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Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

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Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

Processo: 568/07.0TMLSB.L1-2

Relator: ANA PAULA BOULAROT

Descritores: DIVÓRCIO INDEMNIZAÇÃO Nº do Documento: RL Data do Acordão: 22-04-2010 Votação: UNANIMIDADE Texto Integral: S

Meio Processual: APELAÇÃO

Decisão: CONFIRMADA QUANTO À AUTORA REVOGADO RELATIVAMENTE AO

RÉU

Sumário: I A indemnização a que alude o artigo 1792º, nº1 do CCivil, como deflui do seu elemento literal, abrange apenas os danos morais decorrentes do próprio divórcio, v.g. a

desconsideração que, no meio social, o divórcio poderá ocasionar.

II Esta norma afasta a possibilidade de o cônjuge, não

culpado ou menos culpado, possa em acção de divórcio, pedir uma indemnização pelos danos morais decorrentes dos

fundamentos do divórcio, baseando-se estes na violação dos deveres conjugais, podendo no entanto fazê-lo, com este fundamento, em acção própria.

(APB) Decisão Texto Parcial:

Decisão Texto Integral: ACORDAM, NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I A instaurou contra N acção especial de divórcio litigioso pedindo a dissolução do casamento celebrado entre ambos, por culpa exclusiva do Réu, tendo fundamentado o seu pedido no facto de se encontrar separada de facto do Réu há mais de um ano, por ter saído da casa de morada de família atenta a violência exercida pelo marido contra si.

O Réu apresentou contestação, impugnando os factos articulados pela Autora e deduziu reconvenção, pedindo o divórcio por culpa exclusiva daquela, bem como formulou um pedido de

indemnização no valor de € 30,000,00, como compensação pelos danos não patrimoniais derivados da dissolução do casamento. A final foi produzida sentença a julgar improcedente por não provado o pedido da Autora, A, absolvendo o Réu do pedido e a julgar procedente o pedido reconvencional deduzido pelo Réu, N e, decretando o divórcio, dissolvendo casamento celebrado em 12 de Março de 2005, entre a Autora A e o Réu N, por culpa

exclusiva da Autora, condenando esta a pagar ao Réu o montante de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), pelos danos não

patrimoniais causados com a dissolução do casamento, absolvendo-a do demais pedido.

Inconformadas com tal decisão, apenas no que tange à condenação em indemnização por danos não patrimoniais,

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A Autora apresentou as seguintes conclusões:

- Ainda que o Tribunal tenha dado como provados factos que levaram a decidir que foi o cônjuge mulher que violou os deveres conjugais de fidelidade, coabitação e de respeito, esses factos, no contexto da acção, são apenas factos ilícitos que servem de fundamento ao divórcio, ou seja, factos causais, que não têm a virtualidade para caracterizar os danos não patrimoniais

indemnizáveis à luz do regime previsto no art° 1792° do CC.; - No contexto dos autos, o Réu marido não alegou nem foi dado como provado quaisquer factos que levassem o Tribunal a concluir que o divórcio dos autos constituiu um prejuízo ou sofrimento para a sua reputação social, profissional, afectiva, recreativa e até psicológica;

- E ainda que o Tribunal tenha dado como provado que "a dissolução do casamento entre a Autora e Réu é causa de

sofrimento, pelo menos desde Junho de 2007, para este último", este facto, aliás conclusivo, desacompanhado de quaisquer outros, não basta para se concluir no sentido do pedido do Réu, que reclama da Autora o pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais;

- Para além disso fica por explicar o que terá provocado o invocado sofrimento, e que tipo de sofrimento, sendo certo que esse sofrimento não lhe causou "profunda depressão" tal como o Réu invocou no art° 36° da Reconvenção, nem sequer tal

sofrimento o impediu de se divertir, de assistir as jogos de futebol nos estádios, de ir ao café e até de se rir com os seus amigos por causa do questionado sofrimento.

- O que significa dizer que o Tribunal não fez a necessária valorização jurídica dos danos invocados, nos termos e para efeitos dos n°s. 1 e 3 do art° 496° do CC;

- Nem atendeu ao facto do Réu nada ter feito para reactivar a relação matrimonial e que foi ele que quis e pediu o divórcio, colocando-se, assim, numa situação de pretender o divórcio e não de "sofrimento", já que bem sabia que a Autora ainda que tenha proposto a acção de divórcio com o fundamento na violação dos deveres conjugais por parte do Réu e com base na separação de facto há mais de um ano (art° 13° da PI) nunca teria alcançado o divórcio com base em tais motivos, não só porque - como se diz na sentença - não se apuraram quaisquer factos nesse sentido, como também, com a oposição do Réu na separação de facto por um ano não tinha o necessário apoio para atingir o divórcio;

- Consequentemente, foram violadas as disposições legais citadas, designadamente, os art°s. 496°, n° 1 e 3, e 1792° do CC, pelo que deverá a decisão sob recurso ser revogada e substituída por outra que declare absolvida a Autora, aqui Apelante, do pedido

reconvencional na parte que a condenou a pagar ao Réu, a indemnização de 1.500,00 €, a título de danos não patrimoniais.

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Não foram apresentadas contra alegações. O Réu apresentou as seguintes conclusões:

- O Tribunal fixou em € 1.500,00 a indemnização pelos danos não patrimoniais causados ao ora recorrente pelo divórcio, montante esse que, atentos os factos dados como provados, se revela claramente insuficiente para compensar o sofrimento que lhe foi causado.

- Com efeito, face à prova produzida é por demais evidente que a dissolução do casamento causou ao ora recorrente um sofrimento muito intenso pois na verdade foi todo o seu projecto de vida familiar que ruiu e por culpa exclusiva da recorrida.

- De tudo resultando que a douta sentença recorrida ao fixar essa indemnização em € 1.500,00 fez errada interpretação dos factos e igualmente errada interpretação e aplicação do art.° 1792.° do CC., devendo revogar-se, nessa parte, substituindo-a por decisão que fixe essa indemnização em € 30.000,00 conforme

peticionado.

Não foram apresentadas contra alegações

II Colocam-se como questões em sede de recurso as de saber se há lugar, in casu, à fixação de indemnização por danos morais pela dissolução do casamento e, no caso afirmativo, se a indemnização fixada se mostra ajustada.

A sentença sob recurso deu como provados os seguintes factos: - Autora e Réu casaram entre si, segundo o regime de comunhão de adquiridos, no dia 12 de Março de 2005 (alínea A) da Matéria Assente).

- No dia 14 de Janeiro de 2007, nasceu J, filho da Autora e de J (alínea B) da Matéria Assente).

- A Autora saiu da casa onde até então residia com o Réu, no dia 21 de Janeiro de 2006, não mais aí tendo voltado (resposta ao quesito 1° da Base Instrutória).

- Autora e Réu, antes de haverem contraído matrimónio, haviam decidido ter um filho (resposta ao quesito 2° da Base Instrutória). - Decisão essa que implicou um processo clínico destinado à "lavagem de esperma", no Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa, antes do dito casamento (resposta ao quesito 3° da Base Instrutória).

- Para permitir a inseminação artificial da Autora (resposta ao quesito 4° da Base Instrutória).

- Porque o Réu, a essa data, era seropositivo, portador do HIV, como a Autora tinha conhecimento (resposta ao quesito 5° da Base Instrutória).

- A Autora suportou, para os efeitos referidos, diversos exames clínicos que lhe causaram dor física (resposta ao quesito 6° da Base Instrutória).

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Autora, no dia 21 de Janeiro de 2006, em conversa telefónica com o Réu, disse-lhe que já não gostava dele como homem, que já não queria ter nenhum filho dele e que queria o divórcio (resposta ao quesito 10° da Base Instrutória).

- Antes de 21 de Janeiro de 2006, a Autora apenas dormiu fora da casa onde residia com o Réu, na noite de 20 de Janeiro (resposta ao quesito 11° da Base Instrutória).

- Ainda antes de 21 de Janeiro de 2006, a Autora namorava com J (resposta ao quesito 12° da Base Instrutória).

- A dissolução do casamento entre Autora e Réu é uma causa de sofrimento, pelo menos, desde Junho de 2007, para este último (resposta ao quesito 14° da Base Instrutória).

- O Réu nunca faltou ao trabalho como estafeta numa editora por causa de tal sofrimento (resposta ao quesito 15° da Base

Instrutória).

- O Réu nunca deixou de assistir, no estádio, a todos os jogos do Sporting Clube de Portugal, por causa do sofrimento referido (resposta ao quesito 16° da Base Instrutória).

- O Réu nunca deixou de ir ao café e de aí se rir com amigos, por causa do questionado sofrimento (resposta ao quesito 17° da Base Instrutória).

Vejamos.

Dispõe o normativo inserto no artigo 1792º, nº1 do CCivil que «O cônjuge declarado único ou principal culpado e, bem assim, o cônjuge que pediu o divórcio com o fundamento da alínea c) do artigo 1781º, devem reparar os danos não patrimoniais causados ao outro cônjuge pela dissolução do casamento.» e acrescenta o nº2 «O pedido de indemnização deve ser deduzido na própria acção de divórcio.».

Em primeiro lugar há que analisar a que tipo de indemnização se refere este normativo.

Parece que o entendimento correcto do mesmo é o que deflui do seu elemento literal, isto é, a reparação abrange apenas os danos morais decorrentes do próprio divórcio, v.g. a desconsideração que, no meio social, o divórcio poderá ocasionar, cfr Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito da Família, vol I, 2ª edição, 689 e Ana Cristina da Silva Cerdeira, in Da Responsabilidade Civil Dos Cônjuges Entre Si, Coimbra Editora 2000, 150.

Daqui se abarca que esta norma afasta a possibilidade de o cônjuge, não culpado ou menos culpado, possa em acção de divórcio, pedir uma indemnização pelos danos morais decorrentes dos fundamentos do divórcio, baseando-se estes na violação dos deveres conjugais.

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Efectivamente, constituindo a ofensa a tais deveres um facto ilícito a indemnização daí decorrente sempre poderá ser obtida nos termos gerais insertos no artigo 483º do CCivil, utilizando-se a via processual comum, pois não tinha razão de ser o legislador ter inserido aquele preceito de natureza especial com igual

abrangência destoutro, cfr Abel Delgado, Do Divórcio, 2ª edição, 147 e inter alia o Ac STJ de 14 de Novembro de 2006 (Relator Faria Antunes), in www.dgsi.pt.

Ora, o Réu baseou o seu petitório nos danos não patrimoniais causados pela dissolução do seu casamento, tendo computado os mesmos na quantia de € 30.000,00.

O Tribunal recorrido, veio a fixar o quantum indemnizatório em € 1.500,00, tendo em atenção que apenas se provou que o Réu sofreu com a dissolução do seu casamento.

A Autora insurge-se contra esta condenação uma vez que na sua tese o Réu não alegou, nem foi dado como provado, quaisquer factos que levassem o Tribunal a concluir que o divórcio dos autos constituiu um prejuízo ou sofrimento para a sua reputação social, profissional, afectiva, recreativa e até psicológica, nem se atendeu ao facto do Réu nada ter feito para reactivar a relação matrimonial e que foi ele que quis e pediu o divórcio, colocando-se, assim, numa situação de pretender o divórcio e não de

“sofrimento”.

Parece resultar da alegação da Autora/Apelante a tese de que só seria possível ao Réu pedir a atribuição de uma indemnização pela dissolução do casamento se não tivesse, ele também, em sede reconvencional, pedido a dissolução do casamento (esta posição é defendida por Rosendo Dias José, in Indemnizar pelo Divórcio?, in Tribuna da Justiça, Maio de 1985, 5, 4 e seguintes).

Mas assim não tem sido entendido, já que tal posição levaria a restringir a aplicação do normativo inserto no artigo 1792º, maxime, no âmbito do divórcio sanção: é que não se poderá concluir que o cônjuge ofendido que pede o divórcio é também ele responsável pela dissolução do casamento, pois se o faz é porque a vida conjugal se tornou impossível por culpa do outro. A decretação do divórcio e o fim da sociedade conjugal, não advém, nestas circunstâncias, por vontade dos próprios cônjuges, mas antes por via da conduta ilícita de um deles, cfr neste sentido Ângela Cristina da Silva Cerdeira, Da Responsabilidade Civil dos Cônjuges Entre Si, Coimbra Editora 2000, 158.

É possível, nestas situações, peticionar uma indemnização pelos danos decorrentes da dissolução do casamento.

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sobre o Réu o ónus de alegação e prova dos factos constitutivos do seu direito à pretendida indemnização, maxime, os

integradores dos danos que lhe foram causados pela Autora com a dissolução do casamento, danos esses que não se bastam com a mera enunciação genérica de que tal lhe trouxe sofrimento, como veio alegado e se provou (veja-se a resposta ao artigo 14º da base instrutória), cfr Francisco Pereira Coelho e Guilherme de

Oliveira, ibidem, 690 e Ac STJ de 3 de Novembro de 2005 (Relator Pires da Rosa) e de 11 de Julho de 2006 (Relator Sebastião Póvoas), in www.dgsi.pt.

É que uma situação de divórcio acarreta, segundo a experiência comum e a normalidade das coisas, incómodo e sofrimento, só que daí não se poderá inferir, sem mais, a existência de danos que possam consubstanciar o direito à indemnização a que alude o normativo inserto no artigo 1792º, nº1 do CCivil.

Tais danos costumam traduzir-se na desconsideração social que o divórcio acarretou ao divorciado, na dor sofrida por este, na angústia em ver ruir todo um projecto de vida, enfim, um

conjunto de situações concretas graves que mereçam a tutela do direito em termos de sancionamento indemnizatório, de harmonia com o preceituado no artigo 496º, nº1 do CCivil, cfr Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, ibidem, 690.

In casu, o Réu não cumpriu o ónus que sobre si impendia de concretização de todos os factos consubstanciadores dos danos sofridos, não lhe podendo, pois, ser atribuída nem a peticionada indemnização, nem a indemnização que lhe foi arbitrada pela sentença recorrida, procedendo, assim, as conclusões da Autora e improcedendo as conclusões do Réu.

III Destarte, julga-se procedente a Apelação da Autora e

improcedente a Apelação do Réu e em consequência revoga-se a sentença recorrida na parte em que, julgando procedente o pedido reconvencional condenou aquela no pagamento a este da quantia de € 1.500,00 a titulo de indemnização por danos não

patrimoniais pela dissolução do casamento, absolvendo-se a mesma de tal pedido.

Custas pelo Réu (Apelante/Apelado). Lisboa, 22 de Abril de 2010

(Ana Paula Boularot) (Lúcia de Sousa)

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