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ARTIGO
ORIGINAL
Impacto
da
diabetes
na
forma
de
apresentac
¸ão
da
tuberculose
em
doentes
hospitalizados
S.
Carreira
∗,
J.
Costeira,
C.
Gomes,
J.M.
André
e
N.
Diogo
Servic¸odePneumologiaII,CentroHospitalarLisboaNorte,HospitalPulidoValente,Lisboa,Portugal Recebidoa9deagostode2011;aceitea22demarçode2012
DisponívelnaInterneta 19demaiode2012
PALAVRAS-CHAVE Tuberculose; Diabetesmellitus; Padrãoimagiológico; TB-MDR; Mortalidade Resumo
Introduc¸ão: Adiabetesmellitus(DM)éumfatorderiscoparaatuberculose(TB)epode modi-ficarasuaformadeapresentac¸ão.Oobjetivodesteestudofoiodecompreenderainfluência daDMnosaspetosclínicos,imagiológicosedetratamentodaTBemdoenteshospitalizados. Materialemétodos: Num estudoretrospetivo,revimos osprocessosclínicos de123 doentes comTBeDM,internadosentre2000e2008.Estegrupofoicomparadocomoutroconstituído por123doentescomTBesemDM.
Resultados: Apesardeemambososgruposterpredominadooenvolvimentopulmonar multi-lobar,registaram-semaiscasosdeenvolvimentoisoladodoscampospulmonaresinferioresnos diabéticosdoquenosnãodiabéticos(10,6%vs3,3%p=0,03).Aslesõescavitadasforammenos frequentes(63,4%vs82,1%p=0,01)easmanifestac¸õesextrapulmonaresdaTBmais frequen-tes(28,5%vs16,3%p=0,02)nosdiabéticos,comparativamentecomosnãodiabéticos.Não seregistaramdiferenc¸asestatisticamentesignificativasentreosdoisgruposnoqueconcerne aodiagnósticodeTBmultirresistente(MDR-TB)eaosurgimentodeefeitosadversosda tera-pêuticaantibacilar.Amortalidadeintra-hospitalarfoisuperiornosdiabéticos(8,1%vs0,8%p= 0,01).Noentanto,utilizandoaregressãologísticabinária,sóhouvediferenc¸aestatisticamente significativanamortalidadeemrelac¸ãoàvariávelMDR-TB.
Conclusão:EsteestudomostrouqueaDMpodealteraralgunsaspetosclínicoseimagiológicosda formadeapresentac¸ãodaTBemdoenteshospitalizados.Oenvolvimentoisoladodoscampos pulmonaresinferioreseasmanifestac¸õesextrapulmonaresdaTBforammaisfrequentesnos diabéticosdoquenosnãodiabéticos.
© 2011SociedadePortuguesa dePneumologia. PublicadoporElsevier España,S.L.Todosos direitosreservados.
∗Autorparacorrespondência.
Correioeletrónico:sbcarreira@gmail.com(S.Carreira).
0873-2159/$–seefrontmatter©2011SociedadePortuguesadePneumologia.PublicadoporElsevierEspaña,S.L.Todososdireitosreservados.
KEYWORDS Tuberculosis; Diabetesmellitus; Radiologicalfeatures; MDR-TB; Mortality
ImpactofDiabetesonthepresentingfeaturesoftuberculosisinhospitalizedpatients
Abstract
Introduction:Diabetesmellitus(DM)isariskfactorfortuberculosis(TB)andmay modifyits presentingfeatures. The aimofthis study was tofind outthe influence ofDMonclinical, radiologicalandtreatmentfeaturesofTBinhospitalizedpatients.
Materialandmethods: Inaretrospectivestudywereviewedtherecordsof123patientswithTB andDMadmittedfrom2000to2008andcomparedthisgroupwithanotheroneof123patients withTBwithoutDM.
Results: Althoughinbothgroupsmultilobarlunglesionspredominated,thereweremorecases ofisolatedlowerlungfield(LLF)involvementindiabeticsthaninnondiabetics(10.6%vs3.3% p=0.03).Cavitarylesionswerelessfrequent(63.4%vs82.1%p=0.01)andextra-pulmonaryTB manifestations were morefrequent (28.5%vs 16.3% p=0.02) indiabetics thanin nondiabe-tics.Therewerenosignificantdifferencesbetweengroupsregardingmultidrugresistant-TB (MDR-TB)andadverseeffectsofanti-tuberculosisdrugs.Thein-hospitalmortalitywashigher indiabetics(8.1%vs0.8%p=0.01),butusingabinarylogisticregressiontherewassignificant differenceinmortalityonlyinrespecttothevariableMDR-TB.
Conclusions:ThisstudyshowedthatDMaffectedsomeclinicalandradiologicalpresenting fea-turesinhospitalizedTBpatients.LLFinvolvementandextra-pulmonaryTBmanifestationswere morefrequentindiabeticpatientsthaninnondiabeticones.
© 2011SociedadePortuguesa dePneumologia. Publishedby Elsevier España,S.L.All rights reserved.
Introduc
¸ão
Nasúltimasdécadas,aincidênciadatuberculose(TB) dimi-nuiu em alguns países desenvolvidos, mas aumentou em paísescom elevada taxa de infec¸ão pelo vírus da imuno-deficiênciahumana(VIH)1.
Adiabetesmellitus(DM)éatualmenteumadoenc¸a cró-nica importante sobretudo nos países desenvolvidos. Nos paísesemdesenvolvimento,asuaprevalênciatambémtem aumentado1.
Susruta,médicoindiano(600d.C.),foiprovavelmenteo primeiroaestabelecerumaassociac¸ãoentreTBeDM2.
VáriosestudostêmmostradoqueaprevalênciadeTBnos diabéticos,especialmentenaquelescomreduzidocontrolo glicémico,émaiordoquenapopulac¸ãonãodiabética1,3.Em
algunsestudosdecaso-controlo,osautoresconcluíramque oriscorelativodedesenvolverTBésuperior(entre2,44e 8,33)nosdoentesdiabéticosdoquenosnãodiabéticos1.
ADMéresponsável porumadisfunc¸ãodosistema imu-nitário,quepodeaumentarasuscetibilidadeparaaTB.As principaisalterac¸õesimunológicasnaDMsão:disfunc¸ãodas célulaspolimorfonucleares,diminuic¸ãodonúmerode monó-citos periféricos com alterac¸ão da fagocitose,diminuic¸ão datransformac¸ãoblásticadoslinfócitosedefeitonafunc¸ão deopsonizac¸ãodocomplemento.Afisiologiapulmonarestá igualmentealteradanosdoentesdiabéticos2.
Simultaneamente,aTBpodeaumentarosníveisde gli-cemia e fazer despoletar uma «DM latente» ou ser um fator para a sua descompensac¸ão. A febre, a inatividade e a desnutric¸ão estimulam a produc¸ão de hormonas de
stressquesãoresponsáveisporumaumentodaglicemia.Os níveisplasmáticosdeinterleucina-1e defatordenecrose tumoral-alfaestãoaumentadosnasformasgravesdeTB,o quepodeestimularaproduc¸ãodehormonasanti-insulina. Osantibacilarestambéminfluenciamocontrologlicémico.
A rifampicina,indutor dosistemaenzimáticomicrossomal hepático, aumentao metabolismodas sulfonilureiase das biguanidas2,4.Poroutrolado,aDMpodeterumefeito
nega-tivo no tratamento da TB, uma vez que a hiperglicemia diminuiabiodisponibilidadedarifampicina4.Apirazinamida
podeprovocarhipoglicemia,comdificuldadenocontroloda glicemia2,5.
ÉconhecidoqueaDMpodemodificaraapresentac¸ão clí-nicadaTB6.ADMtemsidoassociadaaumriscoaumentado
defalênciadotratamentoantibacilar,derecidivadaTBe demortalidade1.
Ospadrõesimagiológicos daTB nosdoentes diabéticos tambémpodemserdiferentes,questãoreportada primeira-menteporSosmaneSteidl. Estesautoresobservaramuma maiorfrequênciadeenvolvimentoisoladodoscampos pul-monaresinferioresnosdoentesdiabéticos7.
Oobjetivodesteestudofoiodecompreenderainfluência daDMnosaspetos clínicos,imagiológicose detratamento daTBnosdoenteshospitalizados.
Material
e
métodos
EsteestudoretrospetivofoiconduzidonoServic¸ode Pneu-mologia II do Centro Hospitalar Lisboa Norte --- Hospital PulidoValente.Revimostodososprocessosclínicos(123)de doentescomdiagnóstico,àdatadaalta,deTBpulmonare DM,internadosentre2000e2008.Comparámosestegrupo comumgrupocontroloconstituídopor123doentescomTB e sem DM,selecionadode formarandomizada apartir de umabasededadosemqueconstavamtodososdoentescom TBesemDM,internadosnomesmoperíodo.
Osdoentescominfec¸ãoporVIHforamexcluídosdeambos osgrupos. Osdoentesoncológicosnãoforamexcluídos,no entantonenhumdestesseencontravasobquimioterapiaou
radioterapia.Nenhumdoenteestavasoboutraterapêutica imunossupressoraantesdointernamento.
Foramincluídosnogrupodosdiabéticososdoentesque apresentavamumdosseguintescritérios:históriapréviade DMsobterapêuticacominsulinae/ouantidiabéticooral à datadaadmissão;duasoumaisglicemiasemjejum superi-oresa126mg/dlduranteointernamento.
Parâmetrosrevistos
Através da consulta dos processos clínicos dos doentes, compararam-seos2gruposdedoentesnoqueconcerneaos seguintes parâmetros:idade, sexo,imigrac¸ão, localizac¸ão das lesões pulmonares, cavitac¸ão, manifestac¸ões extra-pulmonares da TB, TB multirresistente (MDR-TB), efeitos adversosdosantibacilares,durac¸ãomédiadointernamento emortalidadeintra-hospitalar.
Interpretac¸ãoradiográfica
Ospadrõesradiográficosforamobtidosportelerradiografia detóraxpostero-anteriorefetuadaemtodososdoentes,à data dodiagnóstico e por tomografiacomputorizada (TC) detórax,realizadaem30%dosdoentesemcadagrupo.As telerradiografiasdetóraxeasTCdetóraxforam interpre-tadaspor2investigadores.
Considerámos 3 possíveis distribuic¸ões das lesões pul-monares: envolvimento isolado dos campos pulmonares inferiores, envolvimento isolado dos campos pulmonares superioreseenvolvimentomultilobar.Natelerradiografiade tóraxpostero-anterior,a áreacorrespondenteaos campos pulmonaresinferioresfoidefinidacomoaquelaquese loca-lizavaabaixodeumalinhaimagináriatrac¸adaentreoshilos equeincluíaaregiãopara-hilar.
Análiseestatística
AanáliseestatísticafoirealizadautilizandooprogramaSPSS
(StatisticalPackage for the Social Sciences), versão 15.0. As diferenc¸as estatísticas entreos2 grupos foram avalia-dasatravésdostestesTdeStudenteQui-Quadradoe por regressãologísticabinária(níveldesignificânciap<0,05).
Nãofoinecessáriaaprovac¸ãoética.
Resultados
Nogrupodeestudo,99doentes(80,5%)tinhamdiagnóstico deDMprévioàadmissãoeem24(19,5%)odiagnósticofoi confirmado durante o internamento (13 referiam ter DM, masnãorealizavamterapêuticaantidiabéticaàadmissãoe 11desconheciamteradoenc¸a).Dos99doentesquetinham diagnósticodeDMpreviamenteàadmissão,74realizavam terapêutica com antidiabéticos orais e 25 com insulina. Durante o internamento,78 doentes (63,4%) foram trata-dos cominsulina, 41 (33,3%) comantidiabéticos orais e 4 (3,3%)apenascomdieta.
Aidademédiadosdoentesdiabéticosfoide59,2±14,4 anoseadosnãodiabéticosde41,4±13,8anos.Apesardos diabéticosseremtendencialmentemaisvelhos,adiferenc¸a nãofoiestatisticamentesignificativa.
Tabela 1 Distribuic¸ão radiográfica das lesões da TBnos doentesdiabéticosenãodiabéticos
Distribuic¸ão daslesões Diabéticos Não diabéticos p Multilobar 89(72,3%) 92(74,8%) Envolvimentoisolado 21(17,1%) 27(22,0%) doscampos pulmonares superiores Envolvimentoisolado 13(10,6%) 4(3,2%) p=0,03* doscampos pulmonares inferiores
* Diferenc¸aentreostrêstiposdedistribuic¸õesdaslesões,
com-parandoogrupodosdiabéticoscomodosnãodiabéticos.
Verificou-seaexistênciade87doentesdosexomasculino (70,7%)nogrupo dosdiabéticos e de86(69,9%) nogrupo dos não diabéticos. A diferenc¸a não foi estatisticamente significativa.
O grupo dos nãodiabéticos apresentava 38 imigrantes (30,9%)eogrupodosnãodiabéticos19(15,5%).Adiferenc¸a foiconsideradaestatisticamentesignificativa.Osimigrantes provinhamnamaioriadepaísesafricanos.
A distribuic¸ão radiológica das lesões pulmonares foi distintanos 2grupos (tabela1).Em ambos osgrupos pre-dominouo envolvimento pulmonarmultilobar, noentanto registaram-semaiscasosdeenvolvimentoisoladodos cam-pos pulmonares inferiores nos diabéticos do que nos não diabéticos(10,6%vs3,3%p=0,03).
Foram observadas lesões cavitadas em 101 doentes (82,1%)dogrupodosnãodiabéticoseem78(63,4%)dogrupo dosdiabéticos,diferenc¸aestatisticamentesignificativa(p= 0,01).
Registaram-se manifestac¸ões extrapulmonares em 35 diabéticos (28,5%) e em 20 não diabéticos (16,3%). Esta diferenc¸a também foi estatisticamente significativa (p = 0,02).Asmanifestac¸õesextrapulmonaressãoapresentadas natabela2.
FoidiagnosticadaMDR-TBem5doentes(4,1%)nogrupo dos diabéticose destes, 2 corresponderam acasos de TB extensivamenteresistente(XDR-TB).Nogrupodosnão dia-béticos,registaram-se6casos(4,9%)deMDR-TBe destes, 4corresponderamaXDR-TB.Adiferenc¸aentreos2grupos nãofoiestatisticamentesignificativa.
Tabela2 Manifestac¸õesextrapulmonaresdaTBnos doen-tesdiabéticosenãodiabéticos
Manifestac¸ões extrapulmonaresdaTB Diabéticos Não diabéticos p Total 35 20 p=0,02 Ganglionar 15 14 Pleural 14 6 Brônquica 2 0 Pleuralepericárdica 2 0 Suprarenal 1 0 Laríngea 1 0
Registaram-se13casos(10,6%)dereac¸õesadversasaos antibacilaresnogrupodosdiabéticose15(12,2%)nogrupo dosnãodiabéticos.Adiferenc¸anãofoiestatisticamente sig-nificativa.Nogrupodosdiabéticos,asreac¸õesadversasaos antibacilaresforamhepáticas(4casos),gastrointestinais(4 casos),renais(2casos)eoutras(3casos).
Adurac¸ãodointernamentofoisemelhantenos2grupos (diabéticos:25,7± 20,7dias;nãodiabéticos:25,6±22,5 dias).
Amortalidadeintra-hospitalarfoide8,1% (10doentes) no grupo dos diabéticos e de 0,8% (1 doente) no grupo dosnãodiabéticos.Adiferenc¸a entreos2grupos foi con-sideradaestatisticamente significativa(p=0,01). No grupo dosdiabéticos,6dos10doentes morreramdecausa dire-tamente relacionada com a TB. As causas de morte nos restantes4doentesdiabéticosforamcancrodopulmãoem faseavanc¸ada(2doentes), tromboembolismopulmonar(1 doente)eacidentevascularcerebral(1doente).Acausade mortedodoentenãodiabéticoestevediretamente relacio-nadacomaTB.
Relativamenteàmortalidade,efetuámosumaregressão logística binária com asseguintes variáveis dependentes: idade, diagnóstico de DM, localizac¸ão das lesões pulmo-nares, cavitac¸ão, manifestac¸ões extrapulmonares da TB, MDR-TB e reac¸ões adversasaos antibacilares. Registou-se diferenc¸aestatisticamentesignificativanamortalidade ape-nasemrelac¸ãoàvariávelMDR-TB.OsdoentescomMDR-TB apresentaram um risco relativo de mortalidade de 9,47 (95%CI1,48-60,6),comparativamentecomossemMDR-TB. Assim,morreram18,2%dosdoentescomMDR-TB, compara-tivamentecom3,8%dosdoentessemMDR-TB(p=0,02).
Comparámos também o grupo de 99 doentes que realizavaterapêutica antidiabética previamente ao inter-namentocomogrupode24quenãoefetuavaterapêutica, no que concerne aos seguintes parâmetros: localizac¸ão das lesões pulmonares, cavitac¸ão, manifestac¸ões extra-pulmonares da TB, MDR-TB, efeitos adversos dos anti-bacilares e mortalidade intra-hospitalar. Verificámos que a única diferenc¸a estatisticamente significativa entre os 2 grupos foi a presenc¸a de manifestac¸ões extrapul-monares. Os doentes que não realizavam terapêutica antidiabéticapreviamenteaointernamentoapresentaram, com maior frequência, manifestac¸ões extrapulmonares (p=0,037).
Discussão
Oprincipal aspeto verificado nesteestudo foi o deque a DMalterouaformadeapresentac¸ãodaTBemdoentes hos-pitalizados, o que se traduziu numa maior frequênciade manifestac¸ões extrapulmonares da TB e de envolvimento isoladodoscampospulmonaresinferiores.Osdoentes dia-béticos também apresentaram uma taxa de mortalidade intra-hospitalarsuperior.
Apesardeserretrospetivo,asprincipaismais-valiasdeste estudoforamotamanhodaamostra,aqualidadeda reco-lhados dadose ainclusãodeumgrupocontrolo. Amaior limitac¸ãorelacionou-secomofactodeogrupodeestudoe grupocontrolonãoestaremequiparadosemrelac¸ãoàidade eetnia.
Aliteraturadescreve3categoriasrelativamentea doen-tes hospitalizados com hiperglicemia: diagnóstico prévio de DM, desconhecimento prévio do diagnóstico de DM e hiperglicemia associada ao internamento. Após a alta, é importantedistinguirogrupo2dogrupo3.Tendoemconta que este estudo foi retrospetivo e que osdoentes foram seguidosapósaaltaemoutrasinstituic¸õesdesaúde,nãose teveacessoaoseuestadoglicémicoposterior.Assim,nãofoi possívelconfirmarseosdoentesquedesconheciamterDMà admissãoeramrealmentediabéticosoutinhamapresentado apenashiperglicemiaassociadaaointernamento.Demodo aminimizarestaquestão,comparámosogrupode99 doen-tesque realizavaterapêuticaantidiabéticapreviamenteà admissão com o grupo de 24 que não a efetuava, relati-vamente a diversos parâmetros. Verificámos que a única diferenc¸a estatisticamente significativa foi a presenc¸a de manifestac¸õesextrapulmonares.
Talcomoemoutraspublicac¸ões,opresenteestudo reve-louumataxasuperiordeenvolvimentoisoladodoscampos pulmonaresinferioresnogrupodosdiabéticos, comparati-vamentecomodosnãodiabéticos.Numadasmaioresséries publicadas,Akto˘guetal.encontraramumataxasuperiorde envolvimentodoscampospulmonaresinferiorespelaTBnos diabéticos,comparativamentecomosnãodiabéticos(11% e 5,3% respetivamente)8.Singla etal. observaramno seu
estudoqueoenvolvimentoisoladodoscampospulmonares inferioreserasignificativamentemaisfrequentenos doen-tesdiabéticosdoquenosnãodiabéticos(23,5%vs2,4%)6.
Pérez-Guzmánetal.tambémmostraramnoseuestudoque osdiabéticostinhamumataxasuperiordelesõesdos cam-pospulmonaresinferioresdoqueosnãodiabéticos(19%vs 7%)9.
Contrariamente aos dados dos trabalhos de Singla6 e
de Pérez-Guzmán9, que mostraram uma frequência
signi-ficativamente superior de lesões cavitadas no grupo dos diabéticos comparativamente com o dos não diabéticos, o presente estudo revelou uma frequência inferior de cavitac¸ãonosdiabéticos.
Outro aspeto clínico relevante foi o da frequência de manifestac¸õesextrapulmonarestersidosuperiornos doen-tesdiabéticosdoquenosnãodiabéticos.
Aexplicac¸ãoencontradaparaosachadosradiológicose para a frequência de manifestac¸ões extrapulmonares nos doentes diabéticospodeestar relacionadacomo factode a DM conferir algum grau de imunossupressão2. A forma
de apresentac¸ão clínica e radiológica da TB nos doentes diabéticos partilha alguns aspetos com aquela observada nos doentes infetadospelo VIH. Nestegrupo específico,à medida que a imunidade diminui, os doentes têm maior probabilidadedeapresentarmanifestac¸õesradiológicas atí-picas, como a presenc¸a de infiltrados pulmonares sem cavitac¸ãoesemenvolvimentopreferencialdoscampos pul-monaressuperiores10,11.
Convencionalmente,éreferidoquenosdoentes diabéti-cos hámaiorincidência deresistênciaaosantibacilares12.
Zhangetal.observaramumataxadeMDR-TBsuperiornos doentes diabéticos do que nos não diabéticos (17,7% vs 8,4%)13. No entanto, nopresente estudo, tal como no de
Singla,nãoseregistoudiferenc¸asignificativaentreos doen-tes diabéticos e nãodiabéticos quanto ao diagnóstico de MDR-TB6.Adisparidadederesultadosobtidosnãoencontra
realizac¸ãode maisestudos sobreafrequênciade MDR-TB emdoentesdiabéticos.
Nãoseregistaramtambémdiferenc¸assignificativasentre os 2 grupos, relativamente à presenc¸a de reac¸ões adver-sas aos antibacilares. É de salientar a escassez de dados publicadosreferentesaesteaspeto.
Verificámosqueataxademortalidadeintra-hospitalarfoi significativamentesuperiornogrupodedoentesdiabéticos e que as suas causas foram maioritariamente relaciona-dascomaTB.Noentanto,utilizandoaregressãologística binária,registou-sediferenc¸aestaticamentesignificativana mortalidadeapenasemrelac¸ãoàvariávelMDR-TB.Dooley etal.mostraramnoseuestudoqueosdoentescomDM apre-sentavamumriscodemortalidadeduasvezessuperioraos nãodiabéticos1.
Conclusão
Em conclusão, este estudo mostrou que a DM pode alte-rar alguns aspetos clínicos e imagiológicos da forma de apresentac¸ão da TB em doentes hospitalizados. O envol-vimento isolado dos campos pulmonares inferiores e as manifestac¸õesextrapulmonaresdaTBforammais frequen-tesnosdiabéticosdoquenosnãodiabéticos.
Conflito
de
interesses
Osautoresdeclaramnãohaverconflitodeinteresses.
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