• Nenhum resultado encontrado

Tireoidite de Riedel com Disfagia: Relato de caso

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Tireoidite de Riedel com Disfagia: Relato de caso"

Copied!
5
0
0

Texto

(1)

Tireoidite de Riedel com Disfagia: Relato de caso

Trabalhos apresentados no V Colóquio Multidisciplinar - Deglutição & Disfagia - Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ - Rio de Janeiro maio –2003

Grupo de Estudos dos Distúrbios da Deglutição (GEDD) - Hospital das Clínicas da FMUSP

Resumo

A Tireoidite de Riedel é uma afecção inflamatória e fibrosa da glândula tireóidea bastante rara. Seu caráter fibroso se estende para além da tireóide, aos tecidos adjacentes. Os acometidos apresentam freqüentemente abaulamento cervical de consistência pétrea, compressão da laringe e da traquéia e dificuldade à mobilização do pescoço. A disfagia pode ocorrer, porém é incomum. O quadro simula o carcinoma anaplásico da tireóide. O caso ora relatado é o de um indivíduo que apresentava a Tireoidite de Riedel associada a hipotireoidismo e disfagia. O doente foi tratado com o emprego da operação (tireoidectomia descompressiva e traqueostomia) e de

corticoesteróides.

Introdução

Inicialmente descrita por Bernhard Riedel em 18861 (que a chamou de "eisenhart strumitis"), a Tireoidite de Riedel é conhecida como tireoidite lenhosa, petrosa ou fibrosa invasiva. Ela é uma doença fibro-inflamatória bastante incomum que mimetiza o carcinoma anaplásico da tireóide. Sua incidência está ao redor de 0,05%2,3. Ela é mais freqüente no sexo feminino, na faixa etária entre a terceira e quarta décadas de vida2.

Usualmente se apresenta com uma massa bastante endurecida na topografia da tireóide e aderida a tecidos adjacentes. Os doentes queixam-se de sintomas compressivos como dispnéia, estridor, sensação de sufocamento e disfagia3,4.

Embora seja descrito hipotireoidismo associado à Tireoidite de Riedel, na maior parte dos casos os pacientes estão eutireóideos4. Como a disfagia, o hipoparatireoidismo também é uma das

complicações pouco freqüentes descritas2,4. Os achados histológicos incluem destruição completa do tecido tireóideo, formação de tecido fibroso denso infiltrando o parênquima - semelhante à fibrose retroperitoneal ou à fibrose associada aos tumores desmóides5, reação granulomatosa e extensão da fibrose para tecidos adjacentes como nervos, vasos, gordura e músculo esquelético, podendo gerar até mesmo flebite oclusiva.

A Tireoidite de Hashimoto e a Tireoidite de Riedel eram tidas como variantes do mesmo processo, havendo na segunda destruição completa da glândula acometida e alterações fibróticas. Porém, os critérios morfológicos que distinguem a Tireoidite de Riedel de outras desordens

fibro-inflamatórias foram claramente definidos em 1957 por Woolner et al. 2, que consideraram como exclusivos da Tireoidite de Riedel o envolvimento de tecidos adjacentes pelo processo fibro-inflamatório, "extravasando" a cápsula tireóidea. Além desses, a formação de granulomas e das reações de células gigantes são incomuns na Tireoidite de Hashimoto2,6.

(2)

Relato de caso

Paciente do sexo feminino e com 43 anos de idade referia aumento do volume cervical anterior há três meses. O abaulamento foi progressivo e acompanhado de dor, disfagia, dispnéia esporádica, e emagrecimento de 4kgs. A doente negava antecedentes familiares de tireoidopatias ou doenças auto-imunes.

Ao exame físico apresentava massa endurecida de consistência lenhosa e fixa à inspeção dinâmica. Era impossível a avaliação das demais estruturas do pescoço. Concomitante ao quadro, a paciente referia ter apresentado sinais de hipotireoidismo que já haviam sido pronta e satisfatoriamente tratados com levotiroxina (75mcg por dia).

A larigoscopia evidenciou paresia bilateral de pregas vocais, e a punção aspirativa com agulha fina não esclareceu o diagnóstico, sugerindo Tireoidie de Riedel ou Carcinoma Indiferenciado. A paciente apresentou emagrecimento progressivo de até 1 quilo por semana e piorou da dispnéia durante a investigação. Assim sendo, a doente foi submetida à descompressão cirúrgica das vias aéreas, à traqueostomia de proteção e à gastrostomia para aumentar o aporte nutricional (na época paciente com 42 kgs e IMC=16,2).

Os achados intra-operatórios foram o de fibrose difusa da musculatura pré-tireóidea que estava aderida aderida à tireóide. Os planos eram de difícil diferenciação. Foi realizada a istmectomia e, então, descomprimida a traquéia. Não foi possível a realização de tireoidectomia total pela fibrose intensa e consequente dificuldade de dissecção do feixe vásculo nervoso principal do pescoço, do esôfago e das demais estruturas cervicais.

Sete dias após o procedimento, a paciente apresentou quadro de miíase peri-traqueostomia, acometendo planos profundos do pescoço. Durante cinco dias, com a paciente internada, foi realizada retirada gradual das larvas, sendo observada infecção bacteriana em tecido necrótico nas adjacências da tireóide. A necrose foi tratada com desbridamentos cirúrgicos e antibioticoterapia com ceftriaxone e clindamicina. Até quatro meses depois do início do quadro infeccioso, a

paciente apresentou episódios de fistulização cutânea cervical com drenagem de material

purulento e restos de larvas. Temendo uma possível disseminação do quadro infeccioso local, não foi utilizada a dose inicial de 80 a 100mg/dia de prednisona como preconizado na literatura4,6 para tratamento da tireoidite, mas apenas 10mg/dia - aumentados para 20mg/dia após dois meses, conforme melhora clínica do processo supurativo.

Em cinco meses houve importante melhora clínica com a recuperação total do peso e a alimentação da doente dava-se normal e exclusivamente por via oral. Atualmente paciente

continua em uso de prednisona na dose de 10 mg/dia e de levotiroxina na dose de 100mg/dia. Ela encontra-se integrada novamente no seu convívio social e familiar e sem a traqueostomia e a gastrostomia. Sua nova laringoscopia evidenciou pequena paresia de pregas vocais, com recuperação da voz segundo.

(3)

Discussão

A etiologia da Tireoidite de Riedel é desconhecida, porém existem diversas teorias que tentam explicar a patogênese desta rara afecção fibro-inflamatória. A grande infiltração de células mononucleares e de eosinófilos sustenta a teoria segundo a qual trataria-se de um processo

imunomediado1,5,6,7,8. A melhora clínica observada com a administração de corticóides é talvez a maior evidência de um processo imunológico6. Uma resposta imune mediada por células é uma hipótese bastante defendida na literatura, uma vez que nem sempre anticorpos são identificados no decorrer do quadro clínico8.

Um significativo número de casos ocorre em associação com lesões fibro-inflamatórias similares a este tipo de tireoidite, acometendo órbita, trato hepatobiliar, mediastino e retroperitôneo5,6,7. Tais manifestações podem ocorrer anos após a manifestação inicial da tireoidite. Estas evidências apoiam a hipótese de que a tireoidite de Riedel seria apenas parte de uma doença generalizada que levaria a uma fibroesclerose multifocal primária5,6,7.

O diagnóstico, após realização de criterioso exame físico e anamnese deve ser confirmado por exame anátomopatológico. A punção com agulha fina é menos traumática do que uma biópsia aberta, porém fragmentos pouco representativos podem ser obtidos e um processo maligno pode não ser diferenciado da tireoidite, como se deu no caso ora apresentado. Assim, a biópsia aberta parece ser fundamental para a confirmação diagnóstica da Tireoidite de Riedel, diferenciando-a do carcinoma indiferenciado da tireóide, dos linfomas ou da tireoidite de Hashimoto, seguindo

critérios estabelecidos por Woolner e seus colaboradores2.

O tratamento cirúrgico consiste na descompressão traqueal4 pela excisão do istmo tireóideo. Previamente à excisão, pode ser realizada a biópsia para se confirmar o diagnóstico, que pode ser obtido pelo exame anátomopatológico intraoperatório (ou "de congelação"). Extensas áreas ressecadas devem ser evitadas, para não causar lesões em tecidos e estruturas nobres adjacentes, como artérias carótidas e nervos laríngicos. Após o procedimento, a manutenção do tratamento deve ser com o uso de corticosteróides ou do tamoxifeno, com os quais foram observadas respostas muito satisfatórias1,3,4,5,6,7,8,9. Pacientes com longo tempo de história apresentam pior resposta ao emprego destas drogas6,8.

O tamoxifeno tem seu efeito explicado pela indução "in vitro" e "in vivo" da secreção autócrina do TGF-b, que é um potente inibidor do crescimento de fibroblastos imaturos5. A ação do tamoxifeno pode ajudar na elucidação da etiologia da Tireoidite de Riedel, na qual é patente proliferação fibroblástica.

A observação clínica, sem uso de drogas, pode ser feita em alguns casos10, sendo descrita regressão espontânea da tireoidite. Em muitos casos, entretanto, a doença progride, causando problemas relacionados com o acometimento de estruturas vizinhas por extravasamento capsular6, problemas estes que poderiam ser evitados. O tratamento por radiação externa

mostrou resultados pouco satisfatórios. A manutenção da supressão do TSH é sugerida por alguns autores para minimizar a chance de recorrência6. O seguimento, para avaliação da tireóide com exames de imagem, deve ser realizado, pois existe descrita a associação desta tireoidite com o carcinoma folicular da tireóide11.

A Tireoidite de Riedel é um raro processo fibro-inflamatório, cuja causa é objeto de controvérsias e especulações há anos, sugerindo tratar-se de um processo autoimune ou de uma desordem

(4)

quando há comprometimento de estruturas adjacentes, causando compressão traqueal, paralisia de pregas vocais ou hipoparatireoidismo, devendo ser completado com corticóides ou

tamoxifeno. A disfagia é rara, porém pode ser clinicamente significativa, como no caso

apresentado, e levar o doente à desnutrição. O presente caso ilustra o sucesso do tratamento cirúrgico e clínico, com prednisona em baixas doses e levotiroxina.

Bibliografia

1. ROSE E, ROYSTER HP. Invasive Fibrous Thyroiditis (Riedel's Struma). JAMA 1961; 176:124-6. 2. WOOLNER LB, McCONNAHEY WM, BEAHRS OH. Invasive fibrous thyroiditis (Riedel's Struma). J Clin Endocrinol Metab 1957; 17:201-20.

3. McRORIE ER, CHALMERS J, CAMPBELL IW. Riedel´s Thyroiditis complicated by hypoparathyroidism. Scot Med J 1993; 27-8.

4. VAIDYA B, HARRIS PE, BARRET P, KENDALL-TAYLOR P. Corticosteroid therapy in Riedel´s thyroiditis. Postgraduate Med J 1997; 73:817-9.

5. FEW J, THOMPSON NW, ANGELOS P, SIMEONE D, GIORDANO T, REEVE T. Riedel´s Thyroiditis: Treatment with tamoxifen. Surgery 1996; 120:993-8.

6. LO JC, LOH KC, RUBIN AL, CHA I, GREENSPAN FS. Riedel´s Thyroiditis presenting with

hypotyroidism and hypoparathyroidism: dramatic response to glucocorticoid and thyroxine terapy. Clin Endocrinol 1998; 48:815-8.

7. KATSIKAS D, SHORTHOUSE AJ, TAYLOR S. Riedel´s Thyroiditis. Br J Surg 1976; 63:929-31. 8. THOMSON JA, JAKSON IMD, DUGUID WP. The effect of steroid therapy on Riedel´s Thyroiditis. Scot Med J 1968; 13:13-6.

9. DE M, JAAP A, DEMPSTER J. Tamoxifen therapy in steroid resistant Riedel´s Thyroiditis. Scot Med J 2001; 46:56-7.

10. HARTEMANN P, LECLERE J, MIZRAHI R, ZANNETTI A, GENTON P, PARACHE M. Un cas de thyroidite de Riedel d´évolucion regressive. Ann Endocrin 1979; 40:65-6.

11. HAO SP, CHEM JF, YEN KLC. Riedel´s Thyroiditis associated with follicular carcinoma. Eur Arch Otorhinolaryngolo 1999; 256:470-2.

(5)

Referências

Documentos relacionados

Portanto, mesmo percebendo a presença da música em diferentes situações no ambiente de educação infantil, percebe-se que as atividades relacionadas ao fazer musical ainda são

patula inibe a multiplicação do DENV-3 nas células, (Figura 4), além disso, nas análises microscópicas não foi observado efeito citotóxico do extrato sobre as

Foi membro da Comissão Instaladora do Instituto Universitário de Évora e viria a exercer muitos outros cargos de relevo na Universidade de Évora, nomeadamente, o de Pró-reitor (1976-

libras ou pedagogia com especialização e proficiência em libras 40h 3 Imediato 0821FLET03 FLET Curso de Letras - Língua e Literatura Portuguesa. Estudos literários

De acordo com o Consed (2011), o cursista deve ter em mente os pressupostos básicos que sustentam a formulação do Progestão, tanto do ponto de vista do gerenciamento

Buscando compreender a dinâmica de cada curso da UFJF, nossa pesquisa também tangenciou questões outras que o espaço desta dissertação nos impediu de problematizar, como é o

Declaro que fiz a correção linguística de Português da dissertação de Romualdo Portella Neto, intitulada A Percepção dos Gestores sobre a Gestão de Resíduos da Suinocultura:

Acrescenta que “a ‘fonte do direito’ é o próprio direito em sua passagem de um estado de fluidez e invisibilidade subterrânea ao estado de segurança e clareza” (Montoro, 2016,