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REVISITANDO AS RELAÇÕES FAMILIARES NOS TEMPOS DE COVID-19

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| Revista GETS, Sete Lagoas, v. 2: p.101-115, 2020. | 101

REVISITANDO AS RELAÇÕES FAMILIARES NOS TEMPOS DE

COVID-19

Silvio César Bungi1

cesarsilb@gmail.com Renan dos Santos Pires2

renan-pires29@outlook.com Eliane Mallach Bazzan3

elianemallach@hotmail.com 1. Silvio César Bungi, bacharel em psicologia pela Universidade do Vale dos Sinos (Unisinos); 2. Renan dos Santos Pires, bacharel em direito pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI/ Santiago).

3. Eliane Mallach Bazzan, enfermeira pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI/ Santiago).

Resumo

O presente trabalho é um artigo de revisão bibliográfica que possui como objeto teórico a elaboração de uma análise tocante às relações familiares em meio à pandemia desencadeada pelo SARS-CoV-2 (COVID19). Inicialmente foi realizado um apanhado teórico tratando da família propriamente dita, seu surgimento, especificidades e nuances, vínculos iniciais, formação, desenvolvimento, novas configurações e aspectos histórico-jurídicos. Apoiou-se, para isso, numa pesquisa bibliográfica, referente ao período de 2019 a 2021. Por conseguinte, apontaram-se os impactos gerados pelo isolamento social na saúde mental das pessoas e das famílias. Neste contexto foram indicadas estratégias de enfrentamento como forma de minimizar os efeitos inerentes ao isolamento social imposto.

Palavras-chave: Relações Familiares, família, saúde-mental, novo coronavívus, COVID-19.

Resumen

La obra actual es un artículo de revisión bibliográfica que tiene como objeto teórico la elaboración de un análisis sobre las relaciones familiares en medio de la pandemia desencadenada por el SARS-CoV-2 (COVID19). Inicialmente, se llevó a cabo un enfoque teórico que se ocupaba de la propia familia, su aparición, especificidades y matices, vínculos iniciales, formación, desarrollo, nuevas configuraciones y aspectos histórico-jurídicos. Para ello, fue apoyado por una investigación bibliográfica, refiriéndose al período 2019-2021. Por lo tanto, se señalaron los impactos generados por el aislamiento social en la salud mental de las personas y las familias. En este contexto, se indicaron estrategias de afrontamiento como una forma de minimizar los efectos inherentes al aislamiento social impuesto.

Palabras-Clave: Relaciones familiares, familia, salud mental, nuevas

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The present work is a bibliographic review article that has as theoretical object the elaboration of an analysis regarding family relationships in the midst of the pandemic triggered by SARS-CoV-2 (COVID19). Initially, a theoretical approach was carried out dealing with the family itself, its emergence, specificities and nuances, initial links, formation, development, new configurations and historical-legal aspects. For this, it was supported by a bibliographical research, referring to the period 2019 to 2021. Therefore, the impacts generated by social isolation on the mental health of people and families were pointed out. In this context, coping strategies were indicated as a way to minimize the effects inherent to the social isolation imposed.

Keywords: Family Relations, family, mental health, new coronavívus,

COVID-19.

INTRODUÇÃO

O momento atual tem sido de grandes desafios, principalmente com o surgimento da pandemia do novo coronavírus (COVID19). Tal problemática, de proporções mundiais, tem causado impacto na sociedade e como uma caixa de ressonância modifica a forma das famílias se relacionarem. A família contemporânea apresenta diferentes modelos e configurações e acompanha as mudanças do nosso tempo. Tudo muito rápido e dinâmico como a transitoriedade da vida.

As relações familiares, inseridas neste período, experimentam a referida intempérie e precisam adaptar-se a uma nova realidade. Surgem dúvidas e novos atravessamentos.

Novamente a família transforma-se. Novos conceitos surgem. O tempo passa e o conhecimento traz novas perspectivas, modificando o que antes parecia impossível. A internet com um mundo de informações e novas formas de comunicação pode ser um exemplo disso. Hoje ela faz parte do nosso cotidiano e facilita a aproximação das pessoas, encurta distâncias e conecta, assim, sujeitos e famílias.

O conhecimento trouxe grandes avanços. O computador e o celular também fazem parte do nosso dia a dia e é difícil imaginar a vida sem eles. Surgiram as redes sociais, os grupos virtuais, os aplicativos, e todo um mundo

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de possibilidades de acesso e comunicação. São ferramentas que estão ao alcance de grande parte da população, bastando conectar-se e utilizá-las.

Com base em todo o exposto, onde o processo de transformação familiar acaba convergindo com as restrições impostas pela pandemia, surge, assim, a necessidade de ser feita análise relacionado ao contexto atualmente vivenciado.

Partido desta premissa, delimitou-se o objetivo geral deste estudo em contextualizar a família, apresentando o momento atual, com o surgimento da pandemia do novo coronavírus, suas nuances e reflexos junto às relações familiares. Em contrapartida, o objetivo específico visa apresentar estratégias e ferramentas para minimizar o impacto do isolamento social e suas consequências nos tempos de pandemia.

Em vista disso, a análise em voga poderá contribuir na busca de alternativas para lidar com o momento de dúvidas e incertezas que estamos vivendo.

Este artigo é uma pesquisa de revisão bibliográfica no qual serão utilizados conceitos e pressupostos teóricos revisitados na literatura através da consulta de livros e sites da internet, com o objetivo de vincular algumas características que fundamentam as relações familiares e após esta etapa, o que perpassa estas relações.

2 DESENVOLVIMENTO

2.1 Conceitos, definições e considerações históricas

Desde o início dos tempos estamos em transformação. Semelhante a uma metamorfose, a humanidade está em constante mudança. A terra com seus movimentos traz o dia e a noite. Surgem as novas estações do ano e o tempo segue seu ritmo. As civilizações vão e vêm novos povos surgem e a vida segue seu ciclo. Num intenso movimento de mudanças e acontecimentos.

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A sociedade já presenciou grandes transformações ao longo dos anos. O homem, ser pensante, encontra na inteligência as ferramentas para o seu desenvolvimento.

Para Levy (2008) a inteligência é ligação, circuito e segmento que passam por uma parte de nós, que pertencem a certa rede social. Também existem outros circuitos, que passam por outra parte de nós e que estão em outra rede social. Somos um nó de comunicação de várias redes e é justamente por essa razão que somos seres pensantes. Tornamos-nos criativos e por estarmos mergulhados numa rede heterogênea, diversa, múltipla, com elementos vivos, sociais, familiares, afetivos é que pensamos, agimos e temos capacidade de mudar e crescer. Não somos isolados, somos sujeitos que interagem e necessitam do outro para viver.

De acordo com Turkenicz (1995) os humanos, desde a adolescência, são atravessados por uma conjuntura de casal. Têm a perspectiva de fazer parte de um par e não haverá quem fique de fora destas questões, mesmo os que venham a optar pela renúncia à vida matrimonial e estabeleçam outras prioridades para a sua vida. Pode-se pensar, a partir daí, um início de vínculo que mais tarde se denominará família.

Puget (1994) enfatiza uma tendência do ser humano, que é a busca da organização de sua vida em estruturas, na qual existe um parâmetro pré-estabelecido e se organiza de uma menor para uma maior estabilidade. Para o autor, o casal teria elementos que o definiriam como sendo uma unidade com um alto grau de especificidade. Pode-se pensar no conceito de família, do ponto de vista evolutivo e funcional. Também se pode observar que o casal ou o par se desprende da família inicial (instituição onde se originam os seus modelos) levando junto os vínculos de aliança e pertencimento como referência e constituindo um imaginário.

No entendimento de Bowlby (2015) é possível observar a construção das relações interpessoais nas fases iniciais do desenvolvimento do sujeito e destaca a importância desse processo. O contexto social também influencia no

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desenvolvimento do sujeito. O apego é uma propensão dos humanos na construção de ligações afetivas estruturadas.

Segundo Bowlby (2015), o sofrimento emocional e os distúrbios de personalidade podem ser observados quando ocorre a fragmentação no processo de desenvolvimento da criança. O autor refere que a raiva, a ansiedade, a depressão e o desapego emocional (sentimentos originários da separação ou da perda não desejada) são formas de o sujeito lidar com o mundo e os objetos circundantes.

McGoldrick (1995) define a família como uma unidade articulada emocionalmente desde o berço até o túmulo, e nos mostra como este modelo instituído delimitará futuramente os territórios que seus integrantes irão ocupar ao longo da vida. O autor refere à influência da família em todos os âmbitos, nas relações e na vivência com o mundo, já citados anteriormente.

Bowlby (2015) também faz referência aos padrões de respostas vivenciadas nos primeiros anos da infância, nos quais estão presentes na personalidade do sujeito e farão parte deste, ao longo de sua vida. As relações com o outro; as questões de convívio social; os problemas de adaptação no cotidiano; as dificuldades no mundo do ensino aprendizagem podem ser explicadas a partir de seus estudos. Os vínculos afetivos e os estados subjetivos de forte emoção ocorrem concomitantes. O autor chama a atenção para as intensas emoções humanas que ocorrem na formação, rompimento e renovação de vínculos afetivos. Refere que geram ansiedade, raiva, ódio e amor, entre outros.

Para a criança, em referência aos vínculos familiares, conviver com a mulher do pai, com os irmãos, meio-irmão, seus avós, os filhos do marido da mãe, são desafios comuns hoje em dia. A mudança na configuração familiar trouxe novos formatos como as famílias de pais separados, as famílias recasadas, as monoparentais, as socioafetivas e as homoafetivas (Wall e Lobo, 1999).

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Famílias de pais separados são aquelas onde o pai e a mãe não convivem maritalmente, não estão mais casados ou não estão mais juntos. São aquelas onde houve separação conjugal ou divórcio (Wall e Lobo, 1999).

Podemos associar as famílias monoparentais, como as que possuem uma mãe ou um pai sem cônjuge e com filhos dependentes (crianças ou jovens adultos solteiros) convivendo na mesma casa, no mesmo espaço (Wall e Lobo, 1999) .

As relações familiares genuínas são afetivas e compostas por uma união de afetos (sentimentos). O afeto se origina da convivência social. O parentesco pode ser produzido pela socioafetividade. A partir desses vínculos se formam as famílias socioafetivas (Chaves, 2020).

O divórcio e a separação continuam existindo e as pessoas mantêm o desejo em casar. Desta forma o recasamento continua a fazer parte da vida familiar. Nos relacionamentos em que um dos parceiros ou ambos já se casaram anteriormente e incluem os filhos da união anterior, têm-se as famílias recasadas (Walsh, 2016).

Para Dias (2005) no âmbito do direito de família, as uniões homoafetivas (uniões entre pessoas do mesmo sexo), são identificadas como entidades familiares e a natureza afetiva do vínculo em nenhuma forma se diferencia das uniões heterossexuais. Se duas pessoas estão ligadas por um vínculo, e mantêm uma relação duradoura, pública e contínua, como se casadas fossem, então elas formam um vínculo familiar.

Do ponto de vista historico-jurídico, pode-se observar, conforme a ótica de NORONHA e PARRON (2012), que a família brasileira está estabelecida de forma primordial na sistematização do direito romano e canônico. Justifica-se esta afirmação, uma vez que a família romana possuía estrutura de formação associada a um conjunto de pessoas e coisas que estavam submetidos a um chefe (pater familias), de modo a justificar a conhecida denominação “família patriarcal”. Por conseguinte, no que refere ao direito canônico, nota-se que estava vinculada à igreja católica a função de estabelecer disciplina ao casamento após a acessão do cristianismo.

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Com isso, é inevitável para o entendimento da família brasileira o estudo associado às suas raízes que por vezes ainda influenciam em grande medida as concepções de família em nossa sociedade.

Partindo desta premissa, interessante é mencionar que, no tempo do império, apenas o casamento católico era reconhecido, marcando o monopólio da religião em relação ao vínculo matrimonial. Com o advento da imigração, onde o número de pessoas não católicas aumentou, surgiu a necessidade da intervenção do Estado, sendo assim criado o denominado casamento misto (NORONHA e PARRON, 2012).

Nota-se, assim, que outrora os ditames matrimoniais e, por consequência, a formação da família era fiscalizada e legitimada por parte dos dogmas religiosos da igreja católica, sendo que apenas após a crescente aumento de não católicos no processo de imigração surgiu a possibilidade do casamento misto.

Com a ruptura entre igreja e o domínio da celebração do casamento, o Estado paulatinamente passou a regulamentar a família sob o enfoque social, sendo que esta instituição passou a ser considerada uma peça fundamental para sua estrutura. Em vista disso, onde antes orbitava interesses eminentemente patrimoniais, foram vinculados novos paradigmas, entre os quais a afetividade (NORONHA e PARRON, 2012).

Da mesma forma, a Constituição Federal de 1988, trouxe princípios que modificaram diretamente a organização estabelecida em relação ao Direito de Família, como o materializado princípio da dignidade da pessoa humana, constante em seu artigo 1°, inciso III. Com isso, tomando por base a lei maior, pode-se desconstituir uma série de preconceitos e posições que anteriormente imperavam no conceito da família propriamente dita (NORONHA e PARRON, 2012).

Nesse contexto, pode-se afirmar que a concepção de família é complexa e só pode ser constituída a partir de uma série de percepções das mais diferentes áreas do saber humano, contudo, existem aspectos que

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inevitavelmente se vinculam, independente de sua origem, principalmente, o associado à questão da afetividade para a configuração do seio familiar.

Salienta-se, ainda, que diferentes elementos, como os de natureza cultural e religiosa, modificam substancialmente as estruturas atreladas ao seio familiar e sua própria compreensão como instituição.

2.2 Tempos de COVID-19

Como um recorte no tempo e no percurso da vida, surgiram novos desafios. A rotina das pessoas e das famílias foi alterada. Algo que se tinha ouvido falar em tempos remotos, e até então distantes volta a acontecer. E como uma repetição do passado, estamos vivendo tempos de pandemia.

De acordo com Rodrigues (2020) o novo coronavírus não é o primeiro causador de pandemias mundiais. Em outros momentos, doenças se espalharam pelo mundo e também provocaram danos. A peste bubônica, a varíola, a cólera, a gripe espanhola e a gripe suína foram as principais pandemias que assolaram o planeta. A humanidade conseguiu superar todas elas.

Foi em dezembro de 2019, na cidade de Wuhan, no sul da China, que surgiu o primeiro caso do novo coronavírus (COVID19), provavelmente originado do morcego (Zhou, 2020).

Pesquisadores chineses observaram que trabalhadores de um mercado local de frutos do mar, desenvolviam uma doença semelhante a uma pneumonia, mas sem resposta eficaz para tratamento. Os trabalhadores apresentavam febre, tosse seca, dor de cabeça, dificuldades respiratórias e pneumonia. A doença iniciava com insuficiência respiratória progressiva e podia levar à morte (Zhou, 2020).

Desde o surgimento na China, o novo coronavírus se espalhou pelo mundo e de lá para cá chegou ao Brasil. O primeiro caso surgido no Brasil foi em fevereiro deste ano, na cidade de São Paulo. O homem de 61 anos com

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histórico de viagem à Itália foi tratado no hospital e atualmente está curado (Ministério da Saúde).

Ao chegar ao Brasil o novo coronavírus alterou toda uma relação pré-estabelecida de organização das pessoas e das famílias, mudando os hábitos e rotinas de todos.

Desde o início de fevereiro de 2020 a Organização Mundial da Saúde (OMS), passou a chamar a doença causada pelo novo coronavírus de COVID– 19, representadas pelas iniciais de “Doença do Cororavírus” (em inglês) e o ano do surgimento: 19 (Fiocruz).

A OMS declarou no final de janeiro de 2020 o surto da doença causada pelo novo coronavírus Emergência de Saúde Pública Internacional e em março de 2020 a doença foi caracterizada como uma pandemia de abrangência mundial.

Uma das estratégias utilizadas para diminuir a propagação do vírus foi o distanciamento social, necessário para evitar aglomerações de pessoas, tendo em vista que o vírus é de rápida transmissão.

Segundo o Ministério da Saúde, em 15 de julho de 2020, os casos de COVID-19 registrados no Brasil eram de 1.966.748 e de 75.366 mortes. Em 22 de março de 2021, saltaram para 12.047.526 casos e 295.425 óbitos.

De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) foram confirmados no mundo 13.150.645 casos de COVID-19 e 574.464 mortes até o dia 15 de julho de 2020. Mais recentemente, conforme a Organização Mundial de Saúde, em 22 de março de 2021, o mundo estava com 122.992.844 casos de coronavírus e 2.711.071 mortes.

Em março de 2020 uma Nota do Comitê de Saúde da Pessoa Idosa de pesquisadores da Fundação Osvaldo Cruz (FIOCRUZ) sobre o COVID-19 faz referência ao isolamento para pessoas de todas as idades como importantes neste momento de pandemia.

Observou-se, assim, que é importante colaboração da sociedade geral na prevenção da doença, principalmente, com o uso de máscaras somado a hábitos de higiene pessoal, lavando as mãos com água e sabão, bem como o

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uso de álcool em gel. Considerou-se indispensável o cuidado principalmente com os grupos de risco, integrando entre eles os idosos e pessoas com doenças crônicas (diabetes, hipertensão) (FIOCRUZ).

Estudos recentes evidenciam que a pandemia e as medidas adotadas para o seu enfrentamento impactam a saúde mental dos sujeitos e acarretam o surgimento de sintomas, tais como o estresse, ansiedade e depressão. Em face de tal observação, pode-se concluir que a COVID-19 transcende o conceito de crise epidemiológico, de modo que acaba sendo um desafio do ponto de vista psicológico (Crepaldi, Schmidt, Noal, Bolze & Gabarra, 2020).

Para além disso, quando os cuidados de prevenção falham e, deste modo, ocorre a infecção viral no seio familiar, os entraves para manutenção da saúde mental acabam sendo ainda maiores, posto que isso traz consequências variadas, sejam de ordem financeira, sejam de ordem emocional. Em complemento a isso, cita-se que por vezes, lutos sequenciais são uma possibilidade nefasta na atual realidade, razão pela qual, as famílias enfrentam dificuldade no adaptar-se às sucessivas perdas (Crepaldi, Schmidt, Noal, Bolze & Gabarra, 2020).

O isolamento impõem afastamentos inclusive na hora da morte, impossibilitando a realização de rituais comuns a este momento. A ruptura deste processo ocasiona na impossibilidade de resolução de questões afetivas familiares, como o compartilhamento final de memórias, e da manifestação de agradecimentos ou pedidos de perdão. Tais ações impactam diretamente na família sob vários aspectos e irão refletir nas inter-relações entre os seus integrantes (Crepaldi, Schmidt, Noal, Bolze & Gabarra, 2020).

No entanto, a tecnologia vem sendo utilizada para minorar os danos relacionados ao processo de despedida, de modo que, quando se faz possível, são ofertados smartphones ou computadores para possibilitar o contato durante o processo de tratamento ou mesmo de despedida (Crepaldi, Schmidt, Noal, Bolze & Gabarra, 2020).

Outra problemática está associada ao sofrimento vivenciado, mesmo quando não há perda concreta de um ente querido, exemplo disso é a dor e o

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sofrimento por aqueles que foram acometidos pelo vírus. Tal questão demonstra a relevância do estudo psicológico deste fenômeno, não apenas durante período pandêmico (Crepaldi, Schmidt, Noal, Bolze & Gabarra, 2020).

Em vista disso, famílias dos mais variados países, cada uma dentro da sua individualidade e com suas próprias especificidades, passam a enfrentar a pandemia como um desafio de proporção consideravelmente desafiadora. No entanto, a tecnologia apresenta-se como uma alternativa, a qual contribui nos mais variados momentos, seja ao longo do processo de prevenção, recuperação e, para os casos irreversíveis da patologia, de despedida.

2.3 Novas conexões

Para diminuir a transmissão do vírus, a recomendação é que se evite sair de casa. Embora necessária essa medida pode também afetar a saúde mental das pessoas. Mesmo aquelas que não estejam infectadas pelo vírus, podem apresentar alguns sintomas em decorrência do isolamento (Crepaldi, Schmidt, Noal, Bolze & Gabarra, 2020).

É importante observar o comportamento do grupo familiar, pois estes que antes mantinham proximidade em suas casas, agora necessitam manter o distanciamento mútuo, para protegerem-se de eventual exposição. Todas essas nuances e mudanças na forma da família se relacionar pode gerar sintomas de ansiedade, medo e depressão conforme referido anteriormente.

Para Ornell (2020) o medo é um mecanismo de defesa fundamental para a sobrevivência e juntamente com a raiva deve ser considerado numa pandemia, mas quando é crônico e desproporcional torna-se prejudicial e pode acarretar no surgimento de transtornos psiquiátricos. No momento vivido, o número de pessoas com a saúde mental afetada pode superar o de pessoas atingidas pela infecção.

Conforme Camarano (2004), no Brasil, a saída da casa dos pais tem-se verificado com idades avançadas, ocorrendo aproximadamente aos 26 anos,

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motivado também por restrições econômicas. Para a autora, os lares das famílias brasileiras apresentam especificidades e peculiaridades próprias.

A mudança na rotina de todos, principalmente com os idosos, o reflexo na convivência das famílias, os problemas financeiros gerados pela crise econômica, comércio e serviços fechados, o desemprego, as dúvidas e incertezas. Tudo isso pode gerar sentimentos de desamparo e solidão. Também se observam ansiedade, insônia e raiva.

Outras pessoas podem se sentir sozinhas e tristes. Algumas estratégias mostram-se eficazes para o enfrentamento deste momento. O estreitamento de laços por redes sociais, o apoio social de vizinhos, os hábitos de sono e alimentação saudáveis, a música, os exercícios físicos que podem ser feitos em casa, a importância de informações precisas da saúde para reduzir os impactos e os rumores quanto à grande quantidade de informação muitas vezes excessiva (Raony, 2020).

Conforme Ornell (2020) recomendações de saúde mental durante a pandemia devem incluir cuidar de si e dos outros, manter atividades de lazer, dentro dos protocolos estabelecidos, prestar atenção nas suas necessidades, sentimentos e pensamentos, limitar notícias relacionadas a pandemia, pois podem acarretar em distúrbios de ansiedade. Realizar televisitas por meios de chamadas telefônicas ou de vídeos também são uma opção, além do uso de redes sociais que permitam a comunicação à distância, de modo a facilitar a comunicação e troca de sentimentos neste momento tão confuso.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observou-se que família pode ser entendida como uma construção ao longo do tempo, com características específicas e singulares, articulada desde sua origem até o presente. As mudanças na sua configuração acompanham o nosso tempo, trazendo novos paradigmas e formatos. Desde famílias socioafetivas, recasadas até homoafetivas permeiam o nosso cotidiano e geram novas relações familiares. Com base nisso, nota-se que o meio familiar

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atual certamente sofrerá alterações significativas com o advento da pandemia e suas limitações que lhe são inerentes.

Por conseguinte, como um recorte no tempo, a sociedade vive hoje um desassossego, causado pelo surgimento do novo coronavírus e isso também impacta nas famílias. Muitas rotinas foram alteradas e, com isso, aqueles que antes viviam e conviviam com seus afetos, hoje precisam usar máscaras, não podendo mais tocar, abraçar ou beijar o pai, a mãe, os avós e os filhos. Os idosos, que pertencem ao grupo de risco em meio à COVID-19, precisam resguardar-se, e seus filhos, para protegê-los, não podem mais visitá-los da maneira como faziam antes. Várias mudanças e nuances para garantia da saúde física e mental surgiram num curto espaço de tempo e, para o alcance da proteção frente à pandemia, muitas vezes é cobrado um preço emocional alto, ainda que necessário.

Da mesma forma, pessoas, mesmo que não estejam infectadas, têm sua rotina modificada, ficando sujeitas a problemas de saúde mental e também podem apresentar tristeza e depressão.

Algumas estratégias para minimizar o impacto do isolamento social e dos problemas causados pelo distanciamento, tendo como exemplo: ouvir música, realizar atividade física em casa, manter atividades de lazer, realizar chamadas telefônicas e de vídeos através das redes sociais, ajudam no estreitamento de laços sociais e minimizam o sentimento de desamparo e solidão nestes tempos de pandemia.

Ademais, a tecnologia auxilia no processo de morte, de modo que garante que rituais antigos de despedida sejam concretizados ainda que de uma outra forma. Os smartphones e computadores acabam proporcionando uma efetiva aproximação dentro de uma realidade de distanciamento, ferramentas estas que devem ser utilizadas e ofertadas em grande quantidade na relação familiar contemporânea e até mesmo fora dela.

Mais uma vez a família tem um grande desafio, o de reinventar-se, resignificando suas relações interpessoais, usando a criatividade e as novas tecnologias para conviver com os outros sem a proximidade física.

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Paradoxal e dissonante é o tempo presente. É um momento onde ocorre a valorização daquilo que de fato é essencial, como o carinho, o afeto, o cuidado e a solidariedade. A família terá que atravessar mais este grande desafio. O importante é que já conseguiu superar em outros momentos no passado. É importante para a família ser resiliente.

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Recebido em: 07/10/2020 Aceito em: 12/12/2020

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Referências

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