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A Política Externa de Getúlio Vargas e o papel do Ministro Oswaldo Aranha ( )

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A Política Externa de Getúlio Vargas e o papel do Ministro Oswaldo Aranha

(1938-1944)

Jônatan Coutinho da Silva de Oliveira*

Introdução

O período da História republicana brasileira sob o comando de Getúlio Vargas é um dos mais estudados em nossa historiografia. As diversas dimensões que o governo Vargas adquiriu em seu primeiro momento (1930-1945) é objeto de estudo dos mais diversos acadêmicos das mais diversas áreas, tanto no Brasil quanto no exterior. Mesmo após uma exaustiva compilação de trabalhos sobre este período, a chamada Era Vargas continua sendo um tema que, pelos mais diferentes motivos, continua chamando a atenção para novas pesquisas e diferentes abordagens. A sua dimensão externa, ou seja, as decisões sobre a política externa brasileira é um desses temas que tem ganhado fôlego nos últimos anos a partir de novas abordagens teóricas e metodológicas.

As relações internacionais do Brasil no contexto da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e suas definições de política externa ganharam, principalmente a partir dos anos 1970 com a abertura de arquivos nos Estados Unidos e na Europa, um grande fôlego em suas análises, o que produziu uma grande quantidade de teses, ensaios, artigos e livros sobre o tema. Importantes nomes da historiografia se destacaram nestas análises, como Stanley Hilton, Frank McCann, Roberto Gambini, Gerson Moura e Ricardo Seitenfus. Com esses acadêmicos, ganha realce nos anos 1970 – com reflexos até nas pesquisas dos dias atuais – uma série de chaves interpretativas sobre a política externa brasileira. Conceitos como “política de cima do muro” (McCANN, 1995), “duplo jogo” (GAMBINI, 1977) e “equidistância pragmática” (MOURA, 1980) passam a permear praticamente todas as interpretações da dimensão externa do governo de Getúlio Vargas durante o Estado Novo.

Será apenas após o ano 2000 que uma série de novos estudos, baseados em uma nova abordagem metodológica e teórica conectando a disciplina História com outros campos do

* Graduado em História pela UFRJ, Especialista em História do Brasil pelo IUPERJ/UCAM e Mestrando em História Social pelo PPGHIS/UFRJ. Bolsista da CAPES.

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2 conhecimento, como a Sociologia e a Ciência Política, que a compreensão da política externa brasileira da Era Vargas será vista sobre novos prismas. Os trabalhos de Vágner Camilo Alves (2002), Jorge Ferrer (2007) e Antonio Pedro Tota (2000), por exemplo, concedem um novo caminho para o entendimento das relações exteriores do Brasil que já parecia tão desgastada. Com novas abordagens da Ciência Política e alargando cada vez mais os espectros de estudos das Relações Internacionais, como a análise da presença cultural feita por Tota, uma nova gama de interpretações e possibilidades se abrem para o estudo da política externa brasileira, não somente no período em questão, mas sobre toda uma nova forma de se compreender a própria História da Política Externa Brasileira.

No caso das definições da política externa do Brasil no contexto da Segunda Guerra Mundial, percebe-se a pouca quantidade de trabalhos acadêmicos relativos a um personagem político considerado um importante player do período: Oswaldo Aranha. O advogado gaúcho, no período em questão, ocupou dois importantes postos da diplomacia brasileira. Entre 1934 e 1937 foi o embaixador em Washington e, entre 1938 e 1944, ocupou o Ministério das Relações Exteriores a pedido de seu íntimo amigo Getúlio Vargas.

O presente artigo, que são as primeiras reflexões de parte da minha dissertação de mestrado, pretende analisar, de forma preliminar, as relações políticas entre o presidente Vargas e o ministro Oswaldo Aranha bem como as principais decisões na dimensão externa do governo estadonovista no contexto da Segunda Guerra.

Oswaldo Aranha no Estado Novo (1938)

É notória a estreita relação entre Oswaldo Aranha e Vargas. Ambos já eram velhos conhecidos das lutas republicanas no Rio Grande do Sul desde os anos 1920. Tornaram-se mais próximos e amigos nos preparativos da revolução de 1930, quando Vargas ascende ao poder e catapulta consigo Aranha.

Ainda nos anos 1920, Aranha nutria, inclusive, certa simpatia para com regimes fortes, como o fascismo de Mussolini na Itália. Nesta época, Aranha foi introduzido nos conceitos mais próximos ao fascismo por um primo seu ligado ao integralismo, Alfredo Egídio de Souza Aranha, que tinha ligações próximas à Plínio Salgado (HILTON, 1994, p. 93)

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3 No entanto, é somente em 1934, quando assume a embaixada brasileira em Washington, que Aranha inicia a sua démarche em direção ao fascínio pela democracia liberal de modelo norte-americano. Em carta enviada a Vargas em 1935, Aranha deixa claro como é crescente o seu fascínio pelos Estados Unidos:

Não tens uma idéia da organização moral, política e social deste povo! É uma criação maravilhosa do progresso e da democracia. Isto aqui muda muito as nossas concepções. A evidência da vida e da organização desta gente faz luz sobre muitas dúvidas e erros arraigados entre nós. (apud HILTON, 1994, p. 190-191)

Com isso, a hipótese preliminar inerente a este trabalho é que nem sempre o diplomata fora fascinado pela causa democrática-liberal dos EUA. Após uma breve simpatia com os regimes fortes europeus dos anos 1920, Aranha se aproximou da cultura liberal norte-americana aos poucos ao longo do início dos anos 1930, ao perceber que os Estados Unidos estava se transformando no principal parceiro econômico do Brasil e, principalmente, após se encantar com a sociedade e modo de vidas do vizinho do norte após a sua passagem na chefia da embaixada do Brasil naquela capital.

Já completamente convertido á causa liberal e democrática, Aranha não conseguiria se manter em cargo de confiança no novo governo ditatorial de Vargas que se inaugura com o Estado Novo. Após a instauração do regime de exceção em novembro de 1937, Aranha renuncia à embaixada por se declarar incompatível com o novo regime, não concordando com a nova constituição imposta pelo novo regime. Mesmo após Vargas realizar vários esforços para que continuasse no cargo (VARGAS, 1995, p. 84), Aranha se afasta e retorna ao Brasil e aos trabalhos advocatícios.

No entanto, passados poucos meses de sua saída de Washington, Aranha retorna ao governo pela porta da frente: assume o MRE, um dos ministérios mais importantes do Estado Novo. A aparente contradição de Aranha foi muito questionada na época e ainda é causa de várias discussões em sua biografia. Afinal, Vargas saiu do governo em novembro de 1937 por não concordar com o fechamento do governo, mas retorna a este mesmo governo, em um status maior, poucos meses depois.

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4 A explicação mais plausível, hipótese preliminar inerente a este trabalho, é que, da parte de Vargas, seria muito interessante ter alguém em seu governo reconhecidamente pró-democracia liberal, servindo, ao mesmo tempo, como uma resposta aos setores internos e externos mais liberais e servindo de contrapeso dentro do ministério varguista, onde a maioria dos ministros e secretários mais importantes eram reconhecidamente mais próximos aos ideais totalitários então em voga.

Por parte de Oswaldo Aranha, o seu pragmatismo político e a quase necessidade de permanecer junto ao centro do poder para implementar as suas políticas de aproximação com os Estados Unidos falaram mais alto. Além disso, acredito que a sua íntima proximidade com Vargas também deve ter ajudado a fazer esta escolha. Os assuntos externos era um tema que Aranha já começava a dominar e, de fato, acreditava que poderia contribuir, de alguma forma, para que a política externa brasileira não pendesse demais para o lado dos governos fortes, inclinando-se, em oposição, à tentadora democracia liberal estadunidense.

O presidente e o ministro no contexto da guerra (1939-1944)

Tradicionalmente, a historiografia tentou dualizar as possíveis definições em política externa do Brasil no período que abrange a Segunda Guerra Mundial. De um lado estariam os americanófilos, defendendo uma ligação política e comercial mais estreita com os Estados Unidos e, do outro, os germanófilos, pleiteando uma aproximação maior com os países do Eixo, principalmente com a Alemanha. Do lado americanófilo, o grande expoente seria Oswaldo Aranha e, do lado germanófilo os principais nomes seriam os ministros militares Eurico Dutra e Góis Monteiro. No entanto, uma análise mais atenta dos players da alta política executiva brasileira, podem demonstrar que a existência de lados não era tão bem definida como parece.

Como já esboçado acima, a próprio Oswaldo Aranha, pelo menos até o início dos anos 1930, nutria certa simpatia com os regimes fortes europeus, tanto que, dentre outros motivos, aceitou ocupar um dos cargos políticos mais importantes do Estado Novo. Por outro lado, por mais que os ministros militares nutrissem simpatias com a Alemanha, a sua admiração era muito mais pela capacidade técnica e organização militar do que propriamente pela filosofia social desse tipo de regime. A organização militar alemã era exemplo para todos os exércitos

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5 profissionais do mundo e, também, não menos diferente para o brasileiro, que buscava novos armamentos para melhor se posicionar na arena internacional face a um conflito de proporções globais que se configurava.

No meio dessas divergentes visões de sociedade, comércio e organização militar, Getúlio Vargas despontava por um pragmatismo que lhe garantiu a permanência no poder por quinze anos. Observando o seu diário e outras fontes importantes para o estudo desse período, podemos perceber que o ditador a todo o momento tentava jogar e manipular as divergentes posições e opiniões que existiam dentro do seu governo. Vargas descreve encontros e reuniões ministeriais acaloradas onde as diferentes posições eram levantadas e onde, via de regra, as últimas definições e posições cabiam ao presidente.

Durante os anos da guerra, ainda podemos perceber certas tensões entre as relações políticas de Oswaldo Aranha com Getúlio Vargas. Em pelo menos nove oportunidades, Aranha levou até o presidente seu pedido de demissão entre os anos de 1938 e 1942 (VARGAS, 1995, p. 142-468). Em todos os casos, Vargas conseguiu contornar a situação e convenceu Aranha a permanecer. Em uma das vezes, o ministro teve que, primeiro, pedir orientação a sua mãe para, somente depois, se reunir com Vargas para saber se sairia ou continuaria no ministério (Idem, p. 143)

Um dos períodos de maior tensão e que Aranha tenha parecido com maior autoridade – aproveitando-se do contexto internacional propício – foram os dias entre o ataque japonês a Pearl Harbor, em meados de dezembro de 1941, e o rompimento das relações diplomáticas e comerciais do Brasil com os países do Eixo ao final de janeiro de 1942 quando do término da Conferência de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores no Rio de Janeiro. Nesse momento, Aranha fez valer as repetidas promessas de Vargas de solidariedade continental em caso de ataque de país estrangeiro em território americano. Após o rompimento das relações diplomáticas e comerciais, aprofundaram-se essas mesmas relações com os Estados Unidos, intensificando-se as construções de bases aéreas no nordeste e concluindo as negociações comerciais e da venda de armamentos que até então estavam emperradas.

Como afirma Camilo Alves, no entanto, todos esses avanços comerciais e políticos após o rompimento do Brasil não passaram de “prêmios” pelo posicionamento incondicional ao lado dos países Aliados (ALVES, 2002, p. 152). A adesão do Brasil à causa aliada não foi

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6 exatamente uma questão de escolha. O Brasil, dado a posição em relação aos Estados Unidos e à arena internacional que então se figurava, foi empurrado para o conflito, ganhando alguns benefícios por esta aproximação, ganhos estes que em tempos normais de paz internacional não conseguiria.

Nesse sentido, afirma Alves concluindo a sua pesquisa sobre o envolvimento do Brasil na Segunda Guerra Mundial que

a hipótese subjacente a este trabalho é a de que a menor capacidade de ação autônoma inerente aos pequenos países no cenário internacional é, nem momento de crise e guerra total e mundial, diminuída muitas vezes. Os interesses e estratégias de guerra das grandes potências e a estrutura do sistema internacional imerso em conflito total, entidades mutuamente constitutivas, condicionam de maneira quase coercitiva o envolvimento e nível de participação dos pequenos países. (ALVES, 2002, p. 188)

Portanto, se o posicionamento do Brasil frente a guerra e qual posicionamento tomar nesta mesma guerra não cabiam exclusivamente às definições estratégicas nacionais, mesmo com o pragmatismo de Vargas, a ação do ministro das Relações Exteriores Oswaldo Aranha também seria muito limitada. Aranha, sem dúvida, era um importante player político do Estado Novo. Foi convidado por Vargas justamente por este saber da alta capacidade diplomática que Aranha tinha e pela balança ideológica que poderia representar ao regime. Nesse sentido, Aranha seria mais um conselheiro de Vargas do que propriamente um formulador da política externa brasileira. A démarche brasileira em direção aos Estados Unidos não deve ser imputada exclusivamente a genialidade diplomática de Aranha. Outros fatores podem explicar esta aproximação, como o contexto internacional de guerra total, a dependência do Brasil em relação aos Estados Unidos e também ao próprio pragmatismo de Vargas que, dento da lógica de uma diplomacia presidencial (DANESE, 2000), tendo como Vargas seu maior paradigma, nunca deixaria de atender aos interesses mais essenciais do seu vizinho do norte.

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7 Por fim, cabe destacar que as idéias acima expostas ainda não estão fechadas e vários temas e problematizações ainda são passíveis de outras reflexões. A pesquisa, a nível de mestrado acadêmico para a construção de uma dissertação, encontra-se em estágio intermediário e várias fontes ainda demandam ser consultadas. O que foi exposto faz parte de algumas breves reflexões sobre a política externa brasileira e a participação de dois dos seus principais nomes, mas não extremamente decisivos para os rumos a serem adotados, Getúlio Vargas e Oswaldo Aranha.

Bibliografia

ALVES, Vágner Camilo. O Brasil e a Segunda Guerra Mundial: história de um envolvimento

forçado. Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio; São Paulo: Loyola, 2002.

CAMARGO, Aspásia ; ARAÚJO, João Hermes Pereira de & SIMONSEN, Mário Henrique. Osvaldo Aranha: a estrela da revolução. São Paulo: Mandarim, 1996.

CORREIA, Isabel Regina Pessoa. Desafios de uma missão: a trajetória de Oswaldo Aranha na embaixada brasileira em Washington (1934-1937). Dissertação de Mestrado: Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação em História da UERJ, 2004.

DANESE, Sérgio França. Diplomacia Presidencial. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999.

FERRER, Jorge Luiz Pereira. A Problemática das Relações Internacionais e seu impacto da Argentina, Brasil e Chile durante a Segunda Guerra Mundial (1938-1943). Dissertação de Mestrado: Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação em História Comparada da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2007.

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______________. O Brasil e a Crise Internacional (1930-1945). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1977.

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8 MOURA, Gerson. Autonomia na Dependência. A Política Externa Brasileira de 1935 a 1942. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.

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Referências

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