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Adoçantes e a microbiota intestinal. Dr. Bruno Halpern Endocrinologista e Clínico-geral

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Academic year: 2021

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Dr. Bruno Halpern

Endocrinologista e Clínico-geral

Endocrinologista pela USP e Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Coordenador do Centro de Controle de Peso do Hospital 9 de Julho Pós-graduando do Grupo de Obesidade do Hospital das Clínicas - HCFMUSP Coordenador da Reunião Metabólica do Hospital das Clínicas - HCFMUSP

Adoçantes

e a microbiota

intestinal

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Enquanto a princípio pareça claro que a troca simples de nutrientes calóricos (como o açúcar) por outros não calóricos levaria a uma redução do consumo energético e consequentemente do peso corporal, há hipóteses que sustentam que a relação pode ser muito mais complexa.¹, ²

A relação entre o consumo

de adoçantes e as alterações

metabólicas é alvo de discussão

há muitas décadas.

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Por exemplo, a ativação de receptores de sabor causada por adoçantes poderia aumentar o desejo por outros alimentos em refeições subsequentes, como já foi demonstrado em animais de experimentação (mas não em humanos), assim como essas substâncias não calóricas poderiam ativar vias metabólicas específicas, levando a um aumento dos níveis de insulina.3, 4 Estudos epidemiológicos não nos ajudam muito nessas

questões, por gerar resultados distintos e muitas vezes opostos, além de não estabelecerem relação de causa e efeito (por exemplo, uma maior prevalência de obesidade em uma população que consome adoçantes pode significar apenas que indivíduos obesos, na tentativa de perder peso, consomem mais substâncias que poderiam auxiliá-los).5

De toda forma, estudos randomizados, na maioria de curto prazo, que avaliaram uma troca simples de açúcar por adoçantes (sem outras modificações nutricionais) demonstraram, sim, perda de peso.6, 7 Mesmo

assim dúvidas persistem, pois dados de longo prazo são mais escassos, e esses efeitos benéficos iniciais poderiam se perder caso essas substâncias suscitassem mudanças lentas em nosso metabolismo.

Recentemente, mais controvérsias surgiram sobre o assunto com a publicação de artigos que sugerem que adoçantes poderiam alterar a flora bacteriana e, através desta alteração, levar à resistência à insulina.8, 9 Esse tema é de imensa relevância, visto que a relação entre

a microbiota intestinal e as doenças metabólicas - como obesidade e diabetes - vem sendo mais explorada e demonstrada nos últimos anos, e diversos estudos experimentais encontram uma relação de causa e efeito bem estabelecida, isto é, a microbiota intestinal interferindo positiva ou negativamente no ganho de peso, resistência à insulina e lipogênese.10, 11

Como exemplo, temos os estudos com transplante fecal em animais livres de bactérias, que, ao receberem a microbiota de animais obesos, engordam rapidamente, bem mais do que ao receberem fezes de animais magros, além de claramente terem redução de sua sensibilidade à insulina.12, 13

Nesse sentido, discutiremos a seguir alguns dados em animais de experimentação em relação à mudança de microbiota com o uso de adoçantes e os poucos dados em humanos.

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Nesse estudo seminal, os autores usaram ratos C57Bl/6 como modelo experimental.14 Na primeira parte do estudo, foram utilizados três adoçantes: sacarina, aspartame e sucralose. Após o uso por 11 semanas, os três grupos apresentaram intolerância à glicose superior à vista com o grupo controle, porém esse efeito foi mais pronunciado com o uso da sacarina, que foi escolhida para ser utilizada nos modelos subsequentes.

Na etapa seguinte, os autores alimentaram os animais com uma dieta rica em gordura, gerando um ganho de peso importante, para novamente alimentá-los com água com glicose ou sacarina, em uma dose semelhante à recomendada como máxima pelo FDA para consumo humano. Novamente, após 5 semanas, houve piora da tolerância à glicose nesses animais.

Em seguida, a ideia foi testar se essas alterações poderiam ter uma relação direta com a microbiota intestinal. Para tanto, usaram-se antibióticos de amplo espectro - ciprofloxacina, metronidazol e vancomicina - em diferentes animais, e o resultado foi uma equiparação da resposta glicêmica nos animais que consumiam glicose ou sacarina após 4 semanas com antibióticos. Os autores concluíram, portanto, que a sacarina gerou influências em diversos filos bacterianos, tanto Gram negativos como positivos. Para demonstrar uma relação causal, em seguida foi feito transplante de fezes dos animais que receberam a glicose ou a sacarina para animais livres de bactérias. Como esperado pelos autores, houve piora da resistência à insulina nos animais que receberam a microbiota alterada pela sacarina, o que não ocorreu no grupo que recebeu a microbiota do grupo controle; os testes foram feitos apenas 6 dias após o transplante. Ao se analisarem diretamente as bactérias a um aumento principalmente de bacteroides e clostridiales e uma redução de Lactobacillus reuteri e de

Akkermansia muciniphila, esta última recentemente apontada como uma

bactéria com potencial metabólico favorável, em uma série de estudos.15 Entre as razões encontradas para as modificações está a maior produção de ácidos graxos de cadeia curta pela microbiota dos animais que receberam sacarina, gerando maior lipogênese e glicogênese.

Microbiota

intestinal

e adoçantes:

o estudo de

Suez e cols.

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A parte do estudo de Suez feita em humanos tem um poder de evidência menor, por não poder correlacionar tão bem causa e efeito e porque a parte intervencionista do estudo reuniu apenas 7 indivíduos.

Os autores mostram um pior perfil de tolerância à glicose nos habituais consumidores de adoçantes, mesmo pareado para IMC, além de perfis de microbiota diferentes entre eles. A parte mais interessante, porém, é o estudo de uma semana, no qual pessoas que não consomem comumente adoçantes utilizaram sacarina na dose máxima recomendada pelo FDA. Após esse período, 4 indivíduos apresentaram piora de sua tolerância à glicose, enquanto em 3 o perfil permaneceu semelhante. O que é mais fascinante, porém, é que nesses 4 respondedores houve uma clara mudança da flora bacteriana,

o que não ocorreu nos 3 não respondedores. Quando as fezes foram transferidas para ratos livres de bactérias, os resultados se confirmaram: intolerância à glicose nos ratos que receberam as fezes dos respondedores após o fim do experimento e tolerância normal nos que receberam dos não respondedores, e também nos que receberam dos dois grupos, antes do experimento. Esse dado sugere que, dependendo da flora bacteriana de base (que depende de múltiplos fatores), o consumo de sacarina pode levar a um desequilíbrio da flora inicial e gerar resistência à insulina. Devemos lembrar, contudo, que a dose utilizada foi alta e por tempo curto, e não podemos afirmar se essas alterações iniciais se manteriam com o uso mais prolongado ou mesmo se doses menores, que são as normalmente utilizadas pela população, teriam o mesmo impacto.

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Outros

estudos

Uma pesquisa de Palmnäs e colaboradores demonstrou o aspartame de maneira semelhante e novamente encontrou mudanças da flora bacteriana nos animais expostos a doses que, em humanos, corresponderiam de 2 a 3 latas de refrigerante diet por dia.17 Nesse estudo, houve um aumento de bactérias que produzem

propionato, que tem ações próprias na piora da resistência à insulina. Um estudo mais antigo com sucralose (no qual os animais a recebiam por gavagem) também demonstrou redução significativa da variedade bacteriana, principalmente de bactérias consideradas benéficas, como as bifidobactérias.18

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Conclusão

Dados em animais de experimentação apontam para uma relação entre o consumo de adoçantes (geralmente em doses elevadas) e as mudanças da flora bacteriana que propiciam piora da sensibilidade à insulina. Esses dados não podem ser facilmente extrapolados para humanos, pois, em geral, as doses utilizadas são maiores do que as usadas pela maioria dos indivíduos, e o tempo de exposição mais curto (será que essas mudanças se perpetuam ou até pioram ou há uma adaptação da flora em longo prazo?). Devemos lembrar também que, em humanos, existem muitos outros fatores que podem impactar nessa relação, positiva ou negativamente, como outros componentes das dietas, emulsificantes e outras substâncias não nutritivas presentes em alimentos industrializados, uso de antibióticos e diversos outros.19-21

O que esses estudos nos apontam, sem dúvida, é que a relação entre a microbiota e as doenças metabólicas precisa ser melhor estudada, assim como não podemos definir os adoçantes simplesmente como substâncias não calóricas sem nenhum tipo de influência em nosso organismo. Sabemos que, em curto prazo, a substituição de açúcar por adoçantes não calóricos leva a redução de peso, em estudos randomizados, porém sabemos bem menos das mudanças que ocorrem em longo prazo. Como o consumo de açúcar sabidamente leva a ganho de peso e consequentemente resistência à insulina²², os adoçantes continuam sendo uma opção importante para redução do aporte calórico diário de muitos indivíduos. Porém, caso outros estudos sugiram que mudanças de microbiota em longo prazo possam atenuar esse efeito benéfico dos adoçantes sobre a perda de peso, uma possibilidade terapêutica seria modular essa flora bacteriana nos consumidores de adoçantes, com pré ou probióticos, permitindo a essas pessoas o prazer do gosto doce com um aporte calórico menor. Esse é um tema fascinante e esperamos que estudos sejam feitos para nos ajudar a responder a essas questões.

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REFERÊNCIAS

BIBLIOGRÁFICAS

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3. Swithers SE, Davidson TL. “A role for sweet taste: calorie predictive relation in energy regulation by rats.” Behav Neurosci 2008; 122(1):161-73.

4. Corkey BE. “Banting lecture 2011: hyperinsulinemia: cause or consequence?” 5. Mattes RD, Popkin BM. “Nonnutritive sweetener consumption in humans: effects on appetite and food intake and their putative mechanisms.” Am J Clin Nutr 2009; 89(1):1-14. 6. Rogers PJ, Hogenkamp PS, et al. “Does low-energy sweetener consumption affect energy intake and body weight? A systematic review, including meta-analyses, of the evidence from human and animal studies.” Int J Obes (Lond) 2016; 40(3):381-94.

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8. Daly K, Darby AC, et al. “Low calorie sweeteners and gut microbiota.” Physiol Behav 2016; 164(Pt B):494-500.

9. “A bitter aftertaste: unintended effects of artificial sweeteners on the gut microbiome.” Cell Metab 2014; 20(5):701-3.

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12. Bäckhed F, Ding H, et al. “The gut microbiota as an environmental factor that regulates fat storage.” Proc Natl Acad Sci 2004; 101(44):15718-23.

13. Turnbaugh PJ, Ley RE, et al. “An obesity-associated gut microbiome with increased capacity for energy harvest.” Nature 2006; 444(7122):1027-31.

14. Suez J, Korem T, et al. “Artificial sweeteners induce glucose intolerance by altering the gut microbiota.” Nature 2014; 514(7521):181-6.

15. Everard A, Belzer C, et al. “Cross-talk between Akkermansia muciniphila and intestinal epithelium controls diet-induced obesity.” Proc Natl Acad Sci 2013; 110(22):9066-71. 16. Schneeberger M, Everard A, et al. “Akkermansia muciniphila inversely correlates with the onset of inflammation, altered adipose tissue metabolism and metabolic disorders during obesity in mice.” Sci Rep 2015; 5:16643.

17. Palmnäs MS, Cowan TE, et al. “Low-dose aspartame consumption differentially affects gut microbiota-host metabolic interactions in the diet-induced obese rat.” PLoS One 2014; 9(10):e109841.

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REFORÇA o sistema imunológico com probióticos testados cientificamente e REENERGIZA

o organismo trazendo bem-estar e força.23-27

SAMM 6728 OUTUBRO 2016 • MS. N 4.1077.0305.001-5 • 3317640001

O poder dos

probióticos libera

a força interior dos

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