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Academic year: 2021

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Fernanda Almeida da Silva

MONCORVO FILHO: ASSISTÊNCIA À INFÂNCIA POBRE NO INÍCIO DO SÉCULO XX NO BRASIL.

Santa Maria, RS

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Fernanda Almeida da Silva

MONCORVO FILHO: ASSISTÊNCIA À INFÂNCIA POBRE NO INÍCIO DO SÉCULO XX NO BRASIL.

Trabalho Final de Graduação apresentado ao Curso de História – Área de Ciências Humanas, do Centro Universitário Franciscano, como requisito parcial para obtenção do grau de Licenciado em História.

Orientadora: Profª. Ms. Paula Simone Bolzan Jardim

Santa Maria, RS 2010

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Fernanda Almeida da Silva

MONCORVO FILHO: ASSISTÊNCIA À INFÂNCIA POBRE NO INÍCIO DO SÉCULO XX NO BRASIL.

Trabalho Final de Graduação apresentado ao Curso de História – Área de Ciências Humanas, do Centro Universitário Franciscano, como requisito parcial para obtenção do grau de Licenciado em História.

_________________________________________________ Profª. Ms. Paula Simone Bolzan Jardim – Orientadora (Unifra)

___________________________________________________ Profª. Ms. Janaina Souza Teixeira (Unifra)

____________________________________________________ Profª. Dra. Nikelen Acosta Witter (Unifra)

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RESUMO

O presente trabalho de pesquisa analisou o contexto histórico da emergência da infância enquanto problema social tendo como base os textos e obra do importante médico-filantropo Moncorvo Filho no início do século XX, no Brasil. Esse médico brasileiro teve sempre como grande preocupação a situação da infância pobre e buscava mostrar ao governo e à sociedade que era responsabilidade da nação intervir na miséria em que esses se encontravam. Seu pensamento reflete preocupações do período tais como a garantia de mão-de-obra futura e adequada para ocupar as frentes de trabalho na cidade, em especial na indústria. Para tanto, promoveu e participou de Congressos sobre o tema e realizou um de seus projetos - o Instituto de Proteção e Assistência à Infância, que tinha como missão amparar e auxiliar a infância pobre em todo o Brasil.

PALAVRAS-CHAVE: Infância. Moncorvo Filho. Assistência. Século XX.

ABSTRACT

The present research essay analyzes the historical context of childhood emergency acknowledged as a social problem, based on literature and life work of the important physician and philanthropist Moncorvo Filho, in Brazil, at the dawn of the twentieth century. That Brazilian physician always had as a major concern of his the situation of poor infancy, and therefore, tried to show to government and society that it should be the nation’s responsibility to intervene into the picture of misery of these children. Mentality which reflects the concerns of that period of time, such as the guarantee of having well instructed labor for the future to come, people that would constitute the working front in the cities, principally within the industry. Those ideals were sustained by participating and promoting conferences on the subject, as well as through the launch of the Institute of Protection and Assistance to Childhood (Instituto de Proteção e Assistência à Infância), one of his many projects. Its mission was to help and support the less fortunate children all over the Brazilian country.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO______________________________________________________06

1 CONTEXTO HISTÓRICO DO INÍCIO DO SÉCULO XX E A EMERGÊNCIA DA INFÂNCIA COMO TEMA FILANTRÓPICO E POLÍTICO ____________08

2 MONCORVO FILHO E O DISCURSO MÉDICO-FILANTRÓPICO A RESPEITO DA INFÂNCIA POBRE_____________________________________16 CONSIDERAÇÕES FINAIS __________________________________________ 23 REFERÊNCIAS _____________________________________________________25 FONTES ELETRÔNICAS_____________________________________________27 FONTE DOCUMENTAL ELETRÔNICA________________________________28

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INTRODUÇAO

Esta pesquisa tem importância para o estudo da infância, pois nos mostra que desde muito tempo houve a necessidade de ações e medidas para cuidar das crianças. O problema da infância abandonada e pobre é antigo e merece ser aprofundado, por esta razão escolhemos a obra do médico e filantropo Moncorvo Filho, pois esse toma para si essa preocupação no início do século XX e convoca o governo e a sociedade para juntos combaterem a grande mortalidade infantil. Nesse sentido ainda é preciso salientar que inúmeras produções foram feitas tendo por base sua obra, especialmente na Universidade Santa ÚRSULA-RJ e PUC-RJ, pois sua família doou as produções integralmente para pesquisadoras. Esse material foi digitalizado e isso viabilizou ser utilizado aqui, pois está disponível pelo site da biblioteca da PUC-RJ.

O período histórico do início do século XX foi escolhido tanto pela constituição da obra do médico estudado, como por se tratar do crescimento de um setor industrial, o aumento da população nas cidades, a imigração desacompanhada de infra-estrutura nos centros urbanos, processos que deixam à mostra os vulneráveis, dentre os quais as crianças são o elo mais frágil. Nesse momento, médico e engenheiros apelam para o Estado a fim de que interfira para ordenar a vida pública, munido dos saberes necessários que esses dois grupos profissionais ofereciam. Por meio de jornais e debates, defendiam a difusão em larga escala da higiene para realizar uma medicina preventiva, pois viam na ignorância o maior problema da população. Intensifica-se a batalha para a higienização da população e a medicina higienista chama para si a responsabilidade de orientar o novo mundo urbanizado. As cidades passam por uma remodelação, alargamento de ruas, abastecimento de água, melhor iluminação e canalização de esgotos.

Outro importante aspecto que passava por grandes mudanças era a família e com ela a idéia de que as mães e pais pobres não tinham condições de criar os filhos, portanto deviam ser educados para tal tarefa.

No começo do século XX, a imagem da mulher/mãe devia encaixar-se em todos os ensinamentos que médicos e higienistas anunciavam, tornando-se praticamente enfermeira de sua família. Nesse momento nomes como Moncorvo Filho, que além de médico era estudioso da causa sobre crianças e mães pobres, assumem um importante papel de propagandista e interventor nessa realidade. Dentre as suas contribuições está o Instituto de Proteção e Assistência à Infância, inicialmente organizado no Rio de Janeiro, mas que foi inaugurado em diversos locais do país, em conjunto a órgãos

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governamentais e com a participação da sociedade, além de inúmeras palestras e publicações com o intuito de divulgar a causa infantil.

É nesse cenário que a infância aparece com grande preocupação por parte de médicos filantropos, pois esses começam a dar-se conta que a criança seria o futuro da nação e essa precisava de cuidados desde a gestação até sua maioridade. Os pobres e os abandonados passam a ficar na mira do Estado.

Para dar conta de compreender o período e entender a importância da obra de Moncorvo Filho, o presente trabalho está dividido em dois momentos de pesquisa: No primeiro contextualizou-se o período do início do século XX no Brasil baseado em pesquisa bibliográfica referente ao assunto; e o segundo foi dedicado ao médico e sua trajetória de filantropia na área da saúde infantil.

O problema que persiste até os nossos dias atuais, mas que através de homens e mulheres como Moncorvo Filho que apesar de não solucionar o problema mostrou varias direções a serem tomadas, pois sabemos que sem intervir nas estruturas sociais como políticas econômicas existentes na época e mesmo as dos nossos dias atuais muito pouco foi e será resolvido. O presente trabalho deixa uma porta aberta para futuras pesquisas, pois o assunto está longe de ser solucionado.

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1. CONTEXTO HISTÓRICO DO INÍCIO DO SÉCULO XX E A EMERGÊNCIA DA INFÂNCIA COMO TEMA FILANTRÓPICO E POLÍTICO

Como o restante do mundo, o Brasil também passava por grandes transformações no início do século XX tais como a urbanização e a industrialização, o homem deixando o campo para viver nas cidades com o recente fim do sistema escravista, a isso também se associa à entrada maciça de mão-de-obra imigrante que contribuiu para uma transformação significativa no quadro social das cidades.

Nas várias regiões que receberam imigrantes as características mudam pela forma de assentamento, em São Paulo esse imigrante ocupou as grandes plantações de café e também a cidade trabalhando na incipiente industrialização. Foi nesse momento que a população de São Paulo com cerca de trinta mil habitantes em 1870, passaria para 286 mil em 1907. O crescimento das cidades também está associado à migração da mão-de-obra que ocupou diferentes ofícios nas indústrias têxteis, alimentícia, serrarias e cerâmicas e também nos grandes cafezais (Pesavento, 1992, p.33.).

Já na região sul o imigrante direcionou-se para o campo, basicamente voltado para a propriedade familiar produtora de gêneros de subsistência. Também outra diferença no destino do imigrante que se direcionava para Porto Alegre era que os mesmos se estabeleciam com pequenos negócios como farmácias, sapatarias e funilarias, além do contingente do operariado porto-alegrense formado na sua maioria, por imigrantes no final do século XIX. Como a busca pelo trabalhador ideal não cessava, o negro continuava a ser hostilizado e o imigrante que trouxesse consigo a idéias ¨nocivas¨ à ordem vigente, seria banido do país - um exemplo disso eram os líderes sindicais e dirigentes de greves. (Pesavento, 1992, p.30.). Esse controle era uma das formas para manter a aura republicana de “ordem e progresso” pacífica, que estava sendo impulsionada pelos novos padrões de industrialização e urbanização.

A modernização tecnológica experimentada nos setores da indústria e das classes de alta renda não é partilhada por toda a sociedade. Pode-se afirmar que as condições sociais e habitacionais das cidades não compartilhavam desse progresso, pois não havia estrutura digna para essa população que crescia tão rápido e que tinha parcas condições econômicas. As cidades não se encontravam preparadas para essa demanda. Havia muita falta de infra-estrutura: falta de saneamento, água potável, luz, esgoto, habitação, elementos essenciais de higiene que, uma vez não existindo, causariam problemas de saúde que podiam resultar em epidemias e mortes. A terça parte das habitações

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existentes era de cortiços que abrigavam grande quantidade de pessoas que viviam sem as mínimas condições de salubridade e saneamento. (Pesavento, 1992, p. 32).

Num primeiro momento o crescimento urbano industrial forçou uma reestruturação da vida econômica e do espaço físico da sociedade. Esse desenvolvimento urbano fez com que as diferenças nas relações sociais se apresentassem também na forma de mecanismos de controle, segregação, discriminação e confinamento. O viver em cidades reduz o espaço e evidencia condutas, além de introduzir junto com a fábrica, um novo conceito de tempo não mais marcado pelas estações do ano, mas agora sim, pelo relógio. Segundo Pesavento:

¨em suma, o fenômeno urbano proporciona a emergência de novos problemas e põe em pauta uma série de questões concretas a resolver, tais como a produção da energia, o saneamento urbano, a habitação popular, a racional utilização dos recursos naturais, a educação e o lazer, os efeitos da tecnologia sobre o trabalho industrial, a necessidade de organizar o mercado de trabalho, a definição de regras e instituições de controle social, a satisfação das necessidades de abastecimento. (1992, p.33.)

Em Porto Alegre, a partir de 1890, a cidade cresce e há um surto de construções estimulado pelo governo municipal. Nesse período já se tem a preocupação de retirar dos centros das cidades a população pobre, pois esta é tida como “feia’ e “suja” características que ameaçam a harmonia proporcionada pelos “senhores de gravata” que são belos. Segundo Mauch, “o poder público toma uma série de medidas procurando estimular a transferência dos pobres para habitações baratas e higiênicas nos arrabaldes, saneando o centro da cidade” (2004, p.71.).

É nesse momento que várias cidades estão passando por saneamento e embelezamento.

Há 4 anos dificilmente encontrar-se-ia casa grande ou pequena mesmo em arrabalde; agora não existe menos de 400 em disponibilidade. Os arrabaldes estão aí, e devem ser habitados pelos proprietários. Na cidade propriamente dita, só devem residir os que podem sujeitar-se às regras e preceitos da higiene. (Gazeta da Tarde. Porto Alegre, 17 jan.1898. MCSHJC).

Assim, o centro da cidade passa a ser projetado como a vitrine do progresso, da modernidade, pois aí se encontravam os prédios do governo, lojas, as belezas dos sobrados. Em contrapartida a feiúra de cortiços, tavernas, quitandeiras e os famosos becos causavam uma incômoda convivência entre o que era considerado belo e civilizado com os do que seria feio e atrasado gerando uma mobilização do poder público apoiado no saber médico no sentido de extirpar os elementos poluidores e

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símbolos da pobreza da região central da cidade. Os próprios jornais do período se encarregavam de denunciar e apontar os lugares indesejados.

A fim de prestar auxílio às autoridades os jornalistas não poupavam denúncias e críticas aos becos, tavernas e bordéis:

Até a entrada deste século, os becos de Porto Alegre – e havia-os aqui aos punhados e bem no centro da cidade-eram becos mesmo.

Sórdidos, nauseabundos, intransitáveis, ferviam ainda da bagaceira desregrada.

Gente incorrigível, aquela!

A cidade inteira olhava-a com repugnância... e desprezo. (FERREIRA, Athos Damasceno In: Imagens Sentimentais da Cidade. 1940, p.16-18.)

Assim como o restante do país, Porto Alegre veria chegar o século XX com todos os problemas de saneamento, abastecimento de água restrito, a energia elétrica fornecida pela companhia Fiat Lux restringida ao centro da cidade, nos demais locais, a deficiência de serviços urbanos era regra.

Segundo Margareth Rago (1985), em fins do século XIX e início do século XX a representação do pobre estruturava-se em função de ser este o avesso da burguesia limpa e civilizada. O pobre era representado pelas características de feio, sujo, animalesco, cheio de maus hábitos em suma como um “detrito” da sociedade. Visando modificar sua moradia, sua família, seus hábitos, seu modo de vida que os médicos e o Estado desenvolveram e aplicaram práticas higiênicas e disciplinadoras que compõe o que a autora chama de “pedagogia totalitária” (RAGO, 1985, p. 175.).

A recém instaurada República tentaria imprimir à cidade uma disciplinarização do espaço urbano. A forma encontrada para conter o avanço no número de habitações insalubres e feias era aumentar o imposto predial, principalmente dos cortiços, outra medida era estabelecer regras a serem seguidas nas construções da cidade, assim em 1893 é anunciado no Código de Posturas Municipais de Porto Alegre. Com isso buscava-se padronizar, ordenar e regulamentar o surgimento de novas edificações, pois essas deveriam seguir as novas medidas recomendadas pelos construtores, casas alinhadas, quartos com arejamento, obrigatoriedade de latrinas, estando sujeitas a fiscalização da municipalidade. Segundo Pesavento (1994), o Código de Posturas visava claramente colocar fora das normas e dos padrões aceitos os velhos sobrados e cortiços. Nesse momento os médicos tornam-se autoridades necessárias e com competência para vistoriar habitações e bairros populares, impondo a execução de medidas higiênicas. São Paulo e Rio de Janeiro desde o final do século XIX passam por

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transformações urbanas, abertura de avenidas, construções de chafarizes, calçamento de ruas, instalação de iluminação a gás. Na primeira década do século XX, em São Paulo, é construído o Teatro Municipal. (RAGO, 1985, p.164.). No Rio de Janeiro, a demolição de antigos quarteirões o melhoramento dos serviços do porto são desenvolvidas pelo engenheiro Pereira Passos, com o auxílio do médico Osvaldo Cruz. Essa política sanitarista dos higienistas nas cidades incide também sobre a moradia dos pobres. (RAGO, 1985, p.164).

São através dessas preocupações que as casas, as ruas, as cidades, as fábricas, as escolas, os hospitais, as prisões deveriam ser iluminados, ventilados, para a boa saúde dos habitantes e dos trabalhadores. É dessa forma que se destacam as afirmações do Dr. Francisco Horta Prata e são recorrentes na literatura médica do período: “Ar, luz, sol, calor e água são, pois, elementos essenciais para a salubridade, fixados pela natureza e exigidos tanto para o luxuoso prédio como para a modesta e simples casa do operário” (RAGO, 1985, p. 168.).

É nesse contexto que se destacam os saberes médicos, para sanear o meio ambiente e garantir a formação de indivíduos sadios e fortes. Nos discursos propagados por médicos higienistas e industriais o pobre é rude, selvagem, ignorante. É dessa forma que a casa imunda do pobre é apresentada como origem da doença, da degradação moral e da ameaça política, as autoridades não vislumbravam uma solução rápida para o problema dos cortiços e favelas que era a morada dos operários e a população pobre.

No final do século XIX, os poderes estatais e também capitalistas particulares buscavam através da construção das vilas operárias resolverem à questão da habitação do pobre. Essas vilas seriam construídas nos bairros periféricos das cidades e constituiriam as antíteses dos cortiços e serviriam para que o patrão exercesse controle sobre a vida cotidiana, eliminando todos os intervalos entre trabalho e lazer do trabalhador. Estratégia de fixação patronal as vilas tornaram-se realidade para o sonho de muitos industriais tais como descreve o industrial Jorge Street, dono da fábrica de tecidos, em 1916 constrói a vila Maria Zélia como descreve:

Em redor da fabrica mandei construir casas para a moradia dos trabalhadores, com toda a comodidade e conforto da vida social atual (...) depois um grande parque com coreto para consertos, salão para representações e baile; escola de canto coral e música, um campo de football; uma grande igreja com batistério; um grande armazém com tudo o que o operário possa ter necessidade para sua vida, (...) uma sala de cirurgia-modelo e uma grande farmácia (...) uma escola para os filhos dos operários e creches para lactantes (...). Quis dar ao operário (...) a possibilidade de não sair do âmbito da pequena cidade que fiz construir à margem do rio, nem para a mais elementar

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necessidade da vida (...). Consegui, assim, proporciono, também, aos operários, distração gratuita dentro do estabelecimento, evitar que freqüentem bares, botequins e outros lugares de vicio, afastando-os especialmente do álcool e do jogo. (Grifos meus.) (RAGO, 1985 p.178).

Mesmo com a construção das vilas muitos ainda não tinham moradia, porém não foi somente isso que faltava para os operários, a miséria e a exploração nas fábricas chegava quase que à escravidão: sem garantias, sem assistência médica e sem direitos trabalhistas, mulheres e crianças eram os que mais sofriam, por serem as pessoas mais frágeis no processo. Tinham uma jornada de trabalho que ia de dez a quinze horas, e as crianças pequenas muitas vezes não chegavam à adolescência devido a acidentes no maquinário ficavam mutilados ou morriam. Com a crescente industrialização de São Paulo, a demanda de mão-de-obra era imensa e, nesse momento, devido à grande entrada de imigrantes italianos que formara a classe operária sob o signo da imigração e exploração nos principais centros industriais. (RAGO, 1985 P.37).

Assim como os cortiços, as fábricas também não recebiam fiscalização, estabeleciam-se próximas a várzeas dos rios e de estradas de ferros. Sem fiscalização, as péssimas condições de iluminação, ventilação, ausência de dispositivos de segurança deixavam a mercê a mão-de-obra de todos os riscos de acidentes. O interior das fábricas e oficinas conduzia para um mundo sem trégua e maus tratos: o ar frequentemente impregnado de partículas nocivas que, minavam a saúde dos trabalhadores, até o acidente que, repentinamente, fazia estancar a vida isso acontecia tanto com as crianças quanto com os adultos.

São Paulo industrializou-se através de mãos infantis e adolescentes. No ano de 1890, a mão-de-obra infantil representava um quarto da empregada na indústria têxtil. Crianças e adolescentes também trabalhavam em indústrias alimentícias, químicas e na metalúrgica. Não era o acidente o único risco que os pequeninos sofriam, pois havia ainda os maus-tratos causados pelos patrões e também os abusos que revelam o cotidiano da vida de operários e de operárias nas indústrias. As brincadeiras infantis que os menores teimosamente resistiam à racionalidade imposta pelo ambiente de trabalho foram, ao longo do tempo, em nome da disciplina exigida nas fabricas, o claro detonador de atitudes violentas por parte dos patrões.

Devido a essas crueldades que o dia-a-dia infligia à criança no começo do século XX as autoridades e os médicos começaram a dar maior atenção a essa infância e junto a ela a mãe “carente”. Portanto, principalmente a medicina volta-se para o lado social,

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de caráter preventivo ganhando lugar na orientação da vida privada dos indivíduos. Segundo Herschmann, o objetivo desses médicos, higienistas e sanitaristas eram, de forma geral, normalizar e conseguir que homens e mulheres desempenhassem tanto seus papéis de produtores quanto como reprodutores e guardiões de suas proles sãs (1996, p.17).

As mudanças no contexto da virada do século XX propunham transformar o país, tendo como dogma a tecnologia e a ciência e buscavam se igualar ao modelo de cidade e de sociedade européia, os intelectuais-cientistas apresentavam-se como os responsáveis pelo novo mundo civilizado.

Enquanto os diagnósticos construíam um quadro alarmista, as bipolaridades iam estabelecendo referencias e metas. Em geral, os diagnósticos mais recorrentes eram os de “insalubridade”, “ignorância” e “atraso”; e as bipolaridades mais comuns eram saúde/doença, vida/morte, progresso/atraso e sujo/limpo. Ambas as estratégias permitiram que esses discursos abrissem “caminho” para que se legitimasse a “intervenção”, para que se criasse sustentação legal e moral para uma atuação ostensiva por parte do Estado (tanto na esfera pública quanto privada), de modo a colocar em pratica seu projeto “pedagógico” e “regenerador”. (HERSCHMANN, 1996, p.25.) Essas mudanças deviam começar pela intervenção direta na vida familiar dos pobres que sem lar, sem escola e sem amparo muitas vezes a mãe pobre era obrigada a abrir mão de seus filhos e largá-los na roda dos expostos, e assim a mãe e criança eram totalmente abandonadas. O discurso era que doenças, alcoolismo e também a total falta de instrução aumentavam o índice de crianças mortas e mães desamparadas. Ignorando as condições precárias do trabalho dos pais, migração de um dos tutores para o trabalho ou a própria exploração do trabalho infantil. A busca das causas se restringe a família e seus problemas entendidos como localizados e advindos de sua disfuncionalidade em relação à sociedade.

Assim, consideravam os filantropos que, apesar de viver o auge da modernização e industrialização, as cidades estavam esquecendo de seus “pequeninos”. Nesse sentido emerge a figura do Dr. Moncorvo Filho, que no IV Congresso Brasileiro de Medicina e Cirurgia, em 1900, marcando uma posição de alguém que vinha tendo a oportunidade de examinar por todas as fases o movimento ocorrido nos países cultos em favor da infância pobre, indigente, doente, maltratada ou abandonada. Enfatiza ainda que ficava alarmado com as condições da questão no Brasil e que não poderia ficar indiferente diante desse quadro (GONDRA, J. de G. 2002, p.304).

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A partir do século XIX a proteção a criança torna-se o motor que impulsiona em todo o mundo a criação de associações e instituições para cuidar e proteger os pequeninos e suas mães - como os ambulatórios obstétricos e pediátricos; principalmente dos seus direitos sociais, que devem ocorrer desde o seu nascimento tanto no aspecto público como no privado. Distribuem-se essas iniciativas por alguns campos da sociedade, as competências e atribuições perpassam os meios jurídicos, médico assistencial, educacional. Essas intenções demarcam o período em que a infância e a sua educação, cuidados de moradia, saúdes integram os discursos sobre a edificação dessa sociedade moderna.

Exmas. Senhoras. Meus Senhores. Entre os espectaculos da communidade humana nenhum de certo é mais tocante do que se nos depara de assistir a dedicação feminina às creancinhas desherdadas, á esses pequeninos que não tiveram, com o aconchego do lar, o calor de um seio materno ou que, atormentados pela fome ou pela dor, se arrastam n’uma vida de torturante miséria!...? (KUHLMANN, M. Jr. 2002, p.465).

Uma importante data foi a concomitância da comemoração do centenário da Independência, a realização do Congresso de Proteção à Infância (CBPI) e o 3º Congresso Americano da Criança (CAC), no Rio de Janeiro, de 27 de agosto a 5 de setembro de 1922. Esses eventos foram de importância vital para os envolvidos na melhoria da infância e todos os aspectos envolvidos e teve a participação de diferentes setores sociais. Segundo Kuhlmann Jr, a articulação de setores envolvidos com iniciativas e propostas para a infância no Brasil vinham desde a década de 1870 e ampliou-se no regime republicano com o aparecimento de associações e instituições, com destaque para o Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro (IPAI-RJ), criado por Moncorvo Filho (KUHLMANN Jr. M. 2002, p.460).

A participação do governo no CBPI deixa clara a importância do tema no período e da abrangência do mesmo, assim como dá pistas do entendimento da questão como um problema público. Na lista dos membros de uma primeira categoria estão: “Executivo, Legislativo e Judiciário, União, Estados e o município sede do encontro”.

O presidente de honra era o Presidente da República, Epitácio Pessoa. Depois, arrolam-se o vice-presidente da Republica, o cardeal arcebispo, os ministros de Estado, o prefeito do Distrito Federal, os governadores dos Estados, o vice-presidente do Senado federal, o presidente da Câmara dos Deputados, o presidente do Supremo Tribunal Federal e o presidente do Conselho Municipal. A primeira dama, Mary Sayão Pessoa, coube o posto da organizadora dos festivais, visitas e excursões. (KUHLMANN Jr, Moysés, 2002, p 461.)

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A outra categoria é a dos membros do restante da sociedade que contava com 2325 inscritos em dezembro de 1920, também houve a participação de instituições particulares como Clubes Flamengo, Vasco da Gama e Fluminense, Serviço de Proteção aos Índios, religiosos, médicos, professores, arquitetos-construtores, industrial, fazendeiros e uma outra gama de setores sociais.

O CBPI/ 3º CAC foi dividido em 5 seções: Sociologia e Legislação( particularmente em relação à família e à coletividade); Assistência ( em relação à mulher grávida, mãe ou nutriz, às crianças da primeira e da segunda idade), Pedagogia ( especialmente em relação à psicologia infantil e à educação física, moral e intelectual, inclusive à educação profissional), Medicina( medicina infantil e pediatria em geral, cirurgia, ortopedia e fisioterapia), e Higiene ( eugenia, higiene privada da primeira e da segunda infância, estudo da química alimentar da criança da primeira idade, higiene publica, principalmente das coletividades, sobretudo a higiene escolar) (KUHLMANN Jr, M. 2002, p.463).

Fica claro que o tema escolhido para as seções de discussão eram os problemas que acometiam a população pobre, a falta de assistência, de higiene, doenças contagiosas, alimentação dos primeiros anos de vida e outro assunto que estava sendo bastante cobrada uma nova legislação para a infância. No decorrer do congresso isso fica bastante saliente que somente através da orientação dada por especialistas no caso médicos, intelectuais é que o problema seria encarado e em conjunto com instituições privadas o governo buscaria a melhora para essa população abandonada.

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2. MONCORVO FILHO E O DISCURSO MÉDICO-FILANTRÓPICO A RESPEITO DA INFÂNCIA POBRE

Arthur Moncorvo Filho foi um médico brasileiro, nascido no dia 13 de setembro de 1871 e graduou-se na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em 1897, era filho do Carlos Arthur Moncorvo Figueiredo (1846-1901) considerado o pai da pediatria brasileira. Moncorvo Filho dedicou a maior parte de sua vida à causa dos pobres e principalmente o da infância, era considerado um inovador, pois buscava através de ações filantrópicas acordar o Estado e a sociedade para a situação que se encontrava a infância pobre no Brasil. Suas grandes preocupações eram as situações sociais em que viviam as crianças sem assistência. Apesar de enfrentar dificuldades para por em funcionamento seus planos de melhoria nessa área insistiu, alegava que em outros países a questão era tratada de forma diferente com apoio do Estado. Por tal razão, seu maior objetivo era conscientizar o governo e a sociedade sobre esse grave problema. Em 1899 criou o Instituto de Proteção e Assistência à Infância (IPAI), órgão privado e com caráter filantrópico, apoiado nos conhecimentos da ciência do momento, no caso a eugenia, nesse sentido o problema da criança pobre poderia ser resolvido pela assistência especializada de médicos-higienistas, assegurando a elas uma melhor chance de sobrevivência. No seu entendimento, a caridade deve ser combatida, pois entendia que as ações de auxílio deveriam caminhar lado a lado com a ciência na busca por melhorias nas condições de higiene e tratamento adequado para as doenças existentes. Com o passar dos anos, vários institutos do IPAI foram inaugurados no Brasil: na Bahia em 1903, em Pernambuco 1907, no Maranhão 1911, no Pará 1912, no Ceará 1913, em São Paulo 1911, Santos, Niterói, Campos e de Santa na do Livramento no Rio Grande do Sul em 1922. Para Moncorvo, a disseminação dos Institutos em todo o Brasil deixava clara a necessidade em que se encontrava a infância abandonada que deveria ser tratada e assistida por pessoas dedicadas e capacitadas a dar conta de uma causa tão nobre.

¨E´ dessa cohesão de esforços e de trabalhos bem disciplinados que chegaremos a construir, espero, em tempo não remoto, uma verdadeira federação pela assistência à infância estendendo a sua acção, a sua piedade a todos os recantos do nosso querido Brasil, sem dúvida, tão digno da benemerência dos seus filhos.” (Fala no documento A Tribuna Medica, 1914, discurso Moncorvo Filho)

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No campo da medicina, publicou mais de 300 artigos científicos sobre pediatria e três livros sobre o tema da infância no Brasil: Hygiene Infantil (1917), Formulário de Doenças das Creanças (1923) e Histórico da Protecção à Infância no Brasil (1926). Abordando questões como a orientação das mães para o cuidado desde os primeiros meses de gestação, cuidados no parto domiciliar, a doação do enxoval, bem como a higiene do corpo e das casas, pois apontava a falta de asseio como uma das principais causas de grande mortalidade em bebês recém-nascidos. Essa opinião era partilhada por outros médicos e isso fica evidenciado em função da escolha recorrente da implicação da falta de higiene no trato das crianças e sua relação com doenças e mortes, visíveis nos trabalhos finais de “doutoramento” desde o final do século XIX, nos cursos de medicina, no Brasil (RIZZINI, 2004). Junto a essas questões, os maiores desafios do momento, segundo os estudiosos, seriam: a sífilis, o alcoolismo e a tuberculose, doenças que só poderiam ser enfrentadas pela informação e instrução às pessoas pobres. Ainda segundo esses médicos e filantropos do período esses problemas seriam resultado da ignorância e falta de recursos: trabalho, casa, má alimentação, sem educação que faziam a população voltar-se para os vícios do álcool, jogos e vagabundagem. O discurso desse momento condenava essa vida que era contrária, e estaria em desconformidade com as mudanças que deveriam sanear o corpo físico e social. Uma das versões dessas transformações ocorria nas principais cidades brasileiras como as reformas sanitaristas, pedagógicas e arquitetônicas que se realizavam no século XX (HERSCHMANN, 1996). Seu discurso é bem claro: limpar o sujo. Isso se traduz no fato dos especialistas cada vez mais terem acesso ao cotidiano dos pobres para lhes mostrar que somente através de uma vida saudável e regrada eles poderiam viver melhor. A forma de remediar seria trabalhar com adultos, mas prevenção seria feita com as crianças, assim elas passariam a ser o alvo de preocupação, o atendimento a este objetivo implicava maior abrangência do olhar. A família, grupo básico da sociedade torna-se um dos principais alvos do projeto de medicalização, com atenção especial às mulheres. A propaganda e divulgação de conselhos sobre higiene infantil e cuidados como alimentação, saúde física infantil, bem como a educação da criança, tem como objetivo atingir, em especial, a mãe que é tida como instrumento fundamental de reprodução dos cuidados físicos e morais da família, a cuidadora, enfermeira e educadora (DONZELOT, 1986).

As primeiras décadas do século XX assistem o crescimento das preocupações de homens e mulheres da classe média e altas em relação à necessidade de controle e

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intervenção do governo na sociedade e na vida familiar das famílias pobres para proteger as crianças e suas mães, sob o pretexto de assegurar a riqueza e o progresso da nação brasileira. (Wadsworth, James E. 2010). Essa intervenção variava numa escala que ia desde a criação de programas de vacinação até a criação de instituições preparadas para cuidar e tratar as mães e crianças “carentes”. Moncorvo Filho foi um dos defensores da organização de serviços públicos nesta área, criticou o descaso do governo e da sociedade em relação à pobreza no setor urbano. Seu objetivo era evidenciar a negligência do governo em relação às mães e crianças e ressaltar que essa postura comprometia o futuro da “nação”, pois entendia que somente com saúde e nutrição boas, mãe e criança teriam uma chance de ter um espaço na Republica recém instaurada.

Sempre preocupado com a infância na década de XX, em um de seus discursos salienta as causas de tamanha mortalidade infantil,

A doença e a morte, que tanto assediam nessa época as nossas crianças, impunham verificar-lhes as causas, dentre todas sobrelevando-se, com o mais lamentável analphabetismo, a profunda ignorância de rudimentares conhecimentos de educação hygienica, os funestos effeitos da lues, do alccol, da tuberculose, etc. (MONCORVO, Filho. Algumas considerações sobre o problema da infância, 1930).

A idéia de instituições de assistência à infância promovida por Moncorvo Filho associava à criança com o futuro trabalhador e defensor da nação, portanto nada mais adequado para o Estado que intervir para garantir-lhes o destino saudável dos indivíduos e salvaguardar a sociedade de criminalidade. Acreditava que o poder público deveria assumir o papel reservado aos pais das crianças pobres, a fim de protegê-las da miséria e da delinqüência prevalecentes nas cidades brasileiras. Para Moncorvo Filho, as crianças possuíam um valor único, pois representavam o futuro a partir do qual a força de trabalho poderia e seria moldada. Por meio das instituições que organizou, esperava instaurar um tipo de assistência à infância, no qual o governo poderia criar um sistema nacional centralizado de proteção aos “carentes” e prepará-los para serem inseridos na sociedade.

Sua luta contra a falta de iniciativa por parte do governo e a sociedade foi sempre feroz.

“intensificar a assistência às mães e seus filhos, educar a população brasileira, fiscalisar e aconselhar as famílias pobres por intermédio de beneméritas e competentes Visitadoras, pôr em pratica tudo quanto de útil tem sido pela medicina, pela hygiene e pela Puericultura adquiridos em-prol

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do robustecimento da raça e do combate á nati-mortalidade e á lethalidade infantil, cuidar desveladamente da alimentação dos lactantes devem constituir a base das melhores medidas em bem do povo.” (MONCORVO,1930). É com discursos nesse tom que Moncorvo tenta despertar a população para a causa infantil, “Não poupem os Governos os recursos para tal fim, porque prova-o sobejamente a observação, todas as despezas redundam nos maiores benefícios para as Nações, sendo as mais felizes as que maior interesse desperta á criancinha sob todos os pontos de vista.” MONCORVO, Filho (1930).

Sirvam todos esses elementos preciosos, conquistados através desta iniciativa, para que, de agora em diante, com a necessária perseverança e empenho, se estabeleça, sem descontinuidade, a verdadeira campanha a

criança patrícia, são os votos que alentadamente nutrem os fundadores dos Congressos Brasileiros de Proteção à Infância, convictos achando-se ainda

que o Governo da República, ante um momento tão propício, deles se valha para enfrentar o grave problema, representado, sob o ponto de vista sociológico, pedagógico moral e higiênico, dos que devem com o mais desvelado interesse, ser tratados pelos poderes públicos. É mister que fomente a criação das obras úteis de caridade cientifica, que se estabeleça a legislação apropriada, longe do costumado caráter platônico, tornando-se uma realidade prática, operando, enfim, um movimento promissor,pela disseminação, em todo o país, dos sãos princípios que conduzirão o nosso povo, numa salutar atmosfera de bondade e de carinho, à felicidade e ao vigor físico e moral. (Moncorvo Filho, 1923, p. 128).

Moncorvo Filho entendia que somente através do melhoramento da educação é que a infância seria tratada com mais zelo e cuidado, além de apontar a necessidade da existência de leis protetoras. Essa cruzada que assumiu de salvar a infância, também se tornou uma forma de legitimar o Estado e desautorizar os pais pobres na criação de seus filhos, uma via para controle dos indivíduos em nome também da segurança pública. Seu trabalho no Instituto de Proteção e Assistência a Infância do Rio de Janeiro começava com as mães (Serviço de Puericultura Intra-uterina), com a doação de enxovais, medicamentos, e principalmente a reeducação das mães para a amamentação de seus filhos. Outro importante programa a Gota de Leite, creche para os filhos dos operários, regulamentação das amas - de leite, realização dos concursos de robustez junto a todos esses benefícios existia um grande incentivo na divulgação de estudos e pesquisa científica que fossem acessíveis às mães pobres. _A_obra_da_cruz_branca_Combate_ao.pdf.Moncorvo, Filho.1871-1944. O Projeto de inspeção sanitária escolar do Distrito Federal e a criação do Departamento da Criança no Brasil serviram para intensificar a batalha do analfabetismo além da fundação da Obra da Cruz Branca, destinada a disseminar a instrução popular por todos

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os recantos do país. A_obra_da_cruz_branca_Combate_ao.pdf.Moncorvo, Filho.1871-1944 Todas essas iniciativas mostram vias onde sociedade e Estado poderiam equacionar os efeitos da pobreza, em nome da ajuda, mas em prol da maior causa nacional, progresso.

Os saudáveis deveriam ser reconhecidos e premiados, os concursos de robustez que eram divulgados nos jornais, ocorriam mais ou menos duas vezes ao ano e as mães recebiam uma quantia em dinheiro por seus filhos estarem bem alimentados desde que apresentassem um atestado de pobreza. Para realizar essas iniciativas contava com o apoio das senhoras rica e com seu interesse em ajudar os pobres. Uma mescla entre a busca de ajuda do estado atrelada à iniciativa da sociedade. Por essa razão, consideramos Moncorvo um médico e um filantropo, ele acreditava na ciência e também na iniciativa dos homens e mulheres “de bem”. Contudo, sua preocupação com a infância não implicava em uma necessidade de mudança nas estruturas socioeconômica, não seria um tipo de iniciativa que alterasse a desigualdade da sociedade como: salários baixos, pouco ou nenhum acesso a terra, a falta de escolarização das classes de baixa renda. As condições de moradia precárias e exploração dos operários (homens, mulheres e crianças) que chegavam a trabalhar de 12 a 15 horas diária, por exemplo, não eram vistas como algo a ser combatida nem mesmo oferecer melhores salários e trabalho, o que devia ser mudado eram os vagabundos, os criminosos os ameaçadores da ordem social. Os industriais deveriam ser esclarecidos e apoiar ações de natureza filantrópica e serem bons patrões. O foco era combater os sintomas ou manifestações do empobrecimento dos populares tais como: saúde precária, falta de moradia e de educação, saneamento inadequado, conduta criminal, em outras palavras o alvo era o indivíduo. Não entendia que a exploração do trabalho fizesse parte do problema. Observa-se claramente que a preocupação das classes abastadas com relação aos pobres não tinha como objetivo final beneficiá-los, mas sim preservar a ordem social e, conseqüentemente, proteger o futuro de seus próprios filhos e a segurança coletiva.

O Dispensário central do IPAI-RJ contava com diversos serviços, tanto no que diz respeito à assistência médica quanto à assistência caritativa. Os serviços compreendiam: 1) puericultura intra-uterina: serviços de ginecologia, “higiene da prenhez”, acompanhamento da gestante durante a gravidez e assistência ao parto em domicílio, além da preocupação com o enxoval do bebê, feito pelas Damas da Assistência à Infância. A preocupação

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com a infância surge antes da fecundação. Por isso, Moncorvo Filho aponta para a importância dos exames pré-nupciais, condenando o casamento consangüíneo, segundo ele não tanto pelo parentesco quanto pela maior possibilidade de os filhos terem doenças familiares (sífilis, tuberculose, alcoolismo). Condenava também o casamento entre pessoas muito jovens ou muito velhas, ou ainda com grande diferença de idade. 2) puericultura extra-uterina: serviço de “gotta de leite” (distribuição de leite esterilizado), consultório para lactantes, creche, vacinação, exame das amas de leite, assistência médica com clínica médica e cirúrgica, ortopedia, clínica de olhos, ouvido, nariz e garganta, cirurgia dentária, anatomia patológica e microscopia clínica.

O IPAI possuía serviços para distribuição de roupas e alimentos, atendendo, à época, a quatro mil matriculados, denominados “protegidos”. Estes recebiam “toda sorte de donativos (...), ao mesmo tempo que distrai o seu espirito abatido pela miséria ou pela dor” (MONCORVO FILHO, 1920, p. 15).

Moncorvo entendia que para cuidar da criança o objetivo deveria ser atingir suas mães através da divulgação de conselhos e normas que pudessem chegar até as classes pobres sobre higiene infantil, feita através de publicações, conferências e cursos. Nessas conferências eram ministrados conselhos sobre a saúde física infantil, incluindo higiene da boca e do ouvido, perigos da transmissão de doenças e sua prevenção, higiene domiciliar, profilaxia das verminoses e de doenças como coqueluche e tuberculose, alcoolismo infantil, conselhos sobre nutrição e aleitamento artificial, bem como preocupações com a educação da criança.

Ainda nesse sentido, nos anos 20, todavia, aumentam as denúncias de tuberculose entre crianças trabalhadoras; o ambiente de uma indústria era tido como insalubre e propício à doenças e acidentes, médicos e juristas passam a pensar em uma legislação que regulamentasse o trabalho infantil. Mais uma vez o olhar dos interessados na proteção da infância pobre se debruça num sintoma e não nas reais causas, não se questiona a utilização da mão-de-obra infantil, pois se entendia que o trabalho salvava a criança da delinqüência e a encaminhava para o caminho correto. (Moncorvo Filho. Infância pobre no Brasil. 1930).

A preocupação com a infância tem como pano de fundo questões econômicas, políticas, nacionalistas, não se pensava em alterar o status quo vigente, o pobre permaneceria pobre. A diferença é que passaria a receber uma educação voltada para uma melhor qualidade à assistência à saúde. Esse processo que via a sociedade brasileira em pleno desenvolvimento industrial, a infância pobre deveria ser moldada para ocupar as frentes de trabalho que transformariam o Brasil rural em um país moderno aos moldes dos EUA e Inglaterra. Na tentativa de formação desta nova sociedade, na área jurídica a culminância desses esforços a condição da criança foi

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sendo redefinida, passando de um papel secundário à condição central com a criação de instituições, Tribunal de Menores, legislação específica que regulamentava a intervenção do Estado e dos profissionais na questão.

No âmbito da medicina, com a difusão das idéias relacionadas à Puericultura, gradativamente surgem preocupações com a alimentação, brinquedos, tratamento diferenciado, dentição, desenvolvimento físico e moral. Descobre-se a infância, que assume um espaço próprio e demanda atenção particular, através de seus cuidados, a possibilidade de constituição de uma sociedade sadia, moral e fisicamente tratada.

A esse respeito, é possível afiançar que o Congresso Brasileiro de Proteção à Infância trouxe à luz, temáticas relativas às discussões sobre as leis de proteção e sua urgência; a higiene escolar; a proteção à mulher grávida pobre; a saúde infantil, os princípios de eugenia e sua aplicação; a campanha contra o aborto criminoso; o combate ao analfabetismo em prol da proteção à infância; a situação da infância moralmente abandonada, criminosa e os Tribunais para crianças, como eixos de propostas aportadas em iniciativas destinadas a promover programas de Saúde Publica e de Assistência às crianças oriundas das camadas pobres da sociedade brasileira. (Boletim, 1923, p. 89).

O Congresso Brasileiro de Proteção à Infância foi de suma importância, pois nesse encontro se discutiram não só projetos, mas sim o começo de uma assistência que há muito tempo se fazia necessária ao problema da infância. Os envolvidos que eram da classe dominante no cenário político e econômico, buscaram através de experiências tidas em outros países que já aplicavam a reurbanização, o cuidado com as epidemias e o tratamento com a educação possibilitou uma melhor condição de vida aos pobres. Já vivíamos o auge da industrialização a partir desse momento passamos a tratar com mais zelo os menos “favorecidos”, mas, que fique claro, em nenhum momento cogitou-se o acesso a terra, melhores salários, moradia própria. O problema estava na falta de instrução, pois as classes dominantes perceberam o perigo que a pobreza passou a representar para a sociedade brasileira que se encaminhava para um futuro de desenvolvimento.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Um homem do seu tempo, Moncorvo Filho foi e conviveu com todo o caos que era o início do século XX: crescimento urbano, desigualdade social, a falta de moradia, as cidades com precários sistemas de esgoto e tratamento de água, as revoltas da população nos centros urbanos. O crescimento urbano-industrial, elevada taxa de mortalidade infantil devido aos grandes surtos epidêmicos e o grande número de delinqüentes infantis eram o resultado da desigualdade social existente. Tomou para si a causa e em conjunto com profissionais da área médica, arquitetos, educadores e juristas, que partilhavam a visão de que a infância assim como em outros países que havia estado era a força motriz das frentes de trabalho e do futuro da nação.

Mesmo sem interferir nas estruturas sociais, políticas, econômicas vigentes Moncorvo realizou grandes transformações, pois mostrou através de ações que as famílias pobres não podiam cuidar de seus filhos e isso significava não sabiam preparar os filhos para o futuro e com isso o governo passaria a intervir com o intuito de assegurar uma mão-de-obra farta e dócil. Seu modelo de instituição serviu de base para o desenvolvimento da assistência à infância pobre no Brasil com os programas municipais, federais, estaduais.

Moncorvo Filho inaugurou no Brasil no início do século XX uma filantropia científica voltada para o tratamento de doenças e auxílio dos pobres usando de sua experiência com saúde pública, procurando difundir cuidados como casas arejadas e limpas evitavam o alastramento de bactérias. Que o aleitamento materno nos primeiros meses de vida era essencial ao bebê, através de palestras e cursos divulgava os efeitos nefastos do alcoolismo, da sífilis. Suas ações eram promovidas em parceria do governo com a classe alta, pois essa se conscientizou que somente assumindo a responsabilidade dos pais dessa classe pobre é que o futuro da nação estaria assegurado.

Podemos concluir que através das primeiras décadas do século XX, a infância foi sendo redescoberta e melhor assistida, mas não nos enganemos, falta muito caminho a percorrer para a infância no Brasil ser tratada com dignidade. Isso inclui direitos básicos que muitas delas são excluídas de ter, alimentação adequada, saúde, educação, lazer. Pois ainda nos dias de hoje a mão-de-obra infantil é utilizada nos cafezais, carvoarias, pedreiras e muitos outros lugares que no entendimento de infância são inimagináveis.

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Apesar da discussão quanto aos perigos que a infância corre ser antigo a solução continua sendo uma das mais importantes discussões da nossa sociedade contemporânea e até hoje existem homens e mulheres que dedicam a vida à causa. Agora, legalmente, tentando respeitar o direito de todas as crianças.

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A obra da cruz branca, combate ao analphabetismo [recurso eletrônico] : assumptos da actualidade / Moncorvo Filho

Assumptos da actualidade

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