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Café, câmbio e inflação: as implicações da administração da política monetária no início da república brasileira (1889 - 1893)

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Centro Universitário de Brasília - UniCEUB Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais - FAJS Curso de Bacharelado em Relações Internacionais

BRENO FERNANDES SOBREIRA MENEZES CRUZ

CAFÉ, CÂMBIO E INFLAÇÃO: AS IMPLICAÇÕES DA ADMINISTRAÇÃO DA POLÍTICA MONETÁRIA NO INÍCIO DA REPÚBLICA BRASILEIRA (1889 - 1893)

BRASÍLIA-DF 2020

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BRENO FERNANDES SOBREIRA MENEZES CRUZ

CAFÉ, CÂMBIO E INFLAÇÃO: AS IMPLICAÇÕES DA ADMINISTRAÇÃO DA POLÍTICA MONETÁRIA NO INÍCIO DA REPÚBLICA BRASILEIRA (1889 - 1893)

Artigo científico apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais - FAJS do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).

Orientador: Prof. Dr. Luciano da Rosa Muñoz

BRASÍLIA-DF 2020

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BRENO FERNANDES SOBREIRA MENEZES CRUZ

CAFÉ, CÂMBIO E INFLAÇÃO: AS IMPLICAÇÕES DA ADMINISTRAÇÃO DA POLÍTICA MONETÁRIA NO INÍCIO DA REPÚBLICA BRASILEIRA (1889 - 1893)

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________________ Profº. Dr. Luciano da Rosa Moñoz

Professor Orientador

_________________________________________________________ Profª. Patricia Prego Alves

Professora Examinadora

BRASÍLIA - DF 2020

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“Um único país, o Brasil, tinha escapado a essa profunda decadência dos povos sul-americanos, em virtude de um regime monárquico que colocava o governo ao abrigo das competições. Depois o país foi entregue a uma completa anarquia, e em poucos anos a gente incumbida do poder dilapidou de tal maneira o tesouro, que os impostos foram aumentados em proporção desmedida.”

Gustave le Bon

“A moeda é parte da identidade nacional, um símbolo de massa, algo que nos desvaloriza quando perde valor de forma alucinante [...] a moeda sadia ajuda a igualar os homens.” Gustavo Franco

“Deus que me conceda esses últimos desejos - paz e prosperidade para o Brasil”

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Agradecimentos

Primeiramente agradeço a Deus, Criador do Universo, e a Jesus Cristo nosso senhor, porque sem Ele nada seria possível. E à Imaculada Virgem Maria, minha Mãe santíssima, que sempre tem zelado por mim.

Agradeço aos meus pais Francinaldo Sobreira e Sarita Fernandes pelo apoio e incentivo que serviram de alicerce para minhas realizações. Este artigo de conclusão de curso é fruto de todo o esforço e dedicação empregado por eles em minha vida.

Sou grato ao meu orientador Luciano Muñoz por aceitar conduzir este trabalho, pela confiança depositada no meu projeto e pelas valiosas contribuições dadas durante todo o processo. Obrigado por iluminar o percurso deste artigo e por me manter motivado.

Ao meu professor Mario Drumond Coelho pela grande atenção dispensada que foi essencial para a escolha do projeto e sua base bibliográfica. Obrigado por todos os ensinamentos e conselhos que não só serviram de inspiração para este artigo, mas também para a vida.

Agradeço a todos os Mestres que contribuíram com a minha formação acadêmica. Em especial ao Professor Frederico Seixas por forjar a minha resiliência, conhecimento teórico e senso crítico para atuar como profissional das Relações Internacionais; ao Professor João Paulo Santos, Rodrigo Curi e Fernando Lopes Ferraz que me guiaram nos meus primeiros passos no ramo da economia e sistemas financeiros; a Professora Raquel Boing Marinucci, que me introduziu academicamente nas diversas vertentes da sociedade civil e expandiu a minha percepção dentro do debate de ideias; E ao Professor Cláudio Ferreira da Silva, que me inseriu no Comércio Exterior, foi e é o meu tutor no ramo e, através dessa disciplina, despertou a minha paixão pela área. Obrigado pela paciência, dedicação e por todo o esforço dispensado para a minha formação como internacionalista e como cidadão.

Também quero agradecer ao Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) que dispôs de uma excelente estrutura, um corpo docente excepcional e demonstrou estar comprometido com a qualidade e excelência do ensino.

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CAFÉ, CÂMBIO E INFLAÇÃO: AS IMPLICAÇÕES DA ADMINISTRAÇÃO DA POLÍTICA MONETÁRIA NO INÍCIO DA REPÚBLICA BRASILEIRA (1889 - 1893)

Breno Fernandes Sobreira Menezes Cruz

Resumo: O referido artigo busca escrutar as medidas de política monetária adotadas pelos primeiros governos republicanos no Brasil frente aos desafios econômicos que sucedem o golpe de 1889. Mediante análise do contexto político e econômico do período em questão, o presente estudo objetiva identificar e discutir as implicações sociais e econômicas decorrentes do direcionamento do novo regime perante as variações internacionais do preço do café, não obstante as pressões internas exercidas pela elite cafeeira e a crescente mão de obra assalariada. Deste modo, a condução da política monetária é analisada sob a ótica metodológica da escola austríaca de economia. Por se tratar de uma temática pertencente ao campo da formação econômica brasileira, foi possível concluir que o objeto de estudo, além de marcar a transição para o regime republicano, também perpetuou um modelo de política monetária 'in'convenientemente aplicada na atualidade.

Palavras-chaves: ​Inflação, política monetária, expansão de crédito, câmbio, Encilhamento.

Abstract: This article seeks to examine the monetary policy measures adopted by the first republican governments in Brazil in the face of the economic challenges that followed the 1889 coup. By analyzing the political and economic context of the period in question, the present study aims to identify and discuss the social implications and economic consequences arising from the direction of the new regime in the face of international variations in the price of coffee, despite the internal pressures exerted by the coffee elite and the growing wage labor. In this way, the conduct of monetary policy is analyzed from the methodological point of view of the Austrian school of economics. As it is a theme belonging to the field of Brazilian economic formation, it was possible to conclude that the object of study, in addition to marking the transition to the republican regime, also perpetuated a monetary policy model 'in'conveniently applied today.

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Índice de Imagens

Imagem 1: Ciclos econômicos………..19 Imagem 2: “eis aí o homem”...25

Imagem 3: Variação do preço do café e da taxa de câmbio (1850 a

1900)...27 Imagem 4: Tabela de oscilação da taxa de câmbio………...28

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO​……….... 8 1. CONCEITOS BÁSICOS​………....12 1.1 Política monetária​……….... 12 1.2 Taxa de câmbio​……….... 12 1.3 Inflação​………..13

1.4 Socialização das perdas​………....13

1.5 Expansão monetária​………... 13

1.6 Encilhamento​………... 14

2. MARCO TEÓRICO​………...14

2.1 Liberalismo e Padrão-Ouro​……….. 15

3. O ADVENTO DA REPÚBLICA NO BRASIL​………....20

4. POLÍTICA MONETÁRIA NA PRIMEIRA REPÚBLICA (1889-1893)​...23

4.1 Expansão monetária e desvalorização cambial​……….... 23

4.2 Socialização das perdas e o legado macroeconômico​……….. 30

CONSIDERAÇÕES FINAIS​……….35

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INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por objetivo examinar o seguinte tema: a administração da política monetária nos dois primeiros governos republicanos à luz da variação das1 ​cotações internacionais do café no período sob análise, a saber: 1889 a 1893. O período em tela compreende, de tal modo, a ​baliza temporal ​deste trabalho. Para o efeito de vinculação do tema às ​Relações Internacionais​, deve-se enfatizar desde logo a seguinte conexão: as ​cotações internacionais do café e a política cambial ​são, do ponto de vista conceitual, questão inerente ao comércio internacional. Também serão analisadas as manipulações cambiais discricionárias e a política expansiva de crédito, efetuadas pelos dois primeiros governos republicanos brasileiros, a fim de subsidiar a exportação e defender a renda da classe produtora.

O estudo científico acerca da história econômica brasileira, no tocante à relação entre taxas cambiais, café e inflação, visa também identificar e explicar as raízes de uma problemática presente em nosso cotidiano, a socialização das perdas decorrente das variações cambiais e a consequente volatilidade inflacionária. De acordo com C. Furtado: “Como as importações eram pagas pela coletividade em seu conjunto, os empresários exportadores estavam na realidade logrando socializar as perdas que os mecanismos econômicos tendiam a concentrar em seus lucros.” . 2

A abolição da escravidão no Brasil, no ano de 1888, precedida por outras medidas que coibiram paulatinamente o tráfico de escravos, como a lei Euzébio de Queiroz, a lei do Ventre Livre e dos Sexagenários, teve como reflexos imediatos na sociedade a intensificação da imigração devido à ascendente demanda por mão de obra assalariada. Houve a liberação de3 capitais para outras atividades produtivas, aquecendo o mercado interno, fomentando a expansão da incipiente classe média nacional e iniciando a eliminação de um sistema de trabalho reconhecidamente nocivo para o desenvolvimento . 4

1Governo de Deodoro da Fonseca: 15 de novembro de 1889 a 23 de novembro de 1891; e governo de Floriano

Peixoto: 23 de novembro de 1891 a 15 de novembro de 1894.

2 ​FURTADO, Celso Monteiro. ​Formação econômica do Brasil​. 32ª edição. São Paulo: Companhia Editora

Nacional/ Publifolha, 2005, p. 172.

3​BUESCU, Mircea. ​História Econômica do Brasil: Pesquisas e análises​. APEC, Rio de Janeiro, 1970, p. 241. 4​Idem, p. 241.

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O ​Império (do Brasil), sob o ponto de vista do progresso e do desenvolvimento material do país, não foi o atraso e a estagnação, de que ainda hoje é acusado por quantos não se querem dar ao trabalho de estudar e conhecer melhor esse período da nossa História. E a verdade é o que o Brasil era, de fato, e de direito, sob este e outros aspectos, a primeira Nação da América Latina. Essa hegemonia ela iria conservar até o último dia da Monarquia5

A elite política brasileira, bastante influenciada pela tradição do liberalismo inglês de Adam Smith, apresentava características progressistas no que diz respeito ao desenvolvimento social e liberdade de imprensa, e ortodoxas no tocante à economia. Neste período há um coeficiente de flutuação cambial reduzido, inflação estável, inclusão social de ex-escravos e pessoas portadoras de deficiências , liberdade religiosa e a difusão de ideias6 7 8 através de know-how com estrangeiros de alto gabarito cultural e científico.

A economia brasileira à época era baseada, majoritariamente, na produção e exportação do café. A produção desta matéria prima constituiu um importante núcleo de capitalização e sustentáculo para o indispensável setor externo. A centralização administrativa, estabilidade do governo e sistema financeiro conservador baseado no padrão-ouro foram acompanhados por um período de notável desenvolvimento econômico, parcialmente, em virtude do modelo liberal adotado pelo regime monárquico, que favorecia a iniciativa privada e a diversificação da economia. Não obstante as oscilações e os riscos de volatilidade econômica resultantes de uma economia agroexportadora baseada majoritariamente na monocultura de um bem não essencial , o café. 9

5​LYRA, Heitor. ​História de Dom Pedro II: Fastígio​. São Paulo: USP, 1977, pg.9

6No Brasil, anterior à oficialização da Lei Áurea, há negros, pardos e mulatos que ganharam notoriedade na

corte, a saber: José do Patrocínio, Barão de Guaraciaba, Luiz Gama, André Rebouças, Dom Obá, Visconde de Jequitinhonha, Machado de Assis e etc.

7 O Instituto Imperial dos Meninos Cegos foi criado pelo Imperador D.Pedro II através do Decreto Imperial n.

428, de 12 de setembro de 1854; Em 26 de setembro de 1857 o Imperador Dom Pedro II fundou o Instituto Imperial de Surdos-Mudos, atualmente conhecido como INES. Em decorrência disso, o dia 26 de setembro foi adotado como o Dia Nacional do Surdo. (CABRAL, 2016)

8 ​Art.

179. A inviolabilidade dos Direitos Civis e Políticos dos Cidadãos Brasileiros, que têm por base a liberdade, a segurança individual e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império, pela maneira seguinte.[...]. IV.Todos podem comunicar os seus pensamentos, por palavras, escriptos, e publicá-los pela Imprensa, sem dependência de censura; com tanto que hajam de responder pelos abusos, que cometerem no exercício deste Direito, nos casos, e pela forma, que a Lei determinar; V .Ninguem póde ser perseguido por motivo de Religião, uma vez que respeite a do Estado, e não ofenda a Moral Pública. (BRASIL. Constituição (1824), art. 179)

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Em 1889 ocorre um golpe de Estado que estabelece a república como novo regime político brasileiro , desde então novas políticas monetárias foram adotadas. Tais mudanças,10

resultantes da ruptura com o antigo regime, geraram grande impacto social e econômico, mudando os rumos da nação e afetando diretamente em seu projeto de desenvolvimento nacional. Para João de Scantimburgo, o que "atrasou política, econômica e socialmente o Brasil foi a primeira República, e suas consequências se estenderam pelo futuro" 11

Os anos de 1890 e 1891 foram de loucura, segundo a expressão de um observador estrangeiro, o qual acrescenta ter havido corretores que obtinham lucros diários de 50 a 100 contos e que a oscilação do câmbio fazia e desfazia milionários. Por dois anos, o novo regime pareceu uma autêntica república de banqueiros, em que a lei era enriquecer a todo custo com dinheiro de especulação.[...]. Desde logo, houve enorme encarecimento dos produtos importados devido ao aumento da demanda e ao consumo conspícuo dos novos ricos. A seguir, a inflação generalizada e a duplicação dos preços já em 1892. Ao mesmo tempo, começou a queda do câmbio, encarecendo mais ainda os produtos de importação, que na época abrangiam quase tudo. 12

A desvalorização cambial induzida pelo governo brasileiro, por meio da expansão monetária, foi o principal mecanismo para subsidiar o setor produtivo da época, a classe cafeeira. Atualmente esse mesmo mecanismo continua a ser utilizado eventualmente pelo Estado brasileiro, acarretando as mesmas implicações sociais do século XIX decorrentes da Socialização das perdas , porém agora, gerando discussões na esfera do direito internacional13 do comércio no âmbito da OMC (Organização Mundial do Comércio).

Serão explorados gráficos e dados estatísticos para identificar cotações, taxas de câmbio e custo de vida com objetivo de estabelecer um estudo comparativo entre os períodos 10 O​golpe de Estado republicano foi orquestrado pela elite cafeicultora paulista aliada a jornalistas, sendo o mais

notório deles Quintino Bocaiúva(1836 - 1912) posteriormente nomeado Ministro das Relações Exteriores, e Oficiais do exército adeptos da tradição positivista da Escola Militar do Rio de Janeiro sob influência de Benjamin Constant(1836 - 1891), um dos principais articuladores do golpe republicano.

11​SCANTIMBURGO, João de. ​O Poder Moderador​. São Paulo: Secretaria de Estado da Cultura, 1980, p.34 12 ​CARVALHO, José Murilo de. ​Os Bestializados: O Rio de Janeiro e a República Que Não Foi. Editora

Schwarcz S.A, 3º Edição, São Paulo, 2012, p. 20.

13Segundo Paulo Sandroni (1999, p. 569), ​Socialização das perdas é “Processo pelo qual uma empresa ou um

governo procuram dividir por toda a sociedade perdas que, caso contrário, recairiam sobre uma empresa, um conjunto de empresas ou por todo um setor de atividade. Existem vários mecanismos mediante os quais esse objetivo pode ser alcançado. Um deles é o processo inflacionário, outro é o manejo das taxas de câmbio.

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perquiridos no presente artigo. A partir da coleta dos dados serão analisadas as estratégias dos primeiros governos republicanos para viabilizar a exportação e a manutenção dos lucros em momentos de crise internacional do preço do café, e os impactos sociais e internacionais derivados.

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1. CONCEITOS BÁSICOS

Para os propósitos específicos do presente artigo serão apresentados, desde já, seis conceitos, a saber: (i) política monetária; (ii) taxa de câmbio; (iii) inflação; (iv) socialização das perdas; (v) expansão monetária; e (vi) encilhamento.

1.1 Política monetária

No tocante ao conceito de política monetária, didática a lição de Paulo Sandroni: “Conjunto de medidas adotadas pelo governo visando a adequar os meios de pagamento disponíveis às necessidades da economia do país.” . Este conceito, embora simples, é14 relevante na medida em que revela ser a política monetária tema vinculado à noção de racionalidade e pragmatismo.

Essa adequação geralmente ocorre por meio de uma ação reguladora, exercida pelas autoridades sobre os recursos monetários existentes, de tal maneira que estes sejam plenamente utilizados e tenham um emprego tão eficiente quanto possível. Na maior parte dos países, o principal órgão executor da política monetária é o Banco Central, entidade do Estado ou dele dependente, encarregada da emissão de moeda, da regulação do crédito, da manutenção do padrão monetário e do controle de câmbio. 15

1.2 Taxa de câmbio

Referente ao câmbio, termo bastante usado no presente artigo, Sandroni instrui:

as taxas cambiais são determinadas por uma conjunção de fatores intrínsecos ao país, principalmente a política econômica vigente. O câmbio não possui apenas o valor teórico de determinar preços comparativos entre moedas, mas a função básica de exprimir a relação efetiva de troca entre diferentes países - a troca de moedas é conseqüência das transações comerciais entre países. 16

1.3 Inflação

No tocante ao conceito do fenômeno monetário da inflação, um dos objetos de estudo do trabalho e, tema polêmico de debate entre as diversas escolas de pensamento, Sandroni fundamenta:

Aumento persistente dos preços em geral, de que resulta uma contínua perda do poder aquisitivo da moeda.[...] A inflação, normalmente, pode resultar de fatores estruturais (inflação de custos), monetários (inflação de demanda) ou

14​SANDRONI, Paulo.​ Novíssimo dicionário de economia​. Editora Best Seller, 1999. p, 478 15​SANDRONI, Paulo. ​Novíssimo dicionário de economia.​ Editora Best Seller, 1999. p, 478 16 Idem. p, 74.

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de uma combinação de fatores. Entretanto, independentemente da causa inicial do processo de elevação dos preços, a inflação adquire autonomia suficiente para se auto-alimentar por meio de reações em cadeia (a elevação de um preço “puxando” a elevação de vários outros). 17

1.4 Socialização das perdas

Concernente ao termo cunhado pelo economista Celso Furtado, a socialização das perdas, didático ao dicionário de economia de Paulo Sandroni, é:

Processo pelo qual uma empresa ou um governo procuram dividir por toda a sociedade perdas que, caso contrário, recairiam sobre uma empresa, um conjunto de empresas ou por todo um setor de atividade. Existem vários mecanismos mediante os quais esse objetivo pode ser alcançado. Um Deles é o processo inflacionário, outro é o manejo das taxas de câmbio. 18

1.5 Expansão monetária

A Expansão monetária é o fenômeno base do presente estudo, fator preponderante dentro da política monetária adotada pelas autoridades brasileiras dentro do recorte temporal abordado no artigo. Segundo Sandroni esse fenômeno induzido é:

uma fase de expansão na economia, provocada por uma política econômica (especialmente a monetária) favorável aos investimentos (redução das taxas de juro, facilidades creditícias) e à expansão da demanda intermediária e final. Essa expansão da demanda provoca uma pressão sobre os preços; assim, uma fase de aquecimento[expansão monetária] é geralmente acompanhada de pressões inflacionárias. 19

1.6 Encilhamento

A crise do encilhamento foi a primeira consequência grave da política monetária adotada pelo primeiro governo republicano brasileiro. Essa crise é abordada no capítulo 3 deste artigo. No tocante ao conceito desse termo, Sandroni clarifica:

Política financeira de estímulo à indústria, adotada por Rui Barbosa quando ministro da Fazenda (novembro de 1889 a janeiro de 1891), após a proclamação da República. Baseava-se no incremento do meio circulante com a criação de bancos emissores (tendo como lastro não libras-ouro, mas títulos da dívida pública). [...] O resultado foi uma desenfreada espiral inflacionária e de falências. 20

17 idem. p, 301. 18 Idem. p, 569. 19 Idem. p, 30. 20 Idem. p, 205.

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2. MARCO TEÓRICO

O presente estudo tem por marco teórico o liberalismo em sua vertente econômica. Trata-se de especificação teórica na medida em que o próprio liberalismo conhece variantes, dentre as quais a citada variante econômica e não menos importante a variante política. Neste sentido, relevante a lição de R. Boudoun e F. Bourricaud:

A célebre distinção entre o liberalismo econômico e o liberalismo político, qualquer que seja sua pertinência, desconhece a ligação entre essas facetas ou aspectos bem diferentes embora complementares da tradição liberal. É comum reduzir-se o liberalismo à conhecida fórmula “laissez-faire, laissez-passer”, interpretada como a palavra de ordem da burguesia conquistadora. 21

O liberalismo é composto por diversas vertentes, dentre elas o liberalismo clássico, neoclássico, austríaco, monetarista, entre outros. Assim, fica desde já enfatizado que o presente trabalho opera, apenas e tão-somente, no vetor econômico do liberalismo, seguindo a vertente da Escola Austríaca, calcada epistemologicamente na praxeologia.

A praxeologia não lida com o mundo exterior, mas com a conduta do homem em relação ao mundo exterior. A realidade praxeológica não é o universo físico, mas a reação consciente do homem ao estado em que se encontra o universo. A economia não trata de coisas ou de objetos materiais tangíveis; trata de homens, de suas apreciações e das ações que daí derivam. 22

2.1 Liberalismo e Padrão-Ouro

O liberalismo, como conceito geral, é uma doutrina comprometida com o livre mercado e com a limitação dos campos de atuação do Estado. Se caracteriza como um conjunto de princípios que regem a economia de mercado com objetivo de lograr eficiência, bem-estar individual, estabilidade no âmbito da política monetária, livre fluxo de mercadorias e crescimento econômico.

Segundo Gilpin o liberalismo econômico parte do princípio que os mercados surgem23 espontaneamente para atender às necessidades humanas e, a partir do momento que esses mercados começam a atuar, funcionam de acordo com sua própria dinâmica interna. Desde o início da idade moderna, com a expansão do comércio entre nações e o surgimento da lógica

21​BOUDON, Raymond; BOURRICAUD, François. ​Dicionário Crítico de Sociologia​. Editora Ática, 2º Edição,

São Paulo, 2004, p. 314.

22 ​VON MISES, Ludwig. ​Ação Humana: Um Tratado de Economia​. 3.1ª Edição. São Paulo: Instituto Ludwig

von Mises Brasil, 2010, p.125.

23​GILPIN, Robert; GILPIN, Jean M. ​A economia política das relações internacionais. UnB, Brasília, 2002, p.

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de interdependência econômica global, o mundo tem caminhado rumo à economia de mercado, visto que as demais formas de organização econômica não apresentavam um grau de eficiência satisfatório.

Na época pré moderna, as moedas gozavam de autonomia econômica e política. Como sua oferta e seu valor eram determinados por descobertas fortuitas, ou pelo comércio internacional, estavam relativamente livres da influência dos governos, cuja capacidade de manipulá-las era limitada. Assim, durante milênios, o sistema monetário internacional foi apolítico.

Com a descoberta de ouro e prata no Novo Mundo, a partir do século XVI e XVII, somado ao crescimento do comércio internacional, a independência entre moedas locais e internacionais passou a se extinguir ao passo que era substituída por um cenário de interdependência. Em decorrência da relevante injeção de metais preciosos na europa, as moedas internacionais aproximaram-se cada vez mais em meio ao aumento dos fluxos comerciais e monetários. Os governos perderam a sua já limitada capacidade de manipular as moedas locais, sujeitando a partir de então a atividade econômica nacional e a dinâmica de preços às trocas internacionais. “No princípio do período moderno, a crescente integração das moedas internacionais e locais propiciou a primeira grande contribuição para a ciência da economia e a base para o desenvolvimento da economia liberal” . 24

O padrão-ouro clássico, constituído por “uma série de sistemas de crédito baseados no ouro e interligados por taxas de câmbio fixas” , durante sua vigência como sistema monetário 25

dominante no cenário internacional, propiciou os fundamentos para a bem sucedida ordem política e econômica prevalente no século XIX e início do século XX, atendendo a demandas essenciais de qualquer ordem monetária internacional.

O problema dos ajustes foi resolvido pela adaptação da economia dos países a um nível que mantivesse o valor da sua moeda com relação ao ouro; o problema da liquidez também foi resolvido, pois a produção desse metal era, de modo geral, suficiente para atender à demanda mundial e aos preços prevalecentes em termos de libras esterlinas; e o problema da confiança foi igualmente resolvido porque as pessoas acreditavam que a Grã Bretanha tinha o poder e a vontade de manter o valor da sua moeda ajustada ao preço do ouro. Essas soluções subordinavam a autonomia econômica interna ao objetivo internacional da estabilidade monetária. 26

Segundo os economistas da escola austríaca, a moeda surgiu de forma espontânea para atender a demandas individuais dos agentes econômicos, ou seja, se trata de uma instituição natural que resultou de ações humanas não premeditadas, e não de um contrato social 24​GILPIN, Robert; GILPIN, Jean M. ​A economia política das relações internacionais. UnB, Brasília, 2002, p.

142.

25 CONDLIFFE, John Bell. ​The commerce of nations​. Norton, 1950, p. 365.

26​GILPIN, Robert; GILPIN, Jean M. ​A economia política das relações internacionais​. UnB, Brasília, 2002, p.

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pré-concebido pelo homem. Com o aumento das trocas comerciais, os agentes econômicos constataram maior eficiência das trocas indiretas, as moedas constituíam meio de troca mais negociável e mais aceito nas relações comerciais entre indivíduos de diferentes regiões e nacionalidades, passando a adotá-las em detrimento das trocas diretas (escambo). A saber, todo esse processo se deu de forma espontânea.

Em sua obra, o economista e professor Ubiratan Iorio, fundamentado na percepção econômica austríaca e na análise histórica da moeda, observa que:

Aumentos na oferta de moeda não geram benefícios para a sociedade, basicamente porque eles não alteram os serviços de troca que a moeda proporciona; apenas diluem o poder de compra de cada unidade monetária. Portanto, não existe nenhuma ‘necessidade social’ que justifique o crescimento da oferta monetária, nem mesmo se a produção ou a população aumentarem 27

Já em 1912 Ludwig Von Mises, principal expoente da Escola Austríaca de economia, com sua teoria da moeda e do crédito, resgatou a constatação feita cerca de 100 anos antes por David Ricardo , acerca da improficuidade de políticas de expansão monetária, ou aumento da28 oferta de moeda dentro de um determinado mercado.

Pode ocorrer um excesso ou uma deficiência de moeda nos encaixes individuais. mas tal circunstância pode ser remediada pelo aumento ou diminuição do consumo ou do investimento. (É claro que não devemos incorrer no erro de confundir demanda por moeda para encaixe com o desejo de maior riqueza). A quantidade de moeda disponível na economia como um todo é sempre suficiente para assegurar, a todas as pessoas, todos os serviços que a moeda pode prestar e que efetivamente presta. 29

O “recorrente” aumento contínuo e generalizado dos preços não é causa da inflação, é um sintoma. A inflação é a queda progressiva do poder de compra da unidade monetária que é percebida na consequente elevação dos preços.

O processo inflacionário é um instrumento governamental, manipulado através do seu respectivo sistema bancário, ou banco central, com intuito de favorecer politica e economicamente grupos de interesse expropriando parte da riqueza dos demais grupos da sociedade, grupos esses que geralmente pertencem às classes menos favorecidas. Ou seja, a inflação é o imposto perverso e oculto que o governo usa para socializar as perdas, transferindo dinheiro das camadas mais pobres para o topo do corporativismo estatal.

Quando o Banco Central ou os bancos comerciais expandem a moeda e o crédito, o dinheiro novo assim criado é gasto, inicialmente, em bens e serviços específicos. As demandas por esses produtos sobem em relação às

27​IORIO, Ubiratan Jorge. ​Ação, tempo e conhecimento: A escola Austríaca de economia​. 1º edição. São Paulo:

Instituto Ludwig von Mises, 2011, p. 131

28​Idem, p. 131

29 ​VON MISES, Ludwig. ​Ação Humana: Um Tratado de Economia​. 3.1ª Edição. São Paulo: Instituto Ludwig

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demandas dos demais, o que aumenta seus preços relativamente aos demais preços. À medida que o dinheiro novo espalha-se pela economia, outras demandas aumentam e, portanto, outros preços também aumentam. A riqueza e a renda se redistribuem, em favor daqueles que receberam a moeda nova no início do processo e em detrimento dos que só passaram a recebê-la nos estágios posteriores. Ocorrem, portanto, duas modalidades de alterações de preços relativos: a primeira é esta redistribuição de rendas dos últimos para os primeiros receptores do dinheiro novo, que ocorre durante o processo inflacionário e a segunda são as mudanças permanentes na riqueza e na renda que continuam a se verificar mesmo depois que a moeda nova já se tenha espalhado por toda a economia. 30

Os economistas da Escola Austríaca consideram essencial a implementação de freios institucionais para impedir a sujeição da política monetária à pressões de natureza política e limitar as ações de governos e grupos de interesse. A vista disso, Mises sugere a instituição do padrão-ouro e de taxas fixas de câmbio, isto é, lastrear a moeda ao aprovisionamento de ouro dos bancos centrais.

O grande desafio – a ser prontamente enfrentado, como frisou Hayek – é proteger permanentemente a moeda contra os falsos remédios receitados por muitos economistas, que podem surtir efeitos paliativos no curto prazo, o que sustenta sua popularidade e os leva a crer que possuem a chave da salvação. 31 Para melhor apresentar as consequências desastrosas de uma política monetária expansionista, Hayek analisa a experiência pós Primeira Guerra Mundial da Grande Inflação na Áustria e Alemanha. No caso de ambas as nações foi constatado que “Não só que o nível de emprego criado pela inflação se ia reduzindo à medida que o ritmo da inflação era desacelerado, mas também que, com o término da inflação, surgia o que se passou a chamar de ‘crise de estabilização’, caracterizada por índices alarmantes de desemprego.” . Sendo32

assim, optar por um “empurrão inflacionário” para manter artificialmente um mercado, promover o “pleno emprego” ou protelar uma crise inevitável certamente resultará em uma depressão.

Há dois motivos para que não possamos conviver com a inflação. o primeiro reside no fato de que tal inflação, para atingir a meta desejada, teria que acelerar-se constantemente; ora, uma inflação em aceleração constante mais cedo ou mais tarde há de atingir um grau que tornará impossível qualquer ordem efetiva de uma economia de mercado. o segundo – e o mais importante – está na certeza de que, a longo prazo, essa inflação criará, inevitavelmente, um volume de desemprego muito maior do que aquele que pretendeu evitar. 33

30​IORIO, Ubiratan Jorge. Ação, tempo e conhecimento: A escola Austríaca de economia. 1º edição. São Paulo:

Instituto Ludwig von Mises, 2011, p. 131.

31 Idem, p. 132.

32HAYEK, Friedrich A. ​Desemprego e política monetária​. 2º edição. São Paulo : Instituto Ludwig von Mises,

2011, p.24.

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Políticos e economistas expansionistas defendem taxas flexíveis de câmbio a fim de obter uma margem mais larga para a expansão monetária. Na busca pelo “pleno emprego” eliminam discricionariamente todos os obstáculos que porventura viriam impedir a crescente emissão de dinheiro e expansão de crédito por parte das autoridades monetárias. Segundo Hayek as “taxas fixas de câmbio [...] constituem um freio necessário e praticamente insubstituível para compelir os políticos, bem como as autoridades monetárias subordinadas a eles, a manter estável a moeda” . 34

As perdas e o desemprego gerados nada mais são do que a contrapartida das alocações perversas de recursos geradas pela expansão monetária. Ou seja, expansão monetária e recessão são inseparáveis! Como escreveu Hayek, o excesso de comida não tem como não provocar indigestão​. 35

Imagem 1: ​Ciclos econômicos

Fonte: Reis (2018) 36

As políticas monetárias expansionistas perpetuam no cenário macroeconômico círculos viciosos de crescimento artificial seguidos de profunda recessão. Esse círculo vicioso é mais comumente conhecido entre os economistas como “ciclos econômicos”. A expansão monetária provoca queda nas taxas de juros (inicialmente), aumento da renda nominal e no 34​Idem, p.30.

35IORIO, Ubiratan Jorge.​Ação, tempo e conhecimento: A escola Austríaca de economia​. 1º edição. São Paulo:

Instituto Ludwig von Mises, 2011, p. 135 e 136.

36​REIS, Thiago. ​Ciclo econômico: compreenda como funciona esse interessante conceito. Suno research, 29 de

jun. de 2018. Disponível em < https://www.sunoresearch.com.br/artigos/ciclo-economico/>. Acesso em: 05 de abril de 2020.

(20)

nível de preços relativos, perda do poder de compra da moeda; alterando o comportamento e o padrão de gastos dos diversos agentes econômicos. Tais alterações nos fluxos monetários, entre os variados setores e estágios do processo produtivo, geram um impacto descoordenador na política monetária. Como bem explana o professor Iorio:

As tentativas de fazer a estrutura de produção voltar à situação anterior, mediante novas expansões monetárias nos mesmos pontos em que elas inicialmente ocorreram apenas terão o efeito de perpetuar a descoordenação que se inoculou na estrutura de capital, o que fará com que cada vez mais inflação e mais desemprego sejam gerados para manter-se o artificialismo desejado. Eis aí a origem dos ciclos econômicos, segundo os austríacos.37

Será aplicado, a partir da teoria econômica liberal da Escola Austríaca, o estudo no âmbito da política monetária com o propósito de analisar as políticas de expansão monetária e manipulações cambiais como mecanismo de defesa da renda da classe produtora de café brasileira no final do século XIX, elencando suas implicações socioeconômicas.

37​IORIO, Ubiratan Jorge. ​Ação, tempo e conhecimento: A escola Austríaca de economia​. 1º edição. São Paulo:

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3. O ADVENTO DA REPÚBLICA NO BRASIL

Após a guerra do Paraguai (findada em 1870), com o retorno dos voluntários e militares em exercício no conflito, os quadros do então exército imperial tornaram a reduzir-se consideravelmente. Os militares se ressentiam da pouca atenção do governo dada ao exército, do minguamento da verba destinada à manutenção de materiais e da paulatina redução de seus salários. Após a guerra, os militares, em especial os oficiais, não se conformaram com o eminente retorno aos padrões anteriores ao conflito. Para Viana , isso 38

resultou em uma maior morosidade nas promoções dos oficiais de carreira.

Simultaneamente, tornou-se mais teórica a preparação dêstes na nova Escola Militar, eventualmente submetida à influência da doutrina positivista, preconizadora do advento de uma ​ditadura republicana​como forma ideal de governo. Nesse ambiente predisposto às insatisfações surgiram, no último decênio do Segundo reinado, as chamadas ​questões militares, ​que, exploradas pelos republicanos existentes no país, muito contribuíram para a posterior proclamação do novo sistema político. 39

As questões militares, deflagradas após a Guerra do Paraguai, agravaram a crise existente entre militares e governo. Crise que mais tarde contribuiria para a causa republicana e o derradeiro golpe de Estado que enterrou, junto à mais duradoura Constituição da história do Brasil, um bem sucedido projeto de Estado que viabilizou a unidade nacional, desenvolvimento e estabilidade após a independência.

Apesar da ampla liberdade de opinião vigente no Segundo Reinado, até 1870 jamais se havia cogitado, no país, da criação de um Partido Republicano. Diminuta era a repercussão alcançada, por exemplo, pela pregação do agitador Antônio Borges da Fonseca, que entre 1830 e 1855 manteve cinco pequenos jornais intitulados ​O Republico. ​Somente no ano da terminação da Guerra do Paraguai alguns liberais, dissidentes da agremiação a que pertenciam, aliados a alguns jovens que ainda não haviam participado de atividades políticas, assinaram, a 3 de dezembro de 1870, um manifesto republicano, fundando um Clube e um jornal com essa tendência política. Entre os signatários, incluía-se Saldanha Marinho, ex-deputado e Presidente de Províncias, Aristides Lôbo, Quintino Bocaiúva, Lopes Trovão, Francisco Rangel Pestana e Salvador de Mendonça, êste último Diretor do jornal ​A

República, ​que durou até 1874. 40

O Partido Republicano logrou obter algumas adesões de cidadãos nas províncias do Império, embora efêmeras para efeito de comparação, com destaque à província de São Paulo.

38​VIANNA, Hélio. ​História do Brasil: monarquia e república​. Edições Melhoramentos, 4ª edição, São Paulo,

1966, p. 152.

39 Idem, p. 152. 40 Idem, p. 154.

(22)

A jovem oficialidade da Escola militar do Rio de Janeiro também sofreu influência republicana, através da doutrina positivista de Augusto Comte , que entre seus adeptos no 41

Brasil contava com o professor e Tenente-Coronel Benjamin Constant Botelho Guimarães , 42

um dos principais articuladores do levante republicano, posteriormente nomeado Ministro no primeiro governo provisório em 1889.

Como resultado da propaganda, em 1884 foram eleitos para a câmara dos Deputados três republicanos, inclusive os futuros presidentes da República Prudente de Morais e Campos Salles. Na legislatura seguinte apenas um conseguiu ser eleito. Até 15 de novembro de 1889 haviam-se fundado 74 jornais e 237 Clubes Republicanos em todo o Brasil. Localizavam-se, predominantemente, no Sul do país. Convém notar que muitos tiveram existência efêmera.[...] Na última eleição geral realizada no Império, a 31 de agosto de 1889, apenas dois republicanos foram eleitos deputados, mas não chegaram a tomar posse. 43

Em junho de 1889 o então Presidente de Gabinete , Conservador, foi substituído por 44

um Liberal, Visconde de Ouro Preto . havendo a “necessidade de ser dissolvida a câmara, 45 para que o novo Gabinete pudesse governar, dois deputados que iriam perder o mandato aderiram às idéias republicanas: Cesário Alvim e o Padre Manuel de Carvalho, que em plena sessão terminou o seu discurso com um ‘Viva a República!’ Foi prontamente respondido pelo novo chefe do governo, que recebeu muitos aplausos, partidos dos próprios adversários igualmente monarquistas.” 46

O novo ministério do Império, presidido pelo Visconde de Ouro Preto, a fim de pôr termo à crise entre governo e exército, contrariou o costume de nomear civis para os Ministérios da Guerra e Marinha, indicando para os cargos dois ex-combatentes da Guerra do Paraguai . 47

41​Isidore Auguste Marie François Xavier Comte (​Montpellier​,​ 19 de janeiro​ de​ 1798​ —​ Paris​,​ 5 de setembro​ de

1857​) foi um​ filósofo​ francês​ que formulou a doutrina do​ Positivismo​.

42 O Apostolado Positivista, núcleo dos partidários da filosofia de Augusto Comte e da Religião da Humanidade,

por êle criada, também aconselhava, aos poucos aderentes, a instauração de uma ditadura republicana. Eram seus principais orientadores Miguel Lemos e Teixeira Mendes.(VIANNA, 1966, p. 155).

43​VIANNA, Hélio. ​História do Brasil: monarquia e república​. Edições Melhoramentos, 4ª edição, São Paulo,

1966, p. 155.

44​O cargo equivale ao cargo de​ primeiro-ministro​, tendo sido criado pelo​ Decreto Imperial nº 523 de 20 de Julho

de 1847​. Competia o Presidente de Gabinete (ou também chamado Presidente do Conselho de Ministro / Chefe de Gabinete) dirigir o Poder Executivo no Brasil durante o Segundo Reinado do Império do Brasil, de 1847 a 1889.

45​Afonso Celso de Assis Figueiredo, Visconde de Ouro Preto (​Ouro Preto​,​ 2 de fevereiro​ de​ 1836​ —​ Rio de

Janeiro​,​ 21 de fevereiro​ de​ 1912​)​ político​ brasileiro​, 32° Presidente de Gabinete do Brasil.

46​VIANNA, Hélio. ​História do Brasil: monarquia e república.​ Edições Melhoramentos, 4ª edição, São Paulo,

1966, p. 156.

47 Respectivamente o Marechal-de-Campo Visconde de Maracaju e o Chefe de Esquadra Barão de

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No entanto, os militares continuaram a empenhar-se em criar novas ​questões militares a partir de contenciosos de menor importância, e “exploraram contra o gabinete algumas transferências de Batalhões, que haviam sido aconselhadas pelo Ajudante-General do Exército, Marechal Floriano Peixoto.” 48

Como indício do que iria ocorrer, em cerimônia realizada na Escola Militar, durante a visita de oficiais de um cruzador chileno, em outubro [de 1889], imprudentemente discursou o Professor Benjamin Constant, defendendo o Exército de acusações que lhe não eram feitas.

Em novembro, aproveitando os ressentimentos ainda vivos da terceira questão militar, rapidamente se articulou uma conspiração entre os republicanos do Rio de Janeiro e São Paulo e oficiais do Exército, resolvendo-se proclamar o novo regime quando se reunisse a Assembléia Geral, no dia 20. Em reunião realizada no Clube Militar, no dia 9, ficou Benjamin Constant autorizado a agir em nome de seus companheiros de classe. A 11 do mesmo mês reuniram-se em casa do Marechal deodoro, para resolver sobre a Proclamação da República, elementos civis e militares. 49 No dia preâmbular ao golpe de Estado republicano, foram propalados, mesmo sem qualquer fundamentação, atoardas atribuindo ao ministério o desejo de prender o Tenente-Coronel Benjamin Constant e o Marechal Deodoro da Fonseca. Tal desinformação acabou por precipitar os acontecimentos do dia 15 de novembro de 1889.

O Marechal Deodoro da Fonseca assumiu o comando das forças revoltosas, porém, não com o objetivo de derrubar o Imperador e sim de destituir o então ministério chefiado pelo Visconde de Ouro Preto. Assim que tomou conhecimento da situação, “determinou providências o Visconde de Ouro Preto, mas não foram cumpridas todas as suas ordens, inclusive as dadas ao referido Ajudante-General do Exército [Floriano Peixoto]” . Ao final 50

do dia, numa repentina mudança de posicionamento, o Marechal Deodoro havia concordado em assinar os atos que instauraram o novo regime . 51

A mudança de atitude de Deodoro é geralmente explicada pelo fato de ter chegado ao seu conhecimento que o Visconde de Ouro Preto havia indicado ao Imperador, para a chefia do novo governo, o nome de Gaspar Silveira Martins, inimigo pessoal do Marechal. Achando-se aquele senador em viagem, pouco depois de chegar ao Rio de Janeiro foi preso e em companhia de Ouro Preto e do irmão deste, Conselheiro Carlos Afonso de Assis Figueiredo, deportado para a Europa 52

48​VIANNA, Hélio. ​História do Brasil: monarquia e república​. Edições Melhoramentos, 4ª edição, São Paulo,

1966, p. 156.

49 Idem, p.156. 50 Idem, p. 156. 51 Idem, p.157. 52 Idem, p. 157.

(24)

4. A POLÍTICA MONETÁRIA NA PRIMEIRA REPÚBLICA (1889-1893) 4.1 Expansão monetária e desvalorização cambial

Ao assumir o Governo do regime republicano provisório dos Estados Unidos do Brasil, Deodoro da fonseca nomeia para os ministérios alguns dos intelectuais que apoiaram e articularam o levante republicano e, junto a eles, promove uma reforma estrutural no país, a saber, reproduzindo o sistema federalista norte americano (aos moldes brasileiros). Entre os ministros nomeados: Rui Barbosa para o Ministério da Fazenda, Benjamin Constant para o Ministério da Guerra e Quintino Bocaiúva para o Ministério das Relações Exteriores. De acordo com Furtado:

Com a descentralização republicana o problema da imigração passou às mãos dos estados, sendo abordado de forma muito mais ampla pelo governo do Estado de São Paulo, vale dizer, pela própria classe dos fazendeiros de café. Finalmente, o efeito estimulante da grande inflação de crédito desse período beneficiou duplamente a classe de cafeicultores: proporcionou o crédito necessário para financiar a abertura de novas terras e elevou os preços do produto em moeda nacional com a depreciação cambial. A produção brasileira, que havia aumentado de 3,7 milhões de sacas (de 60 kg) em 1880-81 para 5,5 milhões em 1890-91, alcançaria em 1901-02 16,3 milhões.53

Rui Barbosa coloca em vigor, em 17 janeiro de 1890, sua reforma monetária marcada por uma violenta e célere expansão monetária. Com o acelerado aumento de papel moeda no mercado, Rui Barbosa decreta a inconversibilidade da moeda e das notas de crédito. No primeiro ano após a reforma o meio circulante(papel moeda) aumentou em 40%, agora lastreado em títulos de dívida pública, seguido de uma forte desvalorização cambial em 1891. É importante salientar que os preços internacionais do café iniciam sua trajetória de queda a

54

partir de meados de 1891 e, destarte, as causas dessa brusca e violenta desvalorização devem 55 ser investigadas em outros elementos.

Três regiões bancárias seriam criadas, cada qual tendo seu próprio banco emissor. As emissões seriam inconversíveis, e o total autorizado era de 450 mil contos - o que era mais que o dobro do papel-moeda em circulação a 17

53​FURTADO, Celso Monteiro. Formação econômica do Brasil. Companhia Editora Nacional/ Publifolha, 32ª

edição, São Paulo, 2005, p. 185.

54​FRANCO, Gustavo H. Barroso. A Primeira Década Republicana. In: Marcelo de Paiva ABREU (org.). A

ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana, 1889-1989. Rio de Janeiro, 1992, p. 22.

(25)

de janeiro [de 1890]. [...] A tentativa de se “regionalizar” a emissão bancária [...] não seria bem sucedida.56

O setor financeiro estava permeado por déficits permanentes, que persistiram até a reforma de Murtinho no ano de 1898. As bruscas variações no preço internacional do café, devido à sua demanda volátil por não ser um bem de consumo essencial, somado ao fator da monocultura como base do sistema agroexportador brasileiro, provocaram conjunturas violentas no sistema monetário, caracterizado pelos déficits governamentais e a excessiva desvalorização cambial para a manutenção da renda do setor exportador.

A “defesa do nível de emprego” tornava-se necessária face às crises cíclicas que caracterizavam a economia dos países industrializados, compradores de café, e que resultavam na retração da procura e da queda dos preços “A crise penetrava de fora para dentro”, e os exportadores de café, para manterem suas rendas reais, provocavam a desvalorização cambial da moeda nacional, transferindo, dessa forma, para o resto da comunidade o ônus da crise, através do encarecimento das importações.57

Para Buescu a depreciação cambial se fez “necessária” pois, o setor exportador não subsistiria com a estagnação da taxa cambial ou sutis variações conservadoras. 58 Em contrapartida, Calógeras afirma que “ ​a enorme extensão dada à circulação fiduciária causava verdadeiro alarma. Mas as vozes prudentes foram reduzidas ao silêncio pelo otimismo oficial e o delírio especulador.” , é relevante ressaltar que a nova política de emissão de moedas, que 59 marcou o início da república, foi um delírio de especuladores otimistas e levianos.

56​FRANCO, Gustavo H. Barroso. A Primeira Década Republicana. In: Marcelo de Paiva ABREU (org.). A

ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana, 1889-1989. Rio de Janeiro, 1992, p. 21.

57​BUESCU, Mircea. História Econômica do Brasil: Pesquisas e análises. APEC, Rio de Janeiro, 1970, p. 250 58​Idem, p. 250.

59​CALÓGERAS, J. Pandiá. A Política Monetária do Brasil. Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1960, p.

(26)

Imagem 2: ​“eis aí o homem”

Fonte: Carvalho 60

Torelli explica que no jogo político com as outras elites regionais, a elite cafeeira paulista transformou a questão cafeeira em prioridade nacional e, portanto, era obrigação do Estado defender os interesses desta classe produtora, pois o país dependia deste setor para honrar seus compromissos externos. O governo, a fim de atender à demanda dos produtores,61 estabeleceu uma política creditícia e cambial que beneficiava a exportação de café sem supostamente prejudicar a sua pauta de importação, relevante na mesma medida que a exportação na valorização do capital cafeeiro.

60 Charge publicada na Revista ​O Malho ​em 06/08/1904. Na imagem o Homem representa o povo brasileiro e a

serpente que o envolve representa os males que afligiam a população no início da primeira república, sendo eles, inscritos no corpo da serpente: Miséria, Empréstimos, Câmbio, Impostos, Desfalques e Miséria.(CARVALHO, 2012, p. 168)

61​TORELLI, Leandro Salman. A defesa do café e a política cambial : os interesses da elite paulista na primeira

(27)

Comparando à visão de M. Buescu e C.Furtado, nota-se uma discordância categórica a um aspecto analisado por Torelli. Para aqueles, a política monetária expansionista não beneficiava a exportação do café em valores reais, mas sim, beneficiava a renda e os ganhos nominais dos produtores e exportadores, enquanto que a população assumia o ônus da transferência de prejuízos , a depreciação da moeda nacional afetava diretamente o preço de 62 produtos importados e a inflação, dificultando sua aquisição por parte da população.

Estabeleceu-se o seguinte dilema: a emissão dos bancos era indispensável: não podendo fazê-la baseada no ouro, cumpria aceitá-la tendo como garantia os títulos da dívida pública. E sôbre essa estranha concepção da natureza e função da moeda, o método de garantir uma dívida mediante outra dívida foi considerado a solução científica do problema da circulação no Brasil. 63 A política monetária heterodoxa de expansão monetária e o consequente processo inflacionário resultaram na majoração da taxa de câmbio. Posteriormente, em 1892, já no governo do marechal Floriano Peixoto, o ministro da fazenda Serzedelo Correia aprofundou a política adotada por Rui Barbosa . Entretanto, além desses elementos endógenos que64

influenciaram os ânimos do capital externo, outros de ordem exógena podem ser alinhados.

Não resta dúvida, por outro lado, que influências "exógenas", ligadas aos efeitos sobre as entradas de capital no Brasil do colapso da casa Baring Brothers em londres, em outubro de 1890, e da moratória argentina, teriam grande influência sobre o mercado de câmbio no Brasil em 1891. Em abril, respondendo aos pedidos do ministro Araripe sobre a possibilidade de apoio à sustentação da taxa de câmbio, os Rothschild responderam que "o desafortunado estado de coisas que recentemente se tem observado na República Argentina teve um efeito deplorável sobre todos os papéis e sobre todas as questões financeiras relacionadas aos estados sul americanos".65 A moratória argentina, que causou a quebra de uma tradicional casa financeira londrina, contribuindo assim para a deterioração da confiança do mercado financeiro em relação à América Latina, somado à forte evasão de recursos pelo Balanço de Pagamentos, podem ter contribuído para a desvalorização de 1891.

62​Entende-se por ​transferência de prejuízos​ o fenômeno da ​socialização das perdas​.

63​CALÓGERAS, J. Pandiá. A Política Monetária do Brasil. Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1960, p.

208.

64​FRANCO, Gustavo H. Barroso. A Primeira Década Republicana. In: Marcelo de Paiva ABREU (org.). A

ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana, 1889-1989. Rio de Janeiro, 1992, p. 24.

65​FRANCO, Gustavo H. Barroso. A Primeira Década Republicana. In: Marcelo de Paiva ABREU (org.). A

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Imagem 3: ​Variação do preço do café e da taxa de câmbio (1850 a 1900)

Fonte: Buescu66

No gráfico acima é apresentado a variação da taxa de câmbio, medida em Pence por Mil-Réis, e o preço da saca de café medida em libras esterlinas, entre os anos de 1850 e 1900. A partir dos anos 90, com a grande emissão de dinheiro e crédito, a depreciação cambial recrudesce, caindo de 24 pence por mil-réis em meados de 1890 para 12 pence por mil-réis no final de 1891, assumindo assim proporções de crise . Segue abaixo tabela das oscilações da 67 taxa de câmbio em pence por mil-réis:

66​BUESCU, Mircea. História Econômica do Brasil: Pesquisas e análises. APEC, Rio de Janeiro, 1970, p. 255. 67​FRANCO, Gustavo H. Barroso. A Primeira Década Republicana. In: Marcelo de Paiva ABREU (org.). A

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Imagem 4: ​Tabela de oscilações da taxa de câmbio

Fonte: Calógeras 68

No que tange às implicações da abrupta desvalorização cambial, importante ressaltar a análise de Gustavo Franco:

As dificuldades cambiais do país se tornariam crônicas após a crise de 1891-1892. A taxa de câmbio flutua entre 9 pence e 10 pence por mil-réis até fins de 1895 quando há uma quebra na tendência ascendente da capacidade para importar, mercê da piora acentuada nos termos de troca, vale dizer, de um colapso dos preços do café, já refletindo as safras resultantes do grande aumento no plantio provocado pelas desvalorizações cambiais no início da década. 69

As expansões e contrações na renda dos proprietários, junto ao aumento do fluxo monetário, modificaram o valor real da moeda nacional frente ao cenário internacional. Furtado ainda ressalta que a depreciação que, resulta na transferência de prejuízos para a massa consumidora, concentra os lucros do café no final do século XIX e início do século XX, pois, os assalariados utilizavam parte relevante de sua renda para a aquisição de manufaturados importados, enquanto que os produtores detinham boa parte de seus rendimentos em poupança para expansão do negócio. Furtado conclui que “A contração70

68​CALÓGERAS, J. Pandiá. A Política Monetária do Brasil. Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1960, p.

230.

69​FRANCO, Gustavo H. Barroso. A Primeira Década Republicana. In: Marcelo de Paiva ABREU (org.). A

ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana, 1889-1989. Rio de Janeiro, 1992, p. 14.

70​FURTADO, Celso Monteiro. Formação econômica do Brasil. Companhia Editora Nacional/ Publifolha, 32ª

(30)

cíclica trazia consigo, quase necessariamente, um desequilíbrio na balança de pagamentos, cuja correção se fazia por meio de reajustamentos na taxa cambial.”71

Além do encarecimento dos produtos de importação, houve - em decorrência da inflação e do aumento da demanda externa - também o encarecimento dos produtos internos (commodities), sendo aqueles praticamente todos os produtos manufaturados comercializados no mercado interno. Simultaneamente houve o aumento discricionário dos impostos de importação, o governo passa a cobrá-los em ouro, o que contribuiu ainda mais para o agravamento do custo de vida, como bem afirma Taunay . Esse conjunto de medidas72

demonstra o peso que recai sobre a população em consequência da prioridade dada pelo governo republicano às elites cafeeiras. Se tratava de um sistema utilizado com objetivo de estabelecer um mecanismo de defesa de renda e produção de pequenos grupos de interesse.

É interessante salientar que a inflação e a desvalorização cambial dela decorrente favoreciam o investimento na produção de café. Segundo Vilardo “a política emissionista, dos primeiros anos da República, produziu uma violenta inflação que fazia os preços do café, em mil réis, subir muito mais rapidamente do que em moeda estrangeira ou descer mais lentamente” . Isso estimulou o aumento da produção de café e concomitantemente a elevação73 dos investimentos dos produtores na expansão de suas propriedades e no quadro de funcionários, mesmo com os preços externos já em níveis reduzidos.

Analisando a obra de Furtado , Bertolani afirma que: 74

A defesa dos preços propiciava à cultura do café uma conjuntura privilegiada em relação aos demais produtos primários que entravam no comércio internacional. Essa vantagem proporcionada tendia, por conseguinte, a aumentar. Em contrapartida, os elevados lucros criavam para o cafeicultor o estímulo em seguir com seus investimentos, e assim sendo, tornava-se inevitável que essas inversões tendessem a encaminhar-se para a própria cultura do café. Com isso, o mecanismo de defesa da economia cafeeira era, por sua vez, um procedimento de adiamento de um problema que se tornaria cada vez mais grave.75

71​FURTADO, Celso Monteiro. Formação econômica do Brasil. Companhia Editora Nacional/ Publifolha, 32ª

edição, São Paulo, 2005, p. 164.

72​TAUNAY, Alfredo d'Escragnolle. O Encilhamento. Domingos de Magalhães – Editor, 1º Edição, Rio de

Janeiro, 1894.

73​VILARDO, Franceschina. A burguesia cafeeira paulista e a política econômica na Primeira República.

Campinas, SP: IFCH/Unicamp, 1986, P. 39.

74​FURTADO, Celso Monteiro. Formação econômica do Brasil. Companhia Editora Nacional/ Publifolha, 32ª

edição, São Paulo, 2005.

75 BERTOLANI, Mayara Lyra; FELIPE, Ednilson Silva. Estado, Política Econômica E Defesa Do Café No

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4.2 Socialização das perdas e o legado macroeconômico

Com recurso ao estudo de caso da política monetária do início da primeira República no Brasil, pode-se afirmar que o desalinhamento ao sistema internacional do padrão-ouro (ordem monetária internacional da época) apresenta efeitos econômicos catastróficos no médio e longo prazo.

A crítica ao sistema[ortodoxo] pôsto em prática pelo último Gabinete da Monarquia, pouco científica sob êsse aspecto, possuía, entretanto, a grande vantagem de falar às paixões do momento e exaltar o sentimento partidário, apresentando os triunfadores[republicanos] qual missionários de um novo evangelho econômico. Essa finalidade foi atingida, e a ilusão daí resultante, dissipada bem mais tarde, causou ao Brasil malefícios cujos efeitos ainda perduram." 76

Considerando o contexto social e econômico brasileiro à época: um país agroexportador, com forte presença da elite cafeeira junto aos poderes de Estado, crescimento da mão de obra assalariada e aumento substancial de imigrantes no país. Os déficits orçamentários, a crescente necessidade de suprir as demandas pelo aumento do fluxo monetário, e a queda nas exportações do café levaram as autoridades a precipitarem-se na ilusão de uma política de expansão monetária compulsiva.

A mudança na orientação da política monetária do Brasil, a partir do final do ano de 1889, conferiu ao governo um poder sem precedentes para intervir na economia e no suprimento de moedas em circulação. Esse controle do Estado sobre a moeda, junto à autorização para emissão de dinheiro e expansão de crédito dada pelo governo republicano aos demais bancos instalados no Brasil, atribuiu ao povo a responsabilidade de arcar com uma pesada conta, a inflação.

Era êste, porém, um exemplo republicano, lançado à multidão pouco a par dessas questões, facilmente inflamável e pronta a deixar-se levar por palavras mais ou menos retumbantes, mas que soavam falso. Àqueles que teriam podido demonstrar a inexatidão e o sofisma do argumento empregado, reservavam-se os epítetos de conspirador, reacionário e outras amenidades; a outros, davam-se a entender as vantagens práticas do movimento de negócios que a onda crescente da especulação iria certamente provocar." 77

Sob a política emissionista de Rui Barbosa de 1890, então Ministro da Fazenda, o governo provisório republicano, ignorando as convenções de lastro da moeda brasileira segundo o padrão-ouro, assistiu a uma alta conspícua da inflação que acarretou na bancarrota 76 CALÓGERAS, J. Pandiá. A Política Monetária do Brasil. Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1960, p.

208

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de inúmeras empresas, desaguando numa profunda recessão econômica permeada de sonegação fiscal, desvios de finalidade e corporativismo estatal com pequenos grupos de interesse.

logo no começo de 1892 tinha lugar a falência da Companhia Geral das Estradas de Ferro do Brasil cujo passivo atingia a espantosa soma de 314 mil contos. Somente ao longo de 1893, contudo, em meio a Revolta da Armada, a especulação na bolsa encontraria afinal o seu desfecho 78

Em 7 de dezembro de 1892, na tentativa de sanear a emissão de crédito dispersa entre os bancos regionais e dar continuidade ao projeto de centralização monetária de Rui Barbosa, o ministro da fazenda Serzedelo Correia decretou a fusão do BREUB (Banco da República dos Estados Unidos do Brasil) com o BB (Banco do Brasil), criando o BRB (Banco da República do Brasil). Ao obter maior controle sobre a administração do BRB e sobre as emissões, o então ministro buscou otimizar a administração da liquidez dos excessos do encilhamento com novas medidas de expansão monetária, autorizando a emissão dos “bônus” ou “auxílios à indústria” avaliados em até 100 mil contos. 79

Pouco ou nada resultaria da tentativa de Serzedelo - através do BRB - de “sanear a praça”. A especulação na bolsa contaminara muito profundamente a carteira do próprio BRB. Ao mesmo tempo, a crise cambial aprofundava-se alimentada pela deterioração da situação política que tornava claro o estado de paralisia decisória em que se debatia o governo. A sucessão de levantes ao longo de 1893, destacadamente a luta do Rio Grande do Sul e a eclosão da Revolta da Armada em setembro, parecia demarcar o climax da crise.80 Analisando as medidas tomadas pelas autoridades monetárias brasileiras à época, tendo por base a ótica econômica da escola Austríaca, é possível identificar que as tentativas de postergar as consequências negativas das políticas emissionistas por meio de novas expansões monetárias não só não solucionaram o problema da liquidez das moedas inconversíveis, mas também perpetuaram a descoordenação da estrutura monetária nacional. A manutenção do artificialismo fiduciário na Primeira República teve como consequência óbvia o recrudescimento da recessão, “seria inútil, pois, tentar-se afastar do primeiro Ministro da Fazenda da República a responsabilidade suprema da inundação de papel-moeda, que quase fez naufragar o país com os desastres que levaram à moratória de 1898” . 81

78​FRANCO, Gustavo H. Barroso. A Primeira Década Republicana. In: Marcelo de Paiva ABREU (org.). A

ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana, 1889-1989. Rio de Janeiro, 1992, p. 24.

79​FRANCO, Gustavo H. Barroso. A Primeira Década Republicana. In: Marcelo de Paiva ABREU (org.). A

ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana, 1889-1989. Rio de Janeiro, 1992, p. 23.

80​Idem, p. 24.

81​CALÓGERAS, J. Pandiá. A Política Monetária do Brasil. Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1960, ​p.

(33)

A grande depreciação cambial do último decênio do século, provocada principalmente pela expansão creditícia imoderada do primeiro governo provisório, criou forte pressão sobre as classes assalariadas, particularmente nas zonas urbanas. Essa pressão não é alheia à intranqüilidade social e política que se observa nessa época, caracterizada por levantes militares e intentos revolucionários, dos quais o país se havia desabituado no correr do meio século anterior. 82

A expansão de linhas de crédito, aumento artificial do fluxo monetário e a desvalorização do câmbio foram uma forma de subsídio governamental para os grupos exportadores brasileiros, em especial os produtores de café. Com a queda do preço internacional do café (em libras esterlinas), o governo desvalorizou a moeda nacional para compensar as perdas de lucro dos produtores cafeeiros e reduzir os impactos da flutuação do preço. “A inflação falsifica o cálculo econômico gerando lucros contábeis fictícios que, em maior ou menor grau, serão consumidos” . 83

O processo de correção do desequilíbrio externo significava, em última instância, uma transferência de renda daqueles que pagavam as importações para aqueles que vendiam as exportações. Como as importações eram pagas pela coletividade em seu conjunto, os empresários exportadores estavam na realidade logrando socializar as perdas que os mecanismos econômicos tendiam a concentrar em seus lucros. 84

A fatura desse subsídio foi paga pelos importadores, pequenas e médias empresas, consumidores locais, as incipientes e frágeis indústrias, entre outros que assistiram a deterioração de seu poder de compra no Brasil e no exterior. De acordo com Furtado “o mecanismo pelo qual a economia corrigia o desequilíbrio externo - o reajustamento da taxa cambial - possibilitava a transferência do prejuízo para a grande massa consumidora.

85

Utilizar a inflação e a desvalorização cambial discricionária para subsidiar um setor às custas de outros agentes, além de nocivo, é imoral.

O principal objetivo da política monetária deve ser a manutenção da estabilidade da moeda, logo, o impacto que ela causa sobre o emprego não deve ser o fator primordial para seu estabelecimento. Portanto, as autoridades financeiras devem ser efetivamente resguardadas da pressão política, que muitas vezes as obriga a tomar medidas politicamente

82​FURTADO, Celso Monteiro. Formação econômica do Brasil. 32ª edição. São Paulo: Companhia Editora

Nacional/ Publifolha, 2005, p. 184.

83​DE SOTO, Jesús Huerta. Moeda, Crédito Bancário e Ciclos Econômicos; tradução de Márcia Xavier de Brito.

1ª edição. São Paulo : Instituto Ludwig von Mises. Brasil, 2012, p. 354.

84​FURTADO, Celso Monteiro. Formação econômica do Brasil. 32ª edição. São Paulo: Companhia Editora

Nacional/ Publifolha, 2005​, p. 172.

85​FURTADO, Celso Monteiro. Formação econômica do Brasil. 32ª edição. São Paulo: Companhia Editora

Referências

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