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Projecto de Lei n.º 923/XIII/3ª. Exposição de motivos

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Projecto de Lei n.º 923/XIII/3ª

Impossibilita a disponibilização nas cantinas dos estabelecimentos de ensino de

refeições que contenham carnes processadas, garantindo uma maior qualidade nas

refeições escolares

Exposição de motivos

De acordo com o Relatório “A Saúde dos Portugueses – Perspectiva 2015” elaborado pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), a globalidade dos portugueses estão a perder anualmente cerca de 141 mil anos de vida saudável apenas por terem maus hábitos alimentares. As estimativas apontam para que os hábitos alimentares inadequados sejam o factor de risco com mais peso nos anos de vida saudável que se perdem, com um valor que ascende a 19,2%. A percentagem ultrapassa o peso atingido pela hipertensão arterial ou até mesmo pelo consumo de tabaco e de álcool.

Um estudo publicado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) em 2010 sobre a Balança Alimentar dos Portugueses pinta um cenário negro da alimentação em Portugal. Este estudo, estabelecendo uma comparação entre os hábitos alimentares do novo século com os da década de 90, conclui que a “dieta portuguesa tem-se vindo progressivamente a afastar dos

princípios da variedade, equilíbrio e moderação.” A análise adianta que a carne de suíno

continua a liderar a tabela nacional do consumo de carnes, representando 38% desse total. O mesmo estudo do INE adianta que 51% da população portuguesa tem excesso de peso. A ciência tem demonstrado que uma alimentação pouco equilibrada e diversificada acarreta, directamente, consequências nefastas para a saúde, contribuído para uma diminuição do nível de vida das pessoas, bem como da esperança média de vida. Assim, cabe ao Estado implementar medidas de protecção e promoção da saúde pública e sensibilizar os portugueses para esta questão, demonstrando a importância da adopção de estilos de vida saudáveis.

Ora, em Outubro de 2015, o mundo foi forçado a parar para reflectir sobre o consumo de carne vermelha e processada. Um relatório da Agência Internacional de Investigação do

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Cancro (IARC), organismo da Organização Mundial de Saúde (OMS), elaborado por 22

especialistas de 10 países que teve em consideração mais de 800 estudos científicos já publicados, veio oficializar dados que a ciência tem vindo a reunir ao longo de vários anos, respeitantes aos efeitos negativos para a saúde do elevado consumo de carne processada, isto é, carne que foi transformada através de um processo de salga, cura, fermentação, fumo ou outros quaisquer processos com o objectivo de melhorar o seu sabor e a sua preservação, nomeadamente salsichas, bacon, fiambre, molhos e preparados à base de carne.

Como consequência dos estudos acima identificados, o IARC incluiu a carne processada no grupo de factores “carcinogéneos para o ser humano”, por estar em causa a existência de “evidências suficientes de efeitos carcinogéneos no ser humano”, grupo no qual estão incluídos também, por exemplo, o formaldeído, os raios ultravioleta, o tabaco, o amianto e o álcool que, não tendo riscos idênticos, têm em comum a evidência inequívoca de estarem associados ao aparecimento de cancro.

Uma das explicações que tem sido desenvolvida para explicar este efeito está relacionada com a produção de compostos químicos durante o processamento da carne ou durante o processo culinário. Os especialistas têm defendido que quando a carne é curada ou fumada, ou quando é submetida a altas temperaturas, foram-se hidrocarbonetos aromáticos policíclicos e aminas aromáticas heterocíclicas (N-nitrosaminas). A formação destes compostos encontra-se em maior quantidade nas carnes processadas, dado que têm maior quantidade de aditivos, como nitratos e nitritos, que são percursores das N-nitrosaminas. De acordo com informação do IARC “cada 50 gramas de carne processada ingerida, por dia,

aumenta o risco de cancro colo-rectal em 18 por cento.”, podendo também o seu consumo

estar associado ao desenvolvimento de cancro no estômago.

Apesar do IARC ter concluído pela existência de riscos para a saúde, os dados disponíveis não permitiram concluir se há uma dose segura, isto é, uma dose cujo consumo seja insusceptível de causar quaisquer danos à saúde, sabendo-se todavia que o risco de desenvolvimento de cancro colo-rectal é maior se o consumo for superior a 50 gramas diárias. Porém, os estudos demonstram que mesmo o consumo desta dose não está isenta de perigos e que se toda a

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população consumisse as referidas 50 gramas de carne processada todos os dias, cerca de 15 por cento de todos os casos de cancro do colón e do recto seriam atribuídos a esta exposição e, potencialmente, prevenidos se o consumo destes alimentos fosse evitado.

Repare-se que 50 gramas correspondem, a título de exemplo, a 4 fatias de fiambre, 2 salsichas médias ou 4 fatias de bacon, que se tratam de alimentos consumidos diariamente por muitas famílias portuguesas, não sendo, por isso, difícil que se atinja a dose acima identificada.

Estimativas recentes efectuadas pela OMS apontam para que, por ano, 34 mil pessoas morram devido a uma alimentação rica em carne processada.

De acordo com os últimos dados disponíveis, constantes do “Registo Oncológico Nacional 2010”, elaborado pelo Registo Oncológico Regional do Norte, em 2010 foram diagnosticados 46724 novos casos de cancro em Portugal, a que correspondeu uma taxa de incidência de cancro de 441,9/100000. A taxa de incidência de cancro foi de 507,7/100000 nos homens (25658 casos) e de 381,7/100000 nas mulheres (21066 casos). Relativamente a 2009, verificou-se um aumento de 4,5% no número de casos registados.

Os cancros mais frequentes foram o colo-rectal, próstata, mama e pulmão, que em conjunto representaram cerca de metade da patologia oncológica em Portugal (51,2% do total dos casos). No sexo masculino, o cancro da próstata foi o cancro mais frequente (120,3/100000), seguido do cancro colo-rectal com 4390 novos casos (86,9/100000), do cancro do pulmão (57,7/100000) e do cancro do estômago (34,8/100000). No sexo feminino, cerca de um terço dos tumores diagnosticados correspondeu ao cancro da mama (31,1%), com uma taxa de incidência de 118,5/100000. O cancro colo-rectal foi o 2º mais frequente (55,3/100000), seguido do cancro da tiroide (23,8/100000) e do cancro do estômago (21,3/100000).

Estes dados demonstram que actualmente, em Portugal, o cancro colo-rectal é a segunda forma de cancro mais frequente, matando cerca de 11 pessoas por dia.

Ana Miranda, directora do Registo Oncológico Regional do Sul (ROR-Sul), defende que "as mudanças no cancro têm de ter décadas para se notarem e a subida no cólon, quase igual

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para homens e mulheres, é devida às alterações na alimentação, sobretudo nos grandes centros urbanos".

Estima-se que por ano ocorrem cerca de 608.000 mortes a nível mundial e 212.000 mortes na Europa por cancro colo-rectal, sendo diagnosticados 413.000 novos casos por ano na Europa.

Ora, a alimentação tem um papel fundamental na promoção da saúde e na prevenção de doenças crónicas não transmissíveis, encontrando-se amplamente descrito na literatura que, durante a infância, a adopção de hábitos alimentares inadequados pode aumentar o risco de doenças como a hipertensão arterial, a diabetes Tipo 2 e a obesidade. 1

A aquisição de hábitos alimentares é influenciada por diversos factores, sendo a escola o local privilegiado para a modulação de comportamentos alimentares e para a promoção de saúde, por proporcionar aos alunos conhecimentos e competências para a adopção de comportamentos saudáveis.2Em média, uma criança portuguesa passa 6 horas do seu dia na

escola, pelo que é aqui que a maior parte das refeições é realizada e onde cerca de 35 a 50% do valor energético total diário será consumido,3verificando-se em muitos casos que para

muitas crianças e jovens o acesso à única refeição quente do dia é feito na escola.4Por isto,

os espaços de refeitório escolar e bufete assumem um papel fundamental para a aquisição de hábitos saudáveis.

Assim, tendo por base o Relatório apresentado pelo IARC que demonstra claramente os riscos associados ao consumo de carne processada, consideramos que esta não deveria ser disponibilizada às crianças e jovens nos refeitórios escolares. Não existindo evidências sobre a

1World Health Organization. Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases: Report of the joint WHO/FAO expert consultation. Geneva; 2003.

Dietz WH. Health consequences of obesity in youth: childhood predictors of adult disease. Pediatrics. 1998;101(3 Pt 2):518-25.

2Centers of Disease Control and Prevention. School Health Guidelines to Promote Healthy Eating and Physical Activity. Recommendations and Reports, 2011;60(5).

3Lopes MGC, Coelho E. Diferenças e Semelhanças entre o Uso do Tempo das Crianças e dos Adultos em Portugal. In: Instituto Nacional de Estatística, editor. 2002.

Neumark-Sztainer D, French SA, Hannan PJ, Story M, Fulkerson JA. School lunch and snacking patterns among high school students: associations with school food environment and policies. Int J Behav Nutr Phys Act. 2005;2(1):14. 4Teixeira J, Truninger M, Horta A, et al. Alimentação, austeridade e criatividade: consumo e cidadania nas cantinas

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existência de uma dose segura, isto é, que não causa danos para a saúde e sabendo nós que as consequências associadas ao consumo terá impactos significativos na vida das crianças e jovens, com consequências também para a sua vida na fase adulta, consideramos essencial que, atendendo aos princípios de qualidade e variedade a que devem obedecer as refeições servidas nos refeitórios escolares, se impeça a disponibilização nestes de refeições que na sua composição contenham carnes processadas. Cabe ao Estado, enquanto defensor da saúde pública, sensibilizar os portugueses para esta problemática, incentivando-os a adoptarem estilos de vida mais saudáveis, devendo este também, em primeira linha, dar o exemplo, promovendo uma alimentação saudável e equilibrada nas cantinas escolares, o que só será possível se forem excluídos das mesmas alimentos que em nada contribuem para tal objectivo, como as carnes processadas.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do PAN apresenta o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Objecto

A presente lei visa impossibilitar a disponibilização nas cantinas dos estabelecimentos de ensino de refeições que contenham carnes processadas, garantindo uma maior qualidade nas refeições escolares.

Artigo2.º Âmbito de aplicação

A presente lei aplica-se às cantinas e refeitórios escolares dos estabelecimentos de ensino público, de nível básico e secundário.

Artigo 3.º Carne processada

1 - As ementas diárias disponibilizadas nas cantinas e refeitórios referidos no artigo anterior não podem conter refeições que incluam, na sua composição, carnes processadas.

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2 - Entende-se por carne processada a carne transformada através de um processo de salmoura, secagem, fermentação ou defumação ou qualquer outro processo com o objectivo de realçar o sabor ou melhorar a conservação.

Artigo 4.º Fiscalização

Sem prejuízo das competências atribuídas por lei a outras entidades, compete, em especial, à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica assegurar a fiscalização do cumprimento das normas constantes do presente diploma.

Artigo 5.º Período de transição

As cantinas e refeitórios escolares têm de proceder à adaptação da sua ementa à presente legislação no prazo máximo de 30 dias, a contar da data da entrada em vigor da presente lei.

Artigo 6.º Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação. Palácio de São Bento, 18 de Junho de 2018.

O Deputado, André Silva

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