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A AÇÃO (RE)MODELADORA DO CAPITAL NO ESPAÇO: O CASO DE ESTUDO DA COMUNIDADE DE PESCADORES NA PRAIA DO CUMBUCO CE

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Academic year: 2021

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A AÇÃO (RE)MODELADORA DO CAPITAL NO ESPAÇO: O CASO DE ESTUDO DA COMUNIDADE DE PESCADORES NA PRAIA DO CUMBUCO –

CE

Verônica Araújo Macedo Medeiros

Graduanda em Geografia da Universidade Estadual Paulista – UNESP/ P.Prudente veronica_geografia@yahoo.com.br

Priscila de Oliveira Romcy

Mestrado Acadêmico em Geografia da Universidade Estadual do Ceará Bolsista CAPES priscila_romcy@yahoo.com.br

INTRODUÇÃO

O presente trabalho, enquanto relato de estudo independente, busca compreender a transformação do uso do território pela comunidade de pescadores da praia do Cumbuco (CE) como parte do contexto da expansão do capital pelo espaço. Neste sentido, intentamos discorrer sobre as mudanças no âmbito cultural mais precisamente no modo de vida da comunidade local da praia do Cumbuco (CE), e os rebatimentos no seu horizonte ideológico amparado sob a conjuntura da mundialização do capital.

Pensar as mudanças culturais e os elementos que vêm a alterar um modo de vida coletivo sob o enfoque geográfico, para nós, é trazer para a discussão a problemática da construção social sob a égide da alienação do homem no mundo capitalista, bem como a cooptação do fruto do trabalho socialmente construído e sua disseminação de maneira desigual e combinada pelo mundo como algo alheio ao próprio homem.

O homem, enquanto ser genérico é parte da natureza, e na medida em que precisa sobreviver não só convive com a mesma, mas a transforma com finalidade de suprir suas necessidades. Assim, é por intermédio do trabalho enquanto agir humano, que o homem transforma a natureza e por conseqüência a si mesmo em sua totalidade social.

Não consideramos aqui o homem isoladamente, mas o homem que vive historicamente em sociedade, o qual possibilitou uma acumulação social de conhecimento e a transmissão deste saber a gerações futuras (LESSA, 2007) que possibilita cada vez mais desenvolver os meios necessários para alcançar a finalidades das necessidades humanas. Segundo Lessa (2007), nesta dinâmica: “a busca e a seleção dos meios impulsionam a

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consciência para além de si própria: impulsionam a consciência para o conhecimento do mundo exterior a ela” (LESSA, 2007, p.35).

Nesse aspecto, entendemos que o desenvolvimento social de que fala Lessa (2007), pautado em Lukacs, se refere a uma vida social na qual existe um sentido pleno criado, vivido e expandido pelo próprio homem em sociedade. Posto isso, entendemos que as necessidades humanas a serem supridas não são apenas de ordem natural de sobrevivência, mas de ordem socialmente construída, e porque não dizer cultural, já que este conjunto delineia a totalidade social.

Assim, temos a cultura como uma criação social, um modo de vida característico, valores do autodesenvovimento humano que para Terry Eagleton (2005):

significa cultivo, um cuidar, que é ativo, daquilo que cresce naturalmente, o termo sugere uma dialética entre o artificial e o natural, entre o que fazemos ao mundo e o que o mundo nos faz. É uma noção 'realista', no sentido epistemológico, já que implica a existência de uma natureza ou matéria-prima além de nós; mas tem também uma dimensão 'construtivista', já que essa matéria-prima precisa ser elaborada numa forma humanamente significativa (EAGLETON, 2005 p. 11)

Neste sentido, Eagleton vem somar com a concepção de Lessa sobre o desenvolvimento do homem social, na indicação que e a cultura e o trabalho aparecem não como apartados em uma realidade, mas intrinsecamente construídos pelo todo social como obra do trabalho humano.

Entretanto, qualquer análise deve considerar os períodos históricos e respectivos recortes espaciais em que acontecem os fenômenos. Para tanto, em nosso estudo, só poderíamos compreender a transformação dos pescadores da comunidade do Cumbuco -CE em seu território, em um contexto histórico capitalista, de absorção de áreas periféricas, tendo em vista que “O sistema tem a sua própria lógica, que mina e destrói

poderosamente a lógica de sociedades e economias tradicionais ou pré-capitalistas”

(JAMESON, 2006 p.224).

A análise da reprodução da vida dos pescadores do cumbuco, nos traz novos elementos para a apreensão da relação entre povoados remanescentes com modos de vida típicos com o contexto de apropriação e valorização de novos espaços como alternativa de lucratividade à lógica mundial. Nesse sentido, a leitura do movimento do capital pelas

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compreensão das transformações ocorridas no litoral cearense. No espaço do presente trabalho destacamos, principalmente, a categoria lugar como sendo aquela que revela os conteúdo contraditório da dinâmica social em análise.

A questão do lugar neste trabalho pode ser discutida com um amparo nas leituras realizadas da obra “O Lugar no/do mundo” da geógrafa Ana Fani Carlos. O lugar e sua redefinição exigem perante o processo da globalização que ocorre atualmente de forma acelerada em relação a outros momentos da história. Diante do exposto, o lugar é uma concepção que se dissipa e descaracteriza na presença da massacrante idéia do homogêneo do mundo globalizado. Fani concorda com Milton Santos que o lugar se compõe de uma questão dupla, ele pode ser visto de “fora” pela sua nova definição sendo o seguimento dos acontecimentos históricos e o lugar avaliado de “dentro” no que implicaria uma condição de redefinir o seu sentido.

Assim, entendemos que estes novos processos de reprodução constituem os conteúdos das relações de poder que, em conflito, conformam as territorialidades e os territórios nas mais diversas escalas, através das tessituras trabalhadas por Raffestin(1993). Sob o discurso de democratização do mercado, produção de riqueza e seguridade social, a reprodução das relações de produção é desenvolvida em âmbito mundial, mas subordinada à relação conflitual entre a fragmentação do espaço e a capacidade global das forças produtivas e do conhecimento científico.

A história local é a história da singularidade conquanto ela se prescreva pelos elementos universais constituintes da história. Por assim ser, embora na escala local incomumente sejam visíveis as formas e conteúdos dos grandes processos históricos, ele ganha sentido por meio deles quase sempre encobertos e invisíveis. É no campo local que a história é vivida é onde faz sentido. A história tem uma dimensão social que transparece no cotidiano das pessoas, nos seus modos de vida, em seus relacionamentos com os outros, entre eles o lugar, no uso.

Pensar que as referências são cada vez mais universais, porém a vida se estabelece localmente e adere sentido no cotidiano. A relação espaço/tempo, bem como a relação entre fixos e fluxos marcam a totalidade do processo que se concretiza quanto mundial, contudo localizado.

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Amparadas nos conceitos anteriores, analisamos o caso da comunidade de pescadores na praia do Cumbuco no município de Caucaia - CE que, hoje estão inseridos no processo de desagregação dos seus modos de vida frente às imposições de formas modernas de viver na zona costeira cearense. Essas formas modernas resumem-se a diferentes atores sociais como, especuladores imobiliários, intermediários, atravessadores, veranistas, empreendedores turísticos e turistas em especial.

PESCADORES DO CUMBUCO: MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NA CONFLITIVIDADE DO CAPITAL

Em comunidades remanescentes como o Cumbuco (CE), o modo de vida local costumava ser marcado pela prevalência do valor de uso, por uma configuração local de cultura pautada na vivência e festejos no que tange à religiosidade e à relação de afetividade com o mar.

Os pescadores da comunidade tinham seu próprio ritmo de trabalho, intrinsecamente relacionado com o ciclo natural marinho, onde a pesca é praticada de maneira artesanal com fins primordiais de consumo para a comunidade. O excedente era vendido no mercado da cidade.

No entanto, muitas mudanças tencionam a uma transformação das mais variadas comunidades remanescentes do litoral, principalmente no que diz respeito ao pescador a partir da valorização da zona costeira, que no Nordeste é mais fortemente dinamizada a partir da década de 1970.

Em Cumbuco os pescadores navegam e constroem através da marcação e da prática dos seus ofícios, os territórios de captura essenciais à realização das suas atividades de pesca. Com a construção de casas sob morros, mangues, lagoas os pescadores ergueram suas bases terrestres, assim constituindo vários lugares entre pequenos agrupamentos familiares, sobrevivendo da pesca e extrativismo vegetal e formando uma cultura marítima. (LIMA, 2006)

É nesse contexto espacial que as práticas do turismo se revelam atualmente desfragmentando a comunidade e seu espaço vivido, através da reprodução do capital com atividades e equipamentos de lazer como: kitesurf, passeio de buggy nas dunas, as onerosas

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e luxuosas estadias nos resorts que oferecem serviços e produtos diferenciados a um público seleto.

Esses serviços são oferecidos a pessoas de alto padrão econômico que por sua vez geram fluxos de visitantes, de capital, de trabalhadores prestadores de serviço assim produzindo uma nova ordem espacial, afetando a economia e os costumes da comunidade, submetendo muitas vezes o pescador artesanal a uma condição de assalariado ou o exclui desta lógica que cobre o litoral do estado cearense e também de outros estados litorâneos.

A lógica que tende a uma homogeneidade mundial no local, cada vez mais transforma o estilo de vida da comunidade, forçando os pescadores artesanais a prestarem serviços a proprietários de segunda-residência como cozinheiros, domésticas(os), caseiros, faxineiros, como também para turistas na forma de hospedagem, alimentação, entretenimento. É muito comum notar que alguns pescadores já não pescam mais, a pesca é concebida como atividade complementar ou pela auto-subsistência “apenas”.

As variadas condições de trabalho, a continuidade no mar, a disciplina do trabalho nas embarcações, por si só, não levam a mudanças no modo de vida dessa comunidade pesqueira marítima. As modificações aconteceram sobretudo com a nova lógica do capital que se instala na praia do Cumbuco alterando não só a paisagem como o espaço em sua totalidade.

Essa realidade aqui comentada influencia as condições de existência da comunidade amparadas nas relações sociais que se corporificam no lugar mas que não lhe são exclusivas. Portanto a configuração de como se realiza as atividades produtivas é fundamental para uma compreensão das transformações na relação sociedade-espaço, nas relações entre sujeito e lugar e destes com os “de fora”.

Atualmente a comunidade pesqueira se organiza como resistência a toda essa modificação e organização do capital no lugar em questão, como propósito comum de garantir condições essenciais à manutenção do seu modo de vida, constituindo assim frentes de luta na terra e no mar.

Os conflitos existentes são amparados em diferentes atores sociais geralmente relacionados à moradia ( desapropriações e/ou venda forçada das residências dos pescadores) , à conservação ambiental ( a influência do Estado, a necessidade de manter a natureza como raridade), à sobrevivência e a continuidade da pesca artesanal. Dianto do

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exposto, os pescadores perpetuam-se como sujeitos ativos na história.

Em um modo particular, a luta pelo direito do uso da terra contra o turismo destrutivo, contra o aniquilamento dos estoques pesqueiros e pela preservação dos seus ecossistemas costeiros têm motivado em variados momentos e lugares, defrontes históricos sejam eles organizados ou não como frutos da resistência e do fortalecimento ao direito de ficar.

É no espaço terra-mar que se realizam os encontros e desencontros entre as famílias, companheiros, parentes e desconhecidos; onde também crescem os filhos e filhas; e então nascem e aquecem-se as estratégias de organização e luta. Isso tudo acontece sob o amparo no cerne da cultura marítima ancoradas na apropriação coletiva da terra que são marcas diferenciais da constituição do território da comunidade de Cumbuco.

Enxergando mais a frente desses aspectos, é de extrema importância elencar as relações que se voltam para o ‘externo’. Conforme a comunidade foi tecendo suas relações e intercâmbios com quem não fazia parte do lugar de fato, ou seja, ‘os de fora’, foi se incorporando novos costumes ao precedente modo vida tradicional, inserindo-se gradativamente na economia de troca apoiadas no dinheiro e da reprodução de hábitos alheios, inclusive hábitos de consumo ligados a produção de novas necessidades. Desta forma foi se constituindo uma estrutura de dependências e rupturas internas. Com isso não intencionamos afirmar que a comunidade foi antes auto-suficiente, mas asseverar que as demandas e pressões externas identificadas atualmente ganharam uma maior expressão exigindo, sobremaneira, uma nova dialeticidade na definição da alteridade do sujeito pescador.

Do espaço vivido, do lugar em relação as construções de resistência, o que se evidencia é a consciência dos indivíduos que compõem esse recorte espacial. A consciência é um aspecto fundamental na realização humana, pois resulta num vislumbre, mesmo sob as circunstâncias que provocam a crise da pesca artesanal, a dependência da terra e a possibilidade de des (re)territorialização .

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a coexistência dos valores tradicionais e a inserção da comunidade na nova lógica, vemos os desdobramentos nas novas formas de reprodução social local e no próprio

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território.

A praia do cumbuco, espaço da reprodução da vida da comunidade de pescadores é um espaço visado pelo turismo, pelo conjunto de sua paisagem natural e do caráter simbólico de rusticidade e tranqüilidade oriundos da forma de uso desse território pela sua população local.

Nesse sentido, entendemos que essas características e o conjunto de relações que a permeiam conformam uma territorialidade local que está sendo cooptada pelo poder econômico de âmbito mundial e balizada pelo Estado para a indução de atividades como o turismo - sustentado pelos grandes capitais de entretenimento e de equipamentos de lazer.

Essa manifestação de poder, que é regulada pelo Estado, vem transformando a vila da praia do cumbuco em território de lazer e entretenimento para os turistas, proporcionado infra-estruturas voltadas a este público através da construção de resorts, bares, lojas de marcas internacionais dentre outros estabelecimentos.

A inserção desses equipamentos e do seu ideal de estilo de vida tem influenciado também na identidade da população local e na reprodução do cotidiano desta comunidade pela incorporação de novos valores relacionados ao consumo dos símbolos de status e de representação de poder econômico propagado pela indústria cultural no capitalismo.

No caso particular dos pescadores, esta transformação é agressiva, pois os coagem seja de maneira legal, econômica e simbólica. Tal coerção se materializa na pressão da venda de suas moradias em troca de altos montantes de dinheiro, pela fixação de estabelecimentos os quais não condizem com a dinâmica originária local como bares e espaços de festa como a construção de demais empreendimentos voltados ao turismo que vão mudando os usos dos espaços até então usados pela comunidade.

Diante de tal transformação, abre-se o caminho para afastar o pescador da comunidade, ou como para inseri-lo dentro deste novo ciclo – não como publico alvo de consumo, mas como força de trabalho, como executor alienado do produto do seu trabalho, quando muito assalariado.

A inserção deste estilo de vida, não compete apenas à transformação do ofício da pessoa do pescador, mas em toda à transformação da comunidade, pois os moradores originais já não dispõem das mesmas condições de vida de outrora, seja pela sua moradia que está cada vez mais distante do mar, pela mudança de trabalho remunerado – quando o tem,

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enfim, pela penetração da lógica capitalista na comunidade com o fetiche, o dinheiro, novos valores etc.

Vemos assim a existência da malha econômica, enquanto poder de fato (RAFFESTIN, 1993), conduzir as mudanças no cerne do conjunto de relações que acontecem no território e o conformam. Tal poder não se impõe de forma isolada, pois se inscreve em uma dinâmica de elementos com diferentes escalas de tempo e de forma relacional também nos âmbitos cultural e político.

BIBLIOGRAFIA

CARLOS, A. F. A. . O Lugar No/Do Mundo. 1. ed. São Paulo: HUCITEC, 1996.

CORIOLANO, Luzia Neide M. T. Do local ao global: o turismo litorâneo cearense.Campinas: Papirus, 1998.

EAGLETON, Terry. A idéia de cultura. São Paulo: Editora UNESP, 2005.

LESSA, Sérgio. A ontologia de Lukács: uma introdução. Disponível em:

http://sergiolessa.com/Novaartigos_etallil.html . Acesso em Abril/2009.

LIMA, M. do C. de . Pescadoras e pescadores artesanais do ceará: modo de vida, confrontos e horizontes. Mercator, v. 10, p. 39-54, 2007.

JAMESON, Fredric. A virada cultural: reflexões sobre o pós-modernismo.Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006

MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos.São Paulo: Martin Claret, 2005. MESZÁROS, István. A teoria da alienação em Marx. São Paulo: Boitempo, 2006. RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. São Paulo: Ática, 1993

Referências

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