre as vinte e sete legislações do tributo (Estados e o Distrito Federal) e criar mecanismos para evitar ou solucionar controvérsias entre os sujeitos ativos, minorando os efeitos de uma guerra fiscal anunciada com a promulgação da Constituição Federal”.28

Geraldo Ataliba também escreveu sobre o tema específico:

“[...] embora sua cobrança seja estadual, não há dúvida de que a legislação que o condiciona é necessariamente nacional, exatamente porque as operações mercantis em grande parte se sucedem numa cadeia que começa e termina em diversas unidades da Federação, ou a produção das mercadorias, cuja comercialização é tributável, desdobra-se pelo território de diversos Estados”.29

Para normatização dessa exigência constitucional foi publicada a Lei Complementar nº 87/96, exigindo que todas as leis estaduais ou distrital que tratem do tema obedeçam exaustivamente aos ditames gerais da lei complementar em questão.

Todavia, não foi somente a exigência de Lei Complementar para regular os ditames mais gerais do ICMS que a atual Constituição se preocupou. Outras normas infraconstitucionais de cunho nacional foram permitidas, com intuito vertente de manter o equilíbrio do pacto federativo.

28

Curso Tributário Esquematizado. p. 565. 29

(28)

Delas podemos destacar a competência nacional do Senado Federal de gerir assuntos relativos ao ICMS como o estabelecimento das alíquotas aplicáveis às operações e prestações, internas, interestaduais e de exportação (art. 155, § 2º, IV, CF/88).

Com destaque maior, que este trabalho exige, trazemos o disposto o art. 155, §

2º, XII, “g”, da Constituição atual, já comentado em item anterior, que regula a

concessão de isenções e benefícios em matéria de ICMS deverá ser regulado por meio de Lei Complementar, legitimando a recepção da LC nº 24/75.

Esta Lei Complementar estabelece a obrigatoriedade de deliberação e aprovação de todos os Estados e do Distrito Federal para a concessão de benefícios fiscais durante as reuniões do Conselho de Nacional de Política Fazendária - CONFAZ.

E o CONFAZ durante um bom tempo desempenhou bem o seu papel, porém após a queda do regime militar e um profundo mergulho do país em uma grande crise econômica, acabou por transformar a guerra fiscal entre os Estados no que conhecemos atualmente. E quem escreveu majestosamente sobre o tema foi Marilena Simões Valentim:

“Operacionalmente o CONFAZ funcionou de modo eficiente até a derrocada do regime militar. A partir daí, exacerbaram-se as práticas unilaterais na concessão de investimento ou dilação do prazo de pagamento dos impostos por parte dos estados.

(29)

governos estaduais de procurar influenciar a alocação destes recursos, ou seja, atrair estes novos investimentos para seus estados, através de práticas que ficaram conhecidas como Guerra Fiscal”.30

2.2. Principais características

O ICMS é imposto com maior arrecadação no Brasil desde há muitos anos, por isso o governo federal tenta constantemente emplacar uma reforma tributária que importe no fim do ICMS e na criação do IVA Federal, padronizando as operações e unificando a sua legislação, porém essa é uma das tarefas mais difíceis, pois os Estados não aceitam a perda do poder político que a exação representa nos processos de atração de investimentos para a sua economia.

2.2.1. Extrafiscalidade na Atração de Incentivos Fiscais

É bastante sabido dentro do meio que a maioria da doutrina classifica o ICMS como um imposto eminentemente fiscal, ou seja, o objetivo maior dele é a arrecadação de recursos financeiros para os Estados, o DF e os municípios (já que uma parcela do que recebido a título de ICMS é repartido com eles, conforme art. 158, IV, CF/88)31 e ele realmente o é.

Em contraponto, Adilson Rodrigues Pires comenta a extrafiscalidade em seu

artigo sobre “Ligeiras reflexões sobre a questão dos incentivos fiscais no Brasil”

como sendo:

“Os tributos extrafiscais visam atender a situações sociais, políticas e econômicas relevantes dentro do panorama nacional.

30

A guerra fiscal no Brasil: impactos econômicos. Disponível em: <http://www.achegas.net/numero/quatorze/marilena_v_14.htm>.

31

Art. 158. Pertencem aos Municípios: ...

(30)

(...)

A função extrafiscal, sobretudo, tornou-se importante instrumento de integração social e de distribuição de riqueza”.32

Todavia, para efeito de compreensão deste trabalho, ousamos colocar esta característica logo no princípio no sentido de proporcionar uma análise crítica desta classificação.

O fato é que apoiados nos ditames do art. 155, § 2º, XII, “g”, CF/88, os Estados e o DF tem uma ferramenta destacadamente extrafiscal em mãos para atração de recursos e incentivos para os seus territórios.

Neste contexto, todavia apoiado no princípio da seletividade do ICMS, escreve Ricardo Alexandre:

“O ICMS tem finalidade indiscutivelmente fiscal, apesar de a Constituição Federal permitir que seja seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços (CF, art. 155, § 2º, III), faculdade que, se utilizada, proporcionaria visíveis notas de extrafiscalidade ao tributo, pois sua incidência seria mais elevada sobre as mercadorias e serviços consumidos pelas pessoas de maior capacidade contributiva, de forma a redistribuir renda”.33

O mesmo jurista define que “o tributo possui finalidade extrafiscal quando objetiva fundamentalmente intervir numa situação social ou econômica”.34

2.2.2. Hipóteses de Incidência

Podemos definir a hipótese de incidência como sendo a situação fática discriminada em lei que, caso ocorra, deflagrará a obrigação do sujeito passivo devidamente prescrita.

32

Incentivos Fiscais: questões pontuais nas esferas federal, estadual e municipal. p. 18 33

Curso Tributário Esquematizado. p. 565 34

(31)

No caso do ICMS, há várias possibilidades que podem gerar a obrigação, fato que o caracteriza como um imposto multifacetário, pois possui vários outros dentro dele, proporcionando assim mais do que uma hipótese de incidência.

A mais importante economicamente delas é a incidente sobre a operação de circulação de mercadorias e, como defende Carrazza e a maioria da doutrina, “tal circulação só pode ser jurídica (e não meramente física). A circulação jurídica

pressupõe a transferência (de uma pessoa para outra) de posse ou propriedade da

mercadoria. Sem mudança de titularidade da mercadoria, não há falar em tributação

por meio de ICMS”.35

E a conceituação de mercadoria é de grande valia. Para tanto traremos a lição

de Aliomar Baleeiro, que define mercadoria “o bem econômico que alguém, com o

propósito deliberado de lucro, produz para vender ou compra para revender”.36

Superada esta conceituação, podemos certificar que a maioria esmagadora de casos que provocam e acirram a guerra fiscal são justamente os relacionados com a operação de circulação de mercadorias.

Os contribuintes, com o intuito de baratear os seus custos, acabam por adquirir mercadorias para revenda ou para utilização em seu processo produtivo de Estados que concedem benefícios fiscais sem amparo em Convênios, objetivando galgar preços mais competitivos no mercado.

Essa prática acaba por provocando reações dos Estados destinatários destas mercadorias, no intuito que coibir essa concessão indiscriminada de incentivos.

Todavia o ICMS possui outras formas de incidência como a efetuada sobre:

35

ICMS. p. 38. 36

(32)

 os serviços de transporte interestadual e intermunicipal;

 os serviços de comunicação;

 a produção, importação, circulação, distribuição ou consumo de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos e de energia elétrica.

Veja que dentro da mesma exação podem ser destacadas pelo menos cinco formas específicas de incidência, todavia nos ocuparemos precipuamente da circulação de mercadorias.

2.2.3. Casos de Não-incidência

As formas de não-incidência do ICMS, ou seja, as situações fáticas onde ele não terá aplicação, serão necessariamente as imunidades (casos qualificados na constituição), as isenções (concedidas mediante lei no sentido estrito) e os vácuos normativos implícitos da Constituição.

Porém abordaremos melhor sobre este assunto em capítulo a parte.

2.2.4. Base de Cálculo e Alíquotas

Sobre cada situação fática ocorrida constantemente, dentro do rol de possibilidades estabelecidas, será cobrado um valor relativo ao ICMS que será calculado mediante a aplicação de um percentual sobre uma base imponível.

Esse percentual é o que a doutrina e a legislação chamam de alíquota, sendo que a base imponível será a base de cálculo.

Carrazza conceitua base de cálculo com sendo “a dimensão da materialidade do tributo. É ela que dá critérios para mensurar um fato imponível tributário”37. O

37

(33)

respeitável jurista continua sua destacada facilidade de cátedra afirmando que

alíquota é o critério legal, normalmente expresso em percentual (%), que,

conjuntado à base de cálculo, permite discernir o quantum debeatur (quantia devida,

a título de tributo)”.38

Nas operações com circulação de mercadoria, para determinação da base de cálculo será feita em aplicação no valor da operação realizada.

Já as alíquotas, o Senado Federal, como casa de representação dos Estados, define os percentuais mínimos nas operações internas e fixa também as máximas

(art. 155, § 2º, V, “a” e “b”, CF/88), bem como estabelece as alíquotas aplicáveis às

operações e prestações, interestaduais e de exportação (art. 155, § 2º, IV, CF/88). Esta última medida busca evitar a guerra fiscal se as alíquotas internas fossem menores que as interestaduais.

2.3. O Princípio da Não-cumulatividade do ICMS 2.3.1. Noções gerais

A ideia atual que temos de não-cumulatividade começou a ser adotada no sistema jurídico pátrio com a publicação da Emenda 18/65. Essa emenda trouxe a adoção da não-cumulatividade para o ICM e ao IPI.

Já o artigo 23, II, da Emenda Constitucional 23/83, alterando o texto da Constituição de 1969 (estabelecida pela promulgação da Emenda nº 01/69 que

acabou estabelecer uma “nova ordem Constituição Federal”), trouxe uma inovação que será de grande valia para a compreensão e o esclarecimento de um ponto fundamental deste trabalho, as únicas duas exceções ao princípio da

38

(34)

cumulatividade: “a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação”.

Na atual Constituição, o texto foi trazido quase que da mesma forma, conforme pode verificar-se no artigo 155, § 2º, I e II:

“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

...

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

...

§ 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;

II - a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação:

a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;

b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores;”

Note que o legislador constituinte determinou somente essas duas possibilidades em que a não-cumulatividade sofrerá algum tipo de limitação, fazendo com que muitos doutrinadores defendam veementemente este princípio com um dos pontos basilares do sistema tributário nacional.

Carrazza determina que:

(35)

de ver observado, em cada caso concreto, o princípio da não-cumulatividade do ICMS”.39

Todavia sobre as exceções detalharemos depois em tópico próprio. O que podemos aferir neste momento é que os efeitos jurídicos determinados pela Carta Magna não podem, sob hipótese nenhuma, ser tolhidos pela legislação infraconstitucional.

Mesmo concordando com o entendimento exposto acima, não podemos deixar de mencionar a opinião da outra parte da doutrina de que a não-cumulatividade seja uma mera técnica de arrecadação, tratando-se somente de um direcionamento jurídico da forma como o ICMS deve ser operacionalizado. Assim dissertam José Eduardo Soares de Melo, Luiz Francisco Lippo40 e Christiane Mendonça41.

Já Hugo de Brito Machado considera a não cumulatividade um princípio e também uma técnica de arrecadação, quando afirma “que não se estabelece exaustivamente o modo pelo qual será efetivada a não-cumulatividade”, sendo a

técnica “o modo pelo qual se realiza o princípio”.42

2.3.2. O mecanismo das deduções, o direito ao crédito e a efetiva cobrança nas operações anteriores

Exauridas a classificação e a fonte normativa da não-cumulatividade, traçaremos agora como ela é operacionalizada cotidianamente e o primeiro conceito que o estudioso do assunto deve ter claro é o do mecanismo das deduções do ICMS oriundo de operações anteriores, conforme art. 155, § 2º, I, da Constituição de 88, outrora citado. Ou seja, compensando-se o que for devido em cada operação ou

39

ICMS. p. 339 40

A guerra fiscal do ICMS: uma análise crítica sobre as glosas de crédito. Cit. p. 84. 41

Idibem. Cit. p. 85 42

(36)

prestação, adotando o que foi batizado de sistema de abatimentos ou mecanismo de deduções.

Para ilustrarmos tal processo, pediremos emprestada a lição prática de Cassone:

“[...] o ICMS incidirá sobre o valor total das mercadorias, dando a diretriz de como deverá ser emitido o documento fiscal. E a não-cumulatividade se efetivará no momento do pagamento do imposto por D, em que, do devido na operação de saída de seu estabelecimento, se abaterá o montante do ICMS cobrado nas operações anteriores (de A para B, de B para C, de C para D). Na prática, esse montante cobrado consta do documento relativo à operação de venda, emitido por C contra D, considerando que no documento fiscal de C já vem embutido o valor das anteriores”.43

O que o nobre jurista diz é que quando um contribuinte do ICMS “B” efetua a aquisição de uma mercadoria ou contrata um serviço de um fornecedor qualquer também contribuinte do ICMS “A”, terá o direito de deduzir do valor que irá pagar da exação relativamente as suas saídas (vendas na maioria), ficando a seu cargo somente o que acrescer ao valor adquirido, sendo, portanto, considerado como um tributo sobre o valor agregado. Todavia com algumas diferenciações, já que o IVA tradicional formalmente incide na base de cálculo pela dedução entre o valor de venda da mercadoria e o seu valor de compra, enquanto o ICMS deduz-se o valor efetivo do imposto.

Geraldo Ataliba e Cléber Giardino doutrinaram bem quando consideraram que

o abatimento é, nitidamente, categoria jurídica de hierarquia constitucional porque:

criada pela Constituição. Mais que isso: é direito constitucional reservado ao

43

(37)

contribuinte do ICM; direito público subjetivo de nível constitucional, oponível ao

Estado pelo contribuinte do imposto estadual.”44

Por ser o ICMS um tributo plurifásico, verifica-se de pronto que ele “nascerá”

em cada operação ou prestação de serviço cuja incidência seja devidamente tipificada legalmente, sendo, por este motivo, fundamental a importância da não-cumulatividade para que ele não sofra uma cobrança em cascata. Afinal, como ensinou Ricardo Lobo Torres em seu artigo sobre “O Princípio da Isonomia, os

Incentivos do ICMS e a Jurisprudência do STF sobre a Guerra Fiscal”, “o importante,

no princípio da não-cumulatividade, é evitar a incidência em cascata ou a

pluriincidência, já que o tributo, embora, plurifásico, incide uma única vez”.45

Quanto ao direito ao crédito deste contribuinte que adquire a mercadoria, o princípio da não-cumulatividade garante que todo o ICMS incidente nas operações ou prestações anteriores seja devidamente abatido do imposto devido nas operações posteriores.

Se assim não fosse, qualquer retaliação à não-cumulatividade acarretaria consideráveis abalos nas relações comerciais, devido ao aumento dos custos pela proibição do aproveitamento do imposto destacado na NF. Lembrando para tanto que não se faz necessária a efetiva cobrança do ICMS nas operações anteriores, conforme relatado por Carrazza:

“Basta que as leis de ICMS tenham incidido sobre as operações ou prestações anteriores para que o abatimento seja devido. Em suma, a expressão „montante cobrado‟, contida na segunda parte do art. 155, § 2º, I,

44

ICMS. Cit. p. 341 45

(38)

da CF, deve ser juridicamente entendida como „montante devido‟ e, não, como „montante efetivamente exigido.”46

Klaus Eduardo Rodrigues Marques destaca com bastante propriedade a seguinte premissa:

“No ICMS, com a ocorrência do fato social previsto no antecedente da regra-matriz de incidência tributária, temos o surgimento concomitante de duas relações jurídicas: a primeira, entre o contribuinte vendedor e o Estado, que tem por objeto o pagamento do tributo devido pelo primeiro; e a segunda, entre o contribuinte adquirente da mercadoria e o Estado, que dá ao primeiro o direito subjetivo de utilizar o crédito do ICMS nas suas operações subsequentes”.47

Mais do que a própria lógica da sistemática, mister se faz valorizarmos o princípio da segurança jurídica, pois como ficaria a situação do contribuinte adquirente que estaria em grande imbróglio sobre o real direito de aproveitar o crédito oriundo de suas aquisições de boa-fé?

Além de que a norma concessora de benefício fiscal ilegal somente perderá sua eficácia depois que o STF se manifestar a respeito, mediante propositura de ADI pelos interessados, e, posteriormente, o Senado Federal suspender a execução, de acordo com o art. 52, X, da CF:

“Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: ...

X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;”

José Eduardo Soares de Melo comenta bem em artigo sobre “Incentivos

Fiscais de ICMS: Aspectos Críticos” que “a ADI tem por objetivo retirar uma lei

46

ICMS. p. 343. 47

(39)

inconstitucional do ordenamento jurídico, anulando os efeitos fiscais relativos aos

incentivos concedidos de forma inadequada”.48

Não podemos deixar de mencionar a opinião de Carlos de Oliveira Vianna, que, respaldando-se no mesmo princípio da segurança jurídica, defende a imposição da glosa de créditos e a posterior quebra da não-cumulatividade:

“Por outro lado, a Administração Pública está obrigada a aplicar essas normas sob pena, também, de violação aos princípios da isonomia e da segurança jurídica que deve preservar.”49

2.3.3. Exceções ao Princípio da Não-cumulatividade

Como já aventado, a Constituição de 1988 somente enumerou duas hipóteses de restrição ao princípio da não-cumulatividade, a isenção e a não incidência, podendo ainda a legislação infraconstitucional dispor contra essas duas excepcionalidades, mas nunca estendê-las.

O próprio STF já se manifestou sobre o assunto, atestando o pensamento aqui exposto, inclusive rechaçando a adição às duas hipóteses de redução da base de cálculo, conforme julgamento abaixo:

“RE 357.405-1 – MG – 2ª Turma, Relator. Min. CARLOS VELLOSO, publicado no DJ de 01/02/2005:

“CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. ICMS. BASE DE CÁLCULO: REDUÇÃO. CRÉDITO. PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. C.F., art. 155, § 2º, I.

(...)

II – O princípio da não-cumulatividade consiste no realizar o abatimento, na operação posterior, do imposto incidente e pago na operação anterior. C.F., art. 155, § 2º, I. Impossibilidade da vedação do crédito em razão da redução da base de cálculo do imposto.

48

Incentivos Fiscais: questões pontuais nas esferas federal, estadual e municipal. p. 237 49

(40)

III – RE provido. Não provimento do agravo. Embargos de declaração prejudicados.”(grifos nossos)

Carrazza, inclusive, doutrina que “esse rol é taxativo (numerus clausus), não sendo dado nem ao legislador, nem ao julgador, nem ao agente fiscal, nem ao exegeta, ampliá-lo, tanto mais porque as exceções devem ser interpretadas restritivamente, nos termos da conhecida parêmia exceptio est strictissimae interpretations.”50

Porém, recentemente o Colendo Supremo Tribunal Federal abandonou a linha de pensamento anterior, incluindo nas duas hipóteses a redução da base de cálculo também, conforme a ementa da decisão do RE nº 174.478/SP, publicada no DOU de 30/09/2005, abaixo:

“EMENTA: TRIBUTO. Imposto sobre Circulação de Mercadorias. ICMS. Créditos relativos à entrada de insumos usados em industrialização de produtos cujas saídas foram realizadas com redução da base de cálculo. Caso de isenção fiscal parcial. Previsão de estorno proporcional. Art. 41, inc. IV, da Lei estadual nº 6.374/89, e art. 32, inc. II, do Convênio ICMS nº 66/88. Constitucionalidade reconhecida. Segurança denegada. Improvimento ao recurso. Aplicação do art. 155, § 2º, inc. II, letra "b", da CF. Alegação de mudança da orientação da Corte sobre os institutos da redução da base de cálculo e da isenção parcial. Distinção irrelevante segundo a nova postura jurisprudencial. Acórdão carente de vício lógico. Embargos de declaração rejeitados. O Supremo Tribunal Federal entrou a aproximar as figuras da redução da base de cálculo do ICMS e da isenção parcial, a ponto de as equiparar, na interpretação do art. 155, § 2º, II, "b", da Constituição da República.”

Todavia Carrazza continua defendendo a tese da não-equiparação à isenção:

“A isenção limita o âmbito de validade da norma jurídica tributária, impedindo que o tributo nasça. Ou, se preferirmos, dá nova configuração à norma jurídica tributária, impedindo, assim, que o tributo nasça in concreto (evidentemente, naquela hipótese descrita na lei isentiva).

Em suma, é impróprio falar em isenção parcial, até porque não há meia isenção (ou há isenção, ou não há isenção: tertium non datur).

50

(41)

Muito bem. Na hipótese de o contribuinte optar pela tributação com base de cálculo reduzida, ele não fica isento do pagamento do ICMS, mas apenas vê diminuído o montante a pagar. Há, pois, incidência, embora esta leve a uma redução do quantum debeatur.

Daí não se aplicarem em operações com redução de base de cálculo as vedações ao direito de crédito insculpidas no art. 155, § 2º, II, da CF.”51

Interessante que a própria LC nº 24/75 diferencia os institutos quando em seu art. 1º, para gerar os mesmos efeitos da isenção a outras hipóteses, destaca no seu Parágrafo único a redução da base de cálculo; a devolução total ou parcial, direta ou indireta, condicionada ou não, do tributo, ao contribuinte, a responsável ou a terceiros; a concessão de créditos presumidos; a quaisquer outros incentivos ou favores fiscais ou financeiro-fiscais, concedidos com base no Imposto de Circulação de Mercadorias, dos quais resulte redução ou eliminação, direta ou indireta, do respectivo ônus e as prorrogações e as extensões das isenções vigentes na data de publicação da lei.

Todavia não podemos nos esquecer de apontar os casos de restrição ao creditamento do ICMS elencados na Lei Complementar nº 102/00, que alterou a Lei Complementar n 87/96, adiados para o ano 2.020 pela Lei Complementar nº 138/10, a saber:

 A apropriação à razão de 1/48 avos para os créditos decorrentes de aquisições de mercadorias para o Ativo Permanente do estabelecimento;

 A permissão de aproveitamento do crédito de ICMS incidente na aquisição de Energia Elétrica somente para a fração consumida no processo de industrialização, excluindo, por consequência, a parte utilizada na área administrativa;

51

(42)

 Além ainda do direito ao crédito no recebimento de serviços de comunicação dos quais tenham sido prestados na execução de serviços da mesma natureza.

Alertamos que o STF julgou constitucional a LC nº 102/00, incluindo tais exceções ao elenco normativo, mesmo não sendo a corrente defendida neste trabalho.

(43)

3. Benefícios Fiscais mediante convênio e a “Guerra Fiscal” do ICMS

3.1. Aferições iniciais

Como já comentado em capítulo a parte, o pacto federativo, na sua proposta e operacionalização, para funcionar a esmo necessita de cessão de autonomia político-administrativa e financeira, consubstanciada na repartição de competências tributárias devidamente estatuídas pela Constituição de 88, como fonte de recursos para cada ente federado.

Os tributos, além de sua função eminentemente fiscal (arrecadação), também possuem funções específicas para regular o mercado, estimulando ou desestimulando determinadas condutas, seja qual for o objetivo principal (social, econômico, econômico etc), que é chamado de função extrafiscal dos tributos. Dentre desse contexto de extrafiscalidade está inserida a concessão de benefícios fiscais.

Em artigo escrito sobre “Incentivos Fiscais, Neutralidade da Tributação e Desenvolvimento Econômico”, André Elali incentiva a concessão de benefícios:

“Num país de grande extensão territorial, com enormes diferenças entre as regiões, sejam elas culturais, econômicas ou sociais, o federalismo é uma ferramenta bastante útil na busca da ordem econômica e social, tratando-se de um movimento baseado na tendência de harmonização, no pluralismo e na solidariedade”52

Os entes federados com o vertente foco de atração de uma determinada empresa ou de um determinado rol de empresas acabam por oferecer certas benesses, dentre elas os benefícios fiscais, sejam eles na forma de renúncia tributária ou sobre benefícios financeiros que, inclusive, são atos discricionários do

52

(44)

poder público, servindo de estímulo para a instalação de unidades em seus territórios, já que normalmente essas empresas iriam ser instaladas em outras cidades ou estados com mais estrutura de fornecimento de mercadorias, serviços e, como não, perto de grandes centros consumidores, diminuindo assim os custos e maximizando a logística empresarial.

Todavia o ICMS, como tributo estadual ou distrital e com características eminentemente nacionais, possui vários limitadores constitucionais ao exercício operacional da competência legislativa desta exação, no intuito flagrante de evitar a competição desenfreada entre os estados e o DF, gerando a famigerada Guerra Fiscal.

Já comentamos que a busca predatória por investimentos privados utilizando-se das concessões desregradas de incentivos fiscais à margem da formal autorização mediante convênio de todos os Estados e do DF em deliberação conjunta no CONFAZ, pode trazer uma série de prejuízos à sociedade, repercutindo em distorções econômicas, como o desfalque à livre concorrência, e em distorções jurídicas, como o desrespeito ao princípio da não-cumulatividade, na resposta dos Estados cujos estão localizados os adquirentes de mercadorias com incentivos ilegais.

Marilena Talarico Martins Rodrigues explica com propriedade esse ponto de vista:

(45)

esse estágio, as firmas escolhem sua localização levando em conta apenas as condições de mercado e de produção (e pagando menos imposto em qualquer lugar que desejem se instalar).”53

Daniel Monteiro Peixoto explica sem menos grandeza essa ponto de vista:

“Como justificativa desta prática é comum a tese de que a renúncia fiscal há de ser equilibrada pelo aumento da base tributável, implicando, no final das contas, certo ganho de arrecadação. Este raciocínio, contudo, deve ser tomado com cautela, visto que, com o aumento da competição entre os Estados – um verdadeiro leilão de benefícios -, instaura-se o caráter predatório, exigindo renúncias cada vez maiores para que se configure o referido caráter atrativo.”54

Mais adiante, em seu artigo, o respeitável professor aponta alguns fatores utilizados pelos Estados para legitimar essa busca desenfreada por investimento privados:

 Desequilíbrio entre as diversas regiões e Estados no que respeita à oferta de mão-de-obra qualificada, bem como de infra-estrutura de instalação e outros;

 Atribuição aos Estados-membros (entes subnacionais) da competência para a instituição e cobrança do principal tributo sobre o consumo, ao contrário do que se considera um padrão mundial;

 A adoção do chamado “princípio da origem”, de modo a concentrar o impacto fiscal no Estado em que se localiza a empresa que dará ensejo à operação de saída;

 A falta de aptidão do Judiciário para dar respostas ao problema, devido à lentidão de rito e sobrecarga de processos.

O fato é que ao outorgar um determinado benefício a uma determinada empresa, um Estado passa a ser devedor do contribuinte, na proporção da benesse concedida, e outro Estado também será devedor de contribuinte, quando da aquisição de mercadorias ou serviços a fornecedores localizados no estado concessor dos incentivos inconstitucionais, instaurando-se de vez a revolta do estado destino, com retaliações poderosas.

53

MARTINS, Ives Gandra da Silva. ELALI, André. Peixoto, Marcelo Magalhães. (coords). Incentivos Fiscais: questões pontuais nas esferas federal, estadual e municipal. p. 321.

54

(46)

Recorremo-nos agora ao conceito de Guerra Fiscal emanado por Klaus Eduardo Rodrigues sobre o tema:

“‟Guerra Fiscal‟ é, pois, na acepção utilizada pela ciência do direito, uma competição entre pessoas políticas com o fim de atrair aos seus territórios novos investimentos privados. Como principal artifício desta verdadeira disputa tributária entre unidades federadas, os Estados utilizam-se de isenções, benefícios e incentivos fiscais para desonerar contribuintes e, com isso, garantir o seu desenvolvimento econômico.”55

Opina também Ricardo Varsano sobre a Guerra Fiscal, ao ser citado em artigo de Suelen Cars, quando diz que:

“[...] o ente federado que ganha [...] impõe, na maioria dos casos, uma

perda a alguns dos demais, posto que a guerra raramente é um jogo de soma positiva. O federalismo, que é uma relação de cooperação entre as unidades de governo, é abalado.”56

Outra que comenta sobre o tema com uma lucidez grandiosa é Marilena Simões Valetim quando diz que:

“A troca de critérios de eficiência econômica por artificialismo tributário, na

localização de uma indústria, acaba por reduzir o custo privado da produção e aumentar seu custo social. A consequência é a queda na qualidade e/ou quantidade de serviços públicos. De fato, esses incentivos fiscais não geram, agregadamente, aumento de investimentos, mas apenas determinam sua relocalização dentro do território brasileiro. Dessa forma, não há aumento de produção e do emprego. A „guerra fiscal‟ pode comprometer a capacidade do estado de dinamizar sua economia.”57

55

A guerra fiscal do ICMS: uma análise crítica sobre as glosas de crédito. p. 128 56

CARLS, Suelen. Quem defende a concorrência em face das políticas tributárias de incentivos fiscais e financeiros-fiscais?. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2758, 18 jan. 2011. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/18302>. Acesso em: 3 fev. 2011.

57

(47)

Como principal arma utilizada pelos Estados, no enfrentamento aos demais, concedem benefícios fiscais em sede de ICMS sem o respectivo aval de seus pares em reunião do CONFAZ, ferindo brutalmente a Constituição (art. 155, § 2º, XII, “g”) e a LC nº 24/75 é justamente a glosa dos créditos de ICMS dos contribuintes adquirentes de mercadorias a outros contribuintes interestaduais com benefício irregular.

3.2. Prerrogativas para Concessão de Benefícios Fiscais

As concessões de benefícios em nível de ICMS podem ser aplicadas sobre várias formas, como por exemplo, as isenções, redução de bases de cálculos, diferimentos, créditos outorgados, entre outros. Mas a concessão unilateral de quaisquer dessas desonerações, por qualquer Estado que seja, é terminantemente proibida, conforme versa o artigo 155, XII, “g”, da Constituição Federal.

Esse artigo da CF, já comentado anteriormente, exige a deliberação pelos Estados e o DF para que haja a concessão ou revogação de benefícios e incentivos fiscais, mas também delegou à Lei Complementar Federal a regulamentação da operacionalização desse processo de decisão.

A Constituição Federal de 1988, por meio dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT, recepcionou a LC nº 24/75 que trata justamente do procedimento de criação de convênio concessor de incentivos ficais relativos à isenção e demais de ICMS. Sobre o conteúdo da referida lei, destacamos, a priori, o Art. 1º:

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