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A Caixa de Areia. Uma Peça curta em Memória de Minha Avó ( ) Edward Albee

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Academic year: 2021

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A Caixa de Areia.

Uma Peça curta em Memória de Minha Avó (1876-1959) Edward Albee

Tradução Maria Sílvia Betti

Personagens:

O Jovem, 25 anos, um rapaz bonito e de belo porte físico em traje de banho. Mamãe, 55 anos, uma mulher bem vestida e imponente.

Papai, 60 anos, um homem franzino; grisalho; magro.

Vovó, 86 anos, uma mulher pequena e enrugada com olhos brilhantes. O Músico, sem idade específica, mas seria bom que fosse jovem.

Observação. Quando, no decorrer da peça, Mamãe e Papai se chamam por esses nomes, não deve haver sugestão de regionalismo. Esses nomes são vazios afeto e apontam a pré-senilidade e vacuidade de seus personagens

Cena. Um palco vazio, em que há apenas o seguinte:

Perto das luzes do palco, na direita baixa, duas cadeiras simples colocadas lado a lado, de frente para o público; na esquerda baixa, uma cadeira voltada para a direita do palco com uma estante de partituras musicais diante dela; mais para trás, e no centro do palco, ligeiramente elevada e inclinada, uma grande caixa de areia para crianças com um balde de brinquedo e uma pá; o pano de fundo é o céu, que muda do dia claro para a noite profunda. No início, é dia claro; o Jovem está sozinho no palco, atrás da caixa de areia e voltado para o lado. Ele está fazendo ginástica; ele faz ginástica até o final da peça. Esses exercícios calistênicos que ele faz, empregando apenas os braços, devem sugerir o bater de asas. Afinal, o Jovem é o Anjo da Morte. Mamãe e Papai entram pela esquerda do palco, Mamãe na frente.

(2)

Mamãe - Bem, aqui estamos; esta é a praia. Papai (choramingando) - Estou com frio.

Mamãe (discordando com uma risadinha) - Não seja bobo; está fazendo um calor danado. Olha aquele jovem simpático ali: ele não acha que está frio (acena

para o Jovem) Olá.

Jovem - (com um sorriso cativante) Oi!

Mamãe - (olhando em volta) Isto vai dar super certo! ... você não acha, Papai? Ali tem areia... e tem água lá longe. O que você acha, Papai? Papai - (vagamente) O que você disser está certo, Mamãe.

Mamãe - (com uma risadinha) Bem, é claro ... o que quer que eu diga, então, está resolvido, certo?

Papai - (encolhe os ombros) Ela é sua mãe, não minha.

Mamãe - Eu sei que ela é minha mãe. o que você acha que eu sou? (pausa) Tudo bem, agora; vamos logo com isso. (Ela grita para os bastidores, à

esquerda do palco) Você! Aí fora! Pode entrar agora (O Músico entra, senta-se na cadeira à esquerda do palco, coloca a música na estante, está pronto para tocar. Mamãe acena com a cabeça demonstrando aprovação.) Muito

bom; muito agradável. Você está pronto, Papai? Vamos buscar a Vovó. Papai – Como você quiser, Mamãe.

Mamãe - (abrindo o caminho para fora, à esquerda do palco) Claro, tudo o que eu disser. (Para o músico) Pode começar agora. (O Músico começa a tocar;

Mamãe e Papai saem; o Músico, sem parar de tocar, acena para o rapaz.)

Rapaz (com o mesmo sorriso cativante) - Oi! (Depois de um momento, Mamãe

e Papai voltam, carregando Vovó. Eles a seguram sob as axilas; ela está enrijecida, suas pernas estão dobradas; seus pés não tocam o chão, a expressão em seu rosto de anciã é de perplexidade e medo.)

(3)

Mamãe (com uma risadinha) - Onde eu disser, é claro. Deixe-me ver ... bem ... certo, ali ... na caixa de areia. (pausa) Bem, o que você está esperando, Papai? … A caixa de areia! (Juntos, eles carregam a Vovó até a caixa de areia e meio

que a jogam lá dentro)

Vovó (endireitando-se para se sentar; sua voz é um misto de risada e choro de

bebê) – "Ahhhhhh! Graaaaa!

Papai - O que vamos fazer agora?

Mamãe (para o Músico) - Pode parar agora. (o Músico para.) (De volta para

Papai) O que você quer dizer com “o que vamos fazer agora?” Vamos até lá e

nos sentamos, é claro. (para o Jovem) Olá.

Jovem (sorrindo) - Oi! (Mamãe e Papai vão para as cadeiras, à direita do

palco e se sentam)

Vovó (como antes) Ahhhhh! Ah-haaaaaaa! Graaaaaa!

Papai - Você acha ... você acha que ela está ... confortável? Mamãe (impaciente) Como é que eu posso saber?

Papai - O que vamos fazer agora?

Mamãe - Nós ... espere. Nós ... sentamos aqui ... e esperamos ... é isso que vamos fazer.

Papai - Vamos conversar um com o outro?

Mamãe - Bem, você pode falar, se quiser ... se puder pensar em algo para dizer ... se conseguir pensar em algo novo.

Papai (pensa) - Não ... acho que não.

Mamãe (com uma risada triunfante) - Claro que não!

Vovó (batendo a pá de brinquedo no balde) - Haaaaa! Ah-haaaaaa!

Mamãe - Fique quieta, Vovó ... fique quieta e espere. (Vovó joga uma pá cheia

(4)

de jogar areia na Mamãe! (para o Papai) Ela está jogando areia em mim. (Papai

olha para a Vovó, que grita com ele.)

Vovó - GRAAAAAA!

Mamãe - não olhe para ela. Apenas ... sente aqui ... fique bem quieto ... e espere. (para o Músico) Você ... hã ... você pode continuar e fazer o que tiver que fazer.

(O músico toca. Mamãe e Papai estão imóveis, olhando para a platéia. Vovó

olha para eles, olha para o Músico, olha para o caixa de areia, joga a pá no chão.)

Vovó - Ah-haaaaaa! Graaaaaaa! (Procura reação; não obtém nenhuma. Agora

... ela fala diretamente para o público) Honestamente! Que jeito de tratar uma

velha! Arrastam para fora de casa ... enfiam num carro ... trazem da cidade para cá ... jogam em um monte de areia ... e a deixam aqui sentada. Eu tenho oitenta e seis anos! Eu me casei quando tinha dezessete anos. Com um fazendeiro. Ele morreu quando eu tinha trinta anos. (Para o Músico) Você pode parar com isso, por favor? (O Músico para de tocar). Eu sou uma velha fraca ... como você espera que alguém me ouça com esse pip-pip-pip! (falando consigo mesma) Não há respeito algum por aqui. (para o Jovem) Não há respeito algum por aqui!

Jovem (sorri) - Oi!

Vovó (continua falando com a plateia)- Meu marido morreu quando eu tinha trinta anos e eu tive que criar aquela vaca gorda ali (indica Mamãe) sozinha. Faça uma ideia do trabalho que deu. Meu Deus! (Para o Jovem). Onde foi que eles arranjaram você?

Jovem – Ah... Faz um tempo que eu ando por aí... Vovó – Faço ideia. Heh, heh, heh. Olha só pra você!

Jovem (flexionando os músculos) – Olha só se isso não é demais? (continua

com sua ginástica calistênica).

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Jovem (com doçura) – Pode crer! Vovó – Você é de onde?

Jovem – Sul da Califórnia.

Vovó – Eu sabia. Eu sabia. Como é o seu nome, meu bem? Jovem – Não sei...

Vovó (para a plateia) – E além de tudo é inteligente!

Jovem - Quer dizer... quer dizer, eles ainda não me deram um nome... o pessoal do estúdio...

Vovó (com expressão de surpresa e interesse) - Não me diga... Não me diga... Bem, tenho que te dizer mais uma coisa. Não vá embora.

Jovem – Ah, não.

Vovó (dirigindo-se à plateia) – Muito bom. Muito bom. (E em seguida,

dirigindo-se ao Jovem) Você... você é ator, hein?

Jovem (radiante) – É. Sou.

Vovó (novamente dirigindo-se à plateia; sacode os ombros) – Sou inteligente, mas de qualquer forma eu tinha que sustentar aquela lá sem ajuda de ninguém... e ... e aquele lá que está ao lado dela... é com “aquilo” que ela se casou. Rico? Vou te contar ... dinheiro, dinheiro, dinheiro. Eles me tiraram da fazenda ... o que foi bem decente da parte deles ... e me mudaram para a casa grande da cidade com eles ... arranjaram um bom lugar para mim debaixo do fogão ... me deram um cobertor do exército ... e meu próprio prato ... um prato só meu! E então, vou reclamar do que? De nada, claro! Eu não estou reclamando. (Ela

olha para cima para o céu e grita para alguém fora do palco) Não deveria estar

escurecendo agora, meu bem? (As luzes escurecem e a noite chega. O Músico

começa a tocar; é noite alta agora. Há focos de luz em todos os personagens, incluindo o Jovem, que está, é claro, continuando com sua ginástica calistênica.)

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Mamãe - Shhhhh. Fique quieto ... espere. Papai (choramingando) - Está tão quente. Mamãe - Shhhhhhh. Fique quieto ... espere.

Vovó (falando consigo mesma) - Assim é melhor. Noite. (para o Músico) Meu bem, nesta parte você toca o tempo todo? (o Músico faz que sim com a cabeça). Bem, toque bonito, com suavidade; como um bom menino. Muito bom.

(Ouve-se o som de um trovão fora nos bastidores.)

Papai (inquietando-se) - O que foi isso?

Mamãe (começando a chorar - ) Não foi nada,

Papai - Foi ... foi ... trovão ... ou uma onda quebrando ... ou algo assim.

Mamãe - (sussurrando, em meio às lágrimas) Foi um trovão fora do palco, ... e você sabe o que quer dizer.

Papai - eu não lembro ...

Mamãe (mal conseguindo falar) - Significa que chegou a hora da pobre Vovó ... e eu não aguento mais!

Papai - eu ... acho que você tem que ser corajosa.

Vovó (zombando) - Isso mesmo, criança; seja corajosa. Você vai aguentar; você vai superar isso. (fora do palco: outro trovão ... mais alto)

Mamãe - Ohhhhhhhhhhh ... pobre vovó ... pobre vovó ...

Vovó (para a Mamãe) – Eu estou bem! Eu estou bem! Ainda não aconteceu! (fora do palco um violento trovão; todas as luzes se apagam, exceto o foco de

luz no Jovem; o Músico para de tocar)

Mamãe.- Ohhhhhhhh. . . Ohhhhhhhhhhh ……. (silêncio)

Vovó - não acenda as luzes ainda ... não estou pronta; eu não estou completamente pronta. (silêncio) Tudo certo, querida ... Estou quase terminando. (as luzes acendem novamente, é dia e a luz é intensa ; o Músico

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apoiada sobre um cotovelo, semicoberta, jogando areia sobre si mesma com a pá.)

Vovó (resmungando) – Como é que eu posso fazer as coisas direito com essa droga de pá de brinquedo ...

Papai - Mamãe! Já é dia!

Mamãe (com vivacidade) – É mesmo! Vamos! Nossa longa noite acabou. Vamos deixar de lado nossas lágrimas, nosso luto ... e enfrentar o futuro. É o nosso dever.

Vovó (ainda remexendo a areia com a pá, imitanto Mamãe) - ... tirar o nosso luto ... encarar o futuro ... Senhor! (Mamãe e Papai se levantam, se

espreguiçam. Mamãe acena para o Jovem.)

Jovem (com um sorriso) - Olá! (Vovó se finge de morta. Mamãe e Papai vão

vê-la; ela está com um pouco mais da metade do corpo enterrado na areia; a pá de brinquedo está em suas mãos que estão cruzadas no peito.)

Mamãe (diante da caixa de areia, balançando a cabeça) Que fofa! É ... é difícil ficar triste ... ela parece ... tão feliz. (com orgulho e convicção) Vale a pena fazer as coisas bem feitas. (para o Músico) Tudo bem, agora pode parar, se quiser. Quer dizer, fique por aqui para nadar se quiser; por nós, tudo bem. (ela

suspira pesadamente) Bem, Papai ... lá vamos nós.

Papai – Coragem, Mamãe!

Mamãe – Coragem, Papai! (eles saem, palco à esquerda)

Vovó - Vale a pena fazer as coisas bem feitas... Puxa vida! (ela tenta se sentar) ... bem, crianças ... (descobre que não consegue se levantar) ... eu não consigo me levantar. Eu ... eu não consigo me mexer ... (O Jovem pára sua calistenia,

acena com a cabeça para o Músico, vai até a Vovó e se ajoelha perto da caixa de areia.)

Vovó - eu ... não consigo me mexer ... Jovem - Shhhh… fique quietinha….

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Vovó - eu ... eu não consigo me mexer ...

Jovem - Hã ... senhora. Quem tem uma fala agora sou eu. Vovó - Ah, desculpe, benzinho; vá em frente.

Jovem - eu sou ... hã ... Vovó - Sem pressa, querido.

Jovem – Eu sou o Anjo da Morte. Eu estou ... hã ... eu vim buscar você. Vovó - O que ... o que ... (em seguida, com resignação) ... ahhhhh ... ahhhhh, entendo. (O Jovem se inclina e beija suavemente Vovó na testa.)

Vovó - (com os olhos fechados, as mãos cruzadas sobre o peito novamente, a

pá entre as mãos, um doce sorriso no rosto) Bom ... isso foi muito bom, querido

...

Jovem (ainda ajoelhado) - Shhhhh… quieta….

Vovó - O que eu quis dizer foi que ... que você fez isso muito bem, querido ... Jovem (corando) ... ah ...

Vovó - Sério. Você tem... você tem talento.

Jovem (com um sorriso cativante) - Ah ... obrigado; muito obrigado ... senhora. Vovó (lentamente; suavemente - enquanto o Jovem coloca as mãos em cima

das mãos da Vovó) De nada... de nada ... querido. O Músico continua a tocar

enquanto a cortina desce lentamente.

Referências

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