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REVISÃO SISTEMÁTICA ACERCA DA SAÚDE MENTAL DAS MULHERES E A PRÁTICA DO ABORTO INSEGURO

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REVISÃO SISTEMÁTICA ACERCA DA SAÚDE MENTAL DAS MULHERES E A PRÁTICA DO ABORTO INSEGURO

Caroline Matos Romio1,Adriane Roso2, Mirela Frantz Cardinal3, Samanta Basso4, Larissa Goya Pierry5 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA (UFSM)

RESUMO

Mesmo criminalizado, o aborto induzido no Brasil é uma prática recorrente, configurando-se em um problema de saúde pública, podendo colocar em risco a vida e a integridade física e emocional das mulheres que o realizam. Diante disso, objetiva-se correlacionar dados acerca dos impactos da prática do abortamento inseguro para a saúde mental das mulheres. Para tanto, se fará uma revisão sistemática exploratória da produção teórica sobre a prática do aborto induzido, em um cenário de ilegalidade, e suas repercussões para as condições de saúde mental das mulheres que a realizam. Acredita-se que tal pesquisa possa contribuir com uma compreensão a respeito das condições de saúde das mulheres que abortam no Brasil, e com isso propor possibilidades de uma atenção verdadeiramente integral e humana à saúde sexual e reprodutiva das mulheres.

Palavras-chave: psicologia social crítica, saúde mental, direitos sexuais e reprodutivos, estudos de gênero, aborto induzido.

INTRODUÇÃO

1

Acadêmica do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSM, bolsista CAPES 2

Docente do Programa de Pós-Graduação e Graduação em Psicologia da UFSM 3

Acadêmica do Programa de graduação em Psicologia da UFSM, bolsista PIVIC/UFSM 4

Acadêmica do Programa de Graduação em Psicologia da UFSM, bolsista PROBIC/FAPERGS/UFSM 5

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O presente trabalho é uma produção científica vinculada ao Grupo de Pesquisa “Saúde, Minorias Sociais e Comunicação” do curso de Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria, que trabalha em duas linhas de pesquisa: “Saúde das Mulheres – relações de gênero, representações e políticas públicas” e “(Ciber)Mídia e Instituições: relações de poder, representações e desafios na saúde”. Através da primeira linha de pesquisa é realizado semanalmente um grupo de estudos que trabalha a temática do aborto, que tem como participantes as autoras deste texto.

Neste grupo, são desenvolvidas atividades de ensino, pesquisa e ações de extensão à luz da Psicologia Social, que tem “por objetivo conhecer o indivíduo no conjunto de suas relações sociais, tanto naquilo em que ele é a manifestação grupal e social” (STREY, 1998, p. 16) e da Psicologia Social Crítica, sendo que em ambas a concepção de sujeito histórico é central:

“Para uma concepção de ser humano como produto histórico-social e, ao mesmo tempo, como construtor da sociedade e capaz de transformar essa sociedade por ele construída. Essa concepção de ser humano recoloca a relação indivíduo e sociedade, frente à perspectiva dualista e dicotômica e, ao invés de considerar indivíduo e contexto social influenciando-se mutuamente, propõem a construção de um espaço de intersecção em que um implica o outro e vice-versa (STREY, 1998, p. 14)”.

Com relação ao estudo dos direitos sexuais e reprodutivos, vê-se o quanto o olhar da Psicologia Social Crítica casa com suas diretrizes, pois os mesmos são considerados como poder de tomar decisões com base em informações seguras sobre a fecundidade, gravidez, educação dos filhos, saúde ginecológica e atividade sexual, e recursos para levar a cabo tais decisões de forma segura. Envolvendo as concepções de integridade corporal, autonomia pessoal, igualdade e diversidade (CORRÊA E PETCHESKY, 1996). Quanto à importância desses direitos, percebem-se o quanto as relações de poder opressoras perpassam a vida das mulheres em vários aspectos, influenciando na possibilidade delas exercerem, de fato, seus direitos, muitas vezes limitando-as a um cenário de subjugação construído social e historicamente.

Nesse sentido, a temática do abortamento converge com todas essas questões: direitos sexuais e reprodutivos, feminismo e as relações de poder opressoras. Isso porque sua legalização se apresenta como aspecto central na conquista do direito das mulheres sobre seus

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corpos, em oposição a um discurso machista e opressor que violenta e exclui as mulheres e as faz perder enquanto sujeitos de direitos, especialmente no âmbito da saúde.

Destaca-se que o aborto é realizado pelas mulheres desde os primórdios da humanidade. Conforme a World Health Organization (WHO) (2008), antigamente era até mesmo utilizado como método contraceptivo. Com o estabelecimento das religiões e de uma concepção de alma, sua prática foi estigmatizada e criminalizada. Quanto à definição, o aborto é aqui compreendido, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) (2005), como “a morte ou expulsão do feto espontânea ou induzida antes da 22ª à 28ª semana de gestação, dependendo da legislação do país” (p.25), podendo ser classificado em aborto espontâneo, aborto inevitável, aborto completo, aborto incompleto e aborto induzido.

Ainda de acordo com a OMS (2005), dentre as formas de aborto, neste trabalho buscar-se-á elucidar com mais clareza os efeitos das práticas do aborto induzido, que ocorre através de interferência médica, cirúrgica ou do uso de preparações de ervas ou outras práticas tradicionais que provocam a expulsão total ou parcial dos conteúdos do útero. O aborto induzido, dependendo da legislação de cada país, pode ser legal - realizado por um profissional médico autorizado, de acordo com procedimentos previstos em manuais da saúde -, ou ilegal, feito por uma pessoa sem autorização legal. Quando ele é ilegal, dá base para aquilo que chamamos de aborto inseguro. De acordo com a OMS (2008), abortos inseguros são freqüentemente realizados por pessoas que não têm qualificações e competências para realizá-los, sendo alguns autoinduzidos. Assim, muitas vezes, tanto os procedimentos quanto a administração medicamentosa são feitas de modo incorreto e perigoso, o que somado a condições insalubres, corresponde a riscos para a saúde e para a vida das mulheres. A ilegalidade do aborto faz com que sua real magnitude seja desconhecida e suas conseqüências para a saúde obscurecidas (OMS, 2005).

OBJETIVOS

A pesquisa objetiva compilar, apresentar e discutir dados acerca dos efeitos da prática de abortamento inseguro para a saúde mental das mulheres que a realizam.

JUSTIFICATIVA

O presente estudo sistemático possibilita uma revisão crítica acerca do tema do aborto e suas correlações com a saúde mental. Tal tema se apresenta como atual e é de interesse pessoal das autoras, que pautadas no feminismo, entendem a importância do questionamento

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da moralidade e das relações de poder na construção de modelos mais eficazes e integrais de promoção de saúde para todos. Além de considerarem a necessidade de dar visibilidade ao tema, vêem este como central na compreensão efetiva dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Também, tal pesquisa propõe o levantamento de questões que poderão somar à dissertação de mestrado de uma das autoras.

MÉTODO

Trata-se de estudo descritivo, de revisão sistemática exploratória da produção teórica nacional, desenvolvida e divulgada por meio de artigos e periódicos da área da saúde. A busca ativa dos artigos foi realizada nas seguintes bases de dados: SciELO®, LILACS® e IndexPSI®. Para a busca nas bases de dados foram utilizadas as seguintes palavras-chaves: aborto induzido, e seus sinônimos, conforme os descritores de ciências da saúde, aborto provocado e embriotomia, os quais foram correlacionados à saúde mental, e seu sinônimo, higiene mental.

A revisão sistemática possibilita a busca, a avaliação crítica e a síntese dos resultados obtidos através de outros estudos acerca do tema investigado. O que permite uma síntese de conhecimentos já produzidos e a construção de questões embasadas para estudos posteriores.

Os artigos encontrados foram submetidos aos seguintes critérios de inclusão: estar disponível no SciELO®, LILACS® e IndexPsi® e aparecer como resultado na correlação entre os descritores. Foram excluídos aqueles que tivessem mais de quatro anos de publicação e aqueles escritos em língua estrangeira.

Tendo em vista tais critérios, a busca ativa ocorreu no mês de maio de 2013. Os descritores, depois de utilizados nas bases de dados, revelaram a existência, na ocasião da coleta de dados da pesquisa, o total de 27 artigos. No cruzamento de descritores, alguns desses artigos se repetiram.

Após essa etapa, 2 foram excluídos por não estarem disponíveis em português, 12 possuíam mais de 4 anos, e 3 por não estarem disponíveis em português e possuírem mais de 4 anos. Resultando em 10 artigos que foram utilizados para a presente análise sistemática. A leitura destes artigos buscará dados sobre as condições de saúde mental das mulheres que praticaram aborto induzido. Assim, se correlacionará os estudos e as informações obtidas, a fim de se pensar as condições de acesso à saúde de mulheres que praticam o aborto em um país onde esse é criminalizado, como o Brasil.

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RESULTADOS E DISCUSSÕES

Aqui se pretende apresentar uma reflexão acerca das leituras desses artigos e das inter-relações entre os dados presentes neles. Assim dos 10 artigos, 9 correspondiam a resultados de pesquisa empírica e 1 compreendia uma revisão de literatura. Dentre as pesquisas empíricas 1 foi realizada com profissionais da área da saúde e 9 com mulheres. Quanto ao aborto induzido, 6 estudos apresentaram enfoque no aborto induzido, outros consideraram tanto aborto espontâneo quanto induzido, o que pode revelar uma dificuldade na realização de pesquisas devido a criminalização do aborto no Brasil e com isso, a dificuldade de se saber se a declaração de aborto espontâneo é real por parte das mulheres.

No que concerne aos locais, os estudos foram desenvolvidos predominantemente nos estados de São Paulo, Bahia e Rio Grande do Sul. Além disso, as pesquisas foram realizadas predominantemente por profissionais da área da saúde coletiva com destaque para enfermagem e medicina, sendo que tais características corroboram com o estudo de Menezes e Aquino (2009).

Em se tratando do ano de publicação, 4 artigos foram publicados no ano de 2012 e 3 no ano de 2011, o que pode indicar um aumento no número de pesquisas referentes a aborto e saúde mental no Brasil. Ao que tange ao contexto sociodemográfico, as participantes dos estudos eram predominantemente mulheres jovens adultas, com baixo nível de escolaridade, ensino fundamental ou segundo grau incompleto, autodeclaradas negras e pardas, desempregadas ou exercendo atividades de baixa remuneração, dependentes de auxílio financeiro, seja por companheiros e/ou familiares. A maioria das mulheres participantes já apresentava histórico prévio de abortamento (SOUZA; DINIZ, 2011; DINIZ et al, 2011; VILLELA et al, 2012; MARIUTTI; FUREGATO, 2010), no entanto, pelo fatos das pesquisas se realizarem majoritariamente em ambiente hospitalar e público, tais características podem não corresponder, de modo geral, à população que realiza aborto, visto que se restringem a apenas uma parcela da população.

As características sociodemográficas das mulheres que praticam aborto no Brasil podem corresponder a um modelo muito mais heterogêneo, como reforça o recorte do estudo GRAVAD (Gravidez na Adolescência: Estudo Multicêntrico sobre Jovens, Sexualidade e

Reprodução no Brasil), apresentado por Pilecco, Knauth e Vigo (2011), o qual demonstra

associação positiva entre alta escolaridade e renda familiar mais elevada e a ocorrência de aborto na primeira gravidez. Dessa forma, as jovens mais privilegiadas economicamente, além de ter maior acesso à contracepção, podem optar por um aborto, ainda que de forma

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ilegal. Sendo assim, embora engravidem menos, as jovens de classes mais abastadas se utilizam proporcionalmente mais da prática do aborto do que jovens de classes menos favorecidas. Além disso, essas jovens possuem recursos econômicos para executar a prática do aborto em condições melhores assistidas e mais seguras para a sua saúde.

Quanto à saúde mental, ela é entendida aqui de modo integrado à saúde como um todo, incluindo a saúde reprodutiva e os direitos sexuais, além de estar relacionada a uma noção de integralidade corporal. Nessa direção, pensar as condições de vulnerabilidade social e desigualdades de gênero faz-se imprescindível, visto que condições de autonomia e saúde emocional estão atreladas a condições de poder de acesso a informações para tomada de decisões sobre saúde sexual e reprodutiva e de recursos para tornar estas efetivas (CORRÊA; PETCHESKY, 1996).

Um dado relevante apresentado pelos estudos é a vinculação da prática do aborto induzido com situações de violência, sejam essas psicológicas, físicas ou sexuais, perpetradas pelo cônjuge no ambiente doméstico (DINIZ et al, 2011; GOMES et al, 2012; SOUZA e DINIZ 2011). Assim, ao que parece, mulheres que vivem configurações violentas tendem a abortar mais frequentemente do que as mulheres que não estão expostas à violência. Tal dado permite uma reflexão acerca das condições em que vivem as mulheres e sobre o sofrimento mental advindo delas, presente já antes da prática do aborto, e o quanto esse pode ser compreendido como um ato pela manutenção do direito das mulheres sobre seus corpos, no qual elas podem nãodesejar gerar um filho com um homem abusivo ou violento.

Destaca-se também um índice elevado de práticas de aborto entre mulheres que afirmaram ter sofrido coerção sexual em algum momento de suas vidas (PILECCO, NAUTH, VIGO, 2011). Tal aspecto remete aos direitos sexuais e o quanto o direito a recusa ao sexo ainda é negado às mulheres.

Tais configurações de violência, conforme assinalam Mariutti e Furegato (2010), se configuram em fatores de risco para a integridade emocional das mulheres que praticam o aborto. Esses fatores estão associados também a condições de exclusão socioeconômicas, poucos vínculos afetivos e falta de apoio social e familiar. Quanto ao apoio familiar, Vilela et

al (2012) apontam em sua pesquisa que esse influencia consideravelmente na decisão da

mulher pela prática ou não do aborto. Esse dado remete ao fato de que a prática do abortamento é perpassada pelo contexto social das mulheres, sua vulnerabilidade física, o pouco acesso a informação e métodos contraceptivos, a dificuldade de negociação no uso destes com os parceiros, o discurso social do controle da procriação como responsabilidade da mulher, a vivência da gestação em cenário de violência e por fim a decisão e prática solitária

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do abortamento. Acrescenta-se que as complicações pós-aborto, que levam algumas mulheres a buscar o hospital, também são vivenciadas de modo solitário, conforme demonstra o estudo de Souza e Diniz (2011)

Nesse sentido, a prática do aborto, que pode gerar sofrimento emocional às mulheres, torna-se mais dolorosa em um cenário de abandono e criminalização, como no Brasil, onde a investigação das repercussões psíquicas do aborto merece particular atenção. Nessas configurações, para muitas mulheres, o difícil processo até a obtenção dos meios para abortar e a carência de atenção humanizada nos serviços de saúde tornam dramáticas suas vivência.

Entretanto, a criminalização não interfere apenas na vivência das mulheres como também nas possibilidades de estudo acerca do aborto, assim, Menezes e Aquino (2009) salientam que são poucos os estudos acerca da repercussão do abortamento para a saúde mental das mulheres no Brasil, além disso, os estudos tendem a ser feitos logo após a interrupção, e de modo não longitudinal e com pequenas amostras populacionais.

Quanto aos sentimentos experienciados pelas mulheres, com a interrupção da gestação, os artigos apontam para sentimentos de ambigüidade, com presença de alívio e bem-estar junto com sentimentos de vergonha, culpa, medo e tristeza (SOUZA; DINIZ, 2011; NOMURA, 2011; FARIA, 2012). Além disso, os estudos indicam para uma maior possibilidade de que mulheres que praticam aborto de modo inseguro apresentem quadros de estresse e depressão (DINIZ et al, 2011; NOMURA et al, 2011).

Quanto aos sentimentos vividos pelas mulheres que optam pela interrupção da gestação, a pesquisa de Vilela et al (2012) salienta que esses são singulares e, no caso das mulheres com HIV/Aids, suas condições de saúde perpassam à vivência da gestação e do abortamento, e se expressam na insegurança quanto à possibilidade de transmissão para o bebê, os riscos para a saúde da gestante, e o sofrimento envolvido com os procedimentos de prevenção da transmissão vertical. Além disso, há temores quanto à manutenção do emprego, visto que as ausências ao trabalho devido ao acompanhamento e tratamento da infecção podem se tornar mais frequentes no caso de uma gestação.

No que tange vivências singulares, o estudo de Guedes et al (2009) apresenta os desafios referentes aos direitos sexuais e reprodutivos em mulheres acometidas de sofrimento mental, visto que a sexualidade destas é possivelmente desconsiderada pelos serviços de saúde que freqüentam, a exemplo um Centro de Atenção Psicossocial. Muitas vezes, elas recorrem à prática do aborto para poder legitimar seus direitos sobre seus corpos e sua vida reprodutiva, visto que o seu acesso à contracepção é precário.

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Pensando os serviços de saúde, um aspecto apontado pelas pesquisas que carece de mais estudos é o modelo de atenção oferecido à saúde de mulheres internadas com complicações pós-aborto. Os serviços, muitas vezes, destinam a essas mulheres atendimento excludente, desumano, cerceados por julgamentos morais, oferecendo pouco ou nenhum acesso a informação acerca dos procedimentos que serão realizados e das medidas contraceptivas que posteriormente poderão ser adotadas (MENEZES; AQUINO, 2009; NOMURA et al, 2011; FARIA et al, 2012) . Nesse sentido, há muito a se evoluir quanto à aplicação e efetivação da humanização na atenção ao abortamento, proposta pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2005). Além disso, a atenção tende a ser voltada para intervenções corporais, desconsiderando os aspectos emocionais vinculados à vivência do abortamento (GOMES et al, 2012).

Ainda, uma das alternativas que se apresenta para um atendimento mais humano na atenção à saúde das mulheres é que a criminalização do aborto seja revista e a atenção à saúde das mulheres se dê de modo integral, através do acolhimento dessas mulheres e suas demandas, promovendo um diálogo e um empoderamento que possibilite a elas ter acesso aos seus direitos sexuais e reprodutivos, além de um atendimento integral e humano quando optam pela interrupção de uma gestação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente texto buscou, através de uma revisão sistemática exploratória, apresentar e discutir dados acerca da saúde mental de mulheres que realizam o aborto induzido inseguro. A revisão possibilitou uma maior compreensão acerca da temática e, através dessa surgiram novos questionamentos, que podem servir como disparadores para novas investigações.

Ao buscar refletir acerca das pesquisas, um número mais freqüente de abortamento em situações de violência doméstica se apresenta como um dado em destaque. Entende-se que essa circunstância coloca em risco a saúde física e emocional das mulheres, além disso, os dados indicam que a ocorrência de violência é recorrente na vida de mulheres que se apresentam em condição de vulnerabilidade social. Esse quadro nos remete ao fato de que é preciso reflexão contínua e crítica acerca de todas as relações desiguais que permeiam as questões de gênero em nosso contexto social – as diversas formas de opressões e violências se atravessam, sendo raro estarem sozinhas.

Além disso, outro fato destacado pelas pesquisas é o contexto onde as mulheres estão inseridas, e os fatores de risco que se apresentam à integridade emocional delas. Pouco acesso a bens econômicos, informação e atenção em saúde, configura um cenário de exclusão e

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abandono, onde a prática de interrupção da gestação é um dos únicos recursos que as mulheres possuem para assegurar seus direitos reprodutivos.

Os estudos lembram que mesmo buscando compreender quem são as mulheres que praticam o aborto e quais as dimensões dessa prática em um contexto de criminalidade, há singularidades nessa experiência que estão relacionadas ao contexto social e cultural dessas mulheres e o modo como elas significam o contexto em que a vivenciam. Assim, mulheres que já convivem com outras patologias podem perceber nessa ação contra-reprodutiva a oportunidade de evitarem a vivência de mais exclusões e medos.

Os estudos também apontam para a necessidade de se pensar as práticas em saúde que estão sendo oferecidas às pessoas em situações pós-abortamento. Esse talvez seja o momento para os serviços estabelecerem um diálogo e uma escuta a essas mulheres, possibilitando através dessa relação uma promoção integral de saúde.

Ressalta-se que os estudos apresentam lacunas e apontam para a importância da melhor compreensão da prática do aborto induzido inseguro. Com isso, ficam questionamentos acerca do efeito emocional em longo prazo da prática do aborto inseguro à saúde mental das mulheres, além dos efeitos à saúde de uma tentativa frustrada de aborto, a necessidade de se pensar a correlação entre desejo de abortar e sofrimentos após o nascimento da criança e as condições de atenção à saúde ofertada às mulheres, que buscam serviços de saúde devido complicações pós-abortamento.

Por ora, o presente estudo espera ter contribuído para uma reflexão crítica acerca do tema do abortamento induzido, seus efeitos negativos à saúde das mulheres quando realizados em condições inseguras e espera, com isso, fomentar discussões sobre o acesso seguro à prática. Visto que a criminalização não impede que ela seja realizada, dificulta que ela seja debatida e estudada, e vitimiza mulheres que, muitas vezes, já se encontram em condições de vulnerabilidade social e sofrimento.

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