• Nenhum resultado encontrado

UM ESTUDO SOBRE O CURRÍCULO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "UM ESTUDO SOBRE O CURRÍCULO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL"

Copied!
14
0
0

Texto

(1)

GARCIA, Joe1 - UTP Grupo de Trabalho – Educação e Meio Ambiente Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

Neste trabalho apresentamos um estudo sobre os princípios que orientam o currículo de educação ambiental na Educação Básica, com base na análise de um conjunto de documentos governamentais e outros materiais produzidos pelo movimento ambiental, nas últimas quatro décadas. A educação ambiental, embora uma área relativamente jovem do campo educacional, em poucas décadas de existência conquistou reconhecimento formal e se tornou um componente obrigatório nos currículo dos sistemas educacionais em diversos países, em todos os níveis de ensino. Isso foi possível através de um intenso desenvolvimento impulsionado por debates, lutas e conquistas realizados em diferentes esferas, eventos e contextos históricos, do qual resultaram proposições, princípios e políticas educacionais relativos ao currículo de educação ambiental. Dentre todos esses aspectos, neste trabalho investigamos, com base em procedimentos de análise conceitual, os princípios propostos para orientar o currículo de educação ambiental, no Brasil, no contexto da Educação Básica. Tendo em mente cumprir esse objetivo, inicialmente consideramos algumas questões teóricas sobre o currículo escolar, particularmente relacionadas aos processos e forças envolvidos em sua construção. Em seguida, consideramos alguns marcos históricos do estabelecimento e desdobramento da educação ambiental, explorando proposições encontradas em documentos governamentais e não-governamentais, produzidos a partir da década de 1970. Com base nesse material, procuramos discernir, em especial, um conjunto de princípios propostos para orientar o desenvolvimento do currículo de educação ambiental na Educação Básica. Ao final, retomamos tais princípios e analisamos suas implicações para a implementação do currículo de educação ambiental no contexto da Educação Básica. O estudo revela a interdisciplinaridade como o principal princípio proposto para o currículo da educação ambiental, bem como outras proposições que lhe conferem uma configuração avançada em termos atuais.

Palavras-chave: Educação. Educação Ambiental. Currículo. Princípios. Interdisciplinaridade.

1 Doutor em Educação pela PUCSP. Professor Adjunto do Programa de Pós-Graduação em Educação da

(2)

Introdução

A educação ambiental é uma área relativamente jovem no contexto mais amplo do campo educacional, que passa a se estruturar efetivamente apenas nos anos 1970. Em poucas décadas, entretanto, ela conquistou reconhecimento formal e se tornou um componente obrigatório nos currículo dos sistemas educacionais de diversos países, em todos os níveis de ensino. Isso foi possível através de intensos debates, lutas e conquistas realizados em diferentes esferas, em eventos dentro e fora do Brasil, em fóruns governamentais e não-governamentais, que resultaram na produção de diferentes documentos, contendo princípios, proposições, manifestos e políticas educacionais.

O estudo desses documentos revela não somente os processos que historicamente constituíram a educação ambiental, tal como hoje a vemos ser praticada nas escolas, mas um conjunto de princípios propostos para nortear a implementação do currículo de educação ambiental, particularmente no contexto da Educação Básica. Nesse processo de constituição encontramos a concorrência de diversas abordagens e de diferentes proposições que resultaram em alguns princípios importantes para a implementação do currículo de educação ambiental na Educação Básica. Tais princípios, entretanto, fornecem não somente um conjunto de orientações para o desenvolvimento do currículo, mas uma leitura do papel atribuído à educação ambiental no contexto mais amplo das finalidades da Educação. Afinal, haveria uma relação intrincada entre os desafios ambientais a serem enfrentados em nosso planeta e o papel futuro a ser exercido pelas escolas (HUTCHISON, 2000, p. 15). Isso implica, por exemplo, a necessidade de avançarmos a reflexão sobre as relações entre questões ambientais e a composição do currículo de Educação Básica.

Neste trabalho apresentamos um estudo teórico sobre os princípios que orientam o currículo de educação ambiental na Educação Básica, desenvolvido com auxílio de procedimentos de Análise Conceitual (COOMBS e DANIELS, 1991) de um conjunto de documentos governamentais e outros materiais produzidos pelo movimento ambiental, nas últimas quatro décadas. Para essa finalidade, o texto a seguir está organizado da seguinte forma. Inicialmente apresentamos algumas questões teóricas sobre o currículo escolar, particularmente relacionadas aos processos e forças envolvidos em sua construção. Em seguida, consideramos alguns marcos históricos do estabelecimento e desdobramento da educação ambiental, explorando proposições encontradas em documentos governamentais e não-governamentais, produzidos a partir da década de 1970. Com base nesse material,

(3)

procuramos discernir, em especial, um conjunto de princípios propostos para orientar o desenvolvimento do currículo de educação ambiental na Educação Básica. Ao final, analisamos tais princípios e suas implicações para a implementação do currículo de educação ambiental, no contexto da Educação Básica.

Algumas Questões Teóricas sobre Currículo

Na literatura educacional há diferentes leituras sobre como o currículo escolar, afinal, é produzido. Uma dessas leituras sugere que o currículo resulta de decisões sobre quais conhecimentos são considerados os mais importantes para serem ensinados a todos os alunos nas escolas. Neste sentido, ele resulta de um conjunto de escolhas. E, na medida em que essas escolhas envolvem a seleção ou a exclusão de determinados elementos que compõe a cultura humana, elas precisam recorrer a critérios que supostamente diferenciam aquilo que é mais importante dentro de um campo de diversas possibilidades. É neste sentido que alguns teóricos argumentam que o estabelecimento de um currículo envolve seleção cultural (PEDRA, 2000; SILVA, 1999).

No centro das determinações do currículo, portanto, encontramos um processo complexo de tomada de decisão sobre o que será ensinado nas escolas, que envolve diversos níveis de seleção (PEDRA, 2000). Mas, esse processo não é neutro, ausente de dúvidas ou livre de disputas. Sobre ele incidem diferentes mecanismos de poder (APPLE, 2006), interesses e influências, e a participação de múltiplos agentes (SACRISTÁN, 2000, p. 101). Isso faz com que a composição do currículo ofertado nas escolas, em todos os níveis de ensino, constitua um território muito disputado por diferentes forças. Tal como observam Moreira e Silva (2011, p. 7-8), "O currículo está implicado em relações de poder", pois "transmite visões sociais particulares e interessadas". Assim, ao mesmo tempo em que a produção do currículo envolve invenção, também reflete disputas entre diferentes visões, proposições ou princípios educacionais.

Em sua breve existência, a educação ambiental parece ainda à procura de um discurso pedagógico estável. Desde o seu surgimento, nos anos 1970, a educação ambiental vem incorporando proposições educacionais que tanto a constituem sob abordagens educacionais avançadas, quanto tornam complexa a implementação do seu currículo na Educação Básica. Sob essa perspectiva, portanto, nos parece razoável afirmar que o currículo da educação ambiental encontra-se em meio a um processo de invenção, mas sujeito à influência de

(4)

diferentes forças. Sob essa perspectiva, a constituição da educação ambiental, particularmente no contexto da educação brasileira, oferece um horizonte de investigação muito interessantes para os estudos de currículo.

É a partir da perspectiva acima que desejamos investigar as proposições que estariam concorrendo para definir as linhas do currículo da educação ambiental, na atualidade, no contexto da Educação Básica. Em especial, desejamos saber quais proposições podem ser encontradas nos textos que registram o processo de invenção do currículo de educação ambiental nas últimas décadas? Em resposta a esta indagação, neste trabalho, analisamos os princípios propostos para o desenvolvimento do currículo de educação ambiental.

De um lado encontraremos proposições que tentam originar um currículo que consiga manter-se em sintonia aos tantos desafios ambientais que têm sido percebidos nas últimas décadas. Mas ele deve, sobretudo, ser capaz de fornecer um tipo de aprendizagem que forneça não somente conhecimentos, mas compreensão, valores e competências, bem como um sentimento de urgência e desejo de transformação, para que as crianças que hoje formamos possam, desde agora, atuar na mudança da qualidade de vida em nosso planeta. Mas que tipo de currículo seria mais capaz de produzir esse tipo de aprendizagem? Quais deveriam ser os princípios de sua implementação? Tais são perguntas a explorar neste trabalho.

Princípios do Currículo de Educação Ambiental

No cenário internacional, a ideia de educação ambiental pode ser encontrada já em meados dos anos 1960. Entretanto, é a década de 1970 que constitui um divisor de águas para esta área, em função de um conjunto de eventos, documentos e iniciativas produzidos naquele período, que foram fundamentais para o início do delineamento de um currículo para a educação ambiental.

Desde seu surgimento, a Educação Ambiental vêm incorporando diferentes princípios curriculares, propostos na medida em que avança o conhecimento sobre meio ambiente e são produzidas e exploradas novas abordagens educacionais. É interessante destacar que as transformações no currículo da educação ambiental nas escolas têm refletido particularmente as mudanças na compreensão dos problemas ambientais. Como veremos mais adiante, a finalidade da educação ambiental vai avançar da ideia de preservação ambiental para a intervenção e formação de consciência socioambiental, implicando transformações e desafios ao seu currículo na Educação Básica.

(5)

As primeiras orientações curriculares propostas para a educação ambiental surgiram ao longo dos anos 1970, derivadas principalmente de debates e proposições produzidos em importantes congressos internacionais. Naquele momento, entretanto, a educação ambiental nas escolas estava relacionada à necessidade de resolver a crise ambiental percebida na época, bem como superar as racionalidades em crise que haviam conduzido o planeta àquela condição.

Ao longo dos anos 1970 ocorreram alguns eventos muito importantes para a Educação Ambiental. Em 1972 ocorreu a "Conferência de Estocolmo", ou Conferência das Nações Unidas sobre o Homem e o Meio Ambiente, evento que se tornou um marco histórico para os debates sobre os desafios ambientais mundiais e o que deveria ser feito para superá-los. Nele foi elaborada a chamada Carta de Estocolmo (UNEP, 1972), uma declaração sobre o meio ambiente que estabelece 23 princípios dedicados a orientar e inspirar a tarefa de preservação e melhoria do ambiente humano. Dentre estes, destacamos o princípio 19, que afirma ser essencial a educação sobre questões ambientais, para formar uma visão esclarecida e uma conduta responsável na proteção e melhoria do meio ambiente. Ainda desta Conferência partiu uma recomendação para o estabelecimento de um programa internacional de educação sobre o meio ambiente, de abordagem interdisciplinar, voltado a todos os níveis de ensino. É interessante destacar, portanto, a proposta de interdisciplinaridade para o currículo da educação ambiental, desde o início deste campo educacional.

Em 1975, durante o Encontro Internacional em Educação Ambiental, realizado em Belgrado (hoje capital da Sérvia), foi instituído, o Programa Internacional de Educação

Ambiental (PIEA), sob o apoio da UNESCO e do Programa das Nações Unidas para o Meio

Ambiente (PNUMA). Desde então, este Programa tem produzido diversos materiais com orientações curriculares para educação ambiental, que enfatizem um ensino baseado em

interdisciplinaridade, reflexão crítica e resolução de problemas. Dois anos depois, em 1977,

na Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental, também conhecida como

Conferência de Tbilisi. Neste evento foi produzida uma declaração, conhecida como a Carta de Tbilisi, que afirma o importante papel da educação ambiental na preservação e melhoria do

meio ambiente, bem como no desenvolvimento equilibrado do mundo, e ajuda a clarificar suas características, objetivos e princípios gerais.

Os princípios norteadores da educação ambiental apresentados na Carta de Tbilisi fornecem algumas noções curriculares importantes. Eles afirmam, por exemplo, que a

(6)

educação ambiental deve assumir uma abordagem interdisciplinar, que articule diferentes disciplinas para promover uma percepção integrada dos problemas de meio ambiente. Também propõe uma abordagem curricular que englobe atividades práticas e experiências

concretas, e atribui aos estudantes um papel na definição dos processos de aprendizagem.

Além disso, enfatiza que a educação ambiental deveria estar baseada em aprendizagem que empregue análise crítica e o desenvolvimento de habilidades de resolução de problemas reais encontrados nas comunidades onde vivem os estudantes.

Com base na análise das propostas, documentos, cartas e recomendações para a educação ambiental, produzidos nos anos 1970, particularmente na esfera internacional, é possível distinguir a interdisciplinaridade como principal diretriz a ser considerada na elaboração do seu currículo. Além disso, a finalidade da educação ambiental, naquele período, estava relacionada fundamentalmente à noção de preservação ambiental, perspectiva que refletia uma leitura dos problemas ambientais e do papel atribuído à educação, bem como fornecia uma diretriz para as escolhas do que seria ensinado e como isso será feito nas escolas.

A partir dos anos 1980 ocorreu uma revisão na noção de educação ambiental como algo centrado na preservação ambiental. O discurso pedagógico da educação ambiental vai se afastar do foco de preservação ambiental para explorar uma perspectiva mais complexa, que propõe o desafio de avançar na direção de uma educação ambiental pensada como educação política (REIGOTA, 2009). Naquela década, os problemas de meio ambiente passaram a ser discutidos sob a visão mais ampla das questões de desenvolvimento social e econômico, e surgiu a vertente socioambiental de educação ambiental. Nesta nova perspectiva, os problemas ambientais deixam de ser pensados como algo relacionado apenas à natureza para serem compreendidos como decorrente da ação social. E a educação ambiental vai contemplar formas de intervenção da sociedade sobre a natureza e passar a ser percebida como um fundamento da formação para o exercício de cidadania.

A década de 1980 foi muito importante para a educação ambiental, particularmente na esfera internacional, pois em diversos países surgiram movimentos pela inclusão da discussão ambiental no currículo, em todos os níveis de ensino. Em 1981 foi estabelecida a Política

Nacional de Meio Ambiente (PNMA), que defendia a inclusão da educação ambiental em

todos os níveis de ensino. Essa perspectiva vai ter ressonância na Constituição Federal, promulgada em 1988, que estabelece, no inciso VI do artigo 225, a necessidade de “promover

(7)

a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente” (BRASIL, 1988). Também em 1981 foi instituído o Conselho

Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). Este Conselho, um órgão consultivo e deliberativo

do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), estabelece, em 1984, uma proposta de diretrizes para a educação ambiental (mas que acaba sendo abandonada).

Finalmente, próximo ao fechamento daquela década ocorreu um avanço importante no processo de inserção da educação ambiental no currículo da Educação Básica. Em 1987, o MEC aprovou o Parecer n.º 226/87 (BRASIL, 1987), que estabeleceu a inclusão da educação ambiental nos currículos do Ensino de 1º. e 2º. Graus (atualmente denominados de Ensino Fundamental e de Ensino Médio. Essa disposição, em sintonia ao que estava ocorrendo em sistemas educacionais de diversos países desenvolvidos, pode ser considerada um dos mais importantes avanços daquela década para a educação ambiental.

A partir do final dos anos 1980, houve uma ampliação da discussão ambiental no país, com o surgimento de novas denominações para conceituar a educação ambiental e a proposição de diferentes orientações para suas práticas pedagógicas (HENRIQUES et al, 2007, p. 22-24). Esse movimento, segundo Sauvé (1997), estaria refletindo a existência de uma variedade de vertentes teóricas no movimento ambiental, que iriam inspirar e derivar diferentes abordagens e práticas pedagógicas de educação ambiental.

Nos anos 1990 encontramos importantes avanços nas discussões sobre educação ambiental, bem como implicações para o currículo. Em 1991, uma proposta do Programa das

Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), destaca o princípio de desenvolvimento sustentável. Essa ideia teria um impacto importante nas discussões ambientais com

conseqüências para a educação ambiental, como se tornaria evidente, no ano seguinte, em 1992, na realização, no Rio de Janeiro, da Conferência das Nações Unidas sobre Meio

Ambiente e Desenvolvimento - também conhecida como "Rio 92". Deste evento surgiu a Agenda 21, bem como a Carta Brasileira de Educação Ambiental. Mas talvez o conceito mais

destacado naquela conferência seja o de sustentabilidade, que iria inspirar abordagens e práticas pedagógicas, constituindo-se um novo princípio curricular que tem persistido no discurso da educação ambiental, entre alguns grupos, até o momento.

O conceito de sustentabilidade se refletiu na noção de educação ambiental como educação para o desenvolvimento sustentável, que recebeu críticas contundentes de Sauvé (2005, p. 310-320), pois estaria comprometida com uma ideologia do desenvolvimento, que

(8)

mantém a noção de educação ambiental como um instrumento a serviço da conservação a longo prazo do meio ambiente. Para aquela autora, a estratégia de desenvolvimento sustentável pode acabar sendo confundida com um projeto de sociedade e impõe uma visão reducionista e hegemônica à educação ambiental, que corre o risco de passar a ser concebida como educação para o desenvolvimento econômico sustentável. Isso implicaria um distanciamento de uma perspectiva educativa capaz de pensar de modo mais amplo a noção de educação ambiental como um projeto de melhoria da nossa relação com o mundo, tanto em uma perspectiva individual, como de conjunto, que iria contribuir para o desenvolvimento de sociedades responsáveis (p. 321). Mas, apesar das muitas críticas, o conceito de sustentabilidade tem se mantido presente no discurso da educação ambiental, em diversos países, sob diferentes perspectivas, mas não sem encontrar forte resistência entre muitos educadores (REIGOTA, 2009).

O final dos anos 1990 trouxe alguns avanços importantes para o currículo da educação ambiental, no Brasil. Entre 1997 e 1998, no contexto da reforma curricular da Educação Básica, o Ministério da Educação lançou os Parâmetros Curriculares Nacionais para o

Ensino Fundamental (BRASIL, 1997, 1998a). Tais documentos orientam que a educação

ambiental deve ser formalmente trabalhada no currículo através de um tema transversal denominado meio ambiente. Deste modo, a educação ambiental vai estar presente no currículo não como uma disciplina específica, mas através de práticas pedagógicas interdisciplinares que possibilite uma aprendizagem baseada no diálogo entre diferentes matérias do currículo.

Em 1999, o MEC, através da Política Nacional de Educação Ambiental (BRASIL, 1999), propõe que a educação ambiental seja desenvolvida no currículo de todos os níveis educacionais, incluindo a Educação Básica, e instituí como princípio básico da educação ambiental, o "pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, na perspectiva da inter, multi e transdisciplinaridade". Dessa forma, vemos um esforço de inserção da educação ambiental no currículo da Educação Infantil, bem como do Ensino Médio, a exemplo do que havia ocorrido em relação ao Ensino Fundamental. E, finalmente, em 2000, vamos encontrar no texto do

Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2000), a proposta de que a educação ambiental fosse

articulada como "tema transversal" e "desenvolvida como uma prática educativa interdisciplinar integrada, contínua e permanente". Dessa forma, tal como havia sido orientado em relação ao Ensino Fundamental, também no Ensino Médio a educação

(9)

ambiental deveria ser desenvolvida através de um currículo baseado na exploração de questões ambientais sob uma perspectiva interdisciplinar e de transversalidade.

Neste século também vamos observar alguns avanços interessantes no currículo da educação ambiental, em paralelo a sua maior presença na Educação Básica. De acordo com dados do censo escolar, na primeira década deste século, já em sua primeira metade, houve um grande avanço em termos da inserção da educação ambiental nas escolas. Segundo Trajber e Mendonça (2007, p. 36): "Em 2001, o número de escolas de Ensino Fundamental que ofereciam Educação Ambiental era de aproximadamente 115 mil, ao passo que, em 2004, foram registradas quase 152 mil instituições". Além disso, em 2004, 94% das escolas do Ensino Fundamental do Brasil estariam exercendo práticas de Educação Ambiental.

Em 2006 o MEC apresenta as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (BRASIL, 2006). Nesse documento, a exemplo do que havia sido proposto na década anterior, encontramos a orientação que a educação ambiental deve ser tratada como tema transversal e ser desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e permanente ao longo do Ensino Médio. Mas será 2012 talvez o ano mais importante para a consolidação dos avanços em relação às políticas para a educação ambiental no Ensino Médio. Nesse ano, o MEC apresenta uma nova versão das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino

Médio (BRASIL, 2012a) que finalmente incorporam ao texto orientações formais sobre a

educação ambiental, que não havia sido mencionada nas primeiras versões daquele documento. Na primeira versão das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino

Médio, instituída pela Resolução 3/1998 (BRASIL, 1998b), havia um silêncio em relação à

educação ambiental. O mesmo ocorreu nas Resoluções ampliadas de 2005, 2006 e 2009. Mas observamos uma mudança substancial no texto das novas Diretrizes, que foram homologadas através da Resolução Nº. 2 de, 30 de Janeiro de 2012 (BRASIL, 2012a). Nesta nova versão das Diretrizes, a sustentabilidade ambiental está considerada como uma das bases da oferta e organização do Ensino Médio. Além disso, a educação ambiental deve receber tratamento transversal e estar integrada à totalidade do currículo, sendo considerada um componente curricular obrigatório em decorrência do disposto na Política Nacional de Educação

Ambiental (BRASIL, 1999). Nestas Diretrizes, finalmente, a educação ambiental é

considerada um componente transversal, que deve ser contemplado em todas as matérias do currículo do Ensino Médio. Em complemento, aquele documento estabelece que a educação ambiental deve estar contemplada no projeto político-pedagógico das escolas e ser

(10)

desenvolvida através de práticas educativas integradas, contínuas e permanentes, através estudos e atividades socioambientais.

Também é importante observar que ainda em 2012, durante a realização da

Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a "Rio+20", o Ministro

da Educação homologou o parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) que propõe as

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental (BRASIL, 2012b). Neste

documento, a educação ambiental é reafirmada como um "componente integrante, essencial e permanente da Educação Nacional", que deve estar articulada no currículo da Educação Básica e da Educação Superior, de forma integrada, portanto, também aos seus projetos pedagógicos das instituições de ensino.

Sem propor a criação de uma disciplina nova nos currículos da Educação Básica, as

Diretrizes apresentam uma clara orientação sobre a inserção curricular da educação ambiental

de uma forma integrada, transversal, contínua e permanente, em todas as matérias e atividades escolares. Aquele documento também orienta o uso de uma abordagem curricular pela qual os temas meio ambiente e sustentabilidade socioambiental sejam tratados de forma transversal, explorando o diálogo possível com conteúdos já constantes do currículo formal. Finalmente, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental sugerem que o planejamento curricular considere atividades de aprendizagem que estimulem o desenvolvimento de diversas aspectos importantes, tais como a visão integrada e multidimensional da área ambiental, o pensamento crítico, o reconhecimento e a valorização da diversidade, e outros aspectos que ajudam a formar uma consciência socioambiental. Mas há também a sugestão de que seja exercida uma educação que avance de práticas escolares fragmentadas e que promova o cuidado e responsabilidade com as diversas formas de vida, e que promova formas de observação e ações pedagógicas envolvendo projetos de intervenção. As Diretrizes, portanto, solicitam avanços claros nas práticas pedagógicas - que devem proporcionar uma formação crítica, reflexiva, ética e fundamentalmente engajada na transformação planetária.

Considerações Finais

Desde os anos 1970, a educação ambiental tem realizado avanços importantes em termos teóricos, na compreensão de seu papel e como deveria estar inserida nas escolas. Esse movimento tem proporcionado diferentes aberturas e possibilidades para pensar como deve

(11)

ser desenhado, afinal, o currículo da Educação Ambiental. Ao longo de suas poucas décadas de existência, a educação ambiental não somente tem se destacado em diversos debates e fóruns internacionais, que discutem a qualidade e continuidade da vida em nosso planeta. Mas, é sobretudo a questão sobre como educar os alunos para que sejam capazes de transformar as visões e práticas sociais que nos colocaram em risco global, que desafiam o currículo da educação ambiental.

O estudo das proposições para o currículo de educação ambiental, nas últimas décadas, aponta um conjunto de escolhas em relação ao que deva nortear a sua natureza. Em especial, encontramos uma grande ênfase dedicada à interdisciplinaridade como o principal princípio a ser observado no desenvolvimento do currículo da educação ambiental no contexto da Educação Básica. Em complemento, a orientação de que as questões da educação ambiental sejam trabalhadas através de uma abordagem transversal, ao longo do currículo – o que poderia ocorrer através de metodologias envolvendo projetos de aprendizagem ou de resolução de problemas, por exemplo. Desse modo, a educação ambiental não seria conteúdo de determinada disciplina ou grupo de disciplinas, nem tampouco uma disciplina específica e ser inserida na Educação Básica.

Através de uma perspectiva de currículo interdisciplinar a escola consegue proporcionar não somente novas aprendizagens, mas a apreensão da realidade sob novas perspectivas. Uma lição importante que temos aprendido a partir do debate sobre os problemas de meio ambiente e de suas implicações para a educação ambiental refere-se à necessidade de revermos as racionalidades que nos trouxeram a esta condição de crise civilizatória e de buscarmos visões alternativas para orientar nossa intervenção no mundo. Tal como nos lembra Leff (2001, p. 191), a complexidade da questão ambiental solicita uma revolução de pensamento. Para isso, precisamos de uma mudança de mentalidade, capaz de transformar o conhecimento e as práticas educativas.

Essa perspectiva nos desafia a conceber uma educação baseada em visões e práticas educativas distintas, que não se apóiem nas racionalidades que ajudaram a moldar a educação tradicional – que ao seu modo colaborou com a produção da crise ambiental na qual nos encontramos. Neste processo, teremos de investigar novos conceitos, explorar perspectivas ainda invisíveis, percorrer trajetos talvez desconhecidos e aprender a educar nossas crianças e jovens segundo perspectivas que as coloquem na direção de um futuro diferente daquele que tem sido desenhado até este momento.

(12)

Finalmente, destacamos duas orientações recentes em relação ao currículo de educação ambiental. Uma delas refere-se à importante articulação da educação ambiental com o projeto político pedagógico das escolas. Isso tenta garantir que as práticas de educação ambiental não se tornem ações isoladas, reflexo da simples escolha pessoal de alguns professores nas escolas. Ao contrário, a educação ambiental deve refletir a visão mais ampla da experiência educativa que a escola deseja oferecer, em todos os seus níveis de ensino e disciplinas. E a segunda orientação curricular a destacar sugere que a educação ambiental deve envolver práticas educativas integradas, que englobem estudos e atividades socioambientais que articulem projetos de intervenção socioambiental. Em consonância a outros teóricos, Hutchison (2000) defende a necessidade de um currículo ecologicamente sensível nas escolas. Uma de suas proposições reside em transformar a sala de aula em um espaço onde as crianças possam experimentar um vínculo com o mundo natural. Isso implicaria em repensar os materiais usados nas escolas, bem como os processos de ensino-aprendizagem, que deveriam tornar possível outra apreciação sobre o mundo natural e quanto a nossa relação de interdependência com ele (p. 138-139). Além disso, inspirado em Brofenbrenner (1979), Hutchison (2000, p. 140) argumenta que a escola poderia desenvolver práticas educativas baseadas na exploração dos sistemas ambientais que mediam a vida dos alunos. Dessa forma as crianças iriam não somente conhecer melhor o ambiente onde vivem, mas aprender como se compõe e funcionam suas comunidades e estreitar vínculos com elas. Este talvez seja o aspecto mais desafiador, pois requer dos professores uma imaginação pedagógica capaz de desenhar experiências de aprendizagem através das quais os alunos realmente consigam fazer alguma diferença na qualidade de vida neste planeta - e não somente compreender que isso é importante e desejar fazer algo.

REFERÊNCIAS

APPLE, M. Ideologia e currículo. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2006.

BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Resolução Nº. 2 de 30 de Janeiro de 2012. Brasília: MEC/NE, 2012a.

BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental. Resolução Nº. 2 de 15 de Junho de 2012. Brasília: MEC/CNE, 2012b.

(13)

BRASIL. Plano Nacional de Educação. Brasília: Câmara dos Deputados, 2000.

BRASIL. Política Nacional de Educação Ambiental. Lei nº. 9.795/99. Brasília: MEC, 1999. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do Ensino

Fundamental. Volume 10.3, Meio Ambiente. Brasília: MEC/SEF, 1998a.

BRASIL Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio. Resolução Nº. 3, de 26 de Junho de 1998. Brasília: MEC, 1998b.

BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais. Volume 9. Meio Ambiente, Saúde. Brasília: MEC/SEF, 1997.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. BRASIL. Parecer CFE/CEGRAU Nº. 226, de 11 de março de 1987. Brasília: MEC, 1987. BRONFENBRENNER, U. The ecology of human development. Cambridge: Harvard University Press, 1979.

COMMBS, J.; DANIELS, L. R. Philosophical inquiry: conceptual analysis. In: SHORT, E. (Ed.). Forms of curriculum inquiry. Albany; SUNY Press, 1991. p. 27-41.

HENRIQUES, R. et al (Orgs.). Educação ambiental: aprendizes de sustentabilidade. Cadernos SECAD 1. Brasília: MEC/Secad, 2007.

HUTCHISON, D. Educação ecológica: ideias sobre consciência ambiental. Porto Alegre: Artmed, 2000.

LEFF, E. Epistemologia ambiental. São Paulo: Cortez, 2001.

MOREIRA, A. F.; SILVA, T. T. Sociologia e teoria crítica do currículo: uma introdução. In: MOREIRA, A. F.; SILVA, T. T. (Orgs.). Currículo, cultura e sociedade. 12. ed. São Paulo: Cortez, 2011. p. 7-37.

PEDRA, J. A. Currículo, conhecimento e suas representações. 4. ed. Campinas: Papirus, 2000.

REIGOTA, M. O que é educação ambiental. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 2009.

SACRISTÁN, J. G. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.

SAUVÉ, L. Educação ambiental: possibilidades e limitações. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 2, p. 317-322, maio/ago. 2005.

(14)

SILVA, T. T. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.

TRAJBER, R.; MENDONÇA, P. R. O que fazem as escolas que dizem que fazem

educação ambiental? Brasília: MEC, 2007.

UNEP. Declaration of the United Nations Conference on the Human Environment. New York: United Nations, 1972.

Referências

Documentos relacionados

Moreover, as noted by Veloso and Dutra (2011) with regard to boundaryless career experiences in a bank, psychological factors appear more important than the physical mobility

E como refere Alves 2015:174 para que o trabalho de auditoria seja realizado com um risco de auditoria num nível baixo, é necessário que o auditor avalie os riscos inerente e

Women with African hair subject their hair to chemical treatments such as hair straightening and relaxing, and thus modify the structure of their hair shaft, making it

Não somente utilidade e prazer, mas todo gênero de impulso tomou partido na luta pelas “verdades”” (FW/GC §110). Assim, ludicamente, a verdade se mostrou pouco

Espera-se que a criopreservação ovocitária se torne uma mais-valia na fertilização in vitro nos vários cenários clínicos: na indisponibilidade do esperma na altura da colheita

Buscando entender não apenas as formas espaciais da cidade, mas dedicando especial atenção à atuação de agentes responsáveis pela produção do espaço urbano e suas estratégias

Os membros do Conselho Fiscal da PORTOPREV – PORTO SEGURO PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR reuniram­se em sua totalidade, nesta data, na sede da Entidade, para apreciar as

Estagiário - Vínculo Empregatício: o estágio previsto na Lei nº 6.494/77, visa propiciar a complementação do ensino e da aprendizagem do estudante-estagiário,