• Nenhum resultado encontrado

Clube Ijuí: relato sobre a evolução formal de um patrimônio eclético / Clube Ijuí: report on a formal evolution of an eccletic heritage

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2020

Share "Clube Ijuí: relato sobre a evolução formal de um patrimônio eclético / Clube Ijuí: report on a formal evolution of an eccletic heritage"

Copied!
12
0
0

Texto

(1)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761

Clube Ijuí: relato sobre a evolução formal de um patrimônio eclético

Clube Ijuí: report on a formal evolution of an eccletic heritage

DOI:10.34117/bjdv6n7-469

Recebimento dos originais: 03/06/2020 Aceitação para publicação: 20/07/2020

Hugo Henzel Steinner

Universidade Federal de Santa Maria. Programa de Pós-Graduação em Patrimônio Cultural. Centro de Ciências Sociais e Humanas/ CCSH

Endereço Postal: Avenida Roraima, nº 1000 - Prédio 74-B, Sala 3241, Cidade Universitária, Bairro Camobi - CEP: 97105-900 - Santa Maria/RS - Brasil

E-mail: hugo_steinner@hotmail.com

Tarcisio Dorn de Oliveira

Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul. Departamento de Ciências Exatas e Engenharias/ DCEEng.

Endereço Postal: Rua Lulu Ingelfritz, Nº 480, Bairro São Geraldo - CEP 98700000 – Ijuí/RS - Brasil

E-mail: tarcisio.oliveira@unijui.edu.br

Denise de Souza Saad

Universidade Federal de Santa Maria. Programa de Pós-Graduação em Patrimônio Cultural. Centro de Ciências Sociais e Humanas/ CCSH

Endereço Postal: Avenida Roraima, nº 1000 - Prédio 74-B, Sala 3241, Cidade Universitária, Bairro Camobi - CEP: 97105-900 - Santa Maria/RS - Brasil

E-mail: dssaad1@hotmail.com

Bruna Fuzzer de Andrade

Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul. Departamento de Ciências Exatas e Engenharias/ DCEEng.

Endereço Postal: Rua Lulu Ingelfritz, Nº 480, Bairro São Geraldo - CEP 98700000 – Ijuí/RS - Brasil

E-mail: bruna.fuzzer@unijui.edu.br

Lurian Agostini

Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul. Departamento de Ciências Exatas e Engenharias/ DCEEng.

Endereço Postal: Rua Lulu Ingelfritz, Nº 480, Bairro São Geraldo - CEP 98700000 – Ijuí/RS - Brasil

E-mail: ghazbah@hotmail.com

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo relatar a evolução formal do Clube Ijuí, uma importante edificação de interesse patrimonial de estilo eclético na Cidade de Ijuí. Localizada no noroeste do Estado do Rio grande do Sul, Ijuí possui em sua conformação urbana, um acervo maioritariamente de estilo eclético visto que se trata de uma localidade com o processo de urbanização bastante recente. Dentre as edificações de interesse histórico destaca-se o Clube Ijuí que foi construído em meados de 1920, teve

(2)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761

uma ampliação em 1934, a qual culminou em uma intervenção significativa na sua fachada e uma reforma em 1997 que pôs a edificação em uso social novamente, após um período em propriedade do poder publico municipal. Atualmente passa por pequenos reparos para manutenção. Este trabalho terá como base o levantamento produzido na disciplina de Projeto de Arquitetura VI, do Curso Arquitetura e Urbanismo da Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul, no segundo semestre do ano de 2018, além de pesquisas bibliográficas e documentais, estas últimas no acervo do próprio Clube e em outras instituições. Na pesquisa foi possível analisar as alterações ocorridas no decorer dos anos, as quais foram necessárias para o mantenimento do espaço e da memória da instituição social na Cidade. Nas intervenções ocorridas a edificação foi parcialmente descaraterizada em relação a sua forma e estilo arquitetônico originais, principalmente no que se refere à fachada, que tinha inspiração neoclassica e foi alterada para ao art déco na reforma de 1934. No processo de pesquisa foi constatado que tais intervenções muitas vezes eram executadas sem o acompanhamento de profissonais habilitados na area de arquitetura ou restauração, em função principalmente da gestão do clube. Entende-se que a preservação do patrimonio é essencial para a memória da Cidade e que intervenções são bem vindas desde que sejam para o mantenimento dos acervos históricos e preferencialmente seguindo critérios técnicos, evitando assim a perda dos mesmos.

Palavras-chave: Patrimônio, Clube Ijuí, Art Déco.

ABSTRACT

This paper aims to report the formal evolution of Clube Ijuí, an important eclectic style building in the city of Ijuí. Located in the northwest of the State of Rio Grande do Sul, Ijuí has in its urban conformation, a collection mostly of eclectic style since it is a location with a very recent urbanization process. Among the buildings of historical interest, the Clube Ijuí stands out, which was built in the middle of 1920, had an extension in 1934, which culminated in a significant intervention on its facade and a renovation in 1997 that put the building in social use again, after a period in the ownership of the municipal public power. Currently undergoes minor repairs for maintenance. This work will be based on the survey produced in the discipline of Architecture Project VI, of the Architecture and Urbanism Course of the Regional University of the Northwest of Rio Grande do Sul, in the second semester of 2018, in addition to bibliographic and documentary research, the latter in the collection of the Club itself and other institutions. In the research, it was possible to analyze the changes that occurred over the years, which were necessary to maintain the space and memory of the social institution in the City. In the interventions that occurred, the building was partially out of character in relation to its original architectural form and style, mainly with regard to the facade, which was neoclassical inspired and was changed to art deco in the 1934 renovation. In the research process it was found that such interventions were often carried out without the assistance of qualified professionals in the area of architecture or restoration, mainly due to the management of the club. It is understood that the preservation of the heritage is essential for the memory of the City and that interventions are welcome as long as they are for the maintenance of historical collections and preferably following technical criteria, thus avoiding their loss.

Keywords: Heritage, Clube Ijuí, Art Deco.

1 INTRODUÇÃO

Localizada na região noroeste do estado do Rio Grande do Sul, a cidade de Ijuí tem uma população estimada de 83.173 habitantes (IBGE, 2018). Caracterizado por uma grande variedade étnica, e a cidade é conhecida como “Terra das Culturas Diversificadas” devido a esse aspecto de pluralidade

(3)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761

das 14 etnias que se manifestam culturalmente na Cidade. Unindo a abundância de diferentes culturas presentes na cidade com o recente processo de urbanização da mesma, a paisagem urbana tornou-se de forma bastante variada, no que se refere à arquitetura, tendo obras de diversos estilos e composições (Schwerz, 2014). Dentre as obras que mais se destacam na memória urbana e que mais representam a diversidade étnica de Ijuí está a sede atual do Clube Ijuí, um marco na paisagem urbana da cidade, construído em meados de 1920, sendo a quarta edificação a abrigar os membros do clube em seus mais de cem anos de história. A localização do Clube se dá na área central do município, próxima a estabelecimentos públicos de suma importância, como a prefeitura e a principal praça da cidade, sendo assim, o clube é facilmente lembrado por todos que algum dia visitou o centro do município de Ijuí. De acordo com Silva (2003), além do aspecto social, o clube também teve importância na vida cultural e esportiva da cidade, pois o mesmo abrigava em seu subsolo pistas de bolão, esporte que, na época, era de grande significância no meio social. Por se tratar de um prédio quase centenário, o clube passou por diversas reformas estruturais e estéticas, sendo algumas necessárias para o mantenimento da estrutura do mesmo e outras apenas por decisões, muitas vezes questionáveis, da regência do próprio clube. Essas intervenções, principalmente as que não têm sólidos motivos para serem realizadas, causam grande impacto na significância do clube aos olhos dos cidadãos, visto que reformas e reparos mal executados ou mal planejados podem acabar por destruir parte da história da obra, fazendo com que o valor histórico da mesma diminua ou, até mesmo, deixe de existir. O presente artigo1 tem como objetivo relatar e avaliar a evolução formal do Clube

Ijuí, expondo, também, como as mudanças sofridas pela obra impactaram na maneira com que a cidade vê o clube nos dias atuais.

2 METODOLOGIA

A pesquisa2 possui uma abordagem aplicada de carácter exploratório, realizada com base no levantamento realizado pela turma da disciplina de Projeto de Arquitetura VI, do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, no segundo semestre de 2018, além de pesquisas bibliográficas e documentais realizadas no próprio acervo do Clube Ijuí e em outras instituições, e consulta às Cartas Patrimoniais.

1 O presente texto conta com apoio da Agência de Fomento FAPERGS através do Edital 02/2017 – PqG, Processo 17/2551-0001 173-2, Projeto – Escala de análise como ferramenta intelectual para educação cidadã: O estudo da cidade como o lócus de vida da população.

2 Desenvolvida junto aos Grupos de Pesquisa Espaço Construído, Sustentabilidade e Tecnologias – Gtec e Ensino e Metodologia em Geografia e Ciências Sociais – GEMGCS da Universidade do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ.

(4)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761 3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

3.1 FORMAS DE INTERVENÇÃO

As definições a cerca das formas de intervenção são constantemente discutidas, ação que se faz necessária pois não são raras a vezes que, devido ao desconhecimento teórico perde-se a noção do que realmente têm valor. Meira (2008) comenta que muitos imóveis são considerados de valor histórico por serem “velhos” e que tudo pode ser passível de ações atualizadoras. Tal pensamento muitas vezes acaba por causar danos aos imóveis.

Dentre as diversas formas de intervenção em patrimônio arquitetônico, as mais pertinentes a serem observadas e que estão relacionadas com o objeto em estudo são a restauração e a reforma. Segundo a Carta de Burra (1980), “a restauração será o reestabelecimento da substância de um bem em um estado anterior conhecido”, ou seja, a restauração tem o objetivo de resgatar elementos de um bem, sejam materiais ou documentais, que foram apagados por qualquer intervenção, seja humana ou não, sofrida pela obra, porém, sem que o ato do restauro mascare as intervenções sofridas pelo objeto ou comprometa ainda mais o valor histórico do mesmo. A reforma, apesar de ter um conceito notavelmente diferente do restauro, ainda confunde o leigo sobre seu real significado. Enquanto o restauro preocupa-se em resgatar e preservar o valor histórico e cultural de uma obra, a reforma altera elementos originais da construção sem a preocupação com a provável perda das características fundamentais que dão identidade para a obra que uma intervenção do tipo causará. A reforma costuma alterar a forma da edificação, tanto internamente quanto externamente, a fim de suprir interesses geralmente pessoais dos donos da obra, seja uma remodelação da fachada para acompanhar a tendência da época, ou uma alteração completa na configuração do interior da obra para atribuir um novo uso à mesma.

Meira (2008) comenta que o grande problema se dá quando o profissional que procederá a projetação não possui uma formação histórico-critica densa. Pra isso algumas medidas administrativas foram criadas a fim de proteger edificações com valor histórico e cultural, as quais apesar de não apontarem uma única maneira correta de proceder ao realizar uma intervenção em uma obra protegida servem de guia para tomar a decisão mais assertiva possível quanto aos dilemas enfrentados ao intervir em uma construção com valor histórico e cultural alto. Essas orientações são chamadas de cartas patrimoniais e foram concebidas ao longo da história, em situações onde medidas protetivas eram necessárias para proteger patrimônios mundiais com valores históricos imensuráveis, e que, atualmente, têm o propósito de guiar o restaurador durante o processo de restauro de uma obra.

O processo de restauração de uma obra com valor histórico tende a ser de grande complexidade, pois o profissional envolvido com tal projeto busca a manutenção de um edifício sabendo previamente que existem impossibilidades técnicas e éticas quanto aos procedimentos normalmente adotados.

(5)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761

Segundo Meira (2008) “a restauração é a disciplina que individualiza e legitima o modo de

intervenção sobre os bens patrimoniais, que são continuamente sujeitos a diversos tipos de deterioração”, no entanto, existem, atualmente, diversas vertentes teóricas sobre o conceito de

restauração e sobre a maneira de realiza-la de maneira ética e tecnicamente correta, apesar disso, dentre todas as maneiras conhecidas, nenhuma é considerada totalmente assertiva. O maior conflito em que o profissional responsável por um projeto de restauração se encontra entre as questões técnicas e éticas é até onde se pode intervir em uma edificação sem fazer com que as modificações na mesma sejam destrutivas para o valor histórico da obra, ou seja, o quão suaves ou radicais as intervenções devem ser para que a obra mantenha o máximo de valor histórico sem que a falta dessas intervenções também venha causar danos à mesma. O restaurador deve levar em consideração todos os aspectos individuais da obra antes de decidir o modo ação que será utilizado na intervenção, sendo assim, pode-se supor que um dos motivos de não existir uma técnica de restauração plenamente perfeita é que existem diferentes obras em diferentes estados de degradação e com diferentes valores históricos.

3.2 CLUBE IJUÍ E A MEMÓRIA DA PAISAGEM

Ser membro ativo e participar das festividades e eventos promovidos pelo Clube Ijuí sempre foi símbolo de status entre os cidadãos de Ijuí e regiões próximas. Na sede do clube aconteciam os mais importantes eventos da cidade e da região como, por exemplo, visitas de importantes figuras públicas, exposições de arte, eventos culturais, entre outros diversos usos relevantes para a sociedade da época, bem como reuniões periódicas dos membros do clube para tratar de aspectos administrativos. Apesar de sua relevância social na época, o Clube Ijuí não tem a mesma intensidade nesse aspecto nos dias de hoje, porém, sua importância cultural e histórica aumentou com o passar dos anos pois é importante lembrar que além da função social ele faz parte da construção da paisagem da cidade.

A atual sede do Clube Ijuí foi idealizada pelo Coronel Albino Jacinto de Oliveira e, apesar de seu estilo eclético, como mostra a figura 01, se percebe grande inspiração no neoclassicismo por parte do idealizador. Silva (2003) descreve o estilo arquitetônico do clube em sua dissertação de mestrado em Artes Visuais como “(...) uma arquitetura eclética, de influência neoclássica italiana. Apesar da

simplicidade, essa característica podia ser reconhecida pelo seu avanço volumétrico apresentado pelos dois pisos semi-circulares que compunham a área média do prédio, adornadas com balaústres nos parapeitos e na platibanda. Esses, por sua vez, realçavam a discreta elegância, dando leveza ao prédio, com seus volumes arredondados e vazados. A platibanda com frontão arqueado se apresentava coroada com seis crateras sobre as pilastras.“

(6)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761

Fig.01: Croqui da fachada principal original do Clube Ijuí, em 1920.

Fonte: acervo Clube Ijuí

O clube passou por significativas reformas ao longo de sua existência, porém, as mesmas foram realizadas sem o devido acompanhamento técnico e preocupação com o valor histórico que o edifício poderia vir a ter no futuro. A influência neoclássica passa praticamente despercebida ao contemplarmos o clube nos dias de hoje, o mesmo, atualmente, se enquadra mais próximo do estilo Art Decó, estilo, esse, que estava em alta na época em que as primeiras grandes intervenções no clube ocorreram. Silva (2003) diz que em 1934, a obra já havia sido parcialmente descaracterizada, os balaústres que ornamentavam as sacadas e a platibanda foram retirados e as crateras em que os mesmos estavam foram fechadas. Segundo Silva (2003), a intenção da regência do clube ao realizar essas intervenções era de ajustar a forma do clube às novas tendências da época, no caso, o Art Decó. Além das mudanças externas, o clube também sofreu alterações em seu interior, o acesso ao pavimento superior, onde está o salão de festas da edificação, era feito somente por uma escada externa em sua composição original, após as primeiras alterações formais o caminho até o salão passou a ser na parte interna do clube, a escada externa foi removida, o clube foi ampliado em direção a oeste, e uma copa, dois banheiros e uma escada central foram construídos na área ampliada. Após as primeiras intervenções, o clube sofreu uma segunda ampliação, na mesma direção que a anterior, para que fosse comportada uma sala de jogos que atualmente é utilizada como salão de festas, chamado de Salão Verde. Em 1980 o porão do clube é reformado a fim de transformar-se em uma boate e, algum tempo depois, sofre outra reforma e tem seu uso modificado para um restaurante, o qual está em funcionamento até os dias de hoje.

Após décadas de vida da quarta sede do clube, o mesmo passou por uma das épocas mais financeiramente frágeis desde sua fundação, sendo desapropriado pelo Poder Público Municipal em 11 de janeiro de 1993 por meio da assinatura de Wanderley Agostinho Burmann e fica sob a posse da

(7)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761

Prefeitura Municipal de Ijuí por pouco mais de quatro anos. Durante o tempo em que ficou sob a responsabilidade da Prefeitura, o clube acabou se deteriorando devido à falta de cuidados e manutenção que o órgão responsável deveria ter se encarregado de providenciar, e isso fez com que, em 1997, quando a desapropriação do clube fora revogada pelo então prefeito Ortiz Iboti Schöer, a obra devesse passar por outra restauração a fim de recuperar-se dos danos causados pela imprudência e abandono por parte dos responsáveis durante os passados quatro anos (BINDÉ, 2010 – jornal: “O repórter” – acervo Museu Antropológico Doutor Pestana). O clube, sob a regência do então presidente Thomaz Alquino Moraes, passou a adotar uma postura mais cuidadosa com sua sede durante as seguidas reformas e reparos às quais a obra fora submetida nos anos seguintes, afinal, na época a edificação já se aproximava de seus oitenta anos de existência, e a população já reconhecia o valor histórico que a mesma tinha. Foram feitos pequenos reparos e adequações no interior e exterior do clube, como, por exemplo, adaptações às normas exigidas pelo corpo de bombeiros, reforços na sustentação do piso e entre outras pequenas intervenções. Esses reparos foram possíveis graças à comoção de vários setores da comunidade da região em levantar recursos para o clube, sendo assim, é seguro dizer que atualmente o cidadão ijuíense tem reconhecido mais frequentemente o valor histórico e cultural que a edificação possui, visto que, por ser uma obra quase centenária, a atual sede do clube testemunhou a criação, o desenvolvimento e a queda de inúmeros marcos da cidade, sejam eles arquitetônicos, culturais ou sociais. Para motivar a contribuição dos habitantes para os reparos do clube e conscientiza-los da importância que a edificação tinha para a cidade de Ijuí, logo após a devolução do clube aos respectivos donos pela Prefeitura Municipal, foi exposta uma faixa entre as colunas da fachada do clube, ainda com aspecto deteriorado, como mostra a figura 02, com os seguintes dizeres: “o valor de uma comunidade não se mede apenas pelo seu poder político e econômico, mas também pelo trabalho que ela dispensa a sua história e pela conservação de sua memória representada em bens imóveis e recantos que valorizam o seu passado”.

Fig.02: Fotografia de 1997 da fachada do Clube Ijuí, logo após a instalação da faixa para sensibilizar os cidadãos ijuienses

quanto à necessidade da preservação do patrimônio.

(8)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761

3.3 EVOLUÇÃO FORMAL DA EDIFICAÇÃO

Como apontado anteriormente, o clube sofreu diversas mudanças em seu aspecto formal, sendo estas tão significantes que acabaram fazendo com que o mesmo migrasse de um estilo arquitetônico para outro. As intervenções realizadas na parte interior do clube através dos anos podem ser entendidas de maneira mais eficiente ao observar a figura 03. A primeira planta representa o clube em seu estado original, com uma escada lateral que dava acesso ao salão de festas no pavimento superior. A segunda planta representa a primeira ampliação do clube, onde a escadaria lateral foi retirada e o acesso ao segundo pavimento passou a ser pela parte interna do edifício. A terceira e última planta representa a última ampliação, onde foi anexado o Salão Verde no térreo da edificação, alterando sua planta e volumetria.

Fig.03: Evolução formal do clube em planta baixa. Da esquerda para a direita: planta baixa da obra original, planta baixa

após a primeira ampliação, planta baixa após a terceira ampliação.

Fonte: acervo Clube Ijuí – adaptado pelos autores

As ampliações foram realizadas devido ao crescimento do clube em relevância e contingente, sem a consciência da importância histórica e cultural que a edificação teria com o passar dos anos. O problema das alterações feitas durante as reformas na parte interior da edificação é justamente o fato de que as mesmas foram realizadas sem acompanhamento técnico especializado, visto que, caso fossem, conhecendo os conceitos de preservação de patrimônio histórico e cultural, e prevendo o imenso valor histórico que a obra teria para a cidade, escolhas que acarretaram na parcial descaracterização do prédio seriam descartadas e a obra manteria seu valor histórico elevado e perene. Apesar de as mudanças feitas no interior da sede do Clube Ijuí impactarem de maneira extremamente negativa o valor histórico do mesmo, essas intervenções não foram as mais graves sofridas pela obra em questões sociais. O estilo arquitetônico do clube era, originalmente, eclético com fortes inspirações no movimento neoclássico, o que pode ser facilmente percebido ao observar

(9)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761

registros de sua primeira fachada, visto que a mesma continha elementos característicos do neoclassicismo, como, por exemplo, a simetria da fachada e as crateras com balaústres na platibanda, nas sacadas laterais e na central. A retirada dos balaústres e o fechamento das crateras em 1934, conforme mostra a figura 04, foram as intervenções que impactaram de maneira mais negativa no valor histórico do clube, pois a fachada do mesmo sempre foi o principal elemento de sua identidade como obra, além disso, esse tipo de procedimento de retirada de elementos da fachada confronta as orientações da maioria das cartas patrimoniais que guiam os restauradores hoje em dia, a exemplo da Carta de Burra (1980), que orienta que “a retirada de um conteúdo ao qual o bem deve uma parte de

sua significação cultural não pode ser admitida, a menos que represente o único meio de assegurar a salvaguarda e a segurança desse conteúdo.”

Fig.04: comparação entre a fachada original do Clube Ijuí, de 1923, e a mesma fachada após a primeira grande reforma,

em 1934.

Fonte: acervo Clube Ijuí – adaptado pelos autores

A intervenção realizada na fachada do clube no ano de 1934 foi a grande responsável pela mudança de estilo arquitetônico da obra, fazendo com que o mesmo transformasse sua fachada eclética com inspirações neoclássicas em uma fachada eclética com inspirações em Art Decó, estilo que estava em alta na época da reforma. O impacto negativo que a mudança de um dos elementos mais importantes para a criação da identidade da obra tem sobre o sentimento de pertencimento do cidadão ijuiense para com o clube é grande, segundo Machado (2010), a memória é o meio pelo qual uma sociedade reconhece elementos próprios de sua história como seus. Uma construção tão imponente, conhecida pelos habitantes locais, e bem localizada como o Clube Ijuí acaba por ensinar sobre o passado da região apenas ao ser contemplado ou visitado, e o fato de que existe mais história por trás da fachada atual que, infelizmente, nunca mais poderá ser vivida por quem quer que passe pelo clube e o observe, faz com que o potencial da obra de ensinar sobre a história da cidade seja drasticamente reduzido.

(10)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Clube Ijuí, assim como qualquer outra obra arquitetônica que se aproxime da idade do mesmo, é de grande relevância para a sociedade como um todo. Apesar de hoje em dia não exercer sua função original com a mesma frequência de antigamente, o clube passou a ter uma função adicional ainda mais importante que o convívio social promovido pelo mesmo e o acolhimento dos principais eventos da cidade: a capacidade de ensinar sobre a história da cidade àqueles que o contemplam e estudam sobre suas origens, contudo, as intervenções realizadas de maneira inadequada no Clube Ijuí e a grande perda da identidade do edifício original revelam um quadro preocupante envolvendo a preservação do patrimônio histórico e cultural no interior do estado do Rio Grande do Sul. A necessidade de mudanças na infraestrutura da sede do clube na época não justifica a perda de grande parte do valor histórico da obra por conta da má execução e da falta de planejamento e acompanhamento por um profissional qualificado das intervenções realizadas, sendo a mudança de estilo arquitetônico da obra por meio da reforma da fachada mais carente de justificativas sólidas ainda, visto que um dos elementos mais importantes para a identidade do clube foi perdido, e o que motivou a mudança foram questões exclusivamente estéticas, ou seja, a infraestrutura do prédio não requisitava nenhuma mudança do gênero na época.

Conclui-se que a preservação do patrimônio histórico e cultural é de suma importância para a perpetuação da história da cidade, e que intervenções são bem-vindas desde que busquem o mantenimento da identidade de cada edificação, respeitando seu tempo e sua historicidade. Também, este trabalho serve como mostra de como o desconhecimento sobre patrimônio histórico e cultural e os diferentes modos de intervenção, por parte dos gestores das obras com valor histórico, pode ser bastante danoso. É, também, de grande importância que os conceitos estudados envolvendo os diversos tipos de patrimônio existentes sejam propagados de maneira mais extensa, principalmente para a porção leiga da população, para que mais pessoas se interessem pelo valor histórico dessas edificações, que seja possível que essas obras continuem contando suas histórias e para que continuemos aprendendo com o passado contado através das mesmas.

Por fim, deve-se ir além da arquitetura, inserir nas suas reflexões a cultura material, como costumes, festas, tradições e práticas. Assim, tem-se a inserção do patrimônio no conceito do turismo, como prática, principal elemento de definição de investimentos e roteiros do lugar, também os profissionais da área possuem uma preocupação com o patrimônio histórico e cultural. Contudo, a educação patrimonial como a forma de ensinar com foco nos bens culturais, com finalidade de aproximar as pessoas com o patrimônio cultural da sua região. Utilizando metodologias próprias, e tendo o patrimônio em questão como ponto de partida, fomenta-se o processo de aprendizagem para capacitar o indivíduo para conhecer, usar, desfrutar, recriar, ler, compreender e transformar o

(11)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761

patrimônio. Dessa maneira, incentiva-se o uso dos objetos, locais, monumentos e prédios históricos, para ensinar ao passo que se cria uma consciência de valorização do patrimônio do lugar, como fomento da formação de cidadania, identidade cultural e sentimento de pertencimento. O patrimônio cultural é o legado que povos e civilizações deixaram, e que contribuem para a perpetuação da memória e dos caminhos percorridos. Utilizando de mecanismos como salvaguarda, difusão, conservação e gestão dos bens patrimoniais, torna-se possível a preservação das histórias e das identidades culturais que o patrimônio expressa, bem como o impedimento de sua destruição, ou descaracterização. Instiga-se por esse meio a preservação do Clube, que se mantém vivo no coração de cada habitante da cidade.

REFERÊNCIAS

ABREU, Maurício de Almeida. Sobre a memória das cidades. In: Revista da Faculdade de Letras – Geografia I série, Vol XIX, Porto 1998, p. 77-97.

BINDÉ, Ademar Campos. Ijuí: histórias revividas 100 anos de emancipação. 2012. Ijuí, Editora Líder, 346 p.

BRASIL. Lei 25/1937. Organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0025.htm>, 30 de novembro de 1937. Bourdin, A. A Questão Local. Rio de Janeiro, DP & A Editora, 2001.

CARLOS, A. F. A. A (re)produção do espaço urbano. São Paulo: EDUSP, 1994.

COSTA, Otávio. Memória e paisagem: em busca do simbólico dos lugares. In: Espaço e Cultura, UERJ, RJ, Edição Comemorativa, p. 146-156, 1993-2008.

CHOAY. F. A Alegoria do Patrimônio. São Paulo, Editora UNESP, 2001.

DIMENSTEIN, D. Educação patrimonial, memória e cidadania: a experiência dos professores de

história da rede municipal de Jaboatão dos Guararapes - PE. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso

de Formação de Gestores Culturais dos Estados do Nordeste) - Universidade Federal da Bahia, Bahia, 2017.

ELIADE, M. Imagens e Símbolos: ensaios sobre o simbolismo mágico-religioso. São Paulo. Martins Fontes, 1991.

FARIA Nathalie Danif Moreira de; WOORTMANN, Ellen Fensterseifer. A Educação Patrimonial como elemento de socialização para jovens em situação de risco. Revista Hospitalidade. São Paulo, v. VI, n. 2, p. 49-72, jun.- dez. 2009.

SILVA, Marilda Almeida da. Fragmentos: Vestígios que contam histórias Ijuhy (1890-1942). 2003. 266f. Dissertação (Mestrado em Artes Visuais) – Faculdade de Artes Visuais, Universidade Federal do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003.

(12)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p.48343-48354 jul. 2020. ISSN 2525-8761

MEIRA, Ana Luisa Goelzer. A restauração como disciplina. O patrimônio histórico e artístico nacional no Rio Grande do Sul no séc. XX: atribuição de valores e critérios de intervenção. 480 p. Tese (Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional) – Faculdade de Arquitetura, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008. p. 71-92.

MACHADO, Gilmara de Cássia. O ensino da educação patrimonial nas escolas municipais de belo horizonte: análise das repercussões dos projetos paisagem de BH - uma descoberta e do projeto onde mora a minha história? 2010. 127 f. Dissertação (Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local) - Instituto de educação continuada, pesquisa e extensão, Centro Universitário UNA, Belo Horizonte / MG, 2010.

SCHWERZ, Luciana. Ijuí: sua história e sua arquitetura pelo olhar da fotografia. 2014. 42 f. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em História) – Faculdade de história, Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, Ijuí, 2014.

Carta de Burra. 1980. Disponível em:

<http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Burra%201980.pdf> Acesso em 8 de maio de 2019

Acervo do Clube Ijuí

Referências

Documentos relacionados

[r]

Segundo Carvalho (2011), “estima-se que haja no território brasileiro cerca de 20% do número total de espécies do planeta” e por este motivo torna-se necessário

Apesar de serem propostos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais no ano de 1998, os temas transversais adentraram o ensino brasileiro recentemente, por tratar de

Contrariamente ao que foi exposto no primeiro capítulo, a respeito da primeira face do mundo, a saber, a representação, passaremos agora à exposição destinada à segunda face do

CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS DO ENSINO DE FILOSOFIA NO BRASIL: desafios na conjuntura atual na Escola Assis Chateaubriand1 RESUMO: O presente artigo pretende refletir sobre a definição

Para preparar a pimenta branca, as espigas são colhidas quando os frutos apresentam a coloração amarelada ou vermelha. As espigas são colocadas em sacos de plástico trançado sem

A tem á tica dos jornais mudou com o progresso social e é cada vez maior a variação de assuntos con- sumidos pelo homem, o que conduz também à especialização dos jor- nais,

Nessa situação temos claramente a relação de tecnovívio apresentado por Dubatti (2012) operando, visto que nessa experiência ambos os atores tra- çam um diálogo que não se dá