UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
RAYANE JÉSSICA ARANHA DA SILVA
A RESISTÊNCIA DE UMA ESCOLA: AS
INTERAÇÕES DOS DISCURSOS PEDAGÓGICOS
NA ARQUITETURA DO GRUPO ESCOLAR DA
VILA CASTELO BRANCO.
Campinas
RAYANE JÉSSICA ARANHA DA SILVA
A resistência de uma escola: as interações dos discursos pedagógicos na Arquitetura do Grupo Escolar da Vila Castelo Branco.
Dissertação de Mestrado
apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da
Universidade Estadual de
Campinas para obtenção do título de Mestra em Educação, na área de concentração de
Educação, Conhecimento,
Linguagem e Arte.
Orientadora: Profa. Dra. Maria do Carmo Martins
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA RAYANE JÉSSICA ARANHA DA SILVA, E ORIENTADA PELA Profa. Dra. MARIA DO CARMO MARTINS.
Campinas
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): Não se aplica.
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas Biblioteca da Faculdade de Educação
Rosemary Passos - CRB 8/5751
Informações para Biblioteca Digital
Título em outro idioma: The resistance of a school : the interactions of the
pedagogical
discourse in architecture of Group School Vila Castelo Branco
Palavras-chave em inglês: School Arquitecture Dictatorship - Brazil Public education Educational politics Memory School history
Área de concentração: Educação, Conhecimento, Linguagem e Arte Titulação: Mestra em Educação
Banca examinadora:
Maria do Carmo Martins [Orientador]
Doris Catharine Cornelie Knatz Kowaltowski André Luiz Paulilo
Data de defesa: 16-02-2016
Programa de Pós-Graduação: Educação
Silva, Rayane Jéssica Aranha da Silva, 1989-
Si38r Sil A resistência de uma escola : as interações dos discursos pedagógicos na arquitetura do Grupo Escolar da Vila Castelo Branco / Rayane Jéssica Aranha da Silva. – Campinas, SP : [s.n.], 2016.
S lOrientador: Maria do Carmo Martins.
Sil Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação.
Sil 1. Arquitetura escolar. 2. Ditadura - Brasil. 3. Educação pública. 4. Política educacional. 5. Memória. 6. Escolas - História. I. Martins, Maria do
Carmo,1964-. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação. III. Título.
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
A resistência de uma escola: as interações dos discursos pedagógicos na Arquitetura do Grupo Escolar da Vila Castelo Branco.
Autora: Rayane Jéssica Aranha da Silva
COMISSÃO JULGADORA:
Maria do Carmo Martins (orientadora)
Doris Catharine Cornelie Knatz Kowaltowski
André Luiz Paulilo
A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno
Sob a história, a memória e o esquecimento. Sob a memória
e o esquecimento, a vida. Mas escrever a vida é uma outra história. Inacabamento.(RICOEUR, 2007, p.172)
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer, primeiramente, à Carminha, querida orientadora, com
quem tive o privilégio de trabalhar, receber orientações e incentivos que
tornaram possível а conclusão desta dissertação. Não tenho palavras para
dizer obrigada pelo seu comprometimento, paciência e acolhida.
Agradeço também a minha família, especialmente minha mãe Maria de
Lurdes, que me acompanhou neste percurso, com seu carinho e incentivo
integrais.
À professora Dóris e professor André, agradeço a minuciosa leitura que
fizeram do texto de qualificação e os apontamentos acerca dos caminhos para
o desenvolvimento e finalização da pesquisa.
Ao querido Rafael, por tornar a trajetória de escrita desse texto mais
doce.
Aos queridos colegas do grupo de pesquisa MEMÓRIA: Priscila, Carla,
Getúlio, Gisele e Maurício.
Aos amigos, Thaís, Gláucia, Helen, José Carlos, Renan, Lucila, e
Marcos, agradeço as palavras e ações de incentivo durante a jornada.
À Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), na figura da
funcionária Selma, agradeço a disponibilização de seus arquivos sobre a
escola.
A todos aqueles que, ainda que eu não consiga perceber, foram fundamentais para realização deste trabalho.
RESUMO
Esta pesquisa toma como objetos de estudo o Grupo Escolar da Vila Castelo Branco e sua arquitetura escolar, bem como as modificações estruturais e organizacionais nela ocorridas por intermédio das relações e interações dos discursos pedagógicos e a prática escolar no período de 1967 a 2010. A instituição ora investigada tem seu projeto e construção datados no final da década de 1960. Nesse sentido, a análise da trajetória da instituição e sua arquitetura nos permite narrar as reorganizações e modificações ocorridas em seu interior a partir das interferências e alterações das políticas educacionais em curso no país desde o período da ditadura militar até a sua municipalização. A partir da análise documental, a pesquisa apreendeu as relações existentes entre as permanências e rupturas na arquitetura da escola na relação com a prática escolar e cotidiano da instituição, o que evidenciou a íntima relação da materialidade da arquitetura escolar na conformação da educação empreendida nos discursos pedagógicos de cada período.
Palavras-Chave: Arquitetura escolar; Ditadura civil militar brasileira; Educação Pública; Política Educacional; Memória e História da Escola.
ABSTRACT
This research is a historical approach of the architecture of a primary school from Vila Castelo Branco, a popular neighborhood in Campinas/SP, as well as the structural and organizational changes in the school building, it occurred through the relationships and interactions of the pedagogical discourse and school practices in the period from 1967 to 2010. The institution investigated its was projected and constructed in the 1960s, and this sense, the analysis of their school architecture and history allows us to narrate the reorganizations and changes occurring within it from interference and changes in current educational policy in the country from the period of military dictatorship till educational reforms, in 2010, when the school passed to for a county administration. From the documentary analysis, research seized the relationship between the continuities and breaks in the school of architecture in relation to school practice and daily life of the institution, which showed the close relationship of school architecture materiality in shaping undertaken education in speeches teaching of each period.
Keywords: School Architecture; Brazilian military-civilian dictatorship; Public education; Educational policy, Memory and History of school.
RELAÇÃO DE FIGURAS
Figura 1: Inauguração da Vila Castelo Branco, 1967. ... p. 24 Figura 2: Reportagem sobre a inauguração do bairro. ... p. 25 Figura 3: Planta do projeto das casas da Vila Castelo Branco. ... p. 26 Figura 4: Fachada padrão das casas da Vila Bela. ... p. 27 Figura 5: Imagem da configuração espacial do bairro. ... p. 31 Figura 6: Planta baixa do Escola Estadual Antônio Fernandes Gonçalves. ... p. 43 Figura 7: Planta com modificação para referência do trabalho. ... p. 44 Figura 8: Zoom do Bloco Administrativo da escola. ... p. 45 Figura 9: Zoom do Bloco de Salas de Aula. ... p. 46 Figura 10: Zoom do andar inferior da Escola. ... p. 46 Figura 11. Documento de vistoria da Escola. ... p. 47 Figura 12: Mastros elevados da Escola. ... p. 52 Figura 13: Entrada do prédio administrativo da escola (1970). ... p. 53 Figura 14: Teatro semi-arena da escola. ... p. 54 Figura 15: Corredores de acesso ao pavimento inferior da escola. ... p. 55 Figura 16: Pátio coberto sob pilotis. ... p. 58 Figura 17: Teatro interno do galpão coberto da escola. ... p. 59 Figura 18: Perspectiva transversal dos blocos de sala de aula ... p. 59 Figura 19: Refeitório abaixo do bloco de salas de aula. ... p. 60 Figura 20: Blocos paralelos de sala de aula. ... p. 61 Figura 21: Planta do terreno e construção do prédio escolar. ... p. 63 Figura 22: Livro ponto da escola. ... p. 88 Figura 23: Corredor de acesso ao pavimento inferior da escola. ... p. 92 Figura 24: Bloco administrativo no projeto de original e o atual (2010). ... p.97 Figura 25: Modificações dos ambientes no bloco de salas de aula. ... p. 100 Figura 26: Piso de ardósia das salas de aula e corredores. ... p. 102 Figura 27. Planta baixa do piso inferior da escola. ... p. 103
RELAÇÃO DE QUADROS
Quadro 1. Relação de ambientes e metragem do projeto original do Grupo Escolar da Vila Castelo Branco (1967). ... p. 65
Quadro 2. Distribuição das turmas nos três períodos do primeiro ano de funcionamento do Grupo Escolar da Vila Castelo Branco (1967). ... p. 74
Quadro 3. Distribuição das turmas no início do ano letivo de 1968 do Grupo Escolar da Vila Castelo Branco. ... p. 77
Quadro 4. Alterações e modificações dos ambientes no pavimento administrativo. ... p. 97
Quadro 5. Relação de ambientes e seus respectivos usos Grupo Escolar Antônio Fernandes Gonçalves (1967) e na Escola Municipal de Ensino Fundamental Pe. Francisco Silva (2008). ... p. 107
Quadro 6. Linha do tempo da trajetória da Escola Estadual Antônio Fernandes Gonçalves. ... p. 109
RELAÇÃO DE SIGLAS
APM – Associação de Pais e Mestres.
BNH – Banco Nacional de Habitação.
CAE – Coordenadoria de Arquitetura Escolar.
CENP – Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas.
Ceplar – Campanha de Educação Popular
Cohab – Companhia de Habitação.
Conesp – Companhia de Construções Escolares do Estado de São Paulo
CPC – Centro Popular de Cultura
EMC – Educação Moral e Cívica.
Emef – Escola Municipal de Ensino Fundamental.
FAB – Força Aérea Brasileira.
Fece – Fundo Estadual de Construções Escolares
FDE – Fundação para o Desenvolvimento da Educação.
Gesc – Grupo Escolar
Ipesp – Instituto de Previdência do Estado de São Paulo.
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
MCP – Movimento de Cultura Popular
Mobral – Movimento Brasileiro de Alfabetização
OSPB – Organização Social e Política do Brasil.
Pladi – Plano de Ação e Desenvolvimento Integrado.
Progen – Projeto Gente Nova.
Saresp – Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São
Paulo
SEE/SP – Secretaria Estadual de Educação
Serfhau – Serviço Federal de Habitação e Urbanismo.
SUMÁRIO
1. Apresentação... p. 14
2. Introdução ... p. 17
3. Diálogos do cenário urbano: o bairro e a escola. ... p. 21
3.1 A Vila Bela ... p. 23
4. Arquitetura escolar: criação, construção e implantação da escola ... p. 42
5. Molduras, contornos e intervenções: a escola, a arquitetura escolar e as
políticas educacionais ... p. 73
6. Considerações finais: construções futuras ... p. 112
1. APRESENTAÇÃO
“Um livro é como uma casa. Tem fachada, jardim, sala de visitas, quartos, dependências de empregada e até mesmo cozinha e porão. (...) Que não repare nos móveis, que o dono da morada é modesto e bem-intencionado, que não houve muito tempo para limpar direito a sala ou arrumar os quartos. Que vá, enfim, ficando à vontade e desculpando alguma coisa”. (DAMATTA, 1997, p.11)
Convido o leitor a entrar na minha “casa” e conhecer sua história,
construção e acabamento. Espero que se sinta à vontade durante nossa
conversa. Compartilho com o visitante a história de uma escola construída em
uma vila popular do município de Campinas. Como quem conta com apreço e
significado, divido aqui pedaço a pedaço as memórias daqueles que
projetaram, construíram, trabalharam e vivenciaram os passos e espaços da
história dessa instituição e seu bairro.
O bairro que abriga essa escola chama-se Vila Castelo Branco, e assim
como a instituição de ensino, teve seu nome de origem alterado em virtude de
determinações políticas. Buscando uma analogia com possíveis etapas de
construção, por meio deste texto, apresentaremos uma análise das etapas
como: fase de escolha do terreno, elaboração do projeto, infraestrutura,
estrutura, paredes e vedações, telhado e cobertura, instalações, portas e
janelas, acabamento e paisagismo. Para dar conta de todos os aspectos da
obra dividimos em três partes a abordagem de nossa escola, são elas:
fundação, estrutura e acabamento.
A etapa de fundação será problematizada no primeiro capítulo. Nesse
contexto, abordaremos o desenvolvimento e modernização da cidade de
Campinas, aspectos relacionados ao governo militar dos anos de 1964 a 1985
como a Vila Castelo Branco e sua relação com a cidade e a Escola Estadual
Antônio Fernandes Gonçalves.
O segundo capítulo estrutura uma discussão focalizada no prédio da
escola, sua criação, localização, arquitetura, materiais e técnicas construtivas
utilizadas na sua edificação. Empreende, também, uma análise do espaço
escolar como elemento constituinte do currículo educativo.
O terceiro e último capítulo trata da escola e suas relações
“pós-acabamento”, isto é, aborda as relações e aspectos derivados do uso, fluxo,
apropriação, reorganizações e desafios infringidos ao cotidiano desse espaço
2. INTRODUÇÃO
A preocupação central deste trabalho é investigar a história do Grupo
Escolar Professor Antônio Fernandes Gonçalves e as relações estabelecidas
entre a arquitetura escolar e as práticas educativas mencionadas e ensinadas
naquele espaço. Para tanto, considera-se, ainda, as políticas educacionais
desenvolvidas no período de vigência de tal instituição. Esta escola ilustra parte
do processo de expansão da rede física de escolas do estado de São Paulo e
nos ajuda a compreender os desdobramentos e repercussões ocasionados no
interior da instituição por meio das mudanças legislativas realizadas no período
do regime militar.
Considerando o momento histórico da ditadura militar, o estudo
centrou-se nas relações produzidas no espaço escolar a partir da arquitetura escolar
analisando as práticas escolares e os usos do espaço no interior instituição. A
abordagem da relação entre arquitetura escolar e as práticas escolares,
sobretudo no uso dos espaços, evidência a complexidade e dinamismo ao qual
o espaço escolar é submetido na concretização da educação. Na realização e
cumprimento dos objetivos educacionais e suas respectivas finalidades, o fazer
educacional no “chão da escola” se achata, se deforma e se adapta às
mudanças legislativas, administrativas, arquitetônicas e pedagógicas. Na
postura de persistência e insistência da escola pública vemos quão dotada de
resiliência ela é.
O conceito de resiliência tem origem na Física e se refere à propriedade
que alguns materiais possuem de acumular energia, quando submetidos à
deformação permanente (BARBOSA, 2011). A partir do conceito de resistência
dos materiais, a Psicologia apropriou-se do termo definindo-o, na perspectiva
americana, como a capacidade de resposta do sujeito frente às adversidades
do meio (BRANDÃO; GIANORDOLLI-NASCIMENTO, 2011).
Ao tratar da história do Grupo Escolar Professor Antônio Fernandes
Gonçalves, constatamos que a definição de ambos os campos lhe são
pertinentes, posto que a arquitetura escolar da instituição, ao longo dos seus
43 anos, suportou diversas pressões externas e resistiu às adversidades do
tempo e das políticas educacionais. Chegar a essa constatação foi possível,
pois esta pesquisa entende que o estudo da arquitetura escolar e o currículo
podem delinear um caminho para a compreensão da história das instituições.
Nesse sentido, tomamos como referência a contribuição de Viñao Frago
(1998), que defende que a arquitetura escolar se constitui como um programa,
um currículo invisível que educa e colabora para a formação de identidades.
Veremos adiante que a análise da arquitetura dos espaços escolares é
um subsídio importante para a apreensão das complexidades existentes entre
os muros da escola. As disposições dos espaços presentes e ausentes dentro
de uma instituição escolar formatam a diagramação de
“uma espécie de discurso que institui na sua materialidade um sistema de valores, como de ordem disciplina e vigilância, marcos para a aprendizagem sensorial e motora, e toda uma semiologia que cobre diferentes símbolos estéticos, culturais e também ideológicos” (ESCOLANO, 1998, p. 26).
O levantamento de fontes lança luz às correntes da literatura sobre
educação a partir do campo da história da Educação. Para tanto, realizamos
uma pesquisa documental entre o período de 1967, ano de criação da escola, e
2010, data em que a escola foi municipalizada. Ainda sobre as fontes,
ressaltamos que o processo de municipalização sofrido pela instituição
prejudicou o acesso aos documentos selecionados para esta investigação.
Com o repasse do prédio escolar ao município de Campinas, o acervo da
instituição foi transferido para a escola estadual mais próxima e muitos
documentos foram descartados nesse trâmite. Infelizmente os registros de
fotos, plantas, plano de ensino, atividades e trabalhos discentes e docentes
ficam a margem da preservação, posto que a documentação cuja guarda é
permanente abarca apenas os documentos referentes à vida funcional dos
profissionais da escola e os prontuários dos alunos.
O Grupo Escolar Professor Antônio Fernandes Gonçalves foi construído
e implantado no ano de 1967 pelo poder público na recém-criada Vila Castelo
Branco. A criação da instituição na comunidade possibilitou o atendimento de
grande parcela das crianças pertencentes às famílias operárias do bairro e
regiões vizinhas, o que a tornou responsável pela formação educacional de
várias gerações de moradores da região noroeste da cidade. O prédio da
escola possui fundação sob pilotis, o que acabou por elevá-la em relação às
casas populares existentes em suas imediações, constatação que depende do
posicionamento do observador, visto que da rua do portão de entrada a
instituição parece ser completamente térrea.
Esse fato aliado às proporções da instituição nos leva a crer, que sua
construção visou não apenas atender a demanda de alunos do bairro, mas
A beleza da construção, o estilo arquitetônico moderno adotado e a
visibilidade central que fora destinada à escola revelam que a presença
daquela instituição significava, de algum modo, uma propaganda dos projetos e
investimentos da ditadura militar na área educacional.
Nesse sentido, a análise de Viñao Frago (2001) sobre a arquitetura
escolar como elemento constitutivo do currículo contribui com esta pesquisa à
medida que assumimos um olhar sobre a dimensão educativa do espaço na
educação. Destacamos, como referenciais, ainda, o legado de alguns
estudiosos como Lima (1989), Trilla (1985), Escolano (1998), Bencosta (2005),
Buffa (2008), do próprio Viñao Frago (1993, 1994), entre outros. Assim,
privilegiamos uma reflexão sobre o espaço escolar buscando dialogar e lidar
com um tema marcado por multifacetada gama de interpretações que vão além
do teor de vigilância, repressão e punição, características essas enfatizadas
nos trabalhos alicerçados na perspectiva de analise a partir das contribuições
de Foucault (1987).
A compreensão da pesquisa histórica sobre a dinâmica espacial do
bairro Vila Castelo Branco dialoga com as pesquisas de Gonçalves (2002), que
reconstituí a história do bairro a partir da memória dos moradores, e a
investigação de Rodrigues (2008), que analisa os aspectos de segregação
urbana nos moldes centro-periferia existente na formação desse bairro. Essas
produções auxiliaram a pesquisa ora apresentada na medida em que
subsidiaram reflexões sobre as relações estabelecidas no estudo entre a
As análises das reformas educacionais ocorridas no período da ditadura
militar e seus desdobramentos no currículo educacional brasileiro dialogam
com as análises de Martins (2002, 2014) sobre o tema. A partir dos estudos
desenvolvidos pela autora, foi estabelecido um paralelo entre o cenário
curricular nacional e as práticas pedagógicas e organizacionais no interior da
instituição.
O enfoque dado à relação entre o urbano, arquitetura escolar, políticas
educacionais e prática escolar se constituiu como um desafio que apontou uma
perspectiva ainda pouco explorada nas pesquisas no campo da História da
Educação. O objetivo do trabalho não é preencher em absoluto esse espaço,
mas indicar a possibilidade de um outro olhar para as práticas e “táticas”
existentes no cotidiano escolar1.
1
Em "A invenção do cotidiano” Certeau (1994), mostra que o homem "ordinário", inventa o cotidiano com mil maneiras de resistência silenciosa a essa conformação. Essa invenção se dá graças ao que o autor chama de "táticas de resistência" que alteram os objetos e códigos, estabelecendo uma (re) apropriação do espaço e do uso de acordo com o jeito de cada um.
3. Diálogos do cenário urbano, o bairro e a escola.
O conhecimento de si mesmo, a história interior, a memória em suma, é um depósito de imagens. De imagens de espaços que, para nós, foram, alguma vez e durante algum tempo lugares. Lugares nos quais algo de nós ali ficou e que, portanto, nos pertencem; que são, portanto, nossa história. (VIÑAO FRAGO, p.63, 2001)
Narrar a história do Grupo Escolar da Vila Castelo Branco e sua
arquitetura é algo que, na visão deste trabalho, abre diálogo para uma série de
questões que perpassam os muros da escola e vinculam-se a aspectos
relacionados às políticas educacionais, arquitetura escolar e ao cenário urbano
da cidade de Campinas/SP. Nesse sentido o trabalho de conclusão de curso de
Silva (2011), que abordou a história da escola e sua relação com bairro, foi o
elemento disparador para análise da arquitetura escolar da instituição e sua
relação com as políticas públicas educacionais. A abordagem da escola e sua
relação com o cenário educacional foram tratadas nas produções de Silva
(2014) e Martins; Silva (2015).
Ao investigar a escola, identificamos os frequentes momentos em que a
história da instituição escolar relaciona-se diretamente com bairro ao qual está
inserida.
Não apenas o espaço-escola, mas também sua localização, a disposição dele na trama urbana dos povoados e cidades, tem de ser examinada (...). A produção do espaço escolar no tecido de um espaço urbano determinado pode gerar uma imagem da escola como centro de um urbanismo racionalmente planificado ou como uma instituição marginal e excrescente. (ESCOLANO, 2001, p. 28)
Dessa forma, abordar a história da escola implica, necessariamente,
problematizar os aspectos referentes ao contexto de criação da Vila Castelo
Branco na cidade. O município de Campinas, a partir de 1960, e principalmente
industrial do estado de São Paulo. Cabe mencionar que é nesse período que
surgem as primeiras favelas e cortiços na cidade. A desconcentração relativa à
atividade industrial a partir da região metropolitana de São Paulo conduziu o
município de Campinas a um acelerado crescimento econômico e populacional.
Na década de 1960 a cidade contava com 43% de migrantes, e entre 1960 e
1970 o crescimento migratório chegou a 62% (CAIADO et al., 2002). No que
diz respeito às taxas populacionais, de acordo com Rodrigues (2008), esses
índices somaram-se ao aumento da população favelada que no mesmo
período saltou de 1% para 8% da população, o que em números absolutos
representou a crescente de 3 mil para 45 mil habitantes.
Nesse contexto, a criação do Banco Nacional de Habitação (BNH) pelo
governo militar impactou diretamente a oferta de moradia e emprego para os
trabalhadores de baixa renda. As ações do BNH foram divididas em três
frentes: as cooperativas habitacionais; caixas econômicas, associações de
poupança e empréstimo; bem como as companhias habitacionais que tinham
por objetivo atender à população menos favorecida e auxiliar as prefeituras na
implementação dessa política (LEHFELD, 1988). Tal cenário possibilitou o
fortalecimento da discussão sobre o crescimento populacional e da pobreza
como pauta das questões administrativas da cidade. Como uma resposta às
necessidades habitacionais existentes à época, em 17 de fevereiro de 1965,
cria-se e implanta-se na cidade uma unidade da Cohab (Companhia de
Habitação).
A COHAB local, implantada em 1967, contribuiu significativamente para dotar de novos contornos a ocupação urbana de Campinas. Se inicialmente esta acompanhou a instalação das plantas industriais, posteriormente, de acordo com Zimmermann (1989, p. 128) “a construção de moradias para as classes de renda mais baixa direcionou-se majoritariamente para as proximidades das áreas loteadas esparsamente”. (BAENINGUER, 1996, p. 59).
No âmbito da política habitacional desenvolvida pelo poder público
naquele período, o Conjunto Habitacional Vila Rica, de 1966, aparece como a
primeira ação construtiva de moradia do governo da ditadura militar em
Campinas2. Essa construção sinalizou a nova política habitacional para a
população de baixa renda do município. A escolha dos futuros moradores da
Vila Rica se deu por meio dos seguintes critérios: 1º - famílias moradoras em
barracos ou sub-habitações; 2º - funcionários públicos mais necessitados; 3º -
moradores de cortiços e 4º - expropriados pela prefeitura. Após serem
submetidas à triagem inicial, as famílias pré-selecionas tinham que comprovar
renda, tempo de residência na cidade, e número de dependentes, além de não
possuir nenhum outro imóvel (GONÇALVES, 2002). Os meses que
antecederam a inauguração da Vila Rica também anunciaram a compra e início
dos trabalhos para a construção do segundo conjunto habitacional da cidade, a
até então nomeada Vila Bela.
3.1 A Vila Bela
O ato simbólico que marca a inauguração da Vila Bela data de 6 de
agosto de 1967. Naquele dia, em uma cerimônia realizada em praça pública,
estavam presentes em grande número autoridades locais, como o então
prefeito Ruy Novaes e o general Syzeno Sarmento. É importante ressaltar que
antes da solenidade de entrega do empreendimento, a maioria das casas já
estavam ocupadas por seus respectivos proprietários (GONÇALVES, 2002).
2
A citação de Roseane Baeninguer afirma que o ano de criação da Cohab Campinas data de 1967, entretanto, a criação desta instituição ocorreu em 17 de fevereiro de 1965 através da lei n. 3.213.
Inicialmente, o Conjunto Habitacional Vila Castelo Branco foi
denominado Vila Bela. A alteração do nome ocorreu em função da morte do
ex-presidente Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco3, em um acidente de
avião. A aeronave em que ele viajava chocou-se com um jato da FAB4 em
pleno ar. Foram muitas as homenagens que lhe foram prestadas, sendo uma
delas a alteração do nome do novo conjunto habitacional de Campinas aliada à
entronização de seu busto em praça pública. A mudança de nome, também
altera o projeto inicial de construções de bairros cuja denominação qualificaria
e enalteceria o tipo de política e estética urbana neles adotados, tal qual
verificamos nos bairros Vila Rica (1966), Vila Bela (1967) e Vila Boa Vista
(1969).
Figura 1: Inauguração da Vila Castelo Branco, 1967.
Fonte: (GONÇALVES, 2002).
3
Humberto de Alencar Castelo Branco (20/07/1900 – 18/07/1967) foi militar e político brasileiro, primeiro presidente do regime militar instaurado pelo Golpe Militar de 1964.
4
Figura 2: Reportagem sobre a inauguração da Vila Castelo Branco. Junto ao texto escrito, veicula-se
imagem da reprodução do busto do homenageado, isto é, de Castelo Branco.
Fonte: (GONÇALVES, 2002).
Concebida em duas etapas, mais precisamente entre 1967 e 1968, a
Vila Castelo Branco teve em sua totalidade 1.112 unidades habitacionais
construídas, sendo que 688 foram entregues na primeira etapa e 444 na
segunda. Valendo-se do padrão determinado pelo Serviço Federal de
Habitação e Urbanismo (Serfhau), as casas da Vila Castelo Branco foram
projetadas de forma a economizar terreno, material e mão-de-obra, bem como
tempo de construção5. De modo contrário à Vila Rica, as casas desse segundo
empreendimento eram geminadas, duas a duas, distribuídas em terrenos de
135m². De acordo com Gonçalves (2002), as casas do bairro foram construídas
5
O Serfhau foi criado pela lei federal 4.380, de 21 de agosto de 1967. Esse órgão estatal era responsável pela elaboração e coordenação da política nacional no campo do planejamento local integrado. Isso se dava através do estabelecimento de normas e roteiros para os planejadores. (FERREIRA, 2007).
com três tipos de metragem6
, 29,73m², 37,38m² e 45,53m². A configuração das
casas foi projetada a fim de facilitar sua construção, pois essas utilizam uma
mesma cumieira central, o que justifica a ausência de recuo lateral. A
instalação elétrica também era simplificada, os relógios de medição de
consumo eram alinhados partilhando o mesmo poste. No que se refere à
ligação de água e esgoto, também eram divididas, mas possuíam sistemas
independentes. Na Vila Castelo Branco as casas possuíam de um a três
dormitórios, além de sala, cozinha e banheiro, com área média de construção
de 36m².
Figura 3: Planta do projeto das casas da Vila Castelo Branco.
6
Relação de metragem obtida no protocolo 1698 de 20/5/1968 – Hab 17/04/1970 da Secretaria de Planejamento de Campinas/SP.
Figura 4: Fachada padrão das casas construídas na Vila Bela. É possível inferir que ao término da primeira casa, o início da outra residência é marcado pela construção de forma espelhada, como revela a imagem acima.
Fonte: (GONÇALVES, 2002)
A figura 4 mostra a fachada das casas tal qual fora entregue aos
moradores do bairro. Esse modelo de construção corresponde à planta baixa
representada na figura 3. A entrega das casas aos novos residentes não os
poupou das intempéries de adequação ao novo bairro que ainda não dispunha
de serviços básicos como água, luz e transporte. Os relatos de moradores
feitos ao pesquisador José Roberto Gonçalves (2002), presentes em sua
dissertação de mestrado, investigação que reconstituiu a história do bairro,
revelam as angústias e dificuldades dos novos moradores em relação à nova
vida que ali se alicerçava.
A população que compôs o bairro, em sua grande maioria, era formada
torno de três salários mínimos. Os novos moradores vinham de bairros com
relativa concentração de população pobre, mas que estavam mais próximos à
região central e cortiços localizados na região do Cambuí, do próprio Centro,
São Bernardo e Taquaral (GONÇALVES, 2002). Os primeiros moradores da
Vila presenciaram a conformação e constituição do bairro passo a passo,
melhoria a melhoria. As lembranças deles relacionadas aos primeiros anos do
bairro retratam as dificuldades resultantes da distanciada região do centro da
cidade, bem como os problemas de infraestrutura no bairro, que sofria com a
ausência de transporte, água e áreas públicas adequadas para o lazer.
Na década de 1960 a região noroeste da cidade de Campinas era tida
como uma região longínqua, de difícil acesso, de acordo com os primeiros
moradores do bairro tratava-se de um verdadeiro “fim do mundo”
(GONÇALVES, 2002). Essa conotação ganha maior significado quando nos
confrontamos com a estrutura urbana dessa área da cidade no período em
questão. O lugar que abrigava antiga “Vila Bela” tinha como principal ligação
com a região central da cidade a Avenida John Boyd Dunlop, que à época era
uma pista única, cujo asfalto ia somente até a fábrica da Pirelli7. Naquele
período bairros como Jardim Garcia e Vila Padre Manuel de Nóbrega ainda não
existiam no cenário urbano da cidade. O deslocamento dos trabalhadores da
Vila era difícil, uma vez que andavam cerca de três quilômetros a pé até o
Jardim Aurélia, para lá tomarem o ônibus para seus respectivos trabalhos que,
em sua maioria, localizavam-se na região central da cidade.
7
A inauguração da fábrica da Pirelli em Campinas data de janeiro de 1970. A unidade campineira foi a segunda unidade da empresa implantada no Brasil.
A cidade de Campinas, na década de 1960, ilustra o ápice da execução
do planejamento urbano iniciado na década de 1930 com o Plano de
Melhoramentos Urbanos de Campinas. O plano de ordenamento urbano de
Prestes Maia foi elaborado considerando uma implantação de longo prazo, cujo
período de execução estimado era de vinte a cinquenta anos para realização
das proposições assinaladas.
A ostensiva expansão urbana possibilitou ao capital imobiliário grandes
lucros na divisão do solo urbano. Produziu-se, na cidade, uma espacialidade
marcada por vazios urbanos à espera de valorização, com difícil interligação, o
que prejudicou a população pobre, forçada a difíceis deslocamentos para ir de
casa ao trabalho (SEMEGHINI, 1991). Esse processo também influenciou a
estrutura do centro da cidade que foi drasticamente modificado, sobretudo nas
décadas de 1950 e 1960. A valorização da área central da cidade promoveu a
“higienização” dos pobres daquela região e oportunizou ao setor de transportes
uma maior inserção no sistema de mobilidade da época (RODRIGUES, 2008).
A partir desse contexto o ônibus passou a ser o meio de transporte mais
utilizado no deslocamento entre o centro e as demais localidades de Campinas.
Sobre essa ação, Semeghini (1991) afirma:
Finalmente, uma consequência marcante desse padrão de crescimento foi a mudança nas feições da cidade. Essa mudança se traduz fisicamente nos novos arranha-céus, avenidas e logradouros, por um lado, e no surgimento dos novos (e distantes) bairros e loteamentos populares. Socialmente, ela implicou numa crescente segregação espacial dos trabalhadores e das camadas de mais baixas rendas. Até os anos cinquenta, era comum a existência numa mesma área urbana de residências (e habitantes) de distintos níveis sociais e de rendas, embora, é claro, já existissem bairros mais nobres. A valorização intensa e especulativa desses terrenos expulsa dessas áreas a população pobre, que juntamente com o crescente contingente migratório passou a deslocar-se para as áreas mais distantes. Ao mesmo tempo, as áreas mais
centrais vão sendo recicladas, com o impulso à verticalização (SEMEGHINI, 1991, p. 128).
O plano de urbanização da cidade, instituído pelo ato 118 de 1938 do
prefeito João Alves dos Santos iniciou a divisão e zoneamento da cidade. É
considerado como o marco inicial da criação dos micros polos catalizadores
das camadas menos favorecidas em bairros mais distantes com sanção,
subsídio e incentivo do poder público.
Esse Plano tem o caráter do urbanismo vinculado à prática e apoia-se nos ideais do urbanismo “funcionalista” e “higienista”, tendo um enfoque projetual fortemente marcado por conceitos de estética urbana e valorização da paisagem, representante do assim denominado “urbanismo de autoria”. Os edifícios e parques públicos são tomados como símbolos monumentais da cidade, em um ideal de civilidade voltado aos objetos resultantes da intervenção urbanística. A política ocupa um lugar periférico no Plano, sendo a noção de “cidadania” a de uma “colaboração política” para se atingir uma “consciência geral”, pautada no discurso da modernidade que almeja o “progresso” através dos meios técnicos e da racionalidade científica. (CAMPINAS/Plano Diretor 2006, p.31)
Os autores8 que dissertam sobre a expansão urbana da cidade de
Campinas, compreendem essa política como a mola impulsora responsável
pela segregação nos moldes centro-periferia em Campinas. Nesse padrão de
segregação está inserido o caso da Vila Castelo Branco, pois de acordo com
Gonçalves,
Em todo caso, é importante ter em mente que esse foi o molde da segregação ocorrida na Vila Castelo Branco. De modo que nesse bairro podemos dizer que existiu uma combinação de concentração de população de baixa renda, marcada pela diferenciação de infra estrutura e serviços existentes no centro e contígua mancha urbana, separada pela distancia da periferia com piores condições urbanas. (GONÇALVES, 2008, p. 27).
8
BRITO (1969), BAENINGUER (1996), SEMEGHINI (1988; 1991), GONÇALVES (2002), BADARÓ (1986), RODRIGUES (2008), entre outros.
A concepção urbanística da Vila Castelo Branco possui características
que se assemelham às proposições de Orosimbo Maia, que era favorável a
ideia de que os bairros residenciais deveriam ser organizados de forma que
todas as necessidades dos moradores locais fossem ali satisfeitas,
evitando-se, assim, os deslocamentos desnecessários para o centro da cidade. As
ideias defendidas por Orosimbo Maia tinham grande relação com as
proposições do urbanista Prestes Maia, algumas delas, inclusive, foram
implantadas no diagrama urbanístico desenvolvido na Vila Castelo Branco.
Citado por Gonçalves (2002), Ricardo Badaró aborda as convicções
urbanísticas do arquiteto Prestes Maia, que se colocava favorável à criação de
bairros onde,
“As quadras residenciais seriam alongadas e estreitas, dispostas segundo as direções mais favoráveis e definindo as ruas transversais como vias de ligação – mais espaçadas e com algum trânsito – e entre elas se intercalariam, quando necessário, viela para pedestres”. (Prestes Maia) (GONÇALVES, 2002, p.78)
As convicções de Prestes Maia postulavam também que a organização
dos novos bairros deveria ter a escola como centro e as demais áreas
destinadas ao comércio em sua periferia, com ruas mais largas para o tráfego e
deslocamento, permitindo assim que as ruas internas fossem reservadas ao
fluxo e convívio entre os moradores. Ainda de acordo com Prestes Maia, o
recuo frontal das casas deveria abrigar jardins, e cada final de quadra abrigaria
uma área livre para o lazer.
No inicio do bairro os espaços destinados às praças e jardins se
converteram em “amplos terrenos vazios encravados no meio dos quarteirões
Figura 5: Imagem da configuração espacial do bairro. O circulo destaca a centralidade da escola na disposição interna do bairro.
FONTE: googlemaps acessado em 12/01/2015
A figura 5 evidencia a escola como elemento de destaque no bairro, bem
como os espaços de convivência criados a cada quarteirão com árvores de
médio e grande porte, que nos primeiros anos no bairro ainda eram pequenas
mudas. A data da imagem ora apresentada é recente e revela os contornos
atuais do bairro, entretanto, no momento de entrega das casas a estrutura do
bairro era precária, marcada por ruas sem asfalto, casas sem água e energia
elétrica. O único aparato do Estado disponibilizado à população para além das
moradias populares foi o Grupo Escolar da Vila Castelo Branco. Com grande
porte e arquitetura moderna, a escola figurou no cenário espacial do bairro
como elemento marcante dos investimentos do poder público naquela
localidade.
A escola, com destaque na espacialidade do bairro e os investimentos
ali empregados, atuou como um símbolo da materialização da visão de mundo
e percepção do real “ofertada” e estampada à sensibilidade daqueles que, até
A cidade e o bairro, nesse aspecto, não são apenas imagens
sobrepostas aos olhos. Experienciar ruas, calçadas, casas, prédios, energia
elétrica, iluminação pública, disponibilidade de água, escola e jardins
constituem elementos que atuam sobre a forma de sentir e interpretar o mundo
a partir de si mesmo e das condições as quais seus corpos estão submetidos.
O ritmo do trabalho, a velocidade e distância dos deslocamentos, a hora de
dormir e acordar, o que é possível ler, o acesso à cultura e educação, o comer,
vestir e ter, e os demais elementos que compõem a existência do homem estão
estreitamente ligados à capacidade de produção e distribuição de mercadorias
possibilitadas pelo grau de desenvolvimento na morfologia urbana. De acordo
com Prado,
Se a cidade, então, não é percebida apenas com os olhos, parece interessante considerar que sua recepção por parte de seus habitantes/espectadores ocorre também por um meio tátil. É, então, por essa dupla forma de recepção, óptica e tátil, pela percepção e pelo uso, que Walter Benjamin pensa a relação que as pessoas – especificamente as massas – estabelecem com a arquitetura. É uma recepção que se dá coletivamente e mais pela distração, pelo hábito, que pela contemplação ou por uma atitude de recolhimento diante da obra – a não ser no caso do turista diante de um prédio “histórico”. (PRADO, 2011, p. 2)
A aparência e o visível, no espaço citadino, reverberam e modulam as
visões de mundo e sensibilidades delineadas e idealizadas nos projetos
urbanos. Esse aspecto se torna mais evidente quando se segrega em
determinado espaço pessoas de tipos sociais que são indesejáveis, perigosos,
que frustram com sua presença uma estética de mundo. Organizar e
racionalizar o espaço não implica somente em promover um ordenamento do
que está caótico, tais ações são permeadas por intencionalidades outras que
Ruas estreitas em contraposição a avenidas largas e monumentais,
edifícios modernos e casas populares chancelaram os devires do “progresso” e
disseminaram representações simbólicas que explicitam o ideal de cidade
firmado naquele período. Assim, a presença de uma escola de singular
arquitetura num bairro destinado às camadas populares é algo significativo,
uma vez que um espaço público como este firma e perpetua um compromisso
educacional para com aqueles que dele irão usufruir.
A construção de obras públicas de destaque adere à edificação grande
peso simbólico que atua sob o imaginário coletivo por meio da vivência e
experiência. Desse modo, invoca e provoca vínculos afetivos e simbólicos.
Assim, “a escola, em suas diferentes concretizações, é um produto de cada
tempo, e suas formas construtivas são, além dos suportes da memória coletiva
cultural, a expressão simbólica dos valores dominantes nas diferentes épocas”
(ESCOLANO, 2001, p. 47).
Pensar e desvelar uma instituição tal qual se produziu no bairro ora
investigado, e os diálogos e relações que por intermédio dela afloraram,
reforçam a ideia de que a escola pode ser compreendida em sua espacialidade
e especificidade na relação com o urbano.
Edifícios significativos enquanto obras do mundo da cultura, transformam a visão de mundo, os valores e sentimentos, criam novas centralidades no urbano, enfim, trazem à experiência do espaço, novas sensibilidades. A construção de um edifício como um ‘mundo fictício’ proporciona a distância necessária à revelação e transformação da vivência quotidiana. (DUARTE, 2011, p.13)
As características arquitetônicas do Grupo Escolar da Vila Castelo
suas imediações, e também o singularizam se o comparamos com as demais
escolas da cidade construídas no período, sobretudo na região noroeste da
cidade. Assim posto, faz-se necessário contextualizar brevemente o cenário da
rede educacional paulista no final de década de 1950 e início de 1960. Para
tanto, as palavras de Vilanova Artigas nos ajudam a compreender a conjuntura
estrutural desse período.
Em 1960 abandonaram-se os organismos promotores de projeto e construção que vinham sendo usados e criou-se um novo organismo central de programação – o FECE (Fundo Estadual de Construções Escolares). Fazia-se necessário distribuir as escolas em áreas onde elas mais servissem a seu destino. (ARTIGAS, 1999, p. 95)
Com a alteração de mandato no governo estadual e a posse de
Carvalho Pinto, o panorama da precariedade da rede física de escolas
estaduais foi colocado em evidência, e esse tema passou a ser assumido como
prioridade de ação da nova gestão. Para o cumprimento de tal meta foi
elaborado o Pladi (Plano de Ação e Desenvolvimento Integrado). Nele foi
elencada uma série de ações para a construção de 3.000 salas de aula, entre
criação de novas escolas e substituição de escolas galpão.
Um plano de emergência, como se vê. Para a emergência, os órgãos de projeção do estado não estavam aparelhados. Para ajudá-los, resolveu-se atribuir projetos a arquitetos de fora da estrutura do funcionalismo público. Já tinham experiência técnica, acumulada a duras penas, realizando obras particulares. Assim foi projetado, em tempo relativamente curto, um conjunto apreciável de escolas, e a sociedade tomou conhecimento da existência dessa reserva técnica que são os quadros da arquitetura paulista. (ARTIGAS, 1999, p. 97)
Com a abertura da elaboração de projetos por meio de contratação de
escritórios de arquitetura, intensificou-se, no início da década de 1960, o
características desse momento foi a diversificação dos projetos para a
construção de edifícios escolares. Despontam nesse período projetos
modernos e de grande relevância no cenário da arquitetura escolar, dentre
esses os realizados por Vilanova Artigas, um dos arquitetos mais significativos
daquele período. A cidade de Campinas se beneficiou diretamente dos frutos
da iniciativa de ampliação da rede física de escolas do estado. Em relação a
esse período, encontramos na cidade projetos de escolas realizados por
renomados arquitetos como Fábio Penteado, Plinio Croce, Roberto Aflalo,
Rubens Carneiro Vianna, Paulo Mendes da Rocha, Adolpho Rubio Morales,
dentre outros9.
Se compreendermos a escola da Vila Castelo Branco na relação com os
projetos do período, dois elementos nos chamarão atenção, o primeiro mostra
que ela reitera um conjunto de escolas cujos elementos construtivos advêm
desse período histórico, fato que a relaciona com o cenário estadual de
arquitetura escolar. O segundo aspecto diz respeito à mudança de perspectiva
da arquitetura escolar da escola na sua relação com o entorno, pois esse, por
ser desprovido de demais aparatos públicos, eleva-a a condição de melhor
espaço público do perímetro do bairro. Essa perspectiva confere outro valor à
analise da escola, que num cenário estadual tem papel coadjuvante dentre os
projetos que lhe são contemporâneos, mas na relação com o urbano de seu
entorno figura como a principal instituição formativa da região. Isso fica nítido
se considerarmos, por exemplo, as dimensões de sua construção e a
abrangência de seu atendimento educacional.
9
Na tese “Arquitetura Escolar em São Paulo 1959-1962: o page, o Ipesp, e os arquitetos modernos paulistas” de André Augusto de Almeida Alves (2008), temos um panorama dos projetos do período realizados na cidade de Campinas.
Esse aspecto nos leva a crer que sua construção visava não apenas
atender a demanda imediata de alunos do bairro, mas também simbolizar, de
algum modo, uma propaganda dos projetos e investimentos da Ditadura em
relação à nova proposta educacional. Posto que neste período a educação foi
subjugada à meio de transmissão da racionalidade tecnocrática, como o
instrumento que viabilizaria a concretização do slogan “Brasil Grande
Potência”. Pautada na projeção de desenvolvimento econômico do país, a
educação se reestruturou em decorrência das demandas cientificas e
tecnológicas que a sociedade urbano-industrial exigia.
No período da ditadura militar, foram implementadas as reformas
educacionais de 1968, a Lei n. 5.540, que reformou a universidade, e a de
1971, a Lei n. 5.692, que estabeleceu o sistema nacional de 1° e 2° graus.
Ambas tinham como objetivo estabelecer uma ligação intrínseca entre o
aumento da eficiência produtiva do trabalho e a modernização das relações
capitalistas de produção.
(...) a política educacional do período entre 1964 e 1985 estava, em última instância, vinculada organicamente ao modelo econômico que acelerou, de forma autoritária, o processo de modernização do capitalismo brasileiro. Ainda mais: foram reformas educacionais que estavam inseridas num contexto histórico de transição de uma sociedade agrária para uma sociedade urbano-industrial, cujas transformações societárias se desenrolavam desde 1930. (FERREIRA JR; BITTAR, 2008, p. 336).
No que tange à educação, os tecnocratas defendiam como premissa a
aplicação da “teoria do capital humano” como embasamento
teórico-metodológico para a ampliação da produtividade econômica da sociedade. A
instrução e a educação são valores sociais que possuem caráter econômico e,
nesse sentido, podem ser consideradas como “bem de consumo” que, por sua
vez, se constitui como bem permanente de longa duração. Para o referido
autor:
Os investimentos na instrução não podem ser minimizados; muito ao contrário, são de tal magnitude que alteram, radicalmente, as estimativas, geralmente aceitas, do total das poupanças e da formação de capitais, que estão em curso. Deverão ser reformulados os conceitos estabelecidos com relação aos elementos de formação do pagamento e salários (renda relativa), à distribuição da renda por pessoa e às fontes de crescimento econômico. (SCHULTZ, 1973, p. 26).
Dessa maneira, a “teoria do capital humano” estabeleceu uma relação
entre educação e economia, na medida em que a primeira pode ampliar a
capacidade de produção da segunda. Em síntese, no contexto de crescimento
econômico estabelecido no período de ditadura militar, a educação
acompanhou a lógica dos interesses econômicos. Em 1975, Ney Braga
discorria sobre as questões educacionais do país e assinalava uma resposta à
ideologia tecnicista vigente:
O grande desafio que a política para o desenvolvimento econômico e social do País nos impõe é este: que tipo de educação construir e oferecer às crianças e jovens do Brasil de hoje? A resposta a este desafio está intimamente associada aos objetivos ou fins que aquela política de desenvolvimento pretende alcançar. Tais propósitos estão definidos no II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND). Este autodefine-se como dotado de “forte conteúdo social”. Identifica como “objetivo maior de todo o planejamento nacional (...) o homem brasileiro, nas suas diferentes dimensões e aspirações”. O modelo de desenvolvimento escolhido é, coerentemente, um “modelo brasileiro de sociedade aberta, social, racional (...)”. (BRAGA, 1975, p. 3).
Embora as principais reformas educacionais relacionadas à expansão do
ensino realizadas no governo da ditadura tenham se efetivado entre 1968 e
1972, há um dado na rede estadual paulista importante para ser considerado e
relacionado às reformas educacionais que posteriormente abarcaram todo o
país. Nesse sentido, há que se ressaltar a expansão da rede física de escolas
promovida pelo governo Carvalho Pinto, nos anos de 1959 a 1963, que além
de atender, em grande parte, às demandas existentes no estado proporcionou
ao Estado de São Paulo uma condição privilegiada para a implantação e
cumprimento das prescrições normativas que foram oficializadas
posteriormente por meio de reformas educacionais no governo da ditadura
Militar. O conjunto de prédios realizados pelo Fece e o Instituto de Previdência
do Estado de São Paulo10 (Ipesp), na virada da década de 1960, constitui um
episódio importante da história da arquitetura moderna paulista. Essas
construções foram marcadas pela presença de espaços pensados e
estabelecidos em beneficio do salto desenvolvimentista necessário à educação
pública. Grande parte das escolas desse período possui gabinete dentário,
secretaria, biblioteca, laboratório de ciências, anfiteatro, pátios cobertos com
palco, quadra poliesportiva e, em algumas delas, há também piscina
semiolímpica. Essas escolas monumento, cujos terrenos e espaços eram
enormes, circunscreveram na plasticidade das alterações de suas
espacialidades uma história marcada pela resiliência e resistência frente às
mudanças de governo, bem como pelas transformações das políticas
educacionais.
10
O Ipesp na final da década de 1960 atuou na construção de prédios públicos, sobretudo escolas. Sua produção à época se constitui como um importante episódio na história da arquitetura moderna paulista, cujos trabalhos são divulgados e conhecidos a partir experiência e dos prédios projetados por Vilanova Artigas e um grupo de arquitetos em torno dele reunidos.
O bairro da Vila Castelo Branco e sua escola nos ajudam a
compreender, a partir do “chão da escola”, as distorções e contradições
existentes entre os projetos e as políticas educacionais, bem como entre as
normativas e regulações e a concretização do ensino. A partir das análises
documentais realizadas, discutimos historicamente as transformações no
cenário urbano de Campinas e da Vila Castelo Branco, tomando como ponto
de partida o processo de modernização e racionalização dos usos dos
espaços. No capitulo 2, por sua vez, trataremos especificamente da arquitetura
escolar do edifício da escola e suas características. Já no terceiro e último
capitulo, abordaremos a relação entre as políticas educacionais e os usos e
4.
Arquitetura escolar: a criação, construção e
implantação da escola.
Durante toda história do Brasil, houve busca por um rumo em projetos escolares, lutando-se pela construção de prédios de qualidade. O esforço por mudanças na estrutura física, refletido através da arquitetura, manifesta cultura artística, recursos disponíveis e estéticas dominantes de uma época, visando se chegar a um projeto nacional de desenvolvimento (ARTIGAS, 1986).
Fruto de um projeto específico para atender uma escola, construída em
um terreno cedido pela Prefeitura Municipal de Campinas ao Governo do
Estado de São Paulo, o prédio destinado ao Grupo Escolar da Vila Castelo
Branco ocupa uma quadra, tendo por divisa as ruas Sophia Velter Salgado,
Castel Nuovo e Alberto Penteado. Sua entrada, por sua vez, está localizada à
rua Fornovo, número 440. Sua relevância no traçado do bairro, desde seus
primeiros anos até hoje, é notável, pois o terreno que o abriga possui em sua
totalidade 16.193,62m².
Estruturada e organizada originalmente em três blocos, os 2.472m² de
área construída da escola tiveram seu projeto e supervisão executada pelo
órgão do estado Fece (Fundo Estadual de Construções Escolares). Na figura 6
temos a reprodução da planta baixa da escola disponibilizada pela FDE
(Fundação para o Desenvolvimento da Educação). A autoria desse projeto, no
entanto, é desconhecida. Cabe ressaltar que nos arquivos referentes à planta,
o campo de assinatura de elaboração do projeto não está preenchido. A planta
baixa original do projeto, reproduzida na figura 6, conforme mencionado, possui
um destaque em amarelo que evidencia a inversão de desenho do pavimento
Figura 6: Planta baixa da Escola Estadual Antônio Fernandes Gonçalves. Em destaque a inversão do desenho do pavimento inferior.
Para que possamos ter uma melhor visualização da disposição dos
ambientes na construção escolar, apresentamos a figura 7. Essa imagem
figurará como elemento norteador das discussões que empreenderemos mais
adiante sobre o espaço escolar da instituição.
O primeiro pavimento da escola conta com 240,48 m² e aparece
apresentado na figura 8; Esse espaço foi destinado às atividades
administrativas da escola. Sua organização contempla os seguintes ambientes:
portaria, secretaria, direção, biblioteca, depósito, sanitários administrativos,
sala de auxilio da direção e gabinete dentário.
Figura 8: Zoom do Bloco Administrativo da escola, cujo desenho foi retirado da planta original da Escola Estadual Antônio Fernandes Gonçalves.
Os segundo e terceiro blocos foram reservados às salas de aula. Foram
projetados em paralelo, possuem planta simétrica de área construída com
696,96 m² e enlaçam o teatro semi-arena da escola, conforme evidencia a
Figura 9: Zoom do Bloco de Salas de Aula, cujo desenho foi retirado da planta original da Escola Estadual Antônio Fernandes Gonçalves.
O andar inferior da escola possui dois galpões paralelos. Ao fundo do
primeiro galpão temos um depósito, refeitório, cozinha e despensa. O segundo
galpão possui um palco pequeno e dois sanitários. A figura 10 mostra que
temos entre essas duas estruturas dois sanitários para alunos e dois depósitos,
cuja entrada está em posição paralela às escadas do palco do teatro semi
arena.
No acervo documental da escola apenas o documento apresentado na
figura 11 faz menção às características e ambientes da instituição, trazendo à
tona dados específicos sobre a área total do terreno, área construída, área
descoberta, número de salas, banheiros e iluminação. Esse documento,
produzido em 12/06/1968, também nos mostra a identificação provisória do
endereço da escola, por meio da anotação “rua 4”. Mesmo com a alteração dos
nomes das vias, até hoje, se percorrermos o bairro e perguntarmos sobre a
localização de determinado endereço, recebemos uma dupla informação “fica
em tal direção, é a antiga rua número tal”.
Figura 11. Documento de vistoria da escola, produzido em 1968 pelo representante da chefia de prédio do Departamento de Educação. Fonte: Acervo documental da Escola.
Os dados referentes à disposição dos espaços da escola, tamanho e
topografia do terreno foram encontrados no acervo da FDE. No município de
pela gestão e manutenção dos prédios escolares, não dispunha sequer da
planta baixa da instituição, ainda que a escola tenha passado pelo processo de
municipalização em 2010.
Conforme dito anteriormente, o período em que foi construído o Grupo
Escolar da Vila Castelo Branco figura como um momento importante para o
desenvolvimento e ampliação do ensino no estado de São Paulo. A expansão
da rede física de escolas promovida no estado de São Paulo na gestão do
governador Carvalho Pinto elaborou uma série de ações para o enfrentamento
do precário cenário educacional aos quais as escolas paulistas estavam
imersas. O combate à degradação dos prédios escolares e ao elevado índice
de falta de vagas tornou-se prioridade do Plano de Ação do governo, que
estabeleceu prazos para o tratamento dos problemas encontrados.
No que diz respeito ao ensino primário, o plano adotou como premissa a
adequação das instalações escolares a fim de proporcionar “condições de
efetivo ensino elementar a todas as crianças em idade escolar” (Fece, 1963,
p.21). Como prosseguimento à abordagem de estrutura e construção escolar, a
Lei n. 5.444, de 17/11/1959, regulamentou as medidas financeiras para a
execução dos novos prédios e, por intermédio dela, foi criado o Fece, cuja
principal função consistiu na elaboração, desenvolvimento e custeio do
programa de construções para a ampliação de prédios das escolas públicas
estaduais.
O decreto 36.799, de 21/06/1960, de criação do Fece também previu a
possibilidade de contratação temporal de escritórios de arquitetura. Essa
escolares no período. De acordo com Buffa e Pinto, essa iniciativa foi inusitada,
pois,
Até então, o Estado contara apenas com os quadros do funcionalismo para a elaboração dos projetos de edifícios escolares. Pela primeira vez, os arquitetos paulistas foram convidados a projetar obras públicas, não só escolas, mas também postos de saúde, fóruns etc. Segundo as Arquitetas Avany F. Ferreira, Maria Elizabeth P. Corrêa e Mirela G. Melo, foi uma ação de grande envergadura no meio profissional dada a quantidade de arquitetos envolvidos. (BUFFA; PINTO, p. 131, 2002)
O conselho do Fece fez um levantamento das características da rede
estadual de prédios e constatou que, com o rápido crescimento dos núcleos
urbanos, a falta de salas de aula tornou-se maior na zona urbana que na rural.
Não eram esporádicas as escolas com funcionamento em barracões de
madeira cuja organização para o atendimento da demanda de alunos, muitas
vezes, obrigava a realização de três ou mais turnos diários. Esse dado
insere-se num contexto que reitera a cidade como ambiente catalizador do
desenvolvimento econômico, o que confere à instrução pública o caráter de
potencialização do progresso almejado para o país. Segundo Escolano (p. 52,
2001), “patrocinar uma escola é a melhor maneira de contribuir para o
engrandecimento e melhoria material do povo, assim como para o progresso
da nação”.
Frente à precariedade das grandes cidades, o Fece adotou como norma
a edificação e ampliação de prédios somente para grupos escolares. Após um
levantamento prévio do déficit de vagas, o poder executivo do órgão executivo
autorizava a construção dos prédios. Na próxima etapa, solicitavam-se às
construção de novas escolas. A criação do Grupo Escolar da Vila Castelo
Branco se deu nesses moldes.
A contratação de um número elevado de escritórios de arquitetura
contribuiu para a diversificação da produção arquitetônica, entretanto, há uma
linguagem e estilo “comum” dotada de elementos de modernidade aderida aos
projetos desenvolvidos na década de 1960. Encontramos no período
mencionado escolas com estrutura sob pilotis, palco, piscina, quadra
poliesportiva, teatro semi-arena e pátios cobertos. Muitos desses elementos
estão presentes na arquitetura do Grupo escolar da Vila Castelo Branco. Essas
características serão exploradas e tratadas a partir da análise histórica dos
espaços e ambientes da escola.
(...) essa análise requer observar a relação entre lugares e edifícios. Importa por exemplo, saber se a escola se achava integrada fisicamente no edifício da instituição que a acolhia ou se era destinado para ela um local anexo ou um edifício próximo. A visualização – plantas, estampas, fotografias – permite também avaliar o caráter dessa relação. (VIÑAO FRAGO, 2001)
A rua em que se localiza o portão principal da escola revela àqueles que
por ali passam a parte superior dos mastros da instituição, cujas bandeiras
cintilavam para todo e qualquer observador da redondeza. Ao adentrarmos a
escola, voltando-nos para a direita, vemos por completo o espaço elevado com
três mastros destinado ao hasteamento de bandeira, com a face de sua
estrutura voltada para o pavimento administrativo da escola. A presença desse
ambiente como elemento permanente de destaque na disposição espacial da