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MARCO ANTONIO DE JESUS MACHADO

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Academic year: 2019

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A AVALIAÇÃO DOCENTE COMO PROCESSO

DE FORMAÇÃO CONTÍNUA EM SERVIÇO.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

MESTRADO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO

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MARCO ANTONIO DE JESUS MACHADO

A AVALIAÇÃO DOCENTE COMO PROCESSO

DE FORMAÇÃO CONTÍNUA EM SERVIÇO.

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora

da

Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para obtenção

do título de Mestre em Educação:

Currículo, sob orientação da Profa.

Dra. Marina Graziela Feldmann.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

MESTRADO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO

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BANCA EXAMINADORA

____________________________________

____________________________________

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AGRADECIMENTOS

À Marina, professora e orientadora, pela compreensão, apoio, motivação e autonomia dispensadas nas minhas idas e vindas.

À Isabel, professora e amiga, pelo aprendizado no grupo de pesquisa, pelas inúmeras lições de vida e pelas várias contribuições no exame de qualificação.

À amiga Leila, pelo auxilio em momentos profissionais difíceis e pelas diversas contribuições no exame de qualificação.

À amiga Maria del Carmen, pela indicação e acolhida nas instituições pesquisadas.

Aos mestres e mestrandos cuja convivência possibilitou-me grandes momentos de aprendizagem.

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RESUMO

A penetração do pensamento mercantil no ideário pedagógico, incentiva a privatização do ensino para que ele deixe de ser um direito e passe a ser um serviço. Gestores educacionais preocupados com as exigências do mercado adotam mecanismos organizacionais voltados para o controle e para a lógica da regulação, e para tanto têm utilizado a avaliação docente apenas como instrumento de classificação, punição e monitoramento, impondo determinadas ações e comportamentos aos professores, objetivando a eficácia do seu desempenho.

Todavia, acreditamos na relevância da avaliação do trabalho docente como processo de melhoria da qualidade do ensino, quando intenciona a formação contínua do professor em serviço, por meio de uma ação continuada de reflexão sobre a prática, com o objetivo de mudar e aprimorar a qualidade do seu trabalho. A partir deste pressuposto, esta pesquisa tem como objetivo identificar fatores e/ou condições para que a avaliação docente tenha caráter formativo, pois reconhecemos que a intenção formativa contemplada por atividades reflexivas e teóricas, propicia uma formação em serviço que capacita o professor a resolver problemas e a produzir coletivamente novos saberes.

Para dar conta dos aspectos teórico-metodológicos da pesquisa, privilegiamos a abordagem quantitativa, pois esta se coaduna com uma concepção de mundo que associa imagem sensorial, pensamentos e linguagem, objetivando uma ação transformadora sobre o mundo. Na coleta de dados optamos pela entrevista semi-estruturada, por permitir explorar com maior profundidade os saberes do entrevistado, que se vê mais à vontade para dar uma resposta que exprima o que pensa, representa, crê e valoriza. Munidos de tais procedimentos, procuramos investigar as opiniões, resistências, sentimentos e significados elaborados pelos professores durante o processo de avaliação docente em três instituições de ensino: uma privada e as demais públicas.

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO... 08

CAPÍTULO 1 – ENSINO, FORMAÇÃO E DOCÊNCIA 2.1. Situando a Formação no contexto histórico da Educação Brasileira.. 28

2.2. Os desafios da docência frente ao Sistema de Ensino e a Formação Inicial... 33

2.3. O mal estar docente frente a mudanças sociais, políticas e econômicas... 35

CAPÍTULO 2 – AS GRANDES QUESTÕES DA AÇÃO DOCENTE 3.1. O controle do conhecimento e a proletarização do professor... 41

3.2. A profissionalização do ensino... 45

3.3. A formação: um processo permanente... 47

3.4. A complexa e multifacetada realidade escolar... 51

CAPITULO 3 – A AVALIAÇÃO COMO PROCESSO DE FORMAÇÃO 4.1. A possibilidade formativa... 55

4.2. Situando historicamente a avaliação... 56

4.3. O controle do desempenho docente... 58

4.4. A dimensão reflexiva da avaliação docente... 65

4.5. A avaliação emancipatória... 71

CAPITULO 4 – A ANÁLISE DOS DADOS - DA TEORIA À PRÁTICA 5.1. A escola e suas dimensões... 74

5.2. A escola privada... 75

5.3. A escola pública... 88

CONCLUSÃO... 107

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 116

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INTRODUÇÃO

O interesse pela formação de professores construiu-se durante nossa trajetória profissional, marcada por mais de vinte anos em educação, boa parte deles como coordenador e orientador educacional, enfrentando vários desafios didático-pedagógicos, assistindo a avanços e retrocessos na educação e participando deles.

Os primeiros anos na educação foram de encantamento. Atuando como um simples auxiliar de coordenação, o chamado “bedel”, relacionávamo-nos com muita facilidade com os professores, coordenador, direção, mantenedor e demais profissionais que atuavam na comunidade. O olhar ingênuo e a função não exigiam grande responsabilidade com o ensino-aprendizagem, porém foi assim que se iniciou nossa carreira.

Logo após concluir a Licenciatura em Filosofia, assumimos o cargo de coordenador de série no mesmo colégio em que atuávamos como auxiliar. Posteriormente passaríamos por outros cargos administrativos escolares, atuando como professor, mas foi sobretudo na coordenação pedagógica, onde permanecemos por mais tempo, acompanhando de perto as alegrias e angústias de nossos colegas professores, que nossas indagações acerca do trabalho docente principiaram, gerando dúvidas e inquietações.

Nos anos em que atuamos como coordenador pedagógico, orientamos os professores, verificamos o cumprimento dos Planos de Ensino, dos conteúdos a serem ministrados e a percepção dos alunos diante do ensino. Olhando para trás, cremos que nossa prática estava voltada para a vigilância do professor, e para prestação de contas ao diretor e ao mantenedor das instituições em que atuávamos.

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avaliávamos o trabalho docente: superficialmente, baseado em critérios duvidosos e pautado por questões meramente burocráticas e pouco pedagógicas.

Numa determinada escola, a avaliação do professor era realizada por intermédio de um questionário, no qual os alunos atribuíam notas ao professores em cada disciplina. Posteriormente à tabulação das respostas, calculava-se uma média que representava o grau de satisfação esperado pela instituição. Caso o professor se encontrasse abaixo das expectativas da instituição, deveria discutir em sala com seus alunos e analisar os motivos da má avaliação do seu trabalho docente. O fato de ter que discutir suas notas baixas com seus alunos era uma experiência constrangedora, tanto para o professor quanto para o aluno, pois não havia clareza para ambos sobre quais seriam os critérios a serem adotados naquele tipo de avaliação. Embora a escola tenha realizado algumas ações para tentar esclarecê-los, na maioria das vezes o instrumento era utilizado pelos alunos para se vingar do mau desempenho em uma prova ou de alguma advertência disciplinar.

Este tipo de avaliação, voltada unicamente para o controle, embasada na pesquisa de opinião junto ao aluno, juntamente com as observações subjetivas dos coordenadores, ao final do semestre determinava a permanência ou demissão do professor. A avaliação assim realizada revela-se como um instrumento de punição, rejeitado pela maioria dos professores, que ficavam à mercê do julgamento dos alunos.

Já que essa avaliação visava tão-somente atender aos aspectos somativos1 da

organização, pois no fundo o que se pretendia era prestar contas ao mantenedor acerca da qualidade do ensino, causava-nos certa inquietação o fato de efetivamente não ter sido realizado um trabalho sistemático que pudesse despertar no professor alguma mudança, ou até mesmo sugerir-lhe caminhos alternativos diante das suas dificuldades pedagógicas, dando a avaliação do professor um caráter formativo, orientado para o crescimento e desenvolvimento do profissional.

1 ... é um processo que envolve o dever, quer dos indivíduos quer das organizações de que fazem parte, de

prestarem periodicamente contas das tarefas desempenhadas a alguém que tem o poder e a autoridade de modificar subseqüentemente esse desempenho, através da utilização de sanções ou recompensas (Simões,

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Tal sentimento acentuava-se principalmente por se tratar de uma escola técnica, em que a maioria dos professores era formada por docentes de disciplinas técnicas que, provavelmente pelo fato de não terem cursado a Licenciatura, careciam de um melhor embasamento didático-pedagógico ou mesmo metodológico para ministrar suas aulas, embora fossem autoridades na sua área.

A avaliação desses professores não era acompanhada por um processo contínuo de formação que pudesse auxiliá-los em suas dificuldades e/ou deficiências da formação inicial. Pelo contrário, na maioria das vezes optava-se por trocar de professor na esperança de contratar outro que pudesse atingir melhores resultados entre os alunos. Tal conduta pouco contribuía para a melhoria do ensino, pois no ano seguinte os problemas se repetiam em outras situações, e os novos docentes apresentavam outras dificuldades da mesma natureza. Tais ações acabaram por mostrar que a melhoria do ensino dependia muito mais de investimento na formação do professor em dificuldade do que na sua demissão.

O desassossego diante das dificuldades docentes

A avaliação como prática policialesca e intenção essencialmente punitiva, sem nenhum propósito formativo, é uso arbitrário de poder. Tal ação desestimula o docente, principalmente porque a ênfase dos resultados está naquilo que não foi produzido, ignorando os aspectos positivos de seu trabalho, que poderiam servir de estímulo ao aprimoramento.

O foco desse tipo de avaliação concentra-se naquilo que a instituição quer que o professor faça, transformando-o em mero executor de determinações superiores. Sendo assim, tudo o que vem de cima para baixo de forma autoritária geralmente não é incorporado pelo professor, não gera compromisso e produz resultados duvidosos que camuflam a verdade.

Todavia, o gestor em educação tem a responsabilidade2 e obrigação de prestar contas ao mantenedor, informando com transparência se os professores estão

2 A responsabilidade é entendida aqui como um modelo de responsabilização que atribui um papel central às

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realizando seu trabalho com eficiência3, daí a necessidade de processos avaliativos

que forneçam informações das ações docentes, a fim de facilitar o seu controle.

Ainda que a avaliação auxilie no controle dos professores, seu objetivo maior deve ser o de gerar ações formativas, por meio de intervenções reflexivas que auxiliem a transformação da prática docente, visando a melhoria da qualidade do ensino por meio de uma práxis pedagógica consciente. Tal característica avaliativa é condizente com uma gestão que adote o modelo de responsabilização profissional (Afonso, 2000:45), considerando o professor como um profissional, capaz de desenvolver processos pedagógicos que conduzam a uma melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem.

A procura de saberes

Para poder investigar essas questões e fazer frente às dificuldades curriculares no trato com a formação em serviço, ingressamos no Programa de Pós-graduação em Educação: Currículo da PUC/SP, a fim de aprofundar nosso conhecimento pedagógico sobre currículo e, mais especificamente, sobre a formação do professor.

Inicialmente, interessamo-nos pela relação Educação e Trabalho, motivado pelas discussões envolvendo o debate sobre habilidades e competências na instituição de ensino técnico em que atuávamos, no período de adaptação à nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB). Aparentemente, este era um caminho para aproximar a escola da realidade e do mundo do trabalho, e sendo assim acreditávamos que o estudo das questões envolvendo Educação e Trabalho poderia melhorar sensivelmente o ensino.

O desenvolvimento de competências4 parece contribuir para que a escola e os educadores, principalmente aqueles que atuam no ensino técnico, questionem suas práticas, sua maneira de pensar e de agir, sua maneira de estabelecer relações e de

educacionais obtidos pela escola, que para garantir a obtenção de seus objetivos, tenderá a criar mecanismos de controle organizacional (Afonso, 2000).

3 Visto do ponto de vista econômico, com sentido de produtivo. 4 A noção de competência está relacionada

a capacidade de mobilizar diversos recursos cognitivos para enfrentar um tipo de situação. Ela mobiliza recursos como o saber-faze e o saber-agir, articulando esquemas de

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construir conhecimentos, fazendo da prática docente algo significativo, não dissociado do mundo real, que pudesse desenvolver habilidades úteis à vida profissional e à sociedade.

Aos poucos fomos percebendo que a relação entre Educação e Trabalho é mais complexa do que se previa, permeada por interesses antagônicos e relações de poder, na maioria das vezes, desiguais. Alguns sociólogos, sob a ótica materialista-marxista, vêem as novas competências e habilidades como uma nova forma de flexibilização do capital, cujo objetivo é criar novas formas de exploração.

... a adoção do modelo da competência implica um compromisso pós-taylorista, sendo difícil de pôr em prática se não se verificam soluções (negociadas) a toda uma série de problemas, sobretudo o de um desenvolvimento não remunerado das competências dos trabalhadores na base da hierarquia, trabalhadores estes levados no novo modelo de organização do trabalho a uma participação na gestão da produção, a um trabalho em equipe e a um envolvimento maior nas estratégias de competitividade da empresa, sem ter necessariamente uma compensação em termos salariais (Hirata, 1994: 133).

As competências relevantes ao mundo do trabalho, embora signifiquem um aprimoramento das habilidades humanas, também podem estar a serviço do capital. Continuar investigando nesta direção significava aprofundar questões sociológicas envolvendo capital e trabalho, que embora sejam de grande valor para a educação, estavam afastando-nos do foco inicial, cujo objetivo era investigar os possíveis processos de formação contínua, a avaliação docente, e o currículo.

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O currículo é um campo minado, cheio de contradições e conflitos, no qual a escola não é a única instância educadora, pois encontramos ações educativas também nas ONGs, na mídia, nas empresas etc. Pensar o currículo é refletir criticamente sobre a educação, seja lá em que âmbito for, pois a preocupação central da educação está em compreender a finalidade política do trabalho pedagógico.

Nesse sentido perguntamo-nos: qual o valor da Escola? Qual a sua função social? Tais questionamentos só puderam ser respondidos a partir da reflexão sobre a concepção da relação entre Escola e Sociedade. Cortella (2001) analisou três concepções dessa relação que está presente em momentos distintos da educação.

A primeira defende a idéia de que a escola possui um poder salvador, capaz de erradicar a pobreza e as injustiças oriundas de nossa sociedade desigual. Porém, se por um lado trata-se de uma visão otimista, por atribuir tamanho valor à Educação, uma análise mais profunda demonstra que ela é ingênua, pois delega à escola uma autonomia que ela não possui, ou seja, a capacidade de resolver problemas sociais por si mesma, como se fosse neutra e não tivesse nenhuma participação nas injustiças sociais. Tal neutralidade não existe numa sociedade de desiguais: eu sempre tomarei partido de um determinado grupo social ou político, pois consciente ou inconscientemente sempre se está a serviço de alguém em detrimento de outrem. Um posicionamento neutro não luta por mudanças e favorece desse modo àqueles que dominam a situação naquele momento histórico.

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Uma terceira concepção assume uma visão otimista, porém crítica, engendrada pela superação das representações otimista e pessimista, e resultante da natureza contraditória e conflituosa das instituições sociais: considera a dupla função da Educação, conservadora e inovadora. Acontece que tanto uma visão como outra advém das contradições inerentes a um determinado sistema social, que não é imune a mudanças. Portanto, mesmo que as elites controlem o sistema educacional, sempre haverá brechas em que uma visão otimista e crítica poderá encontrar espaços de inovação.

A Educação deve ser encarada como uma atividade político-pedagógico-crítica, que não admite neutralidade e nem está restrita aos ditames de determinado grupo social, pois é detentora de uma autonomia relativa que lhe permite construir coletivamente os espaços efetivos de inovação na prática educativa que cada um desenvolve na sua própria instituição (Cortella, 2001:137). Agir com otimismo crítico é colocar a escola no papel de transformadora da sociedade, para tanto é necessário que ela esteja articulada politicamente, agindo conforme as exigências das demandas sociais e levando em conta as reais necessidades da comunidade educativa. Porém, é necessário que tome cuidado para não cair em certas armadilhas geradoras de fracasso, tais como: o uso não-reflexivo e crítico dos livros didáticos, a reprovação de responsabilidade do educador que não organizou o seu trabalho, e talvez a maior das armadilhas: a força da ideologia, que oculta a verdade dos fatos, velando a realidade.

A ideologia dominante, segundo Apple (1982), são as idéias da classe dominante, em cada momento histórico, e a classe dominante, enquanto força material, é, ao mesmo tempo, a força intelectual dominante na sociedade. A classe que detêm os meios de produção material tem também o controle sobre os meios de produção mental, sujeitando as idéias daquelas classes que não dispõem dos meios de produção.

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dessas idéias para reproduzir uma sociedade estratificada com papéis pré-determinados, e atrela os níveis de crescimento econômico aos níveis de desenvolvimento tecnológico, fazendo com que se tornem dependentes do nível de escolarização. Atribui então à educação, a capacidade de corrigir as desigualdades sociais, funcionando como um mecanismo de mobilidade social, ao mesmo tempo em que transmite a idéia de que a educação e a cultura são neutras, e não possuem força política para a mudança social.

Todavia, o currículo não é intocável e nem neutro. Segundo Freire (1996), é necessário problematizá-lo, pois ele pode e deve ser questionado sob vários aspectos, a fim de colocá-lo numa posição passível de intervenção.

A partir destas concepções, começamos a perceber que auxiliar o professor em sua prática significa situá-lo dentro de um contexto sócio-político, no qual ele possa desvelar interesses que estão para além do cotidiano escolar, conscientizando-se de que a educação não é neutra, e que é necessário posicionar-se perante uma sociedade desigual em que a maioria carente necessita de estudo e educação para defender seus interesses. É fazer o docente perceber que educar significa colocar o ser humano em primeiro lugar em todas as ações e decisões de sua prática, e que, para tanto, é necessário desenvolver a capacidade de lutar contra tudo que materializa as relações humanas, procurando construir e reconstruir ações que libertem e não escravizem o ser humano, provando que o homem, enquanto sujeito de sua história, constrói-se e reconstrói-se a cada dia.

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consideradas reais, válidas e racionais as idéias dessa mesma classe dominante, que impõe assim a sua ideologia.

A educação problematizadora (op.cit.) contradiz a educação bancária, pois se opõe à adaptação e contribui para a inserção do homem no mundo, questionando a realidade por meio da comunicação e do pensamento crítico, gerando uma ação transformadora que visa recriar o mundo, tornando-o mais humano.

Posicionar-se criticamente em educação significa assumir o compromisso de contribuir para o desenvolvimento da consciência crítica de seu educando, a fim de que supere sua visão ingênua de se ver como um ser determinado, para situar-se como um ser histórico, capaz de alterar o curso de injustiças da sua história.

Ao considerar o trabalho docente sob essa ótica, verificamos que tal atitude exige do profissional da educação um constante exercício de reflexão e problematização, algo que muitos professores não sabem fazer, pois no seu processo de formação inicial não desenvolveram essas habilidades. Tais educadores necessitam ser auxiliados por processos formativos em serviço que os auxiliem a refletir e problematizar a sua prática.

Processos de formação em serviço que tenham como objetivo a reflexão e problematização, não devem limitar-se a um período específico, não devem esperar resultados imediatos, não devem estar desvinculados da formação inicial e não devem ser encarados como mera reciclagem, de forma que valorizem os saberes e as competências docentes advindos da formação profissional, do exercício da docência e de aprendizagens realizadas ao longo da vida, dentro e fora da escola.

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Um programa de formação docente continuada deve ser visto como uma estratégia a longo prazo, exigindo esforços sistemáticos e sustentáveis, e a valorização da prática docente como um espaço privilegiado para a formação e reflexão sobre os modos de aprender e de ensinar.

Entretanto, um processo formativo com tais características pode significar um problema para o gestor educacional que necessita de resultados imediatos, a fim de prestar contas das metas e objetivos educacionais estabelecidos pelo mantenedor. Para atingir seus fins, o gestor costuma privilegiar formas de gerenciamento que facilitam a comparação e o controle de resultados, ignorando possíveis processos formativos. Porém, a responsabilização da direção pela gestão e por resultados que comprovem um ensino de qualidade, não se resume somente em adotar mecanismos de controle organizacional, mas também em engendrar mecanismos e processos de promoção e formação profissional. Mais do que controlar os atores educativos é preciso transformá-los em profissionais melhores do que são.

Os estudos sobre a avaliação dentro do Programa de Pós-graduação em Educação: Currículo da PUC/SP possibilitaram-nos entendê-la como um excelente processo de formação contínua em serviço, podendo proporcionar a melhoria qualitativa e pedagógica da instituição, além de gerar possibilidades de transformação e emancipação no docente, que por meio da reflexão crítica, pode modificar qualitativamente sua prática.

A avaliação emancipatória caracteriza-se como um processo de descrição, análise e crítica de uma dada realidade visando transformá-la (Saul 2001: 61).

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fazendo com que ele perceba-se como sujeito de sua própria história, capaz de compreender os fatores sociais e institucionais que condicionam a sua prática, emancipando-se das formas de dominação que afetam o seu pensamento e a sua ação, construindo as suas próprias alternativas de ação.

Esta concepção de avaliação difere daquela que a vê apenas como instrumento de vigilância para garantir o controle administrativo-burocrático e as exigências de produtividade educacional. Nesse caso, a avaliação é utilizada como forma de poder em função das exigências de regulação, de controle educacional e de legitimação organizacional, medindo a eficiência5 do indivíduo, segundo a retórica oficial, como uma necessidade para o aumento da qualidade e da excelência, quando na verdade edulcora “a idéia de produtividade segundo a lógica do mercado: aumentar a quantidade de rendimentos, com menores custos” (Sobrinho, 2004: 2).

Seja como forma de recompensa seja como forma e punição ou coerção, avaliar é uma forma de poder que tanto pode aparecer dissimulada como andar associada a outros poderes (Almerindo, 2000:22)

Ao contrário desta, a concepção de avaliação que investigamos contribui para a promoção do profissional, envolvendo princípios metodológicos voltados para a necessidade do indivíduo e da sociedade, cujo foco principal não é punir os deficientes e premiar os competentes, mas sim contribuir para a formação contínua do docente em serviço.

Essa concepção de avaliação reconhece a importância de se investir no profissional, e admite a possibilidade de suscitar valores emancipatórios a fim de que possa

5 Sobrinho(2004), denomina esta medida de eficiência como

assessment, “trata-se de medir

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desenvolver criticidade e autonomia para o exercício de uma práxis pedagógica reflexiva que objetive a melhora dos processos de ensino-aprendizagem.

Admitimos assim a possibilidade de utilizar na formação docente uma avaliação que permita a reflexão crítica sobre a prática, reflexão essa defendida por Freire (1996) como um momento privilegiado de formação permanente do docente, sem o qual não se pode dizer que há formação, pois só há formação contínua quando desejo que minha prática amanhã seja melhor do que a de hoje, o que implica em estar aberto para a crítica e a mudança.

Neste sentido, a avaliação da prática é fator importante e indispensável à formação da educadora. Quase sempre, lamentavelmente, avaliamos a pessoa da professora e não sua prática. Avaliamos para punir e não para melhorar a ação dos sujeitos e não para formar. (Freire, 2003: 15).

Freire (2003) destaca a importância da avaliação da prática como caminho para a formação teórica, apontando-a como uma necessidade da própria natureza da prática, mas destaca que, na maioria das vezes, a avaliação é punitiva, e não contribui para a formação docente.

Os caminhos da Educação e Formação

A educação no Brasil foi historicamente gerada nos valores burgueses e durante muitos anos foi impregnada por um ensino tradicional-elitista. Atualmente, tem-se limitado a importar modismos educacionais e organizacionais, influenciada por ideologias neoliberais.

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inúmeras incertezas no seu dia-a-dia, melhorar sua qualidade de vida, viver em solidariedade e assumir seu compromisso político de luta por uma sociedade mais justa.

Porém, com a crise do capitalismo, a sociedade torna-se cada vez mais globalizada, desumanizada e competitiva, exigindo dos trabalhadores adaptação a constantes transformações e mudanças. Tal situação não é diferente para o educador que necessita desenvolver-se profissionalmente, aprimorar suas capacidades cognitivas, comportamentais e atitudinais, a fim de fazer frente às exigências de uma profissão cada vez mais complexa e de condições de trabalho cada vez mais precárias, tornando-se agente de mudança.

Para profissionalizar-se, é necessário enxergar o “todo”, situar-se num contexto maior e mais abrangente, para refletir, modificar e recriar a própria prática. Esse caminho em direção à profissionalização não é solitário, realiza-se em interação com outros sujeitos e necessita que o docente seja auxiliado por processos formativos permanentes. Nesse sentido, a escola apresenta-se como um dos possíveis locais para a formação e profissionalização docente, privilegiado talvez, por estar muito próximo da prática.

Segundo Imbernón (2001), a formação a partir da escola surgiu no Reino Unido em meados dos anos 70, como recomendação política, devido aos parcos recursos educativos destinados à formação de professores. Nela, a formação não é apenas um conjunto de técnicas, pois carrega em si os valores, crenças, atitudes e a ideologia da instituição.

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A escola, se entendida como uma comunidade educativa onde as responsabilidades de formação e aprendizagem são partilhadas cooperativamente por vários atores educativos (professores, funcionários, gestores, pais, órgãos fiscalizadores e legisladores), representa um ambiente de formação em serviço, e pode proporcionar espaços para a construção de habilidades e capacidades docentes. Nela, o docente é sujeito e não objeto de formação, podendo dessa forma desenvolver com autonomia sua capacidade de reflexão na ação e conscientizar-se do compromisso social e político em prol de uma prática educativa de qualidade. Por isso, os modelos de formação não devem direcioná-lo, mas orientá-lo e estimulá-lo, contribuindo para o desenvolvimento da autonomia.

Em contrapartida, o professor deve almejar a busca por aperfeiçoamento profissional, e manifestar o seu desejo de mudança pelo comprometimento e pela determinação necessários para enfrentar os sacrifícios implícitos a esta formação extraordinária, já que é acrescida aos compromissos do cotidiano.

Porém, a escola é também um espaço social marcado por lutas e conflitos, e o direcionamento dos processos formativos dependerá do direcionamento das políticas de formação vigentes no contexto onde o docente se situa.

Entretanto, segundo Brzezinski (1.999), as políticas de formação docente parecem estar longe da realidade, pois obedecem aos preceitos do neoliberalismo e às diretrizes do financiador dos programas de formação, o Banco Mundial. Este vem impondo reformas educacionais no intuito de ajustar a educação à lógica do mundo globalizado. Tais reformas preocupam-se mais em conceder certificação e apresentar resultados expressos por dados quantitativos, visando causar impacto nos financiadores, do que conferir uma boa qualificação, preocupando-se em efetivar uma política de formação e profissionalização docente.

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aferir o desempenho e o mérito profissional, visando a certificação de conhecimentos, competências e habilidades de professores da Educação Básica, em todo o país.

Admite-se a avaliação no âmbito da formação de professores, quando ela supera a mera aferição e foca-se numa dimensão formativa, posicionando-se como um processo de formação contínua que possibilite a reflexão sobre a prática e contribua para a melhoria dos saberes docentes.

Promover uma prática docente reflexiva pressupõe, por parte do educador, uma posição crítica perante a realidade, a fim de fazer frente às influências ideológicas de uma sociedade capitalista que procura ocultar seus reais interesses econômicos e ideológicos, reinterpretando-os de forma a apoiar a cultura dominante.

A cultura dominante procura induzir o docente a ver a realidade como um conjunto de valores e significados tidos como verdades absolutas, levando-o a posicionar-se como um participante neutro e a agir como se não tivesse nenhuma participação ou envolvimento no quadro de injustiças sociais que assola a maioria da população mundial. Para Freire (1.996), a educação não admite neutralidade devido ao seu caráter político, sempre se está a favor ou contra um determinado interesse, mesmo que inconsciente apóio um lado ou outro, pois a sociedade possui interesses distintos e ocultos. Posicionar-se como neutro significa adequar-se a uma realidade injusta, denota a ausência de um olhar crítico para perceber o contexto a sua volta e as influências ideológicas da classe dominante.

No campo da formação de professores, destacamos a avaliação da prática docente, que embora usualmente seja orientada pela lógica da regulação, da vigilância e punição, pode avocar um caráter formativo e voltar-se para o desenvolvimento e aprimoramento do profissional da educação. Acreditamos que um processo avaliativo que contemple uma intenção formativa nos resultados apresentados, no feedback e nas sugestões do avaliador, pode auxiliar o profissional a refletir sobre sua prática e a construir soluções e encontrar caminhos para sanar suas dificuldades.

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Porém, ser avaliado ainda causa constrangimento para o docente, gerando sentimentos antagônicos, que podem rejeitar ou acolher a avaliação, conforme sua percepção acerca das intenções avaliativas. Há aquele que, ao ser avaliado, sente seu trabalho invadido por profissionais abarrotados de novas idéias que se dizem especialistas em educação, mas que não conseguem compreender corretamente as dificuldades da prática docente. Para esse professor, o resultado da avaliação e as sugestões do avaliador acabam não contribuindo para o seu trabalho, e podem provocar revolta, afetar a sua auto-estima e a sua autonomia, além de possivelmente criar uma subserviência ao feedback do avaliador.

Em sentido oposto, há o que recebe as críticas e sugestões de forma construtiva, acreditando que o processo avaliativo demonstrou aspectos não desenvolvidos em seu trabalho e que até então não haviam sido percebidos por ele. Para este docente a avaliação significa um processo de reflexão crítica sobre a prática, possibilitando a superação de obstáculos oriundos do cotidiano do seu trabalho.

Não basta dizer que a avaliação é formativa se não ficar claro aos olhos do avaliado o que se avalia, para que se avalia, por que se avalia, como se avalia e a serviço de quem se avalia. Aceitá-la sem reflexão e criticidade denota falta de consciência e submissão perante o poder que a avaliação representa na instituição. Afinal, a avaliação é marcada historicamente pelo seu caráter punitivo, se não ficarem comprovadas suas intenções formativas, ela será vista com desconfiança.

Ao evidenciar seu caráter formativo, a avaliação da prática docente manifesta-se como um excelente processo de formação em serviço. A possibilidade de ser realizada em serviço supre a escassez de tempo que o docente tem para dedicar à profissionalização, ocasionada pela acúmulo de tarefas e pela precária remuneração profissional, pois apresenta condições apropriadas e ideais para a consecução da melhoria da prática docente, e possibilita atingir resultados de qualidade ao envolver no processo, todos os sujeitos presentes na comunidade educativa.

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veladas pela ideologia dominante que, dizendo-se formativa, aplica métodos autoritários e utiliza os resultados para punir, inviabilizando qualquer processo formativo.

A par dessas dificuldades e obstáculos, e acreditando na possibilidade de utilizar a avaliação docente como um processo de formação e reflexão que conduza ao aprimoramento e a profissionalização, apresentamos nosso problema de pesquisa formulando a seguinte questão: quais são os fatores e/ou condições para que a avaliação da prática docente tenha caráter formativo?

Ao investigarmos os processos de avaliação da prática do professor sob o olhar do avaliado, estaremos investigando as opiniões, resistências, sentimentos e significados que ele elabora durante o processo avaliativo. Para enfim encontrar dados que, analisados, deslindem quais são os fatores e/ou condições para que a avaliação da prática docente tenha caráter formativo.

O espaço ideológico e a escolha metodológica

Privilegiamos a abordagem qualitativa na investigação, por apresentar características que permitem compreender melhor a complexidade e o dinamismo dos fenômenos humanos e sociais. Uma abordagem unicamente quantitativa analisaria os fatos sob uma perspectiva racionalista-positivista, ignorando a compreensão da construção e do significado que o sujeito atribui a si e as suas ações.

A visão que o sujeito tem de si e da realidade, constrói-se pelas interpretações e significados realizados em interação com outros sujeitos, portanto, a análise qualitativa do contexto em que se dão essas práticas é um elemento fundamental na compreensão do fenômeno.

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tratamento metodológico hipotético-dedutivo de origem positivista, já que o objeto de nossa pesquisa é investigar os sujeitos humanos e procurar perceber aquilo que eles experimentam, o modo como eles interpretam e as suas experiências e o modo com eles próprios estruturam o mundo social em que vivem. (Bogdan & Biklen, 1993: 51)

A pesquisa de cunho qualitativo coaduna-se com uma concepção de mundo que associa imagem sensorial, pensamentos e linguagem, objetivando uma ação transformadora sobre o mundo. O ser humano interage com o mundo recriando-o, ele interfere na realidade para torná-la melhor, alicerçado na consciência e no reconhecimento do ser condicionado.

Para Freire (1996), é próprio do ser humano ser inacabado e inconcluso. O ser condicionado é diferente do ser determinado, ele é consciente histórica e socialmente de que é inconcluso, e que deve construir a sua presença no mundo fazendo frente a barreiras materiais, econômicas, políticas, culturais e ideológicas, que o oprimem, posicionando-se como alguém que luta para ser sujeito da sua história e não mero objeto.

A seleção do procedimento de coleta de informação

Dentro da abordagem qualitativa, para a coleta de dados optamos por utilizar a entrevista semi-estruturada, por permitir explorar com maior profundidade o saber do entrevistado, que se vê mais à vontade para dar uma resposta que exprima o que realmente ele pensa, representa, crê e valoriza. As entrevistas assim conduzidas favoreceram o diálogo e, segundo Szymanski (2002), permitem o estudo de significados subjetivos.

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Uma entrevista, segundo Szymanski (2002), é uma situação de interação humana, e, portanto, estão presentes sentimentos, expectativas, preconceitos e interpretações, tanto por parte do entrevistado quanto do entrevistador. Por isso, pode ocorrer que o entrevistado utilize-se de estratégias de ocultamento, escondendo informações que supostamente possam ameaçá-lo. Tal atitude parece inevitável, daí o esforço de interação entre ambos. É nesse encontro interpessoal, marcado pelo esforço de interação e reflexividade, que os significados são construídos e podem constituir-se num momento de construção de um novo conhecimento.

Atento às recomendações de Szymanski (2002) e Bogdan & Biklen (1993), inicialmente trocamos amenidades e apresentações mútuas, procurando aquecer a conversa, a fim de criar um clima de cooperação,compartilhamento, e diálogo.

A seguir deixamos claro o objetivo da entrevista, solicitando permissão para a gravação e garantindo o sigilo da origem das informações. Formulamos questões desencadeadoras que serviram como ponto de partida para a fala do entrevistado. Nos casos de respostas estranhas, pedimos esclarecimento ao entrevistado, contudo procuramos estar atentos para o fato de uma resposta confusa poder ter sentido de ocultação, e nesse caso insistimos no esclarecimento, para não criar constrangimentos.

Ao utilizarmos o gravador, atentamos para o fato de que este instrumento não registra aquilo que só o olhar pode perceber, assim, quando o entrevistado gesticulava ou fazia sinais significativos, esses indícios não-verbais, na medida do possível, foram traduzidos em linguagem verbal, e transcritos posteriormente, com caráter de comentário.

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O segundo eixo procurou identificar os sentimentos e expectativas do avaliado durante o processo da avaliação. Sentimento tais como medo, desconfiança, ameaça, vigilância, etc. Se ele sentiu-se vigiado, controlado, testado, desvalorizado, questionado, etc.

O terceiro eixo procurou verificar se a avaliação proporcionou-lhe reflexão sobre a sua prática, conscientização de possíveis falhas na mesma, e oportunidade de melhoria e mudança em seus processos de ensino.

O penúltimo eixo procurou observar se a avaliação foi formativa, propiciando a aquisição de conhecimentos significativos para a sua prática.

O último eixo procurou explorar as contribuições práticas da avaliação para o trabalho docente. Procurando saber se o avaliado desenvolveu algum projeto a partir dos resultados da avaliação, evidenciando uma maior autonomia e desenvolvimento profissional em seu trabalho.

Os dados obtidos não tinham com objetivo testar uma hipótese previamente construída, as idéias ou conceitos foram sendo construídas durante o processo de análise dos dados.

Seguindo as orientações de Szymanski (2002), a primeira transcrição do texto foi registrada de forma literal, incluindo somente as anotações referentes à linguagem não-verbal e ao contexto, bem como as impressões, percepções e sentimentos do pesquisador durante a transcrição (que servirão como elementos de análise). Na segunda versão efetuou-se a limpeza dos vícios de linguagem, e uma melhor organização do texto segundo as normas ortográficas e de sintaxe, sem substituir nenhum termo.

O campo de pesquisa

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Encontrar colégios que se dispusessem a abrir as portas para que pudéssemos investigar o seu processo de avaliação docente não foi uma tarefa fácil, afinal isso representava penetrar num universo de conflitos e relações de poder, que acabam por revelar a intimidade da instituição. Depois de alguns pedidos sem resposta, fomos auxiliados por uma amiga, consultora em educação, que se servindo do seu prestígio e confiança, intercedeu a nosso favor junto a três escolas que haviam realizado processos de avaliação docente. Nelas entrevistamos dezoito profissionais, que se dispuseram a expressar suas experiências com a avaliação do seu trabalho.

Todos os nomes dos profissionais entrevistados, bem como a identificação dos colégios em que trabalham, são fictícios. A primeira escola que visitamos, denominada de Colégio Paz6, localiza-se no interior da cidade de São Paulo, oferece cursos de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio e atende a uma clientela de classe média. Nela foram entrevistados oito professores.

Posteriormente entrevistamos dez profissionais, entre professores e coordenadores, em duas Instituições Públicas Municipais, localizadas na cidade de São Paulo, em regiões distintas e distantes. Elas oferecem cursos para a Educação de Jovens e Adultos EJA, denominadas Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos -CIEJA.

No CIEJA do Carmo7 foram entrevistados três professores e duas coordenadoras; no CIEJA da Fonte8, igualmente foram entrevistados três professores e duas

coordenadoras.

6 O nome é fictício. 7 Idem.

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CAPÍTULO I

EDUCAÇÃO, FORMAÇÃO E AVALIAÇÃO

1.1. Situando a Formação no contexto histórico da Educação Brasileira

O ensino no Brasil, desde os seus primórdios, tinha como finalidade manter a hegemonia daqueles que ocupavam o poder. No período colonial, a classe dominante incorporou o modelo de educação europeu, ministrado pelos padres jesuítas, nossos primeiros professores. Porém, esse tipo de ensino transplantado, desvinculado da realidade local, não contribuía para a construção de uma sociedade nascente, e mostrava-se para a maioria da população como algo alienado, alienante e uniforme, pois atendia somente aos interesses dominantes.

Para Romanelli (1989), nossos primeiros cursos superiores (não-teológicos) surgiram com a vinda de D. João VI, pela necessidade de proporcionar educação para a corte que havia fugido para o Brasil, e, posteriormente, a independência do país trouxe a exigência de desenvolver a capacidade de autogovernar-se, e com ela a necessidade de formar letrados para ocupar cargos administrativos e políticos no novo governo. Com a estrutura de ensino instaurada em 1834, o ensino primário e médio foi relegado a um segundo plano, e por essa razão, não recebiam verbas diretamente do poder central. Nessas condições, o indivíduo que não possuía habilitação para o exercício de uma profissão rendosa, dedicava-se ao ensino primário e médio, sendo chamado de “mestre-escola”.

Ribeiro (2001), ao analisar o período da organização escolar até 1920, assinala que pouca atenção foi dada à formação do magistério, embora nesta época já existissem escolas de nível superior no âmbito Federal, Estadual e Particular, essa em maior número, voltada principalmente para o ensino jurídico, médico e politécnico.

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para a formação do magistério secundário e os critérios de seleção do professor de nível superior não eram eficientes. (Ribeiro, 2001:94)

Segundo o Parecer CNE/CP 28/2001, a formação de professores em nível superior surge com a criação de algumas faculdades para, entre outras ações, qualificar pessoas para o exercício do magistério. Dentre elas, citamos a Faculdade de Educação, Ciências e Letras, criada pelo Decreto 19.852/31 de 11/4/1931, durante o governo provisório de Vargas e sob a gestão do Ministro da Educação e Saúde Pública, Francisco de Campos. Posteriormente, com a Lei 452 de 5/7/1937, organiza-se a Universidade do Brasil e cria-se a Faculdade Nacional de Filosofia, para preparar intelectuais e candidatos ao magistério do ensino secundário e normal. Essa faculdade foi regulamentada somente em 4/4/1939 pelo Decreto-lei 1.190, que criou um curso de Pedagogia. Nele ficou estabelecido que, para a formação de professores em nível superior, haveria mais um ano para introdução do curso de Didática, acrescidos aos três anos de Bacharelado.

Para Caparroz (1992), a duração dos cursos de Bacharelado e Licenciatura foi equiparada em 1946, mas somente em 1962, após a LDB No. 4.024/61, que o conselho Federal de Educação estabeleceu um currículo mínimo para o curso de Licenciatura, desobrigou a manutenção de colégios de aplicação e os estágios passaram a ser realizados nas escolas da comunidade. A LDB 5692/71 do Governo Militar reorganizaria os cursos de formação de professores, criando vários níveis de formação, entre o 1 o grau e o 2 o grau, estabelecendo em lei complementar as

Licenciaturas curta e plena.

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com as dimensões política e social da atividade educativa, incluindo a dinâmica escolar, o relacionamento da escola com seu entorno mais amplo, a avaliação, a gestão (WEBER, 2000: 134).

Até então, a formação dos professores, que vinha avançando devido à expansão do ensino, à visão de educação como capital humano e a uma formação de caráter tecnicista, teve que repensar seus rumos por causa das transformações e crises sócio-econômicas, ao advento das novas tecnologias de comunicação e informatização, e dos novos rumos da política. Enfatizando a necessidade de modernização e qualificação do campo educacional na tarefa de formação do cidadão autônomo e competente tecnicamente.

O padrão de qualidade se dirige para uma formação holística que atinge todas as atividades teóricas e práticas articulando-as em torno de eixos que redefinem e alteram o processo formativo das legislações passadas. A relação teoria e prática deve perpassar todas essas atividades as quais deve estar articuladas ente si como objetivo fundamental formar o docente em nível superior (Parecer CNE/CP 28/2001, A Lei 9.394/96).

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O mesmo parecer aponta alguns princípios que deverão nortear a formação docente da educação básica, dos quais citamos: é necessário que a formação se dê pela concepção de competência, pois não basta saber, é preciso saber mobilizar os conhecimentos, transformando-os em ação; é necessário coerência entre a formação e a prática, pois há que se ter coerência entre o que se faz na formação e o que se espera do professor como profissional; é necessário que as concepções de aprendizagem e avaliação sejam fundamentadas e estudadas; a pesquisa deve ser elemento fundamental; é indispensável o comprometimento com os valores da sociedade democrática; a compreensão do papel social da escola; o domínio dos conteúdos, seus significados em diferentes contextos e sua articulação interdisciplinar; e, finalizando, o domínio do conhecimento pedagógico.

O conceito de competência presente nas Diretrizes Curriculares para a Formação de Professores de nível superior para a Educação Básica elaborado pelo Ministério da Educação e Cultura - MEC, sofre influência de autores francófanos e ibéricos, tais como Philippe Perrenoud. Segundo esse autor, a noção de competência designa “uma capacidade de mobilizar diversos recursos cognitivos para enfrentar um tipo de situações” (Perrenoud, 2000:15), portanto trata-se da capacidade de mobilizar determinadas operações mentais complexas, adaptando-as a situações diversas. Estas requerem habilidades cognitivas, psicológicas e técnicas para o enfrentamento de situações-problema e são construídas em formação e no exercício diário da prática profissional do professor.

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A resolução CNE/CP 1, DE 18 de fevereiro de 2002, leva em conta a importância da competência9 prática, pois adota como um de seus princípios norteadores, a

coerência entre a formação oferecida e a prática esperada pelo futuro professor, tendo em vista: a simetria invertida, onde o preparo do professor, por ocorrer em lugar similar àquele em que vai atuar, demanda consistência entre o que faz na formação e o que dele se espera; e a aprendizagem como processo de construção de conhecimentos, habilidades e valores em interação com a realidade e com os demais indivíduos, no qual são colocadas em uso capacidades pessoais.

Porém, embora os conhecimentos exigidos para a constituição de competências, propiciem ao professor atender com eficiência10 às novas exigências sociais e ao incremento do mercado de trabalho, não questiona o sistema e nem a política educacional adotada pelo governo.

O fato de as novas diretrizes de formação não questionarem seu lócus ideário e político gera críticas por parte daqueles que vêem a noção de competência vinculando-a a uma concepção produtivista e utilitarista, na qual a educação é considerada unicamente como preparação para o mercado de trabalho, distante do seu ideal de formação humana e cidadã.

1.2. Os desafios da docência frente ao Sistema de Ensino e a Formação Inicial

Perceber os problemas e apontar caminhos para uma formação de qualidade não é suficiente se as mudanças no sistema de ensino ocorrem sem a participação do professor, se costumam estar distantes do cotidiano escolar e da realidade docente. Todavia, espera-se que o professor adapte-se a elas e produza resultados, porém

9 O termo competência é utilizado aqui, segundo o Parecer CNE/CP 009/20001, como o domínio dos

conhecimentos em torno dos quais deverá agir; a compreensão das questões envolvidas em seu trabalho, sua identificação e resolução; a autonomia para tomar decisões; a responsabilidade pelas ações feitas; a criticidade nos processos avaliativos avaliando sua própria atuação e o contexto em que atua, e também a capacidade de interagir cooperativamente com a comunidade profissional a que pertence e com a sociedade.

Entretanto para nós, a concepção de competência, não deve contemplar apenas as competências para ensinar,

mas também a capacidade de reflexão crítica em torno das questões sócio-econômicas e políticas, habilidade importante para a formação da autonomia docente e para desvelar interesses ocultos pela ideologia dominante. 10 A eficiência de uma pessoa no desempenho de uma tarefa depende diretamente de uma relação positiva entre

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como o professor não se vê participante desse processo, não se sente atendido com relação aos seus problemas e dificuldades, as mudanças acabam não ocorrendo.

Acostumados a um trabalho bem definido – o ensino, a transmissão de conhecimentos -, os professores se vêm diante de uma situação totalmente nova; embora muitas vezes reconheçam a necessidade de redimensionar o seu trabalho e buscar novas bases para o ensino, via de regra encontram-se despreparados, mal informados e sem condições de, sozinhos, enfrentarem tantos desafios (ALONSO, 1990: 11).

Os desafios do processo de internacionalização da economia, as tensões entre os interesses de mercado e de capital e os interesses sociais, as transformações científicas e tecnológicas e a transformação de uma sociedade industrial numa sociedade baseada na informação, onde o fator de produção passou a ser o conhecimento e o controle do meio técnico-científico-informacional, dificultam a ação docente, pois muitas vezes estes temas não são contemplados na formação inicial.

Quando não há uma preparação inicial adequada que forneça as bases para construir um conhecimento pedagógico especializado (Imbernón, 2001: 58), o professor entra em choque com a realidade, pois recebe uma formação inicial meramente técnica, conteudista, centrada em disciplinas, que pouco tem a ver com a sua prática, com a realidade das escolas, com as mudanças sociais, políticas e econômicas presentes na transição de velhos para novos modelos. Portanto, as reformas nas políticas de formação devem apontar para a necessidade de rompimento das barreiras disciplinares, para a integração entre teoria e a prática, dotando os professores iniciantes de uma bagagem sólida, capacitando-os a agir com reflexão, flexibilidade e o rigor necessário a uma educação crítica que contribua para a mudança e emancipação das pessoas em seu contexto econômico, político e social.

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para que as pessoas aprendam e se adaptem para poder conviver com a mudança e com a incerteza (Imbernón, 2001: 18).

1.3. O mal estar docente frente a mudanças sociais, políticas e econômicas

Esteve (1999), percebeu nos últimos anos, acentuadas mudanças sociais, políticas e econômicas que diferenciam muito nossa sociedade de outros tempos. Tais mudanças refletiram-se também no sistema educativo, e a educação deixou de ser uma promessa de futuro melhor, desgastando a imagem dos sistemas educativos. Para ele, a passagem de um sistema de ensino de elite para um sistema de ensino de massas trouxe um aumento quantitativo de professores e alunos e também vários problemas qualitativos, que exigem profunda reflexão e redefinição do papel do professor, o qual frente a estas mudanças vê-se inseguro e cético com relação às novas políticas educacionais. Tal situação, aliada à falta de apoio, às críticas e à responsabilização do professor como único responsável pelos problemas do ensino, acabam causando um mal-estar docente11, e ainda que ele não seja o principal responsável, encontra-se na linha de frente, sente-se pressionado, mas nem sempre procura ou encontra uma saída.

O fato da educação, por força do sistema, ir deixando de ser um direito social para torna-se mercadoria, impele as instituições de ensino a adoção de métodos de gerenciamento que otimizam a mão de obra, acompanhando uma tendência de mercado. Uma das conseqüências desse movimento é o aumento das exigências em relação ao professor, as quais não se restringem aos aspectos cognitivos.

Os conflitos de relacionamento exigem do professor habilidades no gerenciamento de grupos que em outras épocas não seriam necessárias. Antigamente o professor tinha todos os direitos e o aluno só deveres, porém hoje o aluno se permite realizar diversas agressões físicas, verbais e psicológicas sem qualquer punição.

Na Argentina, um grupo de reitores, diretores, professores e investigadores, chegaram à conclusão de que o principal problema da educação no mundo passa

11 Termo utilizado por Esteves (1999: 25) para descrever os efeitos permanentes de caráter negativo que afetam

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pela relação entre docentes e alunos. Para o ministro argentino se não se puder recuperar a relação aluno-docente nada do que se possa fazer terá valor.12 Em

nosso país, o problema tem um agravante: trata-se da violência, presente em grande parte das escolas. Os relatos de violência são inúmeros. O Diário Catarinense publicou que a Unesco revelou um estudo onde 12% dos alunos, pais, professores e funcionários de escolas públicas e privadas de Santa Catarina sabem onde encontrar e comprar armas de fogo. Dentre os pesquisados: 36% já receberam ameaças de alunos, pais ou professores; 6% foram alvo de violências sexuais e 18% denunciaram depredação de escolas13. O que enfatiza a necessidade de incutir nos currículos o desenvolvimento de valores, tais como a paz e a solidariedade.

A família afetada pelas mudanças sociais e econômicas parece perdida na tarefa de formação do caráter e da moral de seus filhos, delega a escola e ao professor a formação dos valores que deveriam ser desenvolvidos no seio familiar, aumentando o rol das exigências docentes. Todavia, cabe à escola e ao professor, a formação ética de seus alunos, propiciando modos de vivenciar as diferentes inserções sócio-político-culturais entre os cidadãos. A Instituição escolar vive em numa sociedade pluralista, com grupos sociais distintos e com meios de comunicação que defendem valores diferentes, o que acaba rompendo qualquer consenso social sobre que tipo de educação deve ser ministrada.

Os efeitos de uma sociedade pluralista e multiculturalista afetou recentemente as instituições educacionais na França, no episódio envolvendo o uso do véu islâmico pelas estudantes mulçumanas, provocando inúmeras discussões sobre a laicidade. Na ocasião o Senado francês votou e aprovou um projeto de lei enquadrando, em aplicação do princípio de laicidade, o uso de sinais ou de trajes manifestando uma vinculação religiosa nas escolas, nos colégios e nos liceus públicos.14 A medida,

segundo os mulçumanos franceses, se coloca contra o Islã, porém, para o governo, ela cria, para cada indivíduo, as condições de sua liberdade de consciência, assim

12La Nacion, 26/03/2004 - Buenos Aires, Argentina. La relación docente-alumno- Editorial. 13

Diário Catarinense, 06/04/2004 – Florianópolis, SC. Escola e violência - João Aderson Flores, Vereador (PFL) em Florianópolis.

14 Le Monde, 05/03/2004 – Paris, França. A proibição de exibir sinais religiosos na escola é adotada em

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como as de sua liberdade de pensamento e de ação, para praticar a religião de sua escolha ou para ser ateu ou agnóstico.15

No Brasil, as diferenças regionais acentuadas e os grupos menos privilegiados começam a exigir igualdade de condições nos serviços educacionais fornecidos pelo poder público. Um exemplo é a polêmica questão do acesso à Universidade Pública, no último Fórum Mundial da Educação, realizado em São Paulo, durante a fala do Ministro da Educação Tarso Genro, representantes de alunos de universidades públicas (como USP, Unesp, Unicamp e Uerj), do Movimento dos Sem Universidade (MSU) e da Educafro (ONG que trabalha com a educação de negros)16, protestaram e reivindicaram um número maior de vagas principalmente para alunos dos grupos que representavam. Na disputa pela palavra, os grupos chegaram a se ofender, causando certa tensão. A convivência desses mesmos grupos dentro da Universidade evidencia a difícil tarefa do professor na conciliação dos diversos interesses.

Tais exemplos evidenciam o fato de que não há mais um consenso sobre os modelos de educação, as escolas não conseguem integrar as exigências de modelos distintos de educação, gerando um aumento das contradições no exercício da docência. Algumas escolas, ao procurar atender as necessidades do mercado, incorporam transitoriamente metodologias da “moda”, ora se dizem construtivistas, ora tradicionalistas, ora se voltam para as inteligências múltiplas, ora para o ensino voltado para a aprovação no vestibular, etc.

O professor se vê confrontado com a necessidade de protagonizar papéis contraditórios e por isso está sujeito a críticas. Na medida do possível, adapta-se às exigências de uma e de outra, trabalhando em mais de uma escola, sabe que o cotidiano escolar é marcado pela diversidade de idéias e posicionamentos. Infelizmente na maioria das instituições há pouco espaço para a discussão de um ideário comum, os conflitos existentes obrigam o professor a adaptar ou modificar

15 Idem

16 Estado de Minas, 04/04/2004 - Belo Horizonte, MG. Cotas nas particulares. Tarso Genro defende, durante o

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suas atitudes, comportamentos ou opiniões, de acordo com as circunstâncias, e, especialmente em função de interesses e conveniências de cada gestor.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais enfatizam que o Ensino está mudando devido às novas tecnologias, e as mudanças na produção de bens e serviço, e no próprio conhecimento. Os professores devem agora aperfeiçoar a sua prática educativa, buscando novas abordagens e metodologias que se mostrem significativas e contextualizadas, acompanhando assim, o avanço das ciências e as transformações e mudanças sociais. Pressionando o professor a selecionar conteúdos atualizados que se mostrem indispensáveis para acompanhar esses avanços e abandonar alguns conteúdos tradicionalmente transmitidos. Nessas circunstâncias, é natural que o docente fique imobilizado, e sinta-se inseguro e receoso para realizar tais mudanças, pois não sabe o que realmente necessita ser ensinado.

Mudanças curriculares, como nos lembra Torres (1995), não se restringe apenas a conteúdos e objetivos, mas abrange também as relações e aprendizagens sociais caracterizadas por um conjunto de discursos presentes no processo de ensino-aprendizagem. A mudança de conteúdo implica também a mudança do “saber escolar” e da “cultura escolar”, pois a adoção de uma determinada proposta, reflete na escolha de uma determinada concepção educativa, social, política, etc.

Por trás de uma concepção de currículo há conflitos, escolhas, ideologias, interesses políticos e econômicos que são ignorados pelos professores, mas imprescindíveis para que eles possam questionar o que deve ser ensinado. Para desvelar essas relações ocultas é necessário identificar a função social manifesta e latente do conhecimento transmitido, analisando como os princípios de seleção e organização funcionam na reprodução cultural e econômica das relações de classe.

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Segundo estudos de Romanelli (1989), o ensino no Brasil, no período colonial, esteve voltado para as elites. Na época adotavam-se modelos de ensino e hábitos aristocratas, procurando imitar a Metrópole. Havia uma educação mínima para a população branca e indígena em geral (menos para as mulheres) e uma educação média para a classe dominante que seguia, posteriormente, seus estudos na carreira eclesiástica ou encaminhava-se para a Europa. Esse modelo educacional sobreviveu à expulsão dos jesuítas, atravessou o período colonial, imperial e republicano sem grandes modificações, mesmo quando a demanda social por educação das classes mais baixas fez-se necessária, exigindo a ampliação da oferta escolar. Durante todo esse período, esse modelo foi-se firmando como status e símbolo da classe dominante.

Os avanços educacionais obtidos pelo Brasil na década de 90 são impressionantes, segundo dados do Ministério da Educação e da UNESCO-OCDE17, na educação fundamental as matrículas são da ordem de 36 milhões; no ensino médio, são mais de 7,7 milhões e pode chegar a 10,4 milhões em 2005; e no ensino superior, são aproximadamente 2,3 milhões de alunos matriculados. Apesar dos avanços quantitativos obtidos nos últimos anos, em termos qualitativos o ensino oferecido pelas escolas brasileiras é de má qualidade. No Relatório de Monitoramento Global feito pela UNESCO18, entre os 127 países que assinaram o acordo no Fórum Mundial de Educação de Dacar, no Senegal, em 2000, comprometendo-se a tomar medidas para a melhoria do ensino em suas escolas, o Brasil aparece na 72ª colocação. Os dados19 da avaliação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) em 2003 mostram que 55% das crianças da 4ª série do ensino fundamental não têm competência de leitura apropriada à série. Na matemática, 52% das crianças não consolidaram plenamente os algoritmos da soma, da subtração, da multiplicação e da divisão. Em leitura, a média de proficiência obtida foi de 169 pontos, e, em matemática, de 177. O mínimo considerado satisfatório para as duas disciplinas deveria ser de 200 pontos.

17 WERTHEIN, Jorge Educação: O desafio da qualidade

http://www.unesco.org.br/noticias/opiniao/artigow/artigow_qual/mostra_documento - Acessado em 25/01/05.

18http://www.pnud.org.br/educacao/reportagens/index.php?id01=798&lay=ecu - Acessado em 25/01/05.

19

ARAÚJO, Carlos H. & LUZIO, Nildo Educação: quantidade e qualidade

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As mudanças no sistema educativo trouxeram ainda a desvalorização docente. Os antigos mestres e donos do saber perderam seu status social e cultural, além de serem atingidos por um profundo arrocho salarial. A profissão docente que antes era sinal de status, passa a ser para alguns, a última opção quando não se conseguiu uma ocupação melhor, ou ainda “um bico”, uma maneira de aumentar os ganhos. Tal situação levou muitos professores a desiludirem-se e abandonarem a docência, provocando a escassez de profissionais em algumas disciplinas.

Na cidade de São Paulo, segundo artigo publicado no Jornal da Tarde20, apesar de não haver estatísticas, as escolas públicas e particulares começam a enfrentar o problema da falta de professores em algumas disciplinas. A desmotivação para o ingresso de novos professores se deve à desvalorização da carreira, prejudicada por salários baixos, excesso de trabalho e falta de condições para lecionar.

O aumento das responsabilidades do professor e a massificação do ensino no decorrer dos anos trouxeram ainda a decadência dos recursos materiais e das condições de trabalho do professor, devido a diminuição dos investimentos efetuados na educação por parte dos governos. No governo Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro da Educação, Tarso Genro, solicitou publicamente mais recursos para o seu ministério, repetindo o que já havia sido feito intensamente pelo seu antecessor Cristovam Buarque. Nos dizeres do ministro, há que se criar um grande movimento político capaz de dar sustentação à visão de que todos os outros setores da administração pública terão escasso sucesso se o centro desse processo não estiver na questão da educação.21

No passado, além de valorizado, o professor era a única fonte de transmissão de informação, porém o desenvolvimento de fontes de informação alternativas à escola, como os meios multimídias, a internet, tvs a cabo, consegue-se transmitir informações em maior quantidade e qualidade. Tais avanços enfatizam cada vez mais a necessidade dos professores abandonarem uma concepção de ensino,

20

Jornal da Tarde, 10/03/2004 - São Paulo, SP. Eles não querem ser professores.

21

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