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A Ajuda Oficial pra o Desenvolvimento a partir de três perspectivas teóricas

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Academic year: 2021

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LARISSA FERNANDES CATÃO

A AJUDA OFICIAL PARA O DESENVOLVIMENTO A PARTIR DE TRÊS PERSPECTIVAS TEÓRICAS

João Pessoa 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

LARISSA FERNANDES CATÃO

A AJUDA OFICIAL PARA O DESENVOLVIMENTO A PARTIR DE TRÊS PERSPECTIVAS TEÓRICAS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para a conclusão do Curso de Graduação em Relações Internacionais da Universidade Federal da Paraíba.

Orientador: Prof. Dr. Henrique Zeferino de Menezes

João Pessoa 2016

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

C357a Catão, Larissa Fernandes.

A ajuda oficial para o desenvolvimento a partir de três perspectivas teóricas / Larissa Fernandes Catão. – João Pessoa, 2016.

103f.: il.

Orientador: Prof. Dr. Henrique Zeferino de Menezes. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Relações

Internacionais) – UFPB/CCSA.

1. Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS). 2. Ajuda Oficial para o Desenvolvimento sustentável (AOD). 3. Jeffrey Sachs. 4. Dambisa Moyo. 5. Erik Reinert. I. Título.

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer ao meu orientador, Profº Drº Henrique Zeferino De Menezes, por todo o apoio durante esse período, pois sem a sua ajuda e seus ensinamentos, desde as primeiras discussões sobre o tema, eu não teria alcançado esse resultado.

Também gostaria de agradecer aos membros da banca, Profº Ma. Xaman Korai Pinheiro Minillo e Profº Me. Daniel de Campos Antiquera pela participação e contribuição com o aperfeiçoamento da pesquisa.

Não poderia deixar de agradecer a todos os professores do Departamento de Relações Internacionais da UFPB, que construíram juntos uma graduação de excelência que certamente é parte fundamental do meu desenvolvimento pessoal e profissional. Muito do que aprendi com cada um de vocês está aqui nesse trabalho.

Ao meu namorado, minha família e meus amigos, o meu muito obrigada por sempre acreditarem em mim e por me darem forças para enfrentar todos os desafios.

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RESUMO

No pós-Segunda Guerra Mundial, a temática do desenvolvimento adquiriu relevância na agenda internacional. Cada década subsequente configurou cenários com diferentes visões acerca dos objetivos e estratégias para o desenvolvimento, mas, em todas elas, a Ajuda Oficial para o Desenvolvimento (AOD) manteve-se como um dos principais instrumentos utilizado pelos países desenvolvidos para os países periféricos. No início dos anos 2000, a ajuda ganhou espaço como imprescindível meio de implementação dos Objetivos do Milênio da ONU (ODM) e segue com essa função na agenda 2030 para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Apesar de toda importância atribuída à ajuda ao longo das últimas décadas, não há um consenso na literatura sobre o seu papel e sua eficácia. Esse trabalho consiste em uma análise e discussão teórica sobre a Ajuda Oficial Para o Desenvolvimento a partir de três perspectivas: a pró-ajuda, que sustenta analiticamente o seu papel como instrumento para o desenvolvimento, representada pelo economista Jeffrey Sachs; a crítica à ajuda do liberalismo econômico representada pela economista Dambisa Moyo; e a crítica à ajuda do estruturalismo desenvolvimentista representada pelo economista Erik Reinert.

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ABSTRACT

Since the end of the World War II, development issues have become central to the international agenda. Each subsequent decade has set up scenarios with differing perspectives on development goals and strategies, but in all of them Official Development Assistance (ODA) has remained one of the main instruments from developed nations to the peripheral countries. In the early 2000s, aid gained ground as an essential means of implementation to the Millennium Development Goals (MDGs) and has kept this role in the Agenda 2030 for the Sustainable Development Goals (SDGs) Despite all the importance that has been attached to aid over the last decades, there is no consensus in the literature about its role and effectiveness. This work consists of a theoretical analysis and discussion about Official Development Assistance from three perspectives: the pro-aid, which supports analytically its role as an instrument for development, represented by the economist Jeffrey Sachs; the critic from the economic liberalism represented by the economist Dambisa Moyo; and the critic from the structuralism developmentalist represented by the economist Erik Reinert

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 -População Global (10.000 AC – Presente) ... 16 Figura 2- Produto mundial Bruto per capita (Fixado em preços internacionais de 1990) ... 16 Figura 3- Mecanismos de Acumulação de Capital ... 44 Figura 4 - A Armadilha da Pobreza ... 45 Figura 5- A Ajuda Oficial para o Desenvolvimento na quebra da Armadilha da Pobreza ... 46 Figura 6 - A Escada do Desenvolvimento e as Etapas de Desenvolvimento ... 58 Figura 7 - Ciclo Vicioso da Ajuda ... 77

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Total de Ajuda Oficial Para o Desenvolvimento (em milhões de dólares americanos) ... 28

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AOD Ajuda Oficial para o Desenvolvimento CAD Comitê de Ajuda Ao Desenvolvimento

OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico OECE Organização Europeia de Cooperação Econômica

ODM Objetivos de Desenvolvimento do Milênio ODS Objetivos de Desenvolvimento Sustentável OMC Organização Mundial do Comércio

ONU Organização das Nações Unidas PNB Produto Nacional Bruto

UNCTAD Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 12

CAPÍTULO 1 - A AJUDA E O DESENVOLVIMENTO ... 16

1.1 O objetivo do Desenvolvimento no Pós Segunda Guerra Mundial ...18

1.2 A ajuda como instrumento para o desenvolvimento ...20

1.3. OCDE, CAD e a AOD ...22

1.4 A Ajuda para o Desenvolvimento entre as décadas de 1950-90 ...25

1.5 A Ajuda no novo milênio: ODM e ODS ...29

CAPÍTULO 2: A PERSPECTIVA PRÓ AJUDA: JEFFREY SACHS E A TEORIA DA MODERNZIAÇÃO ... 34

2.1: O economista do ‘choque’ para a sua nova missão: acabar com a extrema pobreza na nossa geração. ...34

2.2 Sobre Armadilha da Pobreza, o fim da extrema pobreza e a Escada do Desenvolvimento ...37

2.3. Teoria da Modernização e Jeffrey Sachs: sobre a Ajuda, Grande Empurrão, Arranco e desenvolvimento sustentado. ...50

CAPÍTULO 3: AS PERSPECTIVAS CRÍTICAS À AJUDA ... 64

3.1 A Ajuda Oficial para o Desenvolvimento é um instrumento para o desenvolvimento? ...65

3.1.1 Plano Marshall, o ajuste neoliberal e os Objetivos do Milênio. ... 68

3.2 Quais os efeitos da Ajuda Oficial para o Desenvolvimento? ...73

3.3.1 Novas formas de financiamento: a saída liberal ... 79

3.3.2 Estabelecer a atividade econômica correta: a saída estrutural desenvolvimentista .... 87

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 98

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 102

MUNK, Nina. The Idealist: Jeffrey Sachs and the Quest to End Poverty. Anchor. Setembro, 2013. ... 102

ANEXOS ... 104

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12

INTRODUÇÃO

No pós Segunda Guerra Mundial, a temática do desenvolvimento ganhou centralidade na agenda internacional, em um contexto de crescentes disparidades econômicas e sociais entre as nações. Considerando tais assimetrias, a ajuda internacional passou a ser um elemento fundamental para as diferentes estratégias de desenvolvimento estabelecidas ao longo das décadas. Sua contínua centralidade ao longo do tempo estaria amparada na percepção de que esse instrumento seria efetivo no estímulo ao desenvolvimento dos países periféricos.

Visando a obtenção de um maior controle dos fluxos de ajuda, maior transparência nos processos, e a estabelecer metas para seu aperfeiçoamento em termos quantitativos e qualitativos, o Comitê de Ajuda ao desenvolvimento (CAD) da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), estabeleceu o conceito da Ajuda Oficial para o Desenvolvimento (AOD) 1: definida como ajuda de governos buscando promover o desenvolvimento econômico e o bem-estar dos países beneficiários. Desde então, AOD tem sido a “medida chave utilizada em praticamente todas as metas e avaliações de performance da ajuda” 2.

Esse fluxo de Ajuda pode ser fornecido de forma bilateral ou através de agências multilaterais voltadas para o desenvolvimento. A Ajuda pode ser passada como assistência técnica, como doação (grants) ou como empréstimos em condições mais favoráveis (soft loans), em que no mínimo 25% do valor deve ser doado (grant

element) calculado a uma taxa de desconto de 10% 3.

No inicio dos anos 2000 a AOD ganhou um espaço de destaque como meio de implementação dos Objetivos do Milênio (ODM) da ONU, sendo incluído no ODM 8, que versa sobre parcerias e meios de implementação. Na agenda 2030, dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), a AOD segue com o mesmo papel, agora delimitado no ODS 17 também de parcerias globais para o desenvolvimento e meios de implementação.

1 Informações sobre AOD obtidas no site da OCDE. Disponível em<

http://www.oecd.org/dac/stats/officialdevelopmentassistancedefinitionandcoverage.htm> Acesso em 05 de setembro de 2016.

2

Idem

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13 O economista estadunidense Jeffrey Sachs é um dos principais defensores da utilização da AOD. Ele expôs sua perspectiva pró-ajuda em duas importantes obras, The

End of Poverty (2005) e The age of Sustainable Development (2015), onde sustenta

analiticamente a importância da ajuda como instrumento para o desenvolvimento e, especificamente, como meio de implementação dos grandes planos da ONU.

Sachs utiliza uma representação metafórica do desenvolvimento econômico como uma escada, em que cada subida em um degrau representa melhoria no bem-estar econômico (SACHS, 2005). Sua “escada de desenvolvimento” se assemelha as “etapas de desenvolvimento” (1978) de Walt Rostow, renomado representante da Teoria da Modernização. De acordo com Sachs, a etapa mais difícil do desenvolvimento econômico é a de efetivamente acessar a escada. Quando isso ocorre, criam-se as condições para que o país siga no dinamismo da subida autossustentada. (SACHS, 2005, p.24). A Ajuda Oficial para o Desenvolvimento, nesse caso, seria entendida como importante instrumento para impulsionar o início dessa subida.

Apesar da centralidade da ajuda, como instrumento utilizado pelos países desenvolvidos na contribuição para a melhoria das condições socioeconômica da periferia desde o final da Segunda Guerra Mundial, e dos argumentos econômicos que a sustentam, não há um consenso na literatura com relação ao seu papel e sua eficácia para esse propósito. Assim, torna-se relevante realizar uma análise sobre diferentes abordagens que, por um lado, sustentam analiticamente a prática, como a de Jeffrey Sachs e, por outro, que a criticam como a causa de muitos problemas ou mesmo entrave para o desenvolvimento.

Uma importante crítica à ajuda vem do liberalismo econômico, representada pela economista zambiana Dambisa Moyo. Em 2009, Moyo lançou o livro Dead Aid –

Why Aid is not working and how there is a better way for Africa, onde ela expõe que a

ajuda, na realidade, funcionaria como um obstáculo ao desenvolvimento. De acordo com a economista, a ajuda não é um instrumento a ser utilizado para financiar esse processo, pois para isso deve-se contar com as formas baseadas nos mecanismos de livre mercado.

Outra crítica à ajuda é a do “estruturalismo desenvolvimentista”, identificado nos trabalhos do economista norueguês Erik Reinert. Em seu livro How Rich Countries

Got Rich... and Why Poor Countries Stay Poor, publicado em 2007, o autor indica que a

ajuda não é um instrumento para desenvolvimento econômico, mas sim para uma ‘economia paliativa’, isto é, está voltada apenas para amenizar os sintomas advindos do

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14 subdesenvolvimento, ao invés de representar mudanças nas causas da pobreza (REINERT, 2007, p.240).

Assim, essa pesquisa teve como objetivo a análise e discussão teórica da Ajuda Oficial para o Desenvolvimento a partir das três perspectivas supramencionadas. Para isso, realizou-se uma revisão da literatura sobre o papel e a eficácia da AOD, delimitou-se conceitualmente os termos do objeto, analisou-delimitou-se o fundamento dos argumentos dos autores de cada perspectiva e foram identificadas, de acordo com cada abordagem, as respostas para as seguintes perguntas norteadoras:

(1) A Ajuda Oficial Para o Desenvolvimento leva os países receptores para uma situação melhor do que estariam sem ela?

(2) A Ajuda Oficial Para o Desenvolvimento leva os países para um caminho sustentado de crescimento e desenvolvimento? 4

O trabalho está dividido em três capítulos. No primeiro deles foi exposto o histórico da ajuda como instrumento para o desenvolvimento: desde o inicio do seu uso sistemático nas estratégias de desenvolvimento a partir da década de 1950, sua padronização no âmbito da OCDE como Ajuda Oficial para o Desenvolvimento no final dos anos 60, até a sua inserção nos Objetivos do Milênio e, posteriormente, nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

No segundo capítulo foi apresentada a perspectiva pró-ajuda do economista Jeffrey Sachs: seu argumento sobre o que forma a armadilha da pobreza que impede os países de subirem na escada do desenvolvimento, o que deve ser feito para quebrar tal armadilha e o papel e a importância da AOD nesse processo. Além disso, nessa seção, foi exposta uma análise da relação entre os argumentos de Sachs e os da Teoria da Modernização.

No terceiro capítulo foram apresentadas e comparadas as duas perspectivas críticas à ajuda. Inicialmente foram expostas as críticas que ambas as teorias fazem à Ajuda Oficial para o Desenvolvimento, e, logo em seguida, foram apresentadas as alternativas à ajuda propostas por Dambisa Moyo e Erik Reinert.

4 As perguntas foram elaboradas pelo especialista em desenvolvimento Roger C Riddel, e foram

apresentadas em seu livro Does Foreign Aid Really Work? (2007) e em seu discurso na Australasian Aid And International Development Workshop em Canberra, fevereiro de 2014.Disponível em<

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15 Nas considerações finais foi feita uma breve recapitulação dos argumentos e a explicitação das respostas às duas perguntas norteadoras indicadas de acordo com todo o apurado ao longo dos três capítulos anteriores.

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16 CAPÍTULO 1 - A AJUDA E O DESENVOLVIMENTO

A busca por desenvolvimento não é algo novo na história da sociedade humana, afinal, desde os primórdios é possível identificar esse processo ocorrendo através da utilização da natureza para melhoria na qualidade de vida. Contudo, até o século XIX, o progresso ocorria de forma muito lenta e marginal, até mesmo pela limitação do conhecimento cientifico e tecnológico da época (SACHS, 2005). Se considerarmos a População Mundial e o Produto Mundial Bruto per capita como indicadores, é possível observar nas Figuras 1 e 2 a transformação que ocorreu exatamente na primeira metade do século XIX.

Figura 15 -População Global (10.000 AC – Presente)

Figura 26- Produto mundial Bruto per capita (Fixado em preços internacionais de 1990)

5 Fonte: Bolt, J., and J. L. van Zanden. 2013. “The First Update of the Maddison Project: Re-Estimating Growth Before 1820.” Maddison Project Working Paper 4. Apud SACHS, 2016, p.20

6 Fonte: Bolt, J., and J. L. van Zanden. 2013. “The First Update of the Maddison Project: Re-Estimating Growth Before 1820.” Maddison Project Working Paper 4. Apud SACHS, 2015, p.19.

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17 Os dois indicadores mantiveram alterações pouco significativas até o século XIX, pois a história econômica era marcada por altos e baixos com crescimento seguido de declínios ao invés de um grande progresso econômico sustentado (SACHS, 2005, p.32, tradução livre). Foi apenas nos anos 1800s, que o mundo adentrou em uma trajetória de ascensão. Isso se deu logo após o movimento Iluminista e durante o período da Revolução Industrial: foi a Era do Crescimento Econômico Moderno, como denominado pelo historiador econômico, Simon Kuznet (SACHS,2015).

A Revolução Científica promovida por figuras como Galileu, Newton e Francis Bacon mudou a forma com a qual olhamos para o mundo que nos rodeia. A partir de suas descobertas, a humanidade rompeu com os limites ao desenvolvimento por meio do uso da ciência e tecnologia para mudar a natureza em nosso favor de uma forma sem precedentes (SACHS, 2015, p.75). A máquina a vapor foi a tecnologia que marcou essa ruptura: representou a nova forma de energia que permitiria a produção em escala necessária para a primeira Revolução Industrial (SACHS, 2005, p.33).

As mudanças que se iniciaram na Grã Bretanha logo se espalharam para outros países que também lograram utilizar tecnologia para aumentar a produção e a renda. E, desde então, essa tem sido a trajetória perseguida por muitos países. Contudo, foi também a partir dai que as diferenças entre os países tornaram-se mais profundas, pois, apesar de todas as sociedades terem experimentado algum desenvolvimento nesse momento, a taxa foi bem distinta entre os países (SACHS; 2005, p.30).

O continente que se beneficiou dessa ascensão foi a Europa, que, no fim do século XIX, praticamente dominava o mundo em termos políticos e econômicos. Um reflexo disso foi a partilha do continente africano, por parte dos europeus nesse período. Ela configurou uma nova fase do imperialismo – como feito nas Américas por volta do século XV – agora já em uma etapa pós Revolução Industrial, visando à exploração de seus recursos naturais e sua força de trabalho, além de pretender a imposição da civilização ocidental, como um ‘fardo do homem branco’.

No inicio do século XX os impérios europeus ainda tinham territórios em quase toda África, em parte da Ásia, e ainda logravam grande influência na América Latina e Caribe (SACHS, 2015, p.43). Apesar de terem realizado investimentos em infraestrutura nas suas colônias, não era possível falar em um esforço sistemático voltado para ajudar os países a criarem base para o desenvolvimento, pois as obras feitas eram precárias e pensadas apenas para facilitar a exploração, como o exemplo das linhas de trem na África (SACHS, 2015, p.138).

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18 De qualquer forma, de acordo com Hjertholm e White (2000) e Riddel (2007), devido a essa crescente diferença econômica entre os países, já era possível enquadrar algumas ações pontuais como modelos de ajuda ainda no século XIX e primeira metade do século XX. Essas eram voltadas para assistir os territórios mais pobres e para seguir atendendo aos objetivos comerciais e políticos dos doadores. Alguns exemplos poderiam ser destacados: Em 1896, excedente dos alimentos dos EUA foram enviados para desenvolvimento de mercado no exterior; em 1929 foi lançado o Ato de Desenvolvimento Colonial, e em 1940 e 1945 os Atos de Desenvolvimento e Bem estar Colonial; nos anos 1930s, o Departamento de Agricultura dos EUA financiou centros de pesquisa em agricultura na América Latina; e nos anos 1940s foi enviada ajuda da França a suas colônias para a fundação de universidades (RIDDEL, 2007, p.24; HJERTHOLM; WHITE, 2000, p.60).

1.1 O objetivo do Desenvolvimento no Pós Segunda Guerra Mundial

Apesar dessas ações pontuais, foi apenas com o fim da Segunda Guerra Mundial que a cooperação internacional para o desenvolvimento e a Ajuda Oficial para o Desenvolvimento passaram a ocupar um lugar de destaque na agenda internacional. Alguns fatos foram importantes para formar a conjuntura que levou esses temas ao centro da agenda.

Em primeiro lugar, a criação de novas instituições e assinatura de documentos importantes de comprometimentos para ação conjunta no âmbito internacional. É possível destacar a fundação das Organizações das Nações Unidas em 1945 e a assinatura da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948. Esses representaram de forma mais concreta a união dos países em torno de uma comunidade internacional que, ao menos no discurso, estava comprometida com a paz, segurança internacional, com a garantia dos direitos fundamentais dos indivíduos, e com a igualdade de direitos das nações.

Em segundo lugar, a atuação dos EUA. No pós-guerra e ao longo da segunda metade do século XX, houve a conformação de um equilíbrio de poder bipolar no sistema internacional, com a guerra fria entre EUA e URSS. Assim, os Estados Unidos buscaram atuar de forma mais assertiva para cada vez mais se afirmarem como superpotência e difundirem o seu modelo de sociedade ao passo que buscavam impedir

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19 a propagação do comunismo. Os programas de ajuda tornaram-se instrumentos para suas estratégias nessa disputa.

Dois momentos merecem especial destaque: o Plano Marshall e o discurso dos IV Pontos de Harry Truman. Em 1948, o Secretário de Estado George Marshall discursou na Universidade de Harvard e apresentou o seu plano de ajuda para reconstrução da Europa, o Plano Marshall (RIDDEL, 2007, p.24). Esse foi o primeiro grande plano de ajuda da história e envolveu assistência técnica e administrativa, envio de alimentos, combustível, máquinas e investimento na capacidade industrial. Os valores foram de aproximadamente $13 bilhões de dólares e durou até 19517. O Plano foi bem sucedido no que tange ao auxílio para a reconstrução da Europa e trouxe diversos elementos do subsequente sistema de ajuda (TARP, 2000, p.3), o que deu impulso para que o foco se voltasse para os países em desenvolvimento (HJERTHOLM; WHITE, 2000, p.61).

Em 1949, o presidente Harry Truman realizou seu discurso inaugural de quatro pontos, em que o último consistia “na necessidade de governos de proverem ajuda para o desenvolvimento de países pobres” (RIDDEL, 2007, p.24, tradução livre). Foi o primeiro discurso do líder de uma Nação que foi direcionado a esse tema, e clamava pela importância de utilizar os avanços científicos e industriais em prol do crescimento dos países não desenvolvidos (KEELEY, 2012, p.68). Tornou-se um marco e é considerado por alguns como o pontapé inicial dos programas de ajuda para o desenvolvimento.

Em terceiro lugar, o processo de descolonização. Thorbecke (2000) aponta que os esforços mais sistemáticos de busca por desenvolvimento social e econômico iniciaram-se com o fim do sistema colonial e surgimento dos Estados independentes, pois “seria incoerente com as atribuições das colônias, que atendiam a certa função na divisão do trabalho e seguiam certas condições nas trocas comerciais que implicavam relação de dependência (THORBECKE. 2000, p.12, tradução livre).

Uma grande parte das nações que se tornou independente naquele momento uniu-se com outros países em desenvolvimento em um bloco de nações que negava o alinhamento aos chamados Primeiro e Segundo Mundo. O primeiro encontro do

7

Informações obtidas no website da The George Marshall Foundation. Disponível em<http://marshallfoundation.org/marshall/the-marshall-plan/history-marshall-plan/> Acesso em 03 de setembro de 2016.

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20 “Movimento dos Países não- alinhados” aconteceu em Bandung no ano 1955 e deu força para que eles pudessem pleitear junto a ONU, que a problemática do desenvolvimento fosse inserida na agenda internacional (HJERTHOLM; WHITE, 2000, p.61). Tais reivindicações foram reiteradas por meio do G77 – grupo de países em desenvolvimento – no âmbito da Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), a partir de 1964.

Com todos esses fatores, o cenário estava montado para que as nações pudessem focar na cooperação para o desenvolvimento. Porém, é importante conceituar a diferença entre cooperação e ajuda. De acordo com Bruno Ayllón (2011), “cooperação assume que se trata de um tipo de relação recíproca que implica forças de associação” enquanto ajuda “contém também um sentido social, mas não implica compartir, pois supõe a existência prévia de desigualdade” (AYLLÓN, 2011, p.8, tradução livre).

Com essa compreensão, o instrumento da ajuda assumiu proeminência, devido ao grande contraste existente entre as nações naquele momento. Se por um lado existiam diversos países industrializados e já desenvolvidos, alcançando patamares cada vez mais elevados de riqueza e bem-estar, por outro, havia nações recém-independentes, não industrializadas, assoladas pelo crescente problema da extrema pobreza. O problema da desigualdade entre os países e os efeitos de longo prazo da ajuda internacional na solução desse problema serão discutidos nesse trabalho.

1.2 A ajuda como instrumento para o desenvolvimento

Roger Riddell (2007) define ajuda em seu sentido mais amplo da seguinte forma: “consiste de todos os recursos – bens físicos, habilidades e know-how técnico, subsídios (gifts) ou empréstimos (com taxa de concessionalidade) - transferidos de doadores a receptores” (RIDDELL, 2007, p.17, tradução livre). Ainda de acordo com o autor, a partir desse conceito geral, ajuda externa envolve recursos para questões humanitárias e de desenvolvimento, bem como para promover interesses políticos e estratégicos dos doadores e receptores e ainda atender a finalidades militares (RIDDELL, 2007, p.17, tradução livre).

A ajuda como instrumento para o desenvolvimento, por sua vez, possui uma definição mais restrita. Ela pode ser definida tendo como parâmetro aqueles que a recebem e o uso final do recurso; pode ser definida em termos de quem doa, referindo-se a finalidade pela qual a ajuda é dada; ou ainda com relação aos efeitos tangíveis que

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21 são concretizados nos beneficiários (RIDDELL, 2007, p.18, tradução livre). Dentre essas possibilidades, a mais utilizada, ainda de acordo com Roger Riddell, é aquela orientada pela intenção do doador. Portanto, “ajuda para o desenvolvimento tem sido definida (em termos gerais) como a parte da ajuda externa cuja finalidade é contribuir para o bem-estar humano e desenvolvimento de países pobres” (RIDDELL, 2007, p.18, tradução livre).

Essa definição apresenta três problemas centrais: O primeiro deles é que por ser uma definição focada na intenção do doador, reforça a concepção de que os doadores é que dominam o regime de ajuda (HJERTHOLM; WHITE, 2000, p.62). O segundo é que por basear-se na intenção do doador quanto à finalidade da ajuda, torna-se um conceito aberto a interpretações, isto é, quem deve julgar e como julgar essa intenção de contribuir para o desenvolvimento? (RIDDELL, 2007, p.20). O terceiro é que dessa forma não entram em questão os efeitos da ajuda e sim o seu propósito. Essas questões também serão analisadas nesse trabalho, especialmente os debates teóricos sobre os efeitos da ajuda.

Assim, essa distinção conceitual não é tão evidente na realidade, e tem se tornado cada vez mais complicado diferenciar ajuda para o desenvolvimento de ajuda para outras finalidades. Primeiramente porque muitos países que recebem ajuda por questões geopolíticas, por exemplo, se qualificariam no critério de pobreza e de fato necessitam de ajuda para desenvolvimento (RIDDELL, 2007, p.102, tradução livre). Além disso, há uma divergência entre as justificativas expressas em discursos pelas quais a ajuda é dada e as reais razões de sua alocação (RIDDELL, 2007, p.91, tradução livre). Ou seja, mesmo a ajuda que é oficialmente declarada com a finalidade do desenvolvimento, é desviada desse objetivo para atender a questões comerciais e políticas do doador (HJERTHOLM; WHITE, 2000, p.59).

De forma geral, de acordo com Riddell, não há um debate se as questões comerciais, políticas, econômicas e estratégicas influenciam na prática da ajuda. Na realidade, “se há uma constante na história da ajuda é que os objetivos de desenvolvimento de programas de ajuda têm sido distorcidos pelo uso da ajuda para vantagens políticas e comerciais do doador” (TARP; HJETHOLM apud RIDDELL, p.92, tradução livre). Assim, a questão não é se esses fatores influenciam na prática da ajuda, mas sim o quanto influenciam.

Riddell aponta que Suíça, Holanda, Noruega, Dinamarca e Finlândia são, historicamente, doadores que mantém a solidariedade e o desenvolvimento como

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22 principais fatores influenciadores da alocação da ajuda (RIDDELL, 2007, p.96). Por outro lado, Japão e EUA alocam a sua ajuda principalmente por questões de sua própria segurança e prosperidade, deixando a pobreza dos receptores muito abaixo na sua lista de prioridades (RIDDELL, 2007 p.96).

Outra problemática levantada por Hjertholm e White (2000) é que mesmo quando a ajuda está de fato direcionada para o desenvolvimento e vai acarretar efeitos positivos para os beneficiários, geralmente é uma ajuda voltada para um modelo de desenvolvimento bem específico, baseada na democracia liberal ocidental (p.59, tradução livre) O discurso da Ajuda para o Desenvolvimento trata da busca pelo desenvolvimento como algo consensualmente almejado, assim, reflete os valores dos doadores e não abre margens para diferentes modelos.

Apesar de todos esses desafios, a partir de meados do século XX, o mundo assistiu a um crescente impulso da necessidade de prover ajuda como instrumento para garantir que um número maior de países superasse a pobreza e seguisse no caminho do desenvolvimento. Principalmente porque se observou a persistência da extrema pobreza e sofrimento humano em países pobres, ao mesmo tempo em que ocorria o aumento da riqueza dos países desenvolvidos, que, portanto, tinham ainda mais meios para ajudar a reduzir esse crescente gap entre os países (RIDDELL, 2007, p.120).

1.3. OCDE, CAD e a AOD

A ajuda para o desenvolvimento adquiriu tamanha importância nas décadas seguintes ao fim da Segunda Guerra Mundial, que acabou por alcançar um caráter institucionalizado e oficial com critérios pré-estabelecidos: a Ajuda Oficial para o Desenvolvimento.

Devido ao grande sucesso do Plano Marshall, administrado pela Organização Europeia de Cooperação Econômica (OECE), houve um impulso para levar a ação a nível global. Assim, em 14 de dezembro de 1960, Canadá e Estados Unidos se juntaram aos membros da OEEC e assinaram a criação da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que entrou oficialmente em vigor em 30 de setembro de 1961, e que já na mudança de nome demonstrou o foco no desenvolvimento dentro da cooperação internacional (FUHRER, 1996).

Atualmente a OCDE, que conta com 35 membros, tem a missão de “promover políticas que vão melhorar o bem estar econômico e social das pessoas ao redor do

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23 mundo” 8. Na criação da Organização, foi estabelecido o Departamento de Desenvolvimento que se repartia em dois ramos: Financiamento do Desenvolvimento e Cooperação Técnica. O primeiro deles passou a chamar-se, em 1969, de Diretório de Assistência ao Desenvolvimento e em 1975 de Diretório de Cooperação para Desenvolvimento (FUHRER, 1996).

Antes mesmo da criação efetiva da OCDE, já havia sido formado em 1960 o Grupo de Assistência ao Desenvolvimento, um fórum de consulta entre doadores, que em Março de 1961 estabeleceu o Common Aid Effort, por meio do qual foi “reconhecida a necessidade de se engajarem em um esforço comum para ajudar os países menos desenvolvidos” (HYNES; SCOTT, 2013, p.2). Já no dia 23 julho de 1961 o grupo foi adicionado à estrutura da OCDE, no âmbito do Diretório de Assistência ao Desenvolvimento, passando a se chamar o Comitê de Ajuda ao Desenvolvimento (CAD), que tem como mandato:

Promover a cooperação para desenvolvimento e outras políticas, de modo a contribuir para o desenvolvimento sustentável, incluindo o crescimento econômico, redução da pobreza e melhora dos padrões de vida dos países em desenvolvimento, e um futuro no qual nenhum país dependerá de ajuda9.

Hoje o CAD é formado por 29 países membros e desde então, “tem sido o principal fórum para estabelecer consenso entre os agentes de desenvolvimento sobre definições básicas e normas estatísticas” (HYNES; SCOTT, 2013, p.2, tradução livre).

Em um contexto de variadas “ações, interesses e objetivos envolvidos na área de cooperação para o desenvolvimento” (HYNES; SCOTT, 2013, p.2, tradução livre), o Comitê reconheceu que para obter avanços no cumprimento de sua proposição, seria necessário estabelecer uma base normativa com relação à ajuda. Ademais, a necessidade de estabelecer esses parâmetros também representava os apelos do mundo em desenvolvimento por melhora dos termos e condições de ajuda focando na sua parcela oficial – excluindo fluxos privados – e concessional. (HYNES; SCOTT, 2013, p.2). Até mesmo porque “uma cobertura mais limitada dos fluxos oficiais teria a vantagem de focar mais completamente no problema nos termos de real assistência ao desenvolvimento” (OECD, 1968c apud HYNES; SCOTT. 2013, p.04).

8 Informações obtidas no site da OCDE. Tradução livre. Disponível http://www.oecd.org/about/ Acesso

em 05 de setembro de 2016.

9

Informações sobre o CAD obtidas no site da OCDE. Tradução livre. Disponível em

(24)

24 A partir disso, o CAD estabeleceu o grupo ad hoc para Problemas Estatísticos para chegar, em 1969, na definição (HYNES; SCOTT 2013, p.4), do que seria uma de suas contribuições mais reconhecidas: o conceito de Ajuda Oficial para o Desenvolvimento (AOD), definida como ajuda de governos buscando promover o desenvolvimento econômico e o bem-estar dos países beneficiários. Desde então, AOD tem sido a “medida chave utilizada em praticamente todas as metas e avaliações de performance da ajuda”10.

Esse fluxo de ajuda pode ser fornecido de forma bilateral ou através de agências multilaterais voltadas para o desenvolvimento. A ajuda pode ser passada como assistência técnica, como doação (grants) ou como empréstimos em condições mais favoráveis (soft loans), em que no mínimo 25% do valor deve ser doado (grant element) calculado a uma taxa de desconto de 10% 11. Com relação aos empréstimos, caso ele siga o critério de concessionalidade mencionado, todo o valor poderá ser reportado como AOD.

O CAD disponibiliza um folheto informativo intitulado “Isso é AOD?” (Is it

ODA?)12, em que explica de forma resumida o que pode ser considerado como Ajuda

Oficial para o Desenvolvimento, servindo de guia até mesmo para os países membros, que tem constantes dúvidas sobre o que pode ser reportado. Além disso, a OCDE possui uma lista de países e territórios que são passíveis a receber AOD, e são agrupados de acordo com o nível de desenvolvimento, nas seguintes categorias: países menos desenvolvidos; outros países de renda baixa (PNB per capita menor ou igual a $1045); países de renda média baixa (PNB per capita entre $1046-$4125); países de renda média alta (PNB per capita entre $4126 -$12745). 13

Além da nomenclatura de Ajuda Oficial Para o Desenvolvimento, a OCDE contabiliza “Outros fluxos oficiais” (Other Official Flows- OOF), que são definidos como:

Transações pelos setores oficiais com os países na lista de receptores de ajuda, mas que não se enquadram nas condições de elegibilidade da Ajuda Oficial para o

10 Informações sobre AOD obtidas no site da OCDE. Disponível em<

http://www.oecd.org/dac/stats/officialdevelopmentassistancedefinitionandcoverage.htm> Acesso em 05 de setembro de 2016.

11

idem

12 Is it ODA? 2008. Disponível em< https://www.oecd.org/dac/stats/34086975.pdf> Acesso em 05 de

setembro de 2016.

13 Lista do CAD dos beneficiários de ODA. Os valores são do ano de 2013. Disponível em<

http://www.oecd.org/dac/stats/documentupload/DAC%20List%20of%20ODA%20Recipients%202014% 20final.pdf> Acesso em 09 de outubro de 2016.

(25)

25 Desenvolvimento, ou porque não são destinadas principalmente ao desenvolvimento ou porque têm um elemento de concessionalidade inferior a 25 por cento 14

De acordo com Riddell, há também a utilização da nomenclatura Ajuda Oficial (Official aid), que seria aquela que segue o critério de elegibilidade da AOD, mas que é direcionada para países em nível de desenvolvimento mais avançado do que as categorias supramencionadas, ou seja, que teriam a renda per capita anual acima do $12.745,00 (RIDDELL, 2007, p.19).

A proposta era que a definição comum pudesse trazer mais transparência para o processo; maior possibilidade de compreender os efeitos desses fluxos e o que ainda precisava ser feito; e maior oportunidade para rever as políticas e de estabelecer metas quantitativas e qualitativas para o aperfeiçoamento da ajuda. (HYNES; SCOTT, 2013, p. 02)

Por fim, vale salientar que o conceito de AOD não é algo estático. Ao longo dos anos já sofreu algumas alterações, principalmente com relação aos fluxos elegíveis. Ainda assim, permanece como um formato criticado e que desperta muitas controvérsias a respeito dos fluxos que devem ser considerados, ou qual que deve ser a taxa de concessionalidade, por exemplo. De qualquer forma, Hynes e Scott consideram válidas as críticas ao conceito, pois acreditam que elas não representam uma dissolução do conceito, mas sim apenas adaptações em uma realidade cambiante (HYNES; SCOTT, 2013, p.2).

1.4 A Ajuda para o Desenvolvimento entre as décadas de 1950-90

O objetivo de desenvolvimento econômico e a estratégia utilizada para atingi-lo perpassam e requerem fundamentação em uma compreensão teórica sobre o processo de desenvolvimento (TARP, 2000, p.2; THORBECKE, 2000). Essa dinâmica variou ao longo das últimas décadas, de acordo com a conjuntura, com estudos elaborados, e com o interesse de alguns atores. Contudo, o que permaneceu inalterado foi a centralidade política da ajuda como instrumento utilizado pelos países desenvolvidos para a estratégia de desenvolvimento estabelecida. Assim, desde a década de 50, a ajuda mantém-se como um dos principais mecanismos utilizados pelos países para promover

14

Glossary of Statistical Terms. Other Official Flows. Disponível em<

(26)

26 o desenvolvimento dos países periféricos. O que se está em discussão são os efeitos da ajuda e os interesses por detrás desse tipo de instrumento.

Thorbecke (2000) apresenta uma caracterização histórica desse processo interessante. Segundo o autor, nos anos 50, o objetivo de desenvolvimento predominante era o crescimento econômico concretizado pelo aumento do Produto Nacional Bruto (PNB) (THORBECK, 2000, p.14). Acreditava-se que os países do Terceiro Mundo precisavam de crescimento econômico e que todos os demais propósitos esperados seriam complementares ou mesmo alcançados como consequência disso (THORBECK, 2000, p.14). O papel da ajuda dentro dessa perspectiva era de disponibilizar o capital indispensável para alcançar o nível de poupança que os impulsionaria para um caminho autossustentado de crescimento, ou seja, a ajuda seria “uma fonte de capital para disparar o gatilho do crescimento econômico através de maiores investimentos” (THORBECKE, 2000, p.16, tradução livre).

Nos anos 60 o objetivo de desenvolvimento ainda era primordialmente o crescimento do PNB, contudo, já foram consideradas as questões do emprego e do equilíbrio na balança de pagamento (THORBECKE, 2000, p.19). Para essa finalidade, a ajuda externa também atuou no preenchimento da lacuna financeira na poupança e no provimento de divisas para sanar os déficits na balança de pagamentos, o que iria possibilitar o aumento no nível de investimento (THORBECKE, 2000, p.20).

A ajuda na década de 60 ganhou atenção especial da comunidade internacional, manifestada em alguns fatos relevantes. A ONU proclamou os anos 60 como a primeira década do desenvolvimento.15 De acordo com Roger Riddell (2007) foi a partir dai que iniciou o que ele chama de aid targetry, ou seja, o estabelecimento de metas para o nível de ajuda que deveria ser alcançado.16 Em 1969, Robert McNamara, então presidente do Banco Mundial, organizou a Primeira Comissão sobre Desenvolvimento Internacional, a chamada Comissão Pearson. A ideia era analisar os primeiros 20 anos

15 Informação obtida no site das Nações Unidas, na seção sobre Décadas internacionais. Disponível

emhttp://www.un.org/en/sections/observances/international-decades/ Acesso em 07 de setembro de 2016.

16 Foi sugerida pela World Council of Churches uma meta de 1% de todos os recursos oficias e privados

dos países do DAC para a ajuda. Tal proposta tinha o problema de que não era possível prever fluxos de capitais privados. Com isso, Jan Tinbergen – diretor do Comitê das Nações Unidas para Planejamento para Desenvolvimento em 1964 – propôs uma meta de fluxos oficiais de 0,75% do PNB até 1972, a partir do seu cálculo de quanto era necessário de entrada de capital nos países em desenvolvimento para que eles atingissem altas taxas de crescimento. No encontro da UNCTAD em 1968, alguns países desenvolvidos aceitaram a meta, mas sem a data limite de 1972. (OECD - DAC Journal 2002. History of the 0,7% ODA Target. Disponível em< https://www.oecd.org/dac/stats/45539274.pdf> Acesso em 07 de setembro de 2016)

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27 de ajuda para o desenvolvimento (RIDDELL, 2007, p.29, tradução livre). Os resultados foram registrados no relatório Partners in Development, em que se estabeleceu a meta de 0,7% do PNB até 1975 (RIDDELL, 2007, p.30). E foi já na década de 70, a Segunda Década para Desenvolvimento das Nações Unidas, que se oficializou, no âmbito da Assembleia Geral da ONU, a meta estabelecida na Comissão (RIDDELL, 2007, p.32).

Nos anos 70, houve o entendimento de que uma estratégia focada apenas no crescimento do PNB não iria resolver todos os problemas (THORBECKE, 2000, p.20). Assim, o objetivo mais importante passou a ser a redução da pobreza absoluta, que deveria ser atingida através do emprego produtivo nos setores tradicionais (THORBECKE, 2000, p.21).

Portanto, a ajuda foi utilizada para favorecer diretamente a população, por meio de projetos para garantir as necessidades básicas, como educação, saúde e água potável (RIDDELL, 2007, p.32), além de buscar “aumentar o padrão de vida dos pobres através de crescentes oportunidades de emprego” (THORBECKE, 2000, p.2, tradução livre). O instrumento também teve papel importante em projetos de assistência técnica; projetos de desenvolvimento rural e agrícola, como a revolução verde de melhoria na tecnologia para a agricultura (THORBECKE, 2000, p.24, tradução livre).

Já o inicio dos anos 80 foi marcado por forte crise econômica, caracterizada por alta inflação e recessão (RIDDELL, 2007, p.24), o que impeliu que o objetivo primordial de desenvolvimento da década fosse pautado pela busca por equilíbrio externo na balança de pagamentos e equilíbrio interno orçamentário (THORBECKE, 2000, p.24). Assim, durante a chamada “década perdida”, a estratégia de desenvolvimento se traduziu na implementação da cartilha neoliberal, que pregava a estabilização e políticas de ajuste estrutural, onde se inclui a redução do setor público, corte de regulação do setor privado, orientação para o exterior e confiança nos mercados (THORBECKE, 2000, p.25-7; RIDDELL, 2007, p. 34).

Nesse contexto, mesmo sendo criticada como uma excessiva participação do Estado, a Ajuda permaneceu exercendo um papel central para a estratégia de desenvolvimento. Primeiro, como um meio de salvar o sistema financeiro internacional instável através do auxilio aos países para pagamento de parte do serviço da dívida pública e privada e assim manter os credores. Além disso, foi utilizada para lograr a execução de políticas neoliberais de ajuste, que se tornaram condição para a concessão de ajuda (THORBECKE, 2000, p.28).

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28 No inicio dos anos 90, o processo de desenvolvimento ainda era bastante marcado pela estabilização e ajuste. Contudo, o cenário pós- Guerra Fria trouxe uma piora nas condições socioeconômicas de muitos países, o que impulsionou a volta da redução da pobreza – incluindo melhora na saúde, nutrição, educação e acesso a bens públicos – para o centro dos objetivos de desenvolvimento (THORBECKE, 2000, p.29 tradução livre; TARP, 2000, p.6). Mais uma vez a ajuda assumia o papel de prover os recursos necessários para redução dos níveis de pobreza e melhora na qualidade de vida. O foco foi para investimentos em infraestrutura social e serviços que iriam beneficiar as pessoas mais pobres (THORBECKE, 2000, p.33).

Ao longo de todas essas décadas, a ajuda já foi utilizada para as mais diversas funções, de acordo com a estratégia de desenvolvimento estabelecida. Mas observa-se que independentemente da sua atribuição estipulada, a ajuda manteve sua centralidade como um dos principais instrumentos – por vezes único instrumento e, até mesmo, de forma incoerente com outras ações internacionais – das estratégias de desenvolvimento estabelecidas pelos países desenvolvidos para os países periféricos. É possível notar, com os dados da Tabela 1, que ao longo das décadas houve o crescimento dos fluxos de Ajuda Oficial para o Desenvolvimento, o que confirma sua importância contínua.

Tabela 1 - Total de Ajuda Oficial Para o Desenvolvimento (em milhões de dólares americanos)

17

17 Fonte: Dados obtidos no OECD.stat. Tabela de autoria própria Disponível

(29)

29 1.5 A Ajuda no novo milênio: ODM e ODS

No fim dos anos 90, em preparação para o novo milênio, a OCDE lançou o documento Shaping the 21st Century: the contribution of development cooperation, e já

nos anos 2000, junto com a ONU, FMI e Banco Mundial, foi lançado o A better world

for all: progress towards the international development goal. Ambos contribuíram para

o que viria a ser a novo foco da comunidade internacional no que tange a busca por desenvolvimento: a Declaração do Milênio (CALIARI, 2013).

A colaboração mais concreta, contudo, foi o documento apresentado pelo então Secretário Geral Kofi Annan: We The Peoples: The Role of the United Nations in the

21st Century (CALIARI, 2013). Ele tratou da preocupação das Nações Unidas com os

seres humanos, e expôs “uma visão dos grandes desafios enfrentados pela sociedade global, determinou os diagnósticos das causas e designou as recomendações sobre como os desafios podem ser e enfrentados por meio de cooperação global” (SACHS, 2005, p.211, tradução livre). O texto serviu de base para a Declaração do Milênio, adotada pelos líderes mundiais reunidos em setembro de 2000 na sede das Nações Unidas em Nova Iorque. Esse documento estabeleceu objetivos a serem atingidos dentro de um tempo limite. Esses foram extraídos do documento para formarem os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) (SACHS, 2005, p.211).

Os sete primeiros ODMs expressam a noção de multidimensionalidade da pobreza, que não reside apenas na questão da renda, mas também na “vulnerabilidade a doença, exclusão da educação, fome crônica e subnutrição, falta de acesso a comodidades básicas como água limpa e saneamento, degradação ambiental como desmatamento e erosão da terra que ameaça a vida e os meios de vida” (SACHS, 2005, p.213). Já o ODM 8, de parcerias globais para o desenvolvimento, versa sobre os meios de implementação dos demais objetivos: a Ajuda Oficial para o Desenvolvimento; Comércio e acesso a mercado; sustentabilidade de dívidas, e seu possível perdão ou redução. 18

Caliari (2013, p.6) aponta que o ODM 8 foi necessário inclusive para que o documento tivesse maior apoio dos países em desenvolvimento, pois implicaria o compromisso dos países desenvolvidos. Ademais, ao estabelecer a AOD como um importante meio para atingir os objetivos acordados, a Declaração do Milênio deu um

18 We Can End Poverty. Goals 8: Develop a Global Partnership for development. Disponível em <http://www.un.org/millenniumgoals/global.shtml> Acesso em 09 de setembro de 2016.

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30 novo impulso ao futuro da Ajuda (RIDDELL, 2007, p.41). Caliari ratifica essa afirmação ao dizer que o ODM 8 contribuiu – ainda que pouco – para a construção de um consenso com relação a prioridade de AOD. Ele aponta ainda que as contribuições do ODM 8 para os demais meios de implementação – alívios de dívidas e acesso a mercado – são menos evidentes (CALIARI, 2013).

Contudo, as metas e indicadores do ODM 8 são vagos e com bem menos determinações que os demais. Carece de um estabelecimento quantitativo de metas com relação à ajuda, mesmo essas já tendo sido acordadas em diversas outras conferências, como o Consenso de Monterrey. Fukuda-Parr e Hulme atribuem essa ausência ao possível receio de que iria causar controvérsias políticas se fossem colocados números nesses indicadores dificultando, assim, a aprovação e o comprometimento dos líderes mundiais para com o documento (Fukuda- Parr and Hulme 2011, p.28 apud CALIARI, 2013, p.7).

A Ajuda Oficial para o Desenvolvimento também contou, no inicio do novo milênio, com o impulso das conferências sobre Financiamento para Desenvolvimento. A primeira ocorreu em Março de 2002, em Monterrey no México, onde foi estabelecido o Consenso de Monterrey. Nesse documento a AOD insere-se como uma das principais formas de financiar o desenvolvimento

A Ajuda Oficial para o Desenvolvimento (AOD) tem um papel essencial como fonte complementar de financiamento para o desenvolvimento, especialmente nos países que tem pouca capacidade de atrair investimento privado direito. AOD pode ajudar o país a atingir níveis adequados de recursos domésticos dentro de um período apropriado de tempo, enquanto capital humano, produtivo e capacidade de exportação são aumentadas. AOD pode ser crítica para melhorar o ambiente para a atividade do setor privado e pode assim abrir o caminho para crescimento robusto. AOD é um instrumento crucial para apoiar educação, saúde, desenvolvimento de infraestrutura pública, agricultura, desenvolvimento rural, e segurança alimentar. Para muitos países na África, os países menos desenvolvidos, pequenas ilhas em desenvolvimento, e países

landlocked em desenvolvimento, AOD é ainda a maior fonte de financiamento

externo e é critica para atingir os objetivos e metas da Declaração do Milênio 19

.

O documento acordado em Monterrey também ratificou a necessidade de esforços concretos para atingir a meta de 0.7% do PNB de países desenvolvidos em AOD para países em desenvolvimento e entre 0.15 e 0.20% do PNB em AOD para os países menos desenvolvidos 20. A segunda Conferência ocorreu em Doha no Catar, em 2008, e o documento resultante – Declaração de Doha sobre Financiamento para

19Monterrey Consensus on Financing for Development. Tradução livre Acesso em

http://www.un.org/esa/ffd/monterrey/MonterreyConsensus.pdf Disponível em 08 de setembro de 2016.

(31)

31 Desenvolvimento – reafirma o estabelecido em Monterrey e destaca os desafios que ficaram evidentes desde a última conferência, como crises financeiras, mudanças climáticas, volatilidade dos preços das commodities e reconstrução em contextos pós-conflitos21

.

Na mesma época em que se iniciaram as conferências sobre financiamento, também houve o estabelecimento de estudos que iriam atribuir grande foco a eficácia da ajuda na sua aplicação como instrumento para desenvolvimento (KEELEY, 2012, p.75). Foram realizados quatro Fóruns de Alto Nível sobre essa temática, que reuniram doadores, receptores, agências de ajuda e instituições multilaterais voltadas para o desenvolvimento. Os documentos resultantes desses encontros foram a Declaração de Roma sobre Harmonização (2003), Declaração de Paris (2005), Agenda de Ação de Accra (2008) e o Documento da Parceria de Busan para a Eficácia da Cooperação para o Desenvolvimento (2011).

A principal contribuição dos Fóruns foi o estabelecimento de cinco princípios cuja realização poderia contribuir para melhorar a eficácia da ajuda como instrumento para alcançar o desenvolvimento. Primeiro, o princípio de ownership, que propõe que os países parceiros – ou receptores – devem exercer liderança sobre as políticas e estratégias de desenvolvimento e coordenar as ações. Segundo, o alinhamento, cuja proposta é que os doadores baseiem a ajuda nas estratégias e instituições dos países parceiros e a mantenha untied e previsível. Terceiro, harmonização, de acordo com o qual a ação dos doadores deve ser mais harmonizada e transparente, visando inclusive à busca por complementaridade e divisão do trabalho de modo a evitar duplicidades. Quarto, o princípio da gestão voltada para resultados, ou seja, a administração dos recursos e a tomada de decisão devem ser focadas nos resultados a serem alcançados. O quinto e último princípio é de accountability mútua, em que tanto os doadores quanto os parceiros devem ser accountable.22

No ano de 2012 os líderes mundiais se reuniram no Rio de Janeiro, vinte anos após a Eco 92, para a Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável, ou Rio+20, em que se tratou do desafio de harmonizar crescimento econômico, inclusão social e sustentabilidade ambiental (SACHS, 2015, p.482). O documento gerado dessa

21 Doha Declaration on Financing for development. Disponível

em<http://www.un.org/esa/ffd/doha/documents/Doha_Declaration_FFD.pdf> Acesso em 08 de setembro de 2016.

22

The Paris Declaration on Aid Effectiveness. 2005. Disponível em< http://www.oecd.org/dac/effectiveness/34428351.pdf> Acesso em 08 de setembro de 2016.

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32 discussão foi o The Future We Want, por meio do qual “eles se comprometeram em revigorar a parceria global para desenvolvimento sustentável”. Além disso, reconheceram que o desafio fundamental ligado a isso seria o do combate à extrema pobreza, como já tratado nos ODM (SACHS, 2015, p.482).

Os líderes reunidos acreditaram que os ODM foram bem sucedidos em aumentar os esforços para acabar com a extrema pobreza, ainda que não desprovidos de criticas, e por isso, decidiram que precisavam de algo mais substancial para buscar o desenvolvimento sustentável nas suas três dimensões (SACHS, 2015, p.484). Assim, concordaram em realizar a transição dos ODM para os ODS, ou Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. A ideia dessa nova agenda pós-2015 era envolver um maior número de atores, incluindo não só “governos, mas empresários, cientistas, líderes da sociedade civil, ONGs e estudantes” (SACHS, 2015, p.484, tradução livre).

Além disso, os ODS têm o diferencial de lidar com questões universalmente aplicáveis, pois implicam objetivos que todos os países – desenvolvidos ou em desenvolvimento – terão que atingir: viver de forma sustentável, promover inclusão social, igualdade de gênero e sistemas de energia que são de baixa consumação de carbono (SACHS, 2015, p.484-485)

Os ODS foram estabelecidos na reunião de setembro de 2015 na sede das Nações Unidas em Nova Iorque, e já no dia 01 de Janeiro de 2016 entraram em vigor com a Agenda 2030 para Desenvolvimento Sustentável. Da mesma forma do ODM 8, que versava sobre meios de implementação, o ODS 17 trata das parcerias globais para que os outros 16 objetivos sejam atingidos. As metas específicas do ODS 17 foram dividas em quatro áreas: Finanças, Tecnologia, Capacity Building, Comércio e Questões Sistêmicas. No caso da primeira área, trata-se do fortalecimento de capacidade nacional para mobilizar recursos domésticos, como impostos; da assistência para obter sustentabilidade da dívida; e da Ajuda Oficial para o Desenvolvimento.

Diferentemente do ODM 8, o ODS 17 traz na sua meta pontos quantitativos, isto é, os valores acordados no Consenso de Monterrey:

Países desenvolvidos devem implementar plenamente os seus compromissos com a Ajuda Oficial para Desenvolvimento, incluindo o comprometimento [...] para atingir a meta de 0,7% de AOD/PNB para países em desenvolvimento e de 0.15 para 0,20 % de AOD/PNB para os países menos desenvolvidos23

23 Sustainable Development Goals. 17 goals to transform our world. Goal 17: Revitalize the global

partnership for sustainable development. Tradução livre Disponível em<http://www.un.org/sustainabledevelopment/globalpartnerships/> Acesso em 09 de setembro de 2016.

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33 De acordo com Olsen et al, os ODS tem uma ênfase maior nos meios de implementação do que os ODM (OLSEN et al, 2014, p.1), algo que fica claro ao analisar o maior detalhamento das metas. Contudo, uma problemática que permanece é o fato de tratar meios de implementação como um objetivo igual como os outros, que são fins e não meios. Há o risco de que passe a tratar o meio como um fim nele mesmo, ou seja, não analisar a sua efetividade a partir da sua relação como um instrumento para atingir os resultados dos demais objetivos (CALIARI, 2013, p.20).

No contexto da agenda pós-2015 também ocorreu a Terceira Conferência sobre Financiamento para Desenvolvimento, em Addis Ababa na Etiópia em Julho de 2015, resultando na Agenda de Ação de Addis Ababa. Ela reafirmou os compromissos de Monterrey e Doha, mas demonstrou uma atenção maior com a busca por desenvolvimento sustentável nas suas três dimensões – crescimento econômico inclusivo, proteção do meio ambiente e a promoção da inclusão social.24.

Considerando todo o expresso nesse capítulo, observa-se o quanto a ajuda tem sido considerada elemento fundamental nas estratégias de desenvolvimento, amparada em uma percepção que considera esse instrumento efetivo no estímulo ao desenvolvimento dos países periféricos. Entretanto, ao longo do mesmo período foram se avolumando críticas ao papel estratégico da ajuda, assim como aos seus efeitos reais. Estudos empíricos específicos tem buscado analisar os resultados produzidos pela ajuda em países receptores, da mesma forma que debates teóricos emergiram, a partir de concepções distintas daquelas que dão à ajuda esse papel de destaque na política internacional.

24 Addis Ababa Action Agenda. 2015. Disponível em<

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34 CAPÍTULO 2: A PERSPECTIVA PRÓ AJUDA: JEFFREY SACHS E A TEORIA DA MODERNZIAÇÃO

Maybe it´s having had the good experience of hearing, as I have many, many times, ‘impossible, impossible, impossible, impossible, impossible – obvious’. If you´ve gone through that over a period of twenty-five years, it helps you to filter out a lot of what you´re told. Everything seems impossible until it becomes inevitable (SACHS apud MUNK, 2013, p.7)

Neste capítulo será apresentada a perspectiva pró-ajuda a partir da análise da obra de Jeffrey D Sachs. O economista estadunidense é autor de referência para a formulação da agenda internacional de ajuda pela ONU e pela OCDE. Sachs foi conselheiro do Secretário Geral das Nações Unidas para os ODM e ODS e é um reconhecido defensor da ajuda como meio de implementação desses grandes planos de desenvolvimento da ONU.

2.1: O economista do ‘choque’ para a sua nova missão: acabar com a extrema pobreza na nossa geração.

Jeffrey David Sachs formou-se em economia pela Universidade de Harvard no ano de 1976, e logo foi eleito Harvard Junior Fellow. Já em 1983 concluiu seu Ph.D em macroeconomia internacional e assumiu oficialmente o posto de professor da instituição (MUNK, 2013). Não demorou até que Sachs iniciasse os seus trabalhos fora da academia. Em 1985 foi convidado a ir a Bolívia, atuar como conselheiro do presidente Victor Paz para encontrar uma solução para a grave crise econômica. Sachs então traçou um plano de austeridade bastante radical com forte disciplina fiscal e monetária focando em combater a hiperinflação (MUNK, 2013, p.11-12). Já em 1989 foi a Polônia, buscando oferecer a mesma consultoria para ‘salvar’ a economia polonesa, e junto com David Lipton delineou o “Plano Sachs de estabilização” (MUNK, 2013, p.12) .

Ele realizou uma verdadeira terapia de choque nesses países, o que lhe deu a fama de herói das economias em crise na década de 80 e a alcunha de Doutor Choque (MUNK, 2013, p.15). Foi então que Sachs tornou-se uma celebridade internacional com diversas referências na mídia. Vale salientar, contudo, que ele já era uma figura controversa, recebendo diversas críticas com relação aos seus planos e às suas ações consideradas por alguns como ‘exibicionismo’ (MUNK, 2013, p.15).

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35 No começo dos 90 foi chamado por Boris Yeltsin para realizar sua assessoria na Rússia. Ele trabalhou no período com diversos outros economistas e pensava dentro da mesma cartilha aplicada na Polônia e na Bolívia, isto é, que o país deveria seguir o pilar de privatização, liberalização e estabilização. Contudo, a economia russa não apresentou os resultados esperados com a reforma e seguiu em forte crise (MUNK, 2013, p.17). De acordo com Nina Munk, Sachs reconhece que o plano foi um fracasso, mas ele acredita que não deve ser o culpado por isso, pois não tinha poder de decisão e não teve suas ideias aplicadas (MUNK, 2013, p.18).

Foi apenas no de 1995, que Jeffrey Sachs fez sua primeira viagem para a África Subsaariana, quando foi convidado a visitar a Zâmbia. Para um economista que havia nascido e crescido nos EUA, estudado em Harvard, se especializado em questões macroeconômicas e trabalhado em planos de estabilização, a experiência provocou grande mudança na sua produção acadêmica. Foi como se ele tivesse finalmente acordado para uma realidade que, apesar de estar ali há muito tempo, era brutalmente ignorada: “what the hell is going on here? I hadn´t realized that we were leaving so

many millions of people die every year. I had no idea” (SACHS apud MUNK, 2013,

p.18).

Ao ‘conhecer’ aquela realidade, ele passou a acreditar e afirmar que a cartilha neoliberal de livre comércio, abertura de mercados, desregulamentação, privatização e disciplina fiscal podem não ser o suficiente para resolver os problemas de algumas partes do mundo (MUNK, 2013, p.19). Ele expôs, em 2000, que essas reformas funcionavam se o seu país é a Polônia, mas “não é a resposta se o seu país é a Tanzânia, onde a população sofre de malária holoendêmica, esquistossomose e tudo mais que se pode imaginar” (SACHS, apud MUNK, 2013, p.19, tradução livre).

Toda essa situação provocou o ímpeto de Sachs de ‘salvar’ aquele povo, como ele acreditava que estava fazendo com os planos de estabilização. Assim, passou a estudar sobre saúde global e desenvolvimento (MUNK, 2013, p.29) e deu início a sua ‘missão’ de acabar com a extrema pobreza. Já no final dos anos 90, ele coordenou a Comissão de Macroeconomia e Saúde, que resultou no importante documento publicado em 2001 pela Organização Mundial de Saúde: Macroeconomics and Health: investing

in health for economic development (MUNK, 2013, p.30).

Já nos últimos meses de trabalho na Comissão, Sachs se reunia com o então Secretário Geral da ONU Kofi Annan, e em um desses encontros, no fim do ano 2001, questionou o que poderia fazer para ajudar na complexa tarefa de levar o mundo a

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36 atingir seus anseios do novo milênio. Então, Sachs assumiu o papel de assessor especial para os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, para aconselhar a todo o sistema ONU quais ações deveriam ser tomadas para atingir esses objetivos (SACHS, 2005, p.222). Foi então que deu origem do UN Millennium Project, focado em traçar um plano para alcançar os ODM.

Na mesma época Jeffrey Sachs recebeu outra proposta que iria harmonizar bastante com seu novo foco de trabalho: George Rupp, então presidente da Universidade de Columbia de Nova Iorque, o convidou para assumir a direção do

Columbia´s Earth Institute. O instituto é uma iniciativa da universidade para conectar

diversos departamentos científicos em prol de estudos e ações conjuntas sobre os desafios do clima, gerenciamento ambiental, conservação, saúde pública e desenvolvimento econômico (SACHS, 2005, p.223). Ambos os seus novos trabalhos se articularam bastante, de modo que muito do que foi aplicado no UN Millennium Project adveio de pesquisas do Earth Institute.

Sachs buscou difundir a ideia de que nossa geração pode acabar com a extrema pobreza, e que para isso, será necessário um esforço conjunto. Em conversa com Gerry Lenfest, Sachs o convenceu a apostar em sua empreitada, o que resultou na doação de $5 milhões por parte da Fundação Lenfest. O valor foi utilizado por Sachs para aplicar suas ideias em poucas vilas da África Subsaariana, por meio do chamado Millenium

Villages Project, e consistia na alocação de 120 dólares por pessoa por ano, durante 5

anos, para implementar os seus planos (MUNK, 2013, p.37).

A primeira Vila do Milênio foi lançada em 2005, em Sauri no Quênia. O economista estava convencido de que conseguiria vencer a extrema pobreza naquela vila e que assim poderia replicar esse modelo em diversos locais. Os resultados iniciais começaram a aparecer e encorajaram doadores, o que permitiu iniciar o projeto em outras localidades (MUNK, 2013, p.38,39).

Foi também nesse período que Jeffrey D. Sachs lançou seu livro: The End Of

Poverty: Economic Possibilities for Our time (2005), onde ele expõe seu argumento

sobre o que precisa ser feito para acabar com a extrema pobreza. Em um contexto mais recente, na formação da agenda pós-2015, o economista também segue com intensa participação. Após a Rio+20, Sachs foi encarregado por Ban Ki Moon, Secretário Geral das Nações Unidas, para criar a Sustainable Development Solutions Network (SDSN), uma rede global para solução de problemas relacionados ao desenvolvimento sustentável e para propor o que viriam a ser os Objetivos de Desenvolvimento

Referências

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