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Revista Especial de Educação Física Edição Digital v. 3, n. 1, novembro 2006.

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Disponível em: <http://www.faefi.ufu.br/nepecc> 301

UM ENSAIO SOBRE A DEMOCRATIZAÇÃO DA GESTÃO NO COTIDIANO ESCOLAR: A CONEXÃO QUE FALTA.

Noádia Munhoz Pereira

Discente do Programa de Mestrado em Educação – PPGE/FACED/UFU - noadia1@yahoo.com.br

Resumo

O presente estudo é fruto de reflexões ao longo da experiência enquanto docente pesquisadora nas escolas públicas de Uberlândia no decorrer do ano de 2005. O objetivo geral do texto é trazer para o debate as políticas públicas recentemente implementadas no cotidiano escolar, em específico o impacto dessas políticas na gestão escolar. Metodologicamente as três categorias de análise baseiam-se em elementos constituintes dos processos e práticas gestoriais instaurados no interior da escola. Assim, a compreensão da relação entre democracia e qualidade, o papel dos pais e da comunidade na gestão democrática e o papel do conselho ou colegiado escola, por sua vez, permeiam a justificativa deste trabalho, e conduzem às três categorias de análise elegidas: democracia, qualidade e participação. O que se observa é que a educação e suas mudanças estão sendo intimamente influenciadas pelas transformações no mundo do trabalho. Num contexto de sociedade capitalista, o apelo pelo discurso da competência trás à tona uma resignificação dos conceitos de um ensino de qualidade. Também em nome da democracia a escola institui novos canais de participação. No entanto, verifica-se no cotidiano escolar que esses mecanismos de participação não são garantia de uma gestão democrática, pois as relações de poder ainda estão inseridas no processo de tomada de decisão e nas relações de trabalho no interior das instituições educacionais.

Dada a complexidade da realidade social e educacional brasileira é fundamental a discussão da Gestão Democrática, pois para entendê-la e para que esta seja construída de fato é preciso conhecer alguns elementos, tais como: a relação entre democracia e qualidade; o papel dos pais e da comunidade externa na gestão democrática da escola e o papel do Conselho de Escola (Colegiado Escolar).

Segundo Veiga (1995), o modelo tecnicista apoiado em paradigmas positivistas da ciência, que reforçou a eficiência e a eficácia pela produtividade, de forma fragmentada, entrou em crise e não responde mais às demandas por soluções globalizadas e interdisciplinares dos problemas. Na administração tradicional, onde predominava a pedagogia orgânica ao taylorismo/fordismo, o foco da formação do aluno estava pautado para atender à divisão social e técnica do trabalho.

O ideário escolar prometia sempre um mundo melhor àqueles que seguissem as normas, se mostrassem diligentes, atentos, estudiosos, obedientes. Os que não correspondiam às expectativas escolares iam sendo marcados, e estigmatizados, segregados e finalmente excluídos, por terem se mostrado pouco capazes de atingir os objetivos que a escola lhes colocava o resultado de seu fracasso escolar era imputado a eles próprios e cumpria importante

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Disponível em: <http://www.faefi.ufu.br/nepecc> 302 papel na organização social do trabalho. Estes também eram preparados para o mundo do trabalho, é bem verdade que para funções subalternas e sem os direitos que a escola garantia aos que se destacavam pela “competência” (FERREIRA, 2002, p. 132).

O apelo a novos padrões de produtividade é regido na atualidade dos anos de 1990 por uma gestão econômica voltada ao mercado internacional, o fordismo entra em crise de produtividade, os trabalhadores se revoltam contra o autoritarismo e o consumo fica saturado, assim os Estados nacionais perdem seus poderes econômicos, sendo assim, o capital reorganiza-se no plano internacional, as alternativas giram em torno das políticas de liberação, desregulamentação, privatização, flexibilidade, eficiência nos processos de trabalho, dentre outras características atuais de reestruturação produtiva no contexto de uma economia globalizada.

O capitalismo dos anos de 1990 é que têm configurado as relações de trabalho e o indivíduo no interior da sociedade e da escola. Vivenciamos um processo político e ideológico de ressignificação de conceitos, no sentido de que o Estado enquanto organizador da sociedade regula o que é público, ou seja, a tendência atual é a de abertura de diversos atores sociais na manutenção do espaço público. Com o objetivo de reduzir o máximo o gasto público as mudanças implementadas através da reforma do Estado demonstram a afetiva, descentralização, privatização e flexibilização. A nova palavra de ordem é o neoliberalismo, assim, o raciocínio neoliberal é converter o sistema educacional por si mesmo em um mercado.

Com a globalização da economia e a reestruturação produtiva, os avanços da ciência e da tecnologia nos sistemas de comunicação, surgem as demandas por um novo tipo de trabalhador. O mundo do trabalho busca então indivíduos com capacidade intelectual para resolver problemas práticos utilizando conhecimentos científicos. Este indivíduo deve dominar os vários códigos de linguagem, tais como língua portuguesa, informática, línguas estrangeiras, e, aperfeiçoar-se continuamente. Deve ter autonomia moral que lhe permita ter posicionamento ético e finalmente ter capacidade de se comprometer com o trabalho.

No entanto, o tipo de educação que garanta esta formação não é assegurado para todos. Não obstante o que presenciamos é de um lado a demanda para o trabalhador com altos níveis de especialização, e, por outro lado, um grande número de trabalhadores com educação precária que soma a uma grande massa de excluídos das possibilidades de produção e consumo. Nesse contexto encontram-se as políticas da escola pública.

...parece pacífico que a função da escola é apenas levar os educandos a se apropriarem dos conhecimentos incluídos nas tradicionais disciplinas curriculares: Matemática, Geografia, História, Língua Portuguesa, Biologia etc. Assim, a qualidade da educação seria tanto mais efetiva quanto maior fosse a quantidade desses “conteúdos” apropriados por seus alunos, sendo a escola tanto mais produtiva quanto maior o número desses alunos aprovados (e quanto maiores os escores obtidos) continua em provas e exames que medem a posse dessas informações. (PARO, 2001, p. 37).

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De certa forma o autor citado trás para nossa reflexão que a educação e a escola detentora da ‘qualidade’ no processo de ensino aprendizagem é aquela que inclui em seus conteúdos programáticos as tradicionais disciplinas, aprovam a maioria e possui uma nota satisfatória no ranking de avaliação institucional e individual do aluno. Basicamente, a concepção de ensino na atualidade considera uma qualidade meramente quantificável e que precisa ser questionada.

O que se constata é uma escola pública que tem intensa responsabilidade com a comunidade na prática cotidiana, “afinal educação para todos”, mas que se encontra desaparelhada para enfrentar os desafios que se apresentam na realidade concreta da sociedade brasileira.

Neste contexto, a Gestão Democrática é um desafio que exige revisão de papéis e de rumos na administração escolar, em busca de modelos participativos que respondam à globalidade do processo educativo aliados à consciência de que este processo deve ser repassado e compartilhado por toda a comunidade escolar.

Historicamente a luta pela democratização da gestão escolar toma corpo a partir dos anos de 1980, momento em que os movimentos sociais, com sua intervenção coletiva, intensificam as mobilizações por meio dos sindicatos, congressos, movimentos estudantis, docentes, dentre outros, pelos quais se reivindica a redemocratização da educação e processos políticos mais democráticos e participativos de vários setores na decisão dos rumos das políticas educacionais na sociedade brasileira.

Sendo assim, o movimento dos educadores em defesa da democratização conquistou a inclusão do princípio de gestão democrática da educação. Esta requer a descentralização das decisões coletivas que estimulam a formação de colegiados, grêmios, conselhos, etc. Nesta perspectiva se faz necessário uma descentralização administrativa, inclusive dos recursos financeiros, concedendo maior autonomia às escolas, o que permite a elas maior capacidade de adaptação às condições locais e também uma maior participação de todas as pessoas da escola (pais, alunos, professores, especialistas e funcionários administrativos).

A autonomia da escola reforça a Gestão Democrática, significando a transferência de papéis e competências para a escola, para que ela possa resolver os seus problemas pedagógicos, administrativos e financeiros, garantindo à escola a condição de uma identidade própria, levando em conta as características e as diferenças regionais.

No princípio da autonomia está presente a exigência da participação de professores, pais, alunos, funcionários e outros representantes da comunidade, bem como a forma de viabilização dessa participação: a interação comunicativa, a busca do consenso em pautas básicas, o diálogo intersubjetivo. Por outro lado, a participação implica os processos de gestão, os modos de fazer, a coordenação e a cobrança dos trabalhos e, decididamente, o cumprimento de responsabilidades compartilhadas dentro de uma mínima divisão de tarefas e alto grau de profissionalismo de todos. Portanto, a organização escolar democrática implica não só a participação na gestão, mas a gestão da participação. (LIBÂNEO, 2000, p.61).

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O fortalecimento da escola e sua autonomia não significam que a escola seja uma instituição isolada que caminha só e livre de qualquer compromisso. Ela faz parte de uma estrutura maior que é o sistema educacional, pois a escola está ligada a instituições como a Secretaria da Educação e as Superintendências Regionais de Ensino. O objetivo deste novo modelo de gestão é ampliar o espaço de decisões da escola.

Estabelecer o princípio da autonomia pressupõe o não isolamento e a descentralização, visto que a tendência das instituições, respeitando sua hierarquia no processo de tomada de decisão, é de reduzir a interferência direta, passando a controlar basicamente: a distribuição de recursos; a definição e controle dos meios de acompanhamento e avaliação dos resultados; estabelecimento dos canais de distribuição das informações e as definições de padrões gerais de funcionamento das escolas, que estabelecem os limites em que elas devem operar e promover as adaptações necessárias para o bom funcionamento do sistema educacional como um todo.

Diante da insuficiência da ação do Estado no provimento de um ensino público em quantidade e qualidade compatíveis com as necessidades da população, propugna-se pela iniciativa desta no sentido de exigir um serviço a que tem direito é a população usuária que mantém o Estado com seus impostos e é precisamente que a ela a escola estatal deve servir procurando agir de acordo com seus interesses (PARO, 2001, p.101).

Enquanto sujeitos políticos, fomentar o debate em torno da contextualização da realidade é fundamental para que possamos compreender as transformações que são postas, mas que podem ser questionadas, problematizadas e resignificadas e não meramente constatadas. O esforço por uma maneira de compreensão de um mundo que ‘não é’, mas ‘está sendo’, torna-se um passo para a superação das incoerências de uma gestão do próprio Estado e da escola, que em nome da autonomia e descentralização omite suas funções para garantia do ensino público e de qualidade.

Vivenciamos historicamente que o movimento de redemocratização do Estado político concomitante aos inúmeros movimentos organizados por educadores influenciou a inclusão, no contexto constitucional, de dispositivos significativos em direção à democratização da educação, tais como: a universalização da educação básica “educação para todos”; a eqüidade “oportunidade igual para todos”; a educação de qualidade “sucesso do aluno participativo, crítico competente”. Em decorrência, constituíram fortes indicadores de qualidade no texto constitucional, como a Constituição Federal de 1988 e nas leis normatizadoras da educação, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) 9394/96, por meio da descentralização da educação, fortalecimento da autonomia da escola, gestão democrática da escola pública, construção coletiva da proposta pedagógica da escola, colegiados escolares, etc.

Portanto, a escola em termos constitucionais e legais como mencionados, alcança seus objetivos quando sua função é de educar para a democracia, ou seja, proporciona conhecimentos para o autodesenvolvimento do educando e discernimento para o exercício pleno da cidadania. A democracia, nesse sentido, torna-se fator essencial para construção de uma gestão democrática.

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O que se almeja é a qualidade do ensino, pautada numa dimensão política que privilegia a formação do cidadão atuante numa sociedade democrática, o que significa redimensionar o conceito de qualidade. No mundo de globalização econômica e reestruturação produtiva conforme analisado o conceito de qualidade está associado à eficiência, o que, por sua vez, reduz o papel da escola ao atendimento das leis do mercado. É justamente contra essa concepção tradicional e conservadora, meramente quantificável, que precisamos refletir.

Segundo Paro (2001), na construção da gestão democrática urge a “necessidade de se ter a educação para democracia como componente fundamental da qualidade do ensino”, de tal forma que “não é possível conceber uma educação pública de qualidade sem levar em consideração os fins sociais da escola” (p.10).

Numa perspectiva de gestão democrática a participação dos pais e da comunidade externa demonstra um avanço para o exercício da democracia, pois exige a interação entre os sujeitos, o envolvimento de associações de moradores, sindicatos, a busca pelo trabalho coletivo e pela ação colegiada.

A participação ativa da comunidade interna e externa na tomada de decisão, ou seja, a criação dos conselhos escolares com a participação da comunidade, é reflexo do aprofundamento das lutas de reivindicação por canais de participação coletiva na construção de uma redemocratização da educação debatidos ao longo dos anos de 1980 e 1990.

No entanto é preciso reconhecer que os dispositivos legais, no que diz respeito aos princípios da gestão democrática, a participação da comunidade escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes, são passos importantes, mas insuficientes. A maneira como vêm sendo implementados esses canais de participação esbarram na própria estruturação do poder e autoridade no interior da escola.

Outro aspecto a ser levado em consideração diz respeito aos rumos das políticas educacionais no contexto de reforma do Estado considerando como um dos elementos em pauta a questão da descentralização da educação e o fortalecimento da autonomia da escola, condicionantes relevantes também no texto constitucional e nas leis normatizadoras da educação.

Analisar coletivamente o que de fato essas políticas acarretam nas práticas de gestão do trabalho escolar e pontuar ações é o ponta pé inicial para uma definição de democracia, qualidade, comunidade, ação colegiada e suas relações rumo a definição, rumo a concretização da gestão democrática da escola.

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Referências Bibliográficas:

VEIGA, I. P. A. (Org.). Projeto político pedagógico da escola: uma construção possível. Campinas: Papirus, 1995. (Coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico)

FERREIRA, N. S. C. (Org.). Supervisão educacional para uma escola de qualidade: da formação a ação. 3. ed. São Paulo: Cortez. 2002. LIBÂNEO, J. C. Organização e gestão da escola: teoria e prática. Goiânia: Edição do Autor. 2000.

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