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Ao Excelentíssimo Senhor DD. Secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo,

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São Paulo, 05 de junho de 2020

Ao Excelentíssimo Senhor

DD. Secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo,

Ao Excelentíssimo Senhor

DD. Comandante Geral da Polícia Militar do Estado de São Paulo,

A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por meio de seu Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos, e a DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, no uso de suas atribuições legais, com fundamento no artigo 5º, inciso LXXIV e 134, da Constituição Federal, art. 4º, I, VII e X, da LC 80/94, LC 988/06 e art.

25, da Deliberação 139/09, do Conselho Superior da Defensoria Pública,

CONSIDERANDO que a DEFENSORIA PÚBLICA é “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal”;

CONSIDERANDO que a DEFENSORIA PÚBLICA, nos autos do procedimento administrativo de tutela coletiva, poderá expedir recomendações devidamente fundamentadas, visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, bem como aos demais interesses, direitos e bens cuja defesa lhe caiba promover.

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CONSIDERANDO que a Constituição Federal traz como fundamento da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana, bem como o objetivo de construir uma sociedade livre, justa e solidária; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 1º c/c art. 3º, da CF);

CONSIDERANDO a instauração do procedimento administrativo 004/2011, no âmbito do Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos, cujo objetivo é fiscalizar o respeito ao direito de reunião no Estado de São Paulo;

CONSIDERANDO que a liberdade de expressão não deve sofrer censura prévia, interferência ou pressão direta ou indireta (Princípio 5 da Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos1) e que, conforme sugestão do Relator Especial da ONU, deve ser garantida a possibilidade do exercício do direito de reunião, o que constitui dever dos Estados-parte2;

CONSIDERANDO que a Constituição da República assegura que “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei” (art. 5º, LXI);

CONSIDERANDO que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário, veda expressamente a prisão para averiguação ao dispor sobre a detenção arbitrária3;

1 Aprovado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos em seu 108º período ordinário de sessões, celebrado de 16 a 27 de outubro de 2000

2 Report of the Special Rapporteur on extrajudicial, summary or arbitrary executions, A-HRC-17-28, F, 119, 3..

3 Artigo 7º - Direito à liberdade pessoal

1. Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais.

2. Ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas Constituições políticas dos Estados-partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas.

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CONSIDERANDO que tanto a prisão de uma pessoa por um eventual crime que ela, supostamente, irá cometer, como a pretensão do Poder Público de

“organizar os movimentos” que desejam se manifestar constituem violações frontais às liberdades constitucionais e, por consequência, ao Estado Democrático de Direito;

CONSIDERANDO que os artigos 19 e 20 da Declaração Universal de Direitos Humanos preveem, respectivamente, os direitos à liberdade de opinião e expressão, e à liberdade de reunião e associação pacíficas;

CONSIDERANDO que os artigos 13 e 15 da Convenção Americana de Direitos Humanos, promulgada no Brasil pelo Decreto nº 678 de 1992, igualmente preveem os direitos civis e políticos correspondentes à liberdade de pensamento e de expressão, e ao direito de reunião;

CONSIDERANDO que a Organização das Nações Unidas (ONU), por meio da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979), registra que “os Estados-Partes tomarão todas as medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra a mulher na vida política e pública do país” (Art. 7º) e que, à luz do disposto no Art.5 da Convenção de Belém do Pará (1994), da Organização dos Estados Americanos – OEA, “toda mulher poderá exercer livre e plenamente seus direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais”;

CONSIDERANDO que os Estados devem garantir a proteção efetiva dos direitos de grupos que podem encontrar-se em situações de especial vulnerabilidade como crianças, pessoas com deficiência, integrantes de etnias diversas, gays, lésbicas, bissexuais, transgêneros e intersexuais (LGBTI), inclusive, no que concerne ao exercício do direito de protesto e manifestação, em igualdade de condições;

3. Ninguém pode ser submetido a detenção ou encarceramento arbitrários.

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CONSIDERANDO que a Constituição Federal assegura o direito à liberdade de expressão nos incisos IV e IX do art. 5º e o direito de reunião no inciso XVI do mesmo dispositivo, razão pela qual é livre a manifestação do pensamento e a de todos poderem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização;

CONSIDERANDO que a atuação das forças de segurança deve estar norteada por protocolo claro, imbuído dos propósitos de não surpreender negativamente as pessoas envolvidas, afastando, assim, a potencialidade de conflito entre manifestantes e os agentes de segurança pública; e

com vistas a garantir os direitos constitucionais de manifestação, de liberdade de ir, vir e estar e, especialmente, de reunir-se pacificamente em locais abertos ao público, independentemente de autorização do Poder Público, para se manifestar sobre as pautas políticas que julgarem oportunas, vem RECOMENDAR que, nos atos convocados para o dia 7 de junho de 2020, com previsão de início às 10h e concentração na Avenida Paulista, que:

1. Tendo em vista a pandemia de COVID-19 e a obrigatoriedade do uso de máscaras, conforme legislação vigente, não realizar abordagens, revistas ou até “prisões para averiguação” por essa motivação, permitindo não só o uso de máscaras como também sua eventual distribuição;

2. Abster-se de impor condições ou limites de tempo e lugar à manifestação, mesmo nas situações em que houver a interrupção do fluxo de veículos;

3. Não sejam realizadas “prisões para averiguação”, garantindo-se que, nos termos da lei e da Constituição da República, a detenção e a condução a distrito policial só se dê em caso de flagrante delito ou por ordem judicial;

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4. Na hipótese excepcional de ser efetuada qualquer prisão ou detenção de qualquer pessoa, esta deverá ser imediatamente conduzida à autoridade policial ou judiciária, conforme o caso, mais próxima do local da ocorrência ou aquela especialmente designada para atender a ocorrência, vedada a condução para órgãos ou locais estranhos à estrutura da polícia judiciária ou poder judiciário, assegurada a presença de advogado indicado pelo preso ou defensor(a) público(a) para acompanhar os atos policiais (art. 5º, LXIII, CF), assim como, no caso de estrangeiros, comunicada a representação consular do país de origem do preso;

5. A Polícia Civil se abstenha de, nos interrogatórios e colheita de depoimentos, fazer questionamentos que não guardem qualquer relação com o suposto crime objeto de investigação, como se a pessoa é filiada a algum partido político ou se pertence a algum movimento social;

6. A prisão de qualquer pessoa em flagrante delito ou em cumprimento de ordem (art. 5º, LXI, CF) deve ser imediatamente comunicada ao Ministério Público e à Defensoria Pública, nos termos da legislação em vigor, estando vedada a prática de prisões para “averiguação” e oitivas informais quando da detenção;

7. A presença obrigatória de agentes do sexo feminino junto às equipes para realização de busca pessoal em mulheres, caso necessário, evitando constrangimentos;

8. O respeito à identidade de gênero, razão pelo qual mulheres travestis e transexuais, bem como homens trans, possam optar pela revista realizada por homem ou por mulher;

9. Que os agentes estejam devidamente identificados por meio de nome e patente fixados na farda, colete ou uniforme, de forma visível à distância,

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em especial neste momento em que é obrigatório o uso de máscaras também pelas forças policiais, abstendo-se o Comando-Geral de criar qualquer entrave à identificação e apuração de abusos e violências, como por meio da noticiada e ilegal substituição da identificação nominal dos agentes por sequências alfanuméricas de difícil memorização;

10. Seja determinado aos policiais que não vedem nem impeçam a atuação da imprensa ou de qualquer cidadão de captar imagens e som em vias públicas ou locais acessíveis ao público, especialmente quando destinadas a registrar a atuação policial, abstendo-se de apreender equipamentos de áudio, fotografia e vídeo dos manifestantes (art. 5º, LIV, CF);

11. Seja efetuado o acompanhamento da atuação policial pelos respectivos órgãos de controle interno (corregedoria) efetuando, sempre que possível, registro em vídeo da operação;

12. Seja determinada a proibição do porte e uso de arma de fogo, inclusive com munição de elastômero, pelos policiais atuando no acompanhamento de manifestações lícitas e pacíficas;

13. Seja imediatamente vedado o acompanhamento das manifestações pacíficas pela Tropa de Choque, a qual não poderá ficar postada ostensivamente e à vista dos manifestantes, só podendo atuar após a decisão administrativa de coibir atos eventualmente contrários à lei, que só poderá ser tomada quando não houver outros meios para proteger a ordem pública – em cujo conceito se inclui o direito de livre manifestação;

14. Levar em consideração os princípios na necessidade e da proporcionalidade ao tomar a decisão de dispersar a manifestação;

medida esta que somente deve ser adotada quando não houver outros

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meios disponíveis para proteger a ordem pública de um risco iminente de violência;

15. Comunicar a decisão administrativa de dispersão da manifestação, tomada pelo Comandante da Polícia Militar responsável pela operação de policiamento, aos manifestantes, por meio que permita a compreensão imediata da ordem (por exemplo, por meio de megafone ou carro de som), conferindo-se tempo razoável para sua compreensão e acatamento;

16. Abster-se de utilizar gás lacrimogêneo e bombas de efeito moral para dissolver aglomerações antes da prática do ato administrativo elencado no item anterior, e, em qualquer hipótese, em locais fechados e no centro de aglomerações de pessoas;

17. Não seja feito disparo de bombas aleatoriamente, nem contra membros da imprensa e em especial contra setores da manifestação que não tenham participado de qualquer ato violador do Direito, sobretudo para evitar o pânico e, assim, preservar a vida e a integridade de outros manifestantes que estejam atuando pacificamente;

18. Eventuais disparos de tiros de bala de borracha, bombas de gás lacrimogêneo ou de efeito moral, bem como uso de spray de pimenta, respeitem as distâncias recomendadas pelos protocolos nacionais e internacionais, seguindo as melhores práticas;

19. Seja expressamente ordenado a todos os agentes de segurança, inclusive nas delegacias de polícia, que se abstenham de embaraçar o exercício da Advocacia e da Defensoria Pública durante abordagens e eventuais prisões em flagrante, garantindo o acesso à pessoa detida ou abordada, bem como fornecendo ao profissional do Direito todas as informações

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necessárias ao exercício da ampla defesa, respeitando integralmente suas prerrogativas legais.

Certos de contar com a compreensão de Vossa Excelência a respeito da relevância do tema, apresentamos os mais elevados protestos de estima e consideração.

Viviane Ceolin Dallasta Del Grossi Defensora Pública Federal

1ª Defensoria Regional de Direitos Humanos em São Paulo

João Paulo de Campos Dorini Defensor Público Federal

2ª Defensoria Regional de Direitos Humanos em São Paulo

Rafael Lessa Vieira de Sá Menezes Defensor Público do Estado de São Paulo

Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos

Davi Quintanilha Failde de Azevedo Defensor Público do Estado de São Paulo

Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos

Daniela Batalha Trettel

Defensora Pública do Estado de São Paulo Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos

Referências

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