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PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO

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PODER JUDICIÁRIO

SÃO PAULO

SEGUNDO TRIBUNAL DE ALÇADA CIVIL Décima Câmara

APELAÇÃO COM REVISÃO Nº578.116-0/5 – JUNDIAÍ Apelante: Elialdo Fonseca

Apelado : SERMAC Empreendimentos, Participação e Negócios S/C Ltda.

AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. Art. 331 do Cód. de Proc. Civil. Pressupõe a impossibilidade de julgamento antecipado da lide e a necessidade de produzir-se prova. Sendo facultado o julgamento antecipado diante dos fatos e documentos trazidos à apreciação do Magistrado, dispensável a audiência de conciliação.

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONVERSÃO EM AÇÃO DE DEPÓSITO. O Requerido não negou as obrigações assumidas e deixou de entregar o veículo ou consignar-lhe o equivalente em dinheiro. Preferiu contestar a ação, alegando mas não demonstrando quantum satis, como lhe competia, a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do Autor. Nada fez, aproveitando-se para insuflar ainda maior tumulto no processo. A falta de atendimento à obrigação remanescente, ainda que questionando seu montante, resulta na necessária procedência da ação como decretado em primeiro grau. PRISÃO CIVIL. A imposição da pena de prisão, conforme jurisprudência, perde aos poucos o caráter polêmico, uma vez que os julgamentos recentes têm orientado pela inviabilidade da prisão do devedor na alienação fiduciária em garantia.

Voto nº 4.138 Visto.

SERMAC EMPREENDIMENTOS, PARTICIPAÇÃO E NEGÓCIOS S/C LTDA. ingressou com ação de Busca e Apreensão contra ELIALDO FONSECA, caracteres e qualificação das partes nos autos. Convertida em Ação de Depósito, formalizada a angularidade, encartada a contestação, que foi impugnada, houve entrega da prestação jurisdicional julgando procedente a pretensão e condenando o Requerido a restituir o bem ou seu equivalente em dinheiro, acrescido dos encargos legais, sob pena de prisão, e ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios de 10% sobre o valor do débito.

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nulidade da sentença por não ter sido designada audiência de conciliação; o veículo, objeto do mandado de busca e apreensão não é o descrito no contrato.

SERMAC EMPREENDIMENTOS, PARTICIPAÇÃO E NEGÓCIOS S/C LTDA. apresentou contrariedade, ponderando sobre a desnecessidade da designação de audiência de conciliação em face da confissão, e que o bem foi substituído por opção do Apelante.

É o relatório, adotado no mais o da r. sentença.

O julgamento antecipado e/ou no estado da lide atendeu ao prudente arbítrio do julgador. Não houve cerceamento de defesa de qualquer ordem. Sentiu-se habilitado à entrega da prestação jurisdicional diante das provas existentes. Cumpriu a norma do art. 330 do Cód. de Proc. Civil1. Trata-se ação instruída com robusta prova

material que lhe ofereceu elementos de convicção e a possibilidade do julgamento no estado da lide.

A produção de provas deve evidenciar um âmbito, ou uma extensão de imperiosidade, suficiente para aferir-se sobre a possibilidade de ser alijada a prova documental. É o entendimento doutrinário e jurisprudencial dominante.

“Julgamento antecipado da lide. Presentes os requisitos legais (artigo 330 do Código de Processo Civil) e as condições que ensejam o julgamento antecipado da causa, é dever do juiz, e não mera faculdade de assim proceder. Precedente Jurisprudencial. Presença de elementos hábeis a possibilitar o julgamento da matéria no estado em que se encontrava. Inexistência de Cerceamento de Defesa. Recurso desprovido 2”.

Sendo facultado o julgamento antecipado diante dos fatos e documentos trazidos à apreciação do Magistrado, dispensável a audiência de conciliação prevista no art. 331, do Cód. de Proc. Civil.

”Havendo possibilidade de julgamento antecipado da lide, por se tratar a matéria dos autos exclusivamente de direito, não há que se falar em cerceamento de defesa pela ausência de audiência de tentativa de conciliação, prevista

1 - Art. 330. O juiz conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença: I - quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência.

2 - TJ/SP – Ap. Cível nº 1.271-4 - 7ª Câm. Dir. Priv. - Rel. Des. JÚLIO VIDAL – J. 18.6.97.

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no artigo 331, do Código de Processo Civil, e da audiência de instrução 3”.

“Não é nulo o processo por não realizada audiência de tentativa de conciliação (artigo 331 do Código de Processo Civil), se o julgamento foi antecipado na forma do artigo 330 4”.

“A realização da audiência de que trata o art. 331, do Cód. de Proc. Civil, só se faz necessária para a hipótese de ter de ingressar o feito na sua fase instrutória 5”.

O veículo, objeto do consórcio, grupo 60, cota 90, controle GG, referia-se à marca Volkswagen, modelo Gol 1000, movido a gasolina (folhas 11/12). Contemplado,

recebeu o Apelante carta de crédito com liberdade de escolha de veículo. Optou pelo automóvel marca Volkswagem, modelo Santana-CL, que licenciou em seu nome com alienação fiduciária em favor da Apelada (folha 14).

Falto de razão e sem bom senso jurídico a afirmação das razões “... Sem contar a divergência que se verifica entre o automóvel objeto do contrato de adesão e o apontado na lide para busca e apreensão ...” (folha 82).

Sobre a dívida, diante da sustentação formal do Apelante de que “... mais prudente seria mesmo a audiência de conciliação entre as partes a fim de que, em comum acordo, perante o digno Juízo pudessem negociar o saldo devedor ...” (folha 82 – Grifou-se), desnecessário alongar-se em outras considerações, de

maneira especial em face das provas dos autos.

Evidencia-se, sem esforço, o propósito irregular do malconduzido Apelante, inadimplente, em dificultar o cumprimento da medida judicial de apreensão do veículo. A alegação de “... que o mesmo se encontra no Estado

3 - 2º TACivSP - Ap. s/ Rev. 480.109 - 12ª Câm. - Rel. Juiz LUÍS DE CARVALHO - J. 7.8.97. No mesmo sentido: JTA 159/483 (em.); Ap. c/ Rev. 445.393 - 6ª Câm. - Rel. Juiz PAULO HUNGRIA - J. 13.2.96; Ap. s/ Rev. 456.657 - 6ª Câm. - Rel. Juiz CARLOS STROPPA - J. 2.7.96; Ap. s/ Rev. 463.983 - 3ª Câm. - Rel. Juiz JOÃO SALETTI - J. 15.10.96; Ap. s/ Rev. 467.945 - 3ª Câm. - Rel. Juiz JOÃO SALETTI - J. 3.12.96; AI 472.699 - 8ª Câm. - Rel. Juiz MILTON GORDO - J. 12.12.96; Ap. s/ Rev. 496.479 - 7ª Câm. - Rel. Juiz S. OSCAR FELTRIN - J. 23.9.97; Ap. s/ Rev. 502.894 - 11ª Câm. - Rel. Juiz ARTUR MARQUES - J. 15.12.97; Ap. c/ Rev. 501.374 - 11ª Câm. - Rel. Juiz MENDES GOMES - J. 15.2.97; Ap. c/ Rev. 497.704 - 3ª Câm. - Rel. Juiz CAMBREA FILHO - J. 25.11.97; Ap. s/ Rev. 507.174 - 3ª Câm. - Rel. Juiz JOÃO SALETTI - J. 27.1.98.

4 - 2º TACivSP - Ap. s/ Rev. 496.032 - 3ª Câm. - Rel. Juiz JOÃO SALETTI- J. 2.12.97. No mesmo sentido: JTA 154/303 (em); Ap. s/ Rev. 441.235 - 4ª Câm. - Rel. Juiz RODRIGUES DA SILVA - J. 28.11.95.

5 - 2º TACivSP - Ap. s/ Rev. 487.127 - 4ª Câm. - Rel. Juiz MOURA RIBEIRO - J. 30.7.97.

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do Piauí, onde foi envolvido em acidente e danificado ...” (folha 21),

também sem comprovação técnica, não pode afastar as cláusulas do contrato que, livre e espontaneamente firmou, para aquisição do bem.

O Requerido não negou as obrigações assumidas e deixou de entregar o veículo ou consignar-lhe o equivalente em dinheiro. Preferiu contestar a ação,

alegando mas não demonstrando quantum satis, como lhe

competia, a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do Autor.

Nada fez, aproveitando-se para insuflar ainda maior tumulto no processo. A falta de atendimento à obrigação remanescente, ainda que questionando seu montante, resulta na necessária procedência da ação, como decretado em primeiro grau.

O saldo do valor financiado não altera o deslinde da controvérsia. Importa é que o bem foi oferecido na sua integralidade, e assim mesmo é que se deve ser restituído. Se os valores não são pacíficos, que se discuta sobre eles em ação própria com esse específico propósito.

“O que deve ser entregue, na ação de depósito, é o próprio bem. Caso haja impossibilidade de assim proceder o valor em dinheiro deve corresponder ao da própria coisa objeto da alienação, sem qualquer relação com a dívida em aberto 6”.

A Constituição Federal de 18.9.46, dispunha no artigo 153, § 17:

"Não haverá prisão civil por dívida, multa ou custas, salvo o caso do depositário infiel ou do responsável pelo inadimplemento de obrigação alimentar, na forma da lei".

A Lei nº 4.728, de 14.7.65, com a redação dada pelo Decreto-lei nº 911, de 1º.10.69, constituiu a figura do

"Depositário Infiel". Seguiram-se reiteradas decisões, inclusive do Supremo Tribunal Federal, entendendo que não ofendia a Constituição Federal o decreto de prisão civil do devedor alienante fiduciário.

A Constituição Federal de 5.10.88, dispõe no artigo 5º, inciso LXVIII:

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"Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel".

O Decreto Legislativo nº 27, de 26.5.92, do Congresso Nacional, aprovou o Pacto de São José da Costa Rica. O Brasil fez o depósito da Carta de Adesão à Convenção em 25.9.92, com determinação para o seu cumprimento através do Decreto nº 678, de 6.11.92, publicado no DOU de 9.11.92, págs. 15.562 e seguintes, que diz em seu artigo 71:

"Ninguém deve ser detido por dívidas, exceto em cumprimento de mandado expedido pela autoridade judiciária, em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar".

O Constituinte de 1988 retirou do inciso LXVIII, do artigo 5º, da Constituição Federal, a expressão "na forma da lei". Essa circunstância autoriza uma interpretação diversa daquela que era adotada pelos Tribunais, por se tratar de norma constitucional de exceção.

Esse desvio da regra constitucional tornou impossível a figura do depositário infiel pela legislação ordinária, não mais se justificando um conceito abrangente do contrato de depósito. Diz Carlos Maximiliano7:

"Interpretam-se estritamente os dispositivos que instituem exceções às regras gerais firmadas pelo Constituição. Assim se entendem os que favorecem algumas profissões, classes, ou indivíduos, excluem outros, estabelecem incompatibilidades, asseguram prerrogativas, ou cerceiam, embora temporariamente, a liberdade, ou as garantias da propriedade. Na dúvida, siga-se a regra geral".

O preceito, por excepcionar o sentido protetivo dos direitos individuais consagrados sob o título Dos Direitos e Garantias Individuais, não se torna compatível com uma interpretação extensiva. No artigo 5º, inciso XII, a Constituição Federal transferiu ao legislador ordinário os casos em que permite violação "... nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal". Logo, a lei ordinária não pode ampliar os casos de constrangimento.

A doutrina e a jurisprudência orientam pela

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inexistência de depositário infiel na alienação fiduciária em garantia.

Paulo Restiffe Neto e Paulo Sérgio Restiffe sustentam:

"a) É constitucional a permissão de prisão civil do infiel depositário.

b) Entretanto, no plano infraconstitucional, como tratado internacional, com eficácia no direito doméstico brasileiro, o Pacto de São José da Costa Rica está em plena vigência como norma de caráter geral e, assim, derrogou todas as previsões legislativas de caráter de lei geral sobre prisão civil e os procedimentos para sua aplicação, por infidelidade depositária, inclusive e principalmente o art. 1.287 do C.C. e os arts. 885, par. ún., 902, § 1º, e 904, par. ún., todos do CPC.

c) O Dec.-lei 911/69, muito embora seja lei especial - não revogável diretamente por lei de caráter geral, como é o caso do Pacto de São José da Costa Rica, foi esvaziado reflexamente por não cominar a prisão civil do infiel depositário, mas tão-somente, fazer remissão à fonte cominatória derrogada (Códigos Civil e Processual Civil), de modo que a remissão à responsabilidade imposta pela lei civil geral e à forma de sua aplicação, feita no Dec.-lei 911/69, cai no vazio.

d) Logo, não há responsabilidade civil cujo cumprimento possa ser exigível coercitivamente sob cominação de prisão civil, seja no depósito genuíno, seja no depósito derivado, como no da alienação fiduciária em garantia, penhor mercantil, rural etc, até que outra norma revogue o Pacto de São José da Costa Rica, repristinando a antiga redação do art. 1.287 do CC e preenchendo o vazio deixado nos arts. 885, 902 e 904 do CPC 8”.

José Paulo Cavalcanti escreve:

"Em conseqüência, na chamada alienação fiduciária em garantia na verdade o credor nem é proprietário antes do inadimplemento do devedor, nem pode tornar-se proprietário depois desse inadimplemento. Chega-se à conclusão de que se trata de um autêntico penhor sem tradição da coisa (pág. 17)9".

Álvaro Vilaça Azevedo afirma:

"Se, como visto, malgrado a alienação do bem fiduciário, pelo fiduciante ao fiduciário, e ainda que seja considerado possuidor indireto e titular de propriedade resolúvel, não pode o mesmo fiduciário credor ser privado,

8 - Revista dos Tribunais, vol. 756/37-52.

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pela mesma lei, de ficar com o bem fiduciado, em caso de inadimplemento do devedor.

A condição primordial de qualquer proprietário é de possuir o pleno poder sobre o seu objeto (plena in re potestas).

Ora, a alienação, ainda que fiduciária e ainda que criando propriedade resolúvel, implica a idéia de ser proprietário o credor fiduciário 10".

Antônio Janyr Dall'Agnol Júnior diz:

"A partir da vigência da Constituição de 1988 não mais se viabiliza a prisão civil do alienante fiduciário, porque depositário não é, restringindo-se o meio coercitivo às hipóteses estritas de depósito, conforme se infere da consagração dada ao princípio da vedação de prisão civil por dívida pelo art. 51, LXVII11".

O Superior Tribunal de Justiça decidiu:

"A inserção das leis no ordenamento jurídico pode evidenciar alguma dificuldade na compatibilização das novas normas com o sistema vigente, especialmente quando a novidade bate de frente com antigos institutos, estruturadores do sistema.

É o que acontece com a lei sobre a alienação fiduciária, cujo objetivo evidente foi o de reforçar as garantias do credor, inclusive com a possibilidade de o devedor ser recolhido à prisão por até um ano. Constituindo-se as nossa casas prisionais, no dizer de ex-Ministro da Justiça, 'verdadeiras sucursais do inferno', pode-se bem medir a gravidade da ameaça que pesa sobre o pequeno comerciante, a dona de casa que compra uma geladeira, o agricultor de cinco hectares, inadimplentes por qualquer razão, que são os que realmente sofrem essa espécie de sanção, exatamente por serem pequenos. Na realização do seu intuito, o legislador da alienação fiduciária optou por transformar o credor em proprietário do bem dado em garantia, e o devedor em depositário, quando, na verdade, não há nem propriedade, nem depósito.

Não é proprietário aquele que, ao retomar a posse do bem, através de ação de busca e apreensão, não pode ficar com a coisa para si, estando obrigado a vende-la a terceiros, cujo preço assim obtido também não é seu se não na medida do seu crédito (porque ele sempre apenas foi um credor), devendo repassar o saldo ao devedor, que o recebe apenas por ser o proprietário. Não sendo o credor proprietário, não poderia ele ter dado a coisa em depósito.

10 - Ilegalidade da Prisão Civil por Dívida na Alienação Fíduciáría em Garantia. Repertório de Jurisprudência, nº 23, pág. 461.

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Ainda que o fosse, o contrato de depósito também não se constituiu porque a obrigação do depositário, que é a de restituir a coisa, igualmente não existe, pois o pagamento do débito elimina a hipótese de restituição 12".

Ainda, da jurisprudência:

“Na alienação fiduciária em garantia não se tem um contrato de depósito genuíno, não estando o devedor fiduciante na situação jurídica de depositário 13”.

Diz Decreto-lei nº 911, de 1º.10.69:

“Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na posse do devedor, o credor poderá requerer a conversão do pedido de busca e apreensão, nos mesmos autos, em ação de depósito, na forma prevista no Capítulo II, do Título I, do Livro IV, do Código de Processo Civil 14”.

Dispõe Código de Processo Civil:

“Julgada procedente a ação (de depósito), ordenará o juiz a expedição de mandado para a entrega, em vinte e quatro (24) horas, da coisa ou do equivalente em dinheiro.

Parágrafo único. Não sendo cumprido o mandado, o juiz decretará a prisão do depositário infiel 15”.

Explica Pontes de Miranda:

“Sempre que se trata de dívida, no sentido estrito, e não entrega do bem alheio, a prisão por dívida é constitucionalmente proibida. Salvo se por dívida de alimentos. Noutros termos: se a ação executiva seria pessoal, sem ser por alimentos, incide o art. 150, § 17, da Constituição de 1967; se a ação executiva é real, não. O que faltou à 1ª Câmara Cível da Côrte de Apelação do Distrito Federal foi exatamente atender a que “dívida”, no art. 150, § 17, como no art. 113, 30), da Constituição de 1934, está em sentido estrito (dívida correspondente a direito pessoal).

O texto emprega a expressão “depositário infiel”, mas em sentido genérico. Portanto, não ofende a Constituição de 1967, art. 150, § 17, a regra jurídica sobre prisão civil por se recusar o depositário, extrajudicial ou judicial, a devolver o que recebeu, ou aquilo que lhe foi, por sucessão, às suas mãos; como também não a infringe a regra jurídica, que a crie ou mantenha, para aqueles casos em que o possuidor ou tenedor de coisa alheia responde como o depositário. Na técnica legislativa, responde como

12 - STJ, REsp. nº 54.618-4-RS, Rel. Ruy Rosado de Aguiar. 13 - RT. 728/176.

14 - Artigo 4º.

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depositário que recusa entrega do bem alheio 16”.

É o que também se verifica da obra de Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins:

“A base subjacente a esta relação contratual é a confiança.

Na verdade, o bem não vem às mãos do depositário senão em razão da grande confiabilidade que ele mereça. É esta a razão pela qual o Texto Constitucional abre uma exceção para tratar de maneira severa o depositário infiel, é dizer: aquele que não devolve a coisa que possua nesta qualidade, embora reclamada pelo depositante.

A expressão depositário infiel é utilizada de maneira ampla pela Constituição, dando assim margem à lei ordinária para que possa cominar a pena de prisão a modalidades diferentes de depósito.

O depositário infiel pode muito facilmente ser capitulado em uma figura delituosa, como por exemplo a de apropriação indébita. Mas o que a Constituição quis foi, independentemente de criminalização deste comportamento, munir o depositante de medida judicial que lhe possibilite recuperar o bem depositado. É um comportamento extremamente desleal este de alguém, mercê de uma confiança nele depositada, deixar de restituir bem cuja guarda lhe cabia.

É portanto ainda aqui uma prisão sem caráter apenatório, mas tão-somente dissuasório. Objetiva a remover os óbices que o depositário esteja criando à restituição da coisa 17”.

Admitindo-se que a lei pode impor a pena de prisão para modalidades diferentes de depósito, a solução que se deduz pela razão está voltada ao exame imperioso se existe depósito na alienação fiduciária em garantia.

Sobre o depósito sustenta Orlando Gomes:

“Pelo contrato de depósito recebe alguém objeto móvel para guardá-lo e restituí-lo, por certo prazo.

Quem entrega a coisa para ser guardada chama-se depositante. Quem a recebe, para tê-la em custódia, depositário.

O termo depósito emprega-se em duplo sentido. Ora significa a relação contratual; ora, seu objeto.

O contrato perfaz-se com a entrega da coisa.

Podem ser objeto de depósito, entre nós, somente

16 - Comentários à Constituição de 1967, tomo V, pág. 252, Editora Revista dos Tribunais, 1968.

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as coisa móveis. A limitação, como se verá adiante, quadra melhor à função econômico-social do contrato. Em algumas legislações permite-se, contudo, o depósito de imóveis.

A guarda deve ser temporária, uma vez que é da essência do contrato a obrigação de restituir a coisa depositada. Todavia, pode ser estipulado por prazo determinado ou indeterminado.

A característica do depósito é a obrigação de custódia. Distingue-se do mandato e do comodato, porque não têm estes como causa a guarda e conservação das coisas, posto envolvam-nas18”.

Ao analisar o artigo 1.275 do Código Civil, Clóvis Bevilaqua torna bem visível que a essência do depósito é a guarda da coisa:

“Mas, em verdade, se ao depositário se concede o direito de usar da coisa, já não haverá depósito, e sim comodato se a coisa for infungível e o uso gratuito; locação, se oneroso for o uso; mútuo, se for a coisa fungível. A essência do depósito é a “custodia rei”, a guarda da coisa 19”.

Na alienação fiduciária em garantia o devedor fiduciante não recebe a coisa para guardar, mas para usar; não está adstrito a devolvê-la; não pode ser privado da posse se cumprir as obrigações assumidas. Orlando Gomes distingue:

“Um dos elementos essenciais do contrato de depósito, que o diferencia do comodato, é o fim de custódia. O depositário recebe a coisa para guardá-la, não para usá-la. No entanto, o fiduciante conserva a posse dos bens alienados, não para tê-la sob sua guarda20”.

O depósito na alienação fiduciária em garantia está tecnicamente descaracterizado, circunstância que não autoriza a prisão do devedor.

A jurisprudência perde aos poucos o caráter polêmico, uma vez que os julgamentos recentes têm orientado pela inviabilidade da prisão do devedor na alienação fiduciária em garantia.

“ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. Prisão civil. Inadmissibilidade. A relação que se estabelece na alienação fiduciária não permite nela se reconheça um contrato de depósito, pelo que descabe a prisão civil do devedor inadimplente. Nova orientação da Quarta Turma. Recurso

18 - Contratos, pág. 378, 12ª edição.

19 - Código Civil Comentado - vol. V - 9ª edição (Comentários ao art. 1275). 20 - Alienação Fiduciária em Garantia, pág. 110, 4ª edição.

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conhecido pela divergência, mas provido21”.

“Hábeas Corpus. Prisão civil. Alienação fiduciária. Não há relação de depósito na alienação fiduciária e por isso descabe a prisão civil do devedor. Nova orientação da Quarta Turma. Ordem concedida. Voto vencido 22”.

“Alienação Fiduciária. Prisão civil. Inadmissibilidade. Devedor fiduciante que não pode ser equiparado ao depositário infiel. Regra do art. 1º do Dec.-lei 911/69 que não foi recepcionada pela nova ordem constitucional. Inteligência dos arts. 1.265 e 1.287 do CC e do art. 5º, LXVII, da CF. Ementa Oficial. Segundo a ordem jurídica estabelecida pela Carta Magna de 1988, somente é admissível prisão civil por dívida nas hipóteses de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e de depositário infiel (CF, art. 5º, LXVII). O devedor-fiduciante que descumpre a obrigação pactuada e não entrega a coisa ao credor-fiduciário não se equipara ao depositário infiel, passível de prisão civil, pois o contrato de depósito, disciplinado nos arts. 1.265 a 1.287, do CC, não se equipara, em absoluto, ao contrato de alienação fiduciária. A regra do art. 1º do Dec.-lei 911/69, que equipara a alienação fiduciária em garantia ao contrato de depósito, perdeu a sua vitalidade jurídica em face da nova ordem constitucional23”.

Conclui-se que a conversão da ação de busca e apreensão em ação de depósito seria ato inóxio, não tivesse outros elementos essenciais, como bem explica Adroaldo Furtado Fabrício:

“PRISÃO, ELEMENTO NÃO-ESSENCIAL - Temos insistentemente destacado que uma das grandes inovações do Código em tema de ação de depósito está na facultatividade, agora introduzida, do pedido cominação de prisão. Outra está na supressão da cominação e imposição da pena em caráter liminar.

O direito anterior fazia dessa cominação elemento essencial, caraterístico, da ação de depósito, que sem aquela restaria desfigurada. E, por outro lado, como que presumia até prova em contrário a infidelidade do depositário, a partir da simples propositura da ação, pois o procedimento começava já pela cominação.

Hoje, deixou aquele elemento de ser essencial à

21 - STJ, REsp nº 191407/MG (1998/0075332-0), J. 22.3/99, pág. 00124, Rel. Min. RUY ROSADO DE AGUIAR. (Data da decisão 1º.12.98.

22 - STJ, HC nº 7812/GO (1998/0058556), j. 12.4.99, pág. 00151. Rel. Min. RUY ROSADO DE AGUIAR. Data da decisão 17.11.98.

23 - STJ, RHC nº 6.676-SP, 6ª Turma, j. 24.11.97, Rel. Min. Vicente Leal, DJU 19.12.97.

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ação de depósito, podendo ela existir sem o pedido de cominação e, pois, sem esta, e por via de conseqüência sem a possibilidade de prisão, mesmo quando proclamada pela sentença a infidelidade do depositário. Outrossim, só a sentença pode caracterizar essa infidelidade, e por causa dela cominar a pena de prisão - ainda sem aplicá-la, contudo.

Resulta dessa facultatividade do pedido cominatório que, em sua falta, a sentença de procedência da ação, sem poder sequer cogitar da cominação de pena, simplesmente ordenará a expedição do mandado de entrega, desprovido de qualquer sanção específica para o caso de seu descumprimento. Embora omitida a ressalva no parágrafo único, portanto, ele só pode incidir se tiver sido formulado o pedido correspondente. Não é preciso insistir em que tudo isso, naturalmente, nada tem a ver com a possível responsabilidade penal do depositário, nem com as sanções de ordem criminal que lhe possam ser aplicadas segundo as regras próprias de direito material e processual 24”.

Esta E. Câmara tem decidido em igual sentido.

“Alienação fiduciária em garantia. Prisão civil. Inviabilidade. O devedor fiduciante não é depositário e por isto não está sujeito à prisão civil. Depósito. O valor a ser depositado se não localizado o bem é o seu preço de mercado. Litigância de má-fé. Oposição injustificada à solução do litígio. Multa. Recuso parcialmente provido 25”.

“Meu voto converge com o do nobre Relator no sentido de também não decretar a prisão civil do devedor fiduciante, a meu ver incabível em qualquer caso, nos termos seguintes.

Inúmeros os vv. acórdãos a respeito, em ambos os sentidos, não se esquecendo de que o E. STF, hoje em dia, por maioria, tem admitido a prisão civil, considerando-se como recepcionado o Dec.-lei 911/69 à atual ordem constitucional (v.g., H.C. nº 70.625-8/130 - SP, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA; j. 22.10.93; H.C. nº 71.286 - MG - Rel. Min. FRANCISCO REZEK - j. 30.08.94; etc.).

No entanto, é preciso atentar em profundidade para a natureza do suposto depósito criado pelo Dec.-lei 911/69, para se concluir que não se trata disso, mas de mera garantia ao credor fiduciário, como decidido com acerto no AI nº 536.643-8, do E. 1º TAC, de que se tira o seguinte trecho, do voto vencedor do digno Juiz ANTONIO DE PÁDUA FERRAZ NOGUEIRA:

24 - Comentários ao Código de Processo Civil, vol. VIII, pág. 264, Forense, 1980. 25 - 2ºTACivSP - 10ª Câm. - Ap. c/ Rev. nº 551.331 - Rel. Juiz NESTOR DUARTE.

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PODER JUDICIÁRIO

SÃO PAULO

SEGUNDO TRIBUNAL DE ALÇADA CIVIL Décima Câmara

‘A prisão civil na alienação fiduciária decorre de evidente artifício odioso, oriundo de prepotência do poder econômico imperante no chamado capitalismo selvagem’.

‘A figura do depositário, no caso, não se faz presente, em essência, de modo a se poder conceituá-lo como infiel. Daí, aliás, não tendo o texto constitucional - desta e da anterior ‘Magna Lex’ - caracterizado o que seja o depositário infiel, remeter o seu exame para o caso concreto a ser tratado pela lei ordinária, albergando, desde logo, o conceito constante do Código Civil (art. 1282 e seguintes)’.

(...)

‘A equiparação do simplesmente devedor ao depositário fiduciante, via de conseqüência, é ilegal e deve ser banida do nosso direito pátrio, principalmente depois da volta ao Estado de Direito. Não mais se pode, assim, conceber a ação de cobrança sob ameaça de prisão, com o artifício da alienação fiduciária prevista no artigo 4º do Decreto-lei nº 911/69’.

‘Princípio fundamental de hermenêutica, a ser aplicado também na hipótese, encontramos no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil: “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum ...26”.

Em face ao exposto, rejeitada a matéria considerada preliminar, dá-se parcial provimento ao recurso, excluída a cominação de prisão.

IRINEU PEDROTTI Relator

Referências

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