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Globalização da P&D: impactos nos países em desenvolvimento

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GLOBALIZAÇÃO DA P&D: IMPACTOS NOS PAÍSES EM

DESENVOLVIMENTO

MARIANA BOMBO PEROZZI GAMEIRO; AUGUSTO HAUBER GAMEIRO; UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

PIRASSUNUNGA - SP - BRASIL mbperozz@naturalss.com.br PÔSTER

CIÊNCIA, INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E PESQUISA.

Globalização da P&D: impactos nos países em desenvolvimento

Grupo de Pesquisa: Ciência, Inovação Tecnológica e Pesquisa (12)

1. RESUMO

O trabalho visa analisar as conseqüências positivas e negativas advindas da globalização da pesquisa e desenvolvimento (P&D) sobre os países em desenvolvimento, especialmente os que hospedam essas operações. Para tal, empregou a revisão de literatura como metodologia. Aborda os fatores que possibilitaram a internacionalização da P&D e as vantagens buscadas pelas multinacionais que estabelecem atividades de pesquisa fora de seus países de origem. Elenca os impactos da P&D globalizada. Ressalta ainda a necessidade de uma atitude pró-ativa dos governos, com o objetivo de absorver o conhecimento gerado, garantir os interesses nacionais e maximizar o aproveitamento de seus resultados em favor do desenvolvimento do país. Descreve o perfil de três multinacionais do agronegócio que desenvolvem atividades de P&D no Brasil: Syngenta, DowAgroscience e Monsanto.

Palavras-chaves: Pesquisa, Desenvolvimento, globalização, agronegócio, subsidiárias.

2. INTRODUÇÃO

A abertura das economias, a globalização das firmas e do capital e a rápida difusão de informações e de tecnologias alteraram o contexto dos negócios. O crescimento econômico agora requer esforços substanciais em pesquisas.

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Os países menos desenvolvidos estão expostos à competição internacional, mas em geral não apresentam capacidade tecnológica consolidada. Correm o risco, assim, de ver aumentada a lacuna entre eles e os países desenvolvidos. Em 1997, 80% do comércio global de produtos de alta tecnologia se originava na Europa, Estados Unidos e Japão; e 92% das patentes concedidas no mundo pertenciam a países membros da OCDE1 (Archibugi & Michie, 1997 apud Bowonder, 2001).

Contudo, o aumento da importância dos mercados regionais, a melhoria das tecnologias de comunicação, a flexibilidade para deslocamento físico de equipamentos e pessoas, assim como a qualificação da força de trabalho e a pressão de custos, entre outros, têm levado as multinacionais a investir, cada vez mais, em pesquisa e desenvolvimento (P&D) fora de seus países de origem.

A P&D das multinacionais nos países em desenvolvimento se concentra, geralmente, em poucos países-chaves, como China, Índia, Hong-Kong, Brasil, Cingapura e África do Sul. Recentemente, outros países também começaram a despontar como hospedeiros dessas operações, como Tailândia, Armênia, Nigéria e Vietnã (Unctad, 2005).

Outro movimento observado pela Unctad (2005) é que empresas nascidas em países em desenvolvimento também têm montado unidades de P&D em outros países em desenvolvimento. Em 2000, firmas da Coréia, Malásia, Cingapura e Tailândia investiram em atividades de P&D na Índia. Já em 2003, companhias indianas, indonésias e coreanas anunciaram planos de investir na China, Cingapura e Abu Dhabi.

O fenômeno não é novo, mas como se percebe tem ganhado relevância nos últimos anos. As companhias também complementam as atividades de P&D realizadas em suas sedes e em suas subsidiárias através de parcerias com outras empresas, com grupos acadêmicos e laboratórios comerciais locados em qualquer parte do mundo.

O comércio global de conhecimento e de propriedade intelectual e o fortalecimento das economias através da P&D podem proporcionar benefícios econômicos similares aos trazidos por outras formas de comércio. Mas os ganhos só serão percebidos por aqueles aptos a responder efetivamente à competição (BIAC, 2005).

Neste contexto, os governos desempenham papel relevante para a criação de ambientes atraentes às multinacionais, sem descuidar dos interesses das firmas domésticas e da necessidade de garantir benefícios à economia interna.

O objetivo deste trabalho é, desta forma, analisar os pontos positivos e negativos resultantes da globalização da pesquisa e desenvolvimento sobre os países em desenvolvimento, especialmente os que hospedam essas operações.

3. JUSTIFICATIVA

A globalização da P&D é uma realidade e o Brasil é um dos principais alvos das multinacionais para acolher laboratórios e unidades industriais de pesquisa. Situa-se em sexto lugar na lista de preferências de 104 executivos de multinacionais2 que responderam a uma pesquisa sobre onde pretendem investir em P&D nos próximos três anos, com 11% dos votos (EIU, 2004).

Além disso, no país, as multinacionais são responsáveis pela maior parte das atividades de P&D realizadas em vários setores da economia nacional, como o agronegócio. Este é dominado pela suíça Syngenta, pelas norte-americanas

1 Organisation for Economic Co-operation and Development (Organização de Cooperação e Desenvolvimento

Econômico), que reúne 30 países industrializados.

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DowAgroscience e Monsanto – especialmente na área de biotecnologia – e outras não mencionadas neste trabalho, como a Basf, Bunge e Bayer.

Segundo Weiss (1995), as políticas de ciência e tecnologia no âmbito da OCDE estimulam as parcerias de P&D entre as universidades e empresas, as alianças estratégicas entre firmas nacionais e estrangeiras e a participação de instituições nacionais nos programas internacionais de pesquisa científica cooperativa3.

Torna-se importante, portanto, avaliar quais as implicações da P&D globalizada para os países em desenvolvimento, inclusive a partir da experiência de outras nações que passam pelo mesmo processo. Conhecendo os riscos e benefícios dessa internacionalização, o Brasil pode direcionar esforços de modo a minimizar seus impactos negativos e maximizar o aproveitamento de suas vantagens.

4. METODOLOGIA

O trabalho está calcado em revisão de literatura. Inicialmente foi levantada a bibliografia sobre o tema geral (globalização da P&D) e, em seguida, sobre o tema específico (impactos para os países em desenvolvimento). Procederam-se a pesquisa em bases eletrônicas e a leitura de artigos e relatórios. Foram consultadas, sobretudo, instituições reconhecidas em âmbito nacional, como o Ministério da Ciência e Tecnologia, e internacional, tais qual a United Nations Conference on Trade and Development (Unctad), Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD), e The Economist Intelligence Unit (EIU). Posteriormente, visitou-se a homepage das multinacionais estudadas para obter informações sobre suas atividades de P&D no Brasil.

5. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

5.1 Fatores que possibilitam a globalização da P&D

De acordo com EIU (2004), os fatores que tornaram a globalização da P&D possível e necessária foram:

a) Remoção de barreiras para os negócios internacionais, o que criou oportunidades para as companhias investirem em operações internacionais de P&D;

b) Surgimento de novos mercados, com potencial para adquirir produtos de alta tecnologia de outros países;

c) Solidificação da internet, facilitando a comunicação entre empresas de diferentes localizações e fuso-horários, ajudando a estabelecer o inglês como a língua comum para a Ciência e Tecnologia (C&T);

d) Pressão de custos, que tem levado as companhias a unir recursos e administrar alguns aspectos da P&D juntas;

e) Expansão de locais viáveis para implantar centros de P&D na última década.

Grynszpan (2005) adiciona, ao aumento da importância dos mercados regionais e à melhoria nas tecnologias de informação e comunicação, a flexibilidade das novas tecnologias de manufatura, que facilitaram o descolamento físico entre P&D e industrialização. Menciona ainda a prova, para as corporações, de que existe competência e vantagens comparativas nos países não centrais, como Israel, Índia, Irlanda e China.

Melhorias nas cadeias de fornecimento, na infra-estrutura e no desenvolvimento das bases científicas e de pesquisas nas economias-hospedeiras são motivos, segundo a Unctad

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(2005), que favoreceram a globalização da P&D. Além disso, durante décadas, vários países em desenvolvimento melhoraram seu nível de educação e a capacidade de inovação, tornando-os potenciais receptores das atividades de P&D. Eles ainda aumentaram seus investimentos em P&D, em proporção ao Produto Interno Bruto (PIB). Instituições acadêmicas estabeleceram relações com suas similares no exterior para a troca e realização conjunta de projetos de pesquisa, fortalecendo suas bases de conhecimento.

Segundo BIAC (2005), a atitude pública em relação à ciência também afeta as oportunidades de mercado e, combinada a políticas de incentivo à P&D, é um dos fatores determinantes para a internacionalização da pesquisa. Os investimentos externos em P&D tendem a ser mais intensos quando há a percepção geral de que os resultados trazidos pelas recentes descobertas e inovações são de real importância para a sociedade. As pesquisas na área de biotecnologia, por exemplo, avançam, de certo modo lentamente na Europa porque a população resiste a alimentos geneticamente modificados.

5.2 Prioridades para quem investe em P&D no exterior

As empresas que atualmente investem ou que planejam investir em P&D fora de seus países de origem buscam, primeiramente, maior grau de especialização e/ou conhecimento em outros pontos do mundo (EIU, 2004).

Nos países industrializados, as multinacionais apresentam demanda por pesquisadores altamente qualificados, cuja oferta pode ser restrita em seus países-sede. Já os países emergentes se mostram uma abundante fonte de talentos em P&D, à medida que a qualidade da educação melhora. Ademais, pólos globais de conhecimento ajudam as empresas a evitarem gastos com realocação e salários excessivos.

A proximidade entre universidades e laboratórios de pesquisa de ponta também é uma importante vantagem para muitos tipos de atividades de P&D. As firmas estabelecidas nesses pólos desfrutam de maior facilidade para interagir e formar acordos de cooperação tecnológica, além de poderem absorver novos conhecimentos com rapidez.

A possibilidade de responder à demanda nos mercados em crescimento é outro elemento buscado pelas multinacionais. A habilidade de desenvolver produtos e serviços para nichos particulares - e com rapidez – foi colocada como um grande benefício da P&D globalizada para 2/3 dos entrevistados da EIU (2004). A localização próxima permite entender diferentes culturas e hábitos dos consumidores e, assim, desenhar produtos de acordo com suas preferências. Pode-se também ofertar produtos e serviços em mercados onde há elevada penetração daquele bem/serviço.

A terceira prioridade está relacionada a custos. Para metade dos entrevistados da EIU (2004), reduzir custos através de salários mais baixos, terra e aluguel mais baratos e regimes de impostos favoráveis é um importante benefício da globalização da P&D. Ainda assim, a questão dos custos é de menor importância do que a busca por especialistas e por mercados em expansão. Isso porque a economia com a força de trabalho pode ser parcialmente descompensada pelo custo de coordenar e gerenciar a P&D em múltiplos países. "Os 'custos escondidos' da P&D globalizada podem chocar muitas empresas" (EIU, 2004).

Outras alternativas para reduzir custos com a globalização da P&D são a aquisição ou licença para usar tecnologias existentes em outros países; e a formação de joint ventures em P&D, o que diminui tempo, custo e risco envolvidos com o estabelecimento de operações de P&D em países estrangeiros. Assim, as grandes empresas geralmente abrem

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seus próprios laboratórios em outros países, enquanto pequenas e médias empresas são mais propensas a globalizar por meio de alianças e outsourcing4 (EIU, 2004).

5.3 Impactos para os países em desenvolvimento

Segundo Unctad (2005), a participação dos países em desenvolvimento na globalização da P&D tem sido, até agora, desigual. De um lado, alguns países em desenvolvimento com infraestrutura robusta, força de trabalho altamente treinada, razoável proteção à propriedade intelectual e mercados domésticos atraentes – especialmente na Ásia e no Pacífico – têm atraído investimento externo direto (IED) em P&D. Esses países se beneficiam das oportunidades decorrentes da crescente demanda das multinacionais por talentos pouco onerosos e por mercados em desenvolvimento. Suas políticas focam em medidas para maximizar os efeitos indiretos das tecnologias oriundas do IED e melhorar a capacidade de absorção ao encorajar as firmas locais a se engajarem em P&D. Por outro lado, muitos outros países em desenvolvimento registram crescimento e bem-estar modestos porque seus esforços em P&D permanecem baixos e desligados do setor privado. Observa-se que os investimentos em P&D podem beneficiar diretamente o crescimento da economia, estimulando a eficiência tecnológica. A magnitude em que isso ocorre, contudo, depende do papel que as diferentes unidades de P&D desempenham. Unctad (2005) explica que as unidades de transferência tecnológica, por exemplo, são estabelecidas para adaptar produtos e processos desenvolvidos na matriz às condições e preferências locais, e acabam contribuindo para o treinamento de equipes técnicas locais. Unidades de tecnologia “nativa” freqüentemente identificam oportunidades onde estão inseridas e convencem a matriz de que podem desenvolver produtos e processos adaptados a essas demandas, fazendo uso de materiais disponíveis localmente, resultando em produtos de custo efetivo mais favorável e firmando relações com o sistema de inovação nacional. As unidades de tecnologia regional são estabelecidas para desenvolver novos produtos, ou melhorar os já existentes, estabelecendo fortes relações com o sistema de inovação nacional e servindo a clusters regionais, de modo a expandir suas competências tecnológicas. As unidades de tecnologia global e as unidades de tecnologia corporativa podem converter conhecimento teórico em produtos e processos tangíveis, normalmente visando a competitividade futura da companhia.

As economias hospedeiras também podem extrair benefícios diretos das unidades de P&D das multinacionais ao subcontratar e patrocinar pesquisas em universidades locais. Podem também licenciar tecnologias de subprodutos ou produtos derivados, decorrentes dos investimentos estrangeiros em P&D, em favor das empresas locais (Unctad, 2005).

As atividades de P&D das multinacionais também podem afetar as possibilidades de emprego de pessoal qualificado nas economias-hospedeiras. A entrada de P&D estrangeira pode compensar o risco da migração de cérebros dos países em desenvolvimento ao oferecer mais oportunidades de trabalho, especialmente nos casos em que as competências locais não conseguem criar o volume e o tipo de empregos correspondentes à qualificação da força de trabalho interna. Isso também pode ajudar a trazer de volta ao país pesquisadores e outros profissionais que saíram em busca de oportunidades de trabalho e melhores salários.

Grynszpan (2005) pondera, no entanto, que se a atuação da mão-de-obra qualificada ficar restrita à empresa, unicamente, apenas esta se beneficiará, não trazendo reflexos positivos à economia doméstica.

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A presença das multinacionais pode ainda implicar em conseqüências indiretas aos países-hospedeiros. O encorajamento da cultura comercial entre cientistas e engenheiros é um exemplo. Segundo a Unctad (2005), quando fluxos de investimento externo relacionados à P&D começaram a entrar na Índia, muitos cientistas passaram a focar em pesquisas patenteáveis. E vários deles se tornaram empreendedores, formando suas próprias empresas.

Da mesma forma, as multinacionais podem servir de exemplo e inspirar as firmas locais a absorverem uma cultura de pesquisa e inovação, aumentando os investimentos domésticos em P&D e expandindo a geração de patentes no país. Em vários setores, os laboratórios nacionais podem, inclusive, competir em grau de igualdade com os laboratórios das subsidiárias.

Além disso, mais investimentos externos, desta vez ligados à industrialização, freqüentemente são direcionados ao país hospedeiro para tornar os resultados da P&D (novos produtos e processos) comercializáveis, proporcionando benefícios adicionais à economia local, como a geração de novos postos de trabalho (inclusive menos qualificados, neste caso).

Por outro lado, os benefícios da atração da P&D global não são automáticos para as economias hospedeiras. Em muitas situações, eles podem ser limitados se as subsidiárias criarem poucas ou nenhuma ligação com os atores domésticos, e se não houver a difusão do conhecimento gerado. O isolamento é acentuado pela fragmentação da P&D e pela crescente especialização das unidades (individuais) de pesquisa (Unctad, 2005).

Adicionalmente, argumenta-se que o investimento externo ligado à P&D representa apenas a transferência de posse, sem valor desenvolvimentista, quando se resume à fusão ou à aquisição de um laboratório. Os efeitos dessa conformação de negócios podem ser adversos para a capacidade local de inovação. Um exemplo foi a aquisição de empresas brasileiras do setor automotivo e de telecomunicações, nos anos 1990, por multinacionais, o que levou à redução das atividades de P&D nas firmas adquiridas (Unctad, 1999 apud Unctad, 2005).

Grynszpan (2005) alerta ainda para que as operações de P&D das multinacionais não bloqueiem ou abafem os investimentos em P&D de competidores nacionais. Se as companhias domésticas não estiverem inseridas num ambiente que as permita competir com as afiliadas estrangeiras, o resultado, a longo prazo, poderia ser o desestímulo à pesquisa e à inovação no país por parte das firmas nacionais. Ademais, deve-se ter cautela para que a P&D num país não seja majoritariamente dominada pelo capital estrangeiro, uma vez que nem sempre os interesses das multinacionais correspondem aos interesses e necessidades do país hospedeiro.

O alerta para que o financiamento das pesquisas não seja deixado apenas para as forças de mercado também faz parte do discurso de Bowonder (2001), especialmente no que concerne aos países em desenvolvimento onde os recursos públicos destinados às universidades se dirigem principalmente à manutenção de um crescente número de estudantes, em detrimento da pesquisa.

Um ponto negativo muito importante citado por Unctad (2005) refere-se à possibilidade de desvio de escassos recursos de P&D dos países hospedeiros para as subsidiárias. O investimento externo direto pode, por exemplo, atrair os melhores pesquisadores para os quadros das afiliadas, criando elevados custos de oportunidade para universidades e empresas domésticas – não raro, desfalcando-as. Bowonder (2001) também manifesta a mesma preocupação e acrescenta a necessidade de se treinar pessoas competentes e com visão global para gerenciarem as novas formas de P&B.

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Além disso, algumas multinacionais se mostram mais propensas a transferir o resultado da inovação obtida em países em desenvolvimento do que transferir o processo de inovação em si (Unctad, 1999 apud Unctad, 2005). Os reflexos para a economia hospedeira são, neste caso, marginais.

Para as empresas globais, a inovação é tão móvel quanto a produção, afirma Grynszpan (2005). Assim, caso terminem os motivos pelos quais a multinacional decidiu implantar seu laboratório em certo país, ou caso outra localidade desponte como mais vantajosa, a corporação pode decidir mover o seu laboratório para um novo país. Além dos prejuízos à economia local (como o desemprego), isso pode ocorrer sem que o país tenha desfrutado dos benefícios da instalação daquele laboratório5.

Outra séria implicação negativa da globalização da P&D para os países em desenvolvimento, segundo Bowonder (2001), é a perda do conhecimento tradicional. Produtos e processos cujo emprego vem sendo disseminado há séculos nos países em desenvolvimento correm o risco de não serem renovados ou protegidos. Baseiam-se em práticas e, portanto, não estão documentados, estando susceptíveis à conversão em propriedade intelectual para países desenvolvidos, que os patenteiam.

Não se pode esquecer, também, que a P&D globalizada está geograficamente concentrada em países em desenvolvimento que apresentam características específicas e diversas do restante dos países do mesmo grupo. Tal fato gera preocupação uma vez que pode aumentar a marginalização dos países em desenvolvimento que não são alvos dos investimentos estrangeiros em P&D, num contexto de emergência da sociedade global do conhecimento. Sem uma base científica e tecnológica adequada, os benefícios da globalização da P&D tendem a continuar significando um desafio para a maioria dos países em desenvolvimento, ao invés de uma oportunidade (Unctad, 2005).

Bowonder (2001) afirma que são crescentes as evidências que a distância tecnológica entre países desenvolvidos e menos desenvolvidos estão aumentando. E que as pequenas e médias empresas dos países em desenvolvimento não dispõem nem de recursos nem de habilidades para enfrentar os desafios da competição global (em termos de P&D).

Cabe a ressalva, neste ponto, de que nem toda P&D realizada está no topo da cadeia de valores. Com a modularização da pesquisa, alguns países pequenos podem se especializar em certos nichos (de baixa tecnologia, por exemplo) na tentativa de se enquadrar nas redes de conhecimento globais.

5.4 O NOVO PAPEL DOS GOVERNOS

A habilidade de atrair e se beneficiar dos investimentos externos diretos em P&D dependem, em larga escala, do ambiente político do país hospedeiro. Neste sentido, é crucial que os países em desenvolvimento apresentem, segundo Unctad (2005), estabilidade política e macro-econômica; investimentos consistentes e transparentes; boas políticas industriais e comerciais; bons sistemas de comunicação e um sistema de inovação nacional bem desenvolvido. Bowonder (2001) destaca a necessidade de fortes laços entre empresas, instituições acadêmicas e de pesquisas, e governos.

Assim, os governos precisam priorizar, segundo Grynszpan (2005), a solução de gargalos que dificultam o acesso das empresas aos resultados das pesquisas acadêmicas; e a criação de excelência, através do apoio às pesquisas básicas e à formação de pessoal altamente qualificado.

5 Cabe ressaltar, contudo, que tal mobilidade existe mas é relativa, devido aos elevados custos para a

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Outros cuidados que são consensuais entre diversos autores são a criação de habilidades técnicas para absorver, adaptar e desenvolver tecnologia e know-how; o fortalecimento das universidades, recrutando equipes e provendo-as de financiamentos adequados para manter suas pesquisas; o estabelecimento de parques científicos, de preferência próximos a centros acadêmicos de excelência; e o desenvolvimento de um sistema de proteção à propriedade intelectual.

6. Perfil de três multinacionais do agronegócio que desenvolvem P&D no Brasil6

6.1 Syngenta

Criada em 2000, a partir da fusão da Zeneca Agrícola com a Novartis Agroscience, a Syngenta AG, com sede em Basiléia (Suíça), é uma das líderes mundiais do mercado de defensivos agrícolas e a terceira colocada no mercado de sementes. Com vendas globais de aproximadamente US$ 8,1 bilhões em 2005, a empresa emprega cerca de 19 mil pessoas em mais de 90 países. No Brasil, conta com1.200 profissionais.

A Syngenta investiu, mundialmente, US$ 809 milhões em pesquisa em 2004, o que representa 11% do faturamento total da empresa. Os principais centros de pesquisa da companhia estão instalados na Suíça (Stein - fungicidas e inseticidas), na Inglaterra (Jealott's Hill – herbicidas) e nos Estados Unidos (Research Triangle Park, Carolina do Norte – sementes). Além desses, possui outros 90 centros regionais de pesquisa, inclusive no Brasil.

A companhia se divide em: Syngenta Proteção de Cultivos (Crop Protection), Syngenta Sementes (Seeds) e Syngenta Produtos Profissionais.

A Syngenta Proteção de Cultivos é a maior divisão da companhia. No Brasil, possui uma fábrica em Paulínia (SP) - uma das unidades mais importantes para a multinacional em termos globais -, um laboratório de análises de resíduos químicos em São Paulo (SP), uma unidade experimental em Uberlândia (MG) e outra em Holambra (SP).

A Syngenta Sementes é, segundo a própria empresa, a divisão que mais cresce. Trabalha em conjunto com os produtos da Proteção de Cultivos, considerando as regulamentações de cada país onde está presente. Oferece variedades convencionais ou geneticamente modificadas, onde permitido. A divisão opera dois centros regionais de pesquisas, instalados em Cascavel (PR) e Uberlândia (MG). O centro de pesquisas de Uberlândia é o primeiro de uma empresa privada no país a ter um laboratório de marcadores moleculares - um investimento de US$ 1 milhão. A Syngenta Sementes é também a primeira empresa do Brasil a receber o certificado de qualidade em biossegurança emitido pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CNTBio), que autoriza a Syngenta a desenvolver pesquisas com grandes culturas (milho, soja, algodão e outras) geneticamente modificadas.

A Syngenta Sementes possui ainda duas unidades de beneficiamento de sementes em Matão (SP) e Ituiutuba (MG), ambas equipadas com laboratório de controle de qualidade.

6.2 Dow AgroSciences

A Dow AgroSciences é uma das líderes do mercado mundial de agroquímicos, com sede em Indiana, nos Estados Unidos. Segundo informações da empresa, ela se dedica

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exclusivamente à pesquisa, ao desenvolvimento, à produção e à comercialização de produtos agroquímicos, de sementes (inclusive transgênicos), especialidades domissanitárias e de saúde animal.

No Brasil, a Dow conta com mais de 650 funcionários. O escritório central localiza-se em São Paulo (SP).

O Departamento de P&D da Dow AgroSciences no Brasil conta com uma equipe de pesquisa e desenvolvimento de campo para agroquímicos (agrônomos sediados nas principais regiões agrícolas do Brasil); uma equipe de desenvolvimento de campo de novos híbridos de milho e sorgo; e, uma equipe de Regulamentação e Registro de Produtos, que trabalha na obtenção de registros e cadastros para os produtos desenvolvidos e comercializados pela Dow.

Para a parte de agroquímicos, a Dow possui uma Estação Experimental em Mogi Mirim (SP), a qual integra um grupo de doze centros de pesquisa que a companhia mantém no mundo. Há ainda um Laboratório de Química Ambiental, também em Mogi Mirim (SP), onde se monitora o impacto ambiental dos produtos em desenvolvimento; e um Laboratório de Formulações, localizado em Franco da Rocha (SP).

Para o setor de sementes, a Dow AgroSciences mantém unidades de pesquisas em Jardinópolis (SP) – é o Laboratório de Fitopatologia -, em Guaira (SP), Indianópolis (MG) e Castro (PR), além de locais de testes espalhados pelas regiões produtoras de milho e sorgo no país, onde são avaliados os novos híbridos e trabalhos de biotecnologia.

6.3 Monsanto

A Monsanto iniciou atividades no Brasil em 1951. Desenvolve e comercializa herbicidas, sementes convencionais e geneticamente modificadas. A empresa gera hoje cerca de 1.800 empregos diretos e 7.000 indiretos. Nos últimos 10 anos, investiu mais de US$ 1 bilhão na expansão e modernização de suas unidades industriais em diversos estados brasileiros.

Os investimentos em pesquisa somaram, no Brasil, US$ 7,5 milhões em 2003. No mundo foram cerca de US$ 500 milhões naquele ano, ou seja, mais de US$ 1 milhão por dia. As pesquisas em biotecnologia aliam o melhoramento convencional às modernas técnicas da engenharia genética. A empresa lançou, por exemplo, a semente de soja transgênica Roundup Ready.

A subsidiária brasileira da Monsanto tem um escritório central em São Paulo (SP) e regionais de vendas em Porto Alegre (RS), Londrina (PR), Ribeirão Preto (SP) e Goiânia (GO).

A multinacional está presente em vários estados do país, com unidades diferenciadas, conforme relação a seguir:

- Sorriso (MT): pesquisa de sementes de milho e soja - Camaçari (BA): produção de matéria-prima de herbicidas

- Santa Helena de Goiás (GO): processamento de sementes de milho e sorgo; P&D de agroquímicos e sementes; pesquisa em biotecnologia

- Morrinhos (GO): pesquisa de sementes de soja

- Paracatu (MG): processamento de sementes de milho

- Uberlândia (MG): processamento de sementes de milho e sorgo; P&D de agroquímicos e sementes; pesquisa em biotecnologia; escritório de operações de sementes

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- Ipuã (SP): produção de sementes de milho e sorgo - Barretos (SP): produção de sementes de milho e sorgo

- Itaí (SP): produção de sementes de milho e sorgo - São José dos Campos (SP): produção de herbicidas

- Santa Cruz das Palmeiras (SP): P&D de agroquímicos e sementes; pesquisa em biotecnologia

- Andirá (PR): armazenamento de sementes de milho

- Rolândia (PR): P&D de agroquímicos e sementes; pesquisa em biotecnologia

- Não-me-toque (RS): P&D de agroquímicos e sementes; pesquisa em biotecnologia; processamento de sementes de milho

7. Considerações finais

As razões comerciais para investir em bases internacionais de pesquisas se relacionam a estratégias empresariais e à capacidade de lidar com mudanças de foco nos negócios (BIAC, 2005). A necessidade de reduzir custos é uma delas, embora não seja o fator determinante. As decisões são mais freqüentemente pautadas pela busca por profissionais altamente especializados, por pólos de conhecimento científico e tecnológico, e por acesso a mercados em expansão.

No setor agrícola, especificamente, infere-se que uma das principais motivações para que as multinacionais invistam em P&D no Brasil é a proximidade com o mercado consumidor. A grande dimensão da agricultura brasileira – em termos de área plantada, volume de produção e número de produtores (pequenos, médios e grandes), por exemplo – indicam a enorme potencialidade do mercado de sementes, defensivos, herbicidas, fungicidas e outros. Portanto, pesquisar e desenvolver produtos adequados à realidade nacional constitui-se numa importante estratégia para essas empresas, uma vez que torna a comercialização mais eficiente.

Portanto, regiões que oferecem um ambiente fértil para a pesquisa e inovação, com boa infra-estrutura, bons sistemas de comunicação, força de trabalho bem educada, universidades fortes, crescente demanda, políticas científicas e tecnológicas bem definidas e regras de comercialização transparentes, entre outros, são alvo de investimentos externos diretos em P&D. China, Índia, Brasil e Cingapura, por exemplo, são países que hospedam laboratórios de pesquisa de multinacionais de vários setores.

O reflexo deste cenário tende a ser positivo tanto para as empresas estrangeiras quanto para os países hospedeiros. Mas as opiniões divergem quanto ao grau de benefícios que a globalização da P&D traz para os países em desenvolvimento.

Não se pode esquecer que nos países mais desenvolvidos, a economia é madura e sabe aproveitar as inovações, sendo que o conhecimento gerado se integra mais facilmente com a estrutura local. Já nos países em desenvolvimento, essa absorção dificilmente acontece de forma natural, e corre-se o risco de o investimento em P&D se transformar num enclave e pouco beneficiar a economia local (Grynszpan, 2005).

Dentre os benefícios advindos da P&D globalizada, destacam-se, por exemplo, a criação de empregos; agregação de valor aos produtos fabricados no país; geração de patentes; spin-offs; promoção de parcerias entre empresas locais, multinacionais, universidades e centros de pesquisa; transferência da cultura comercial e científica aos agentes domésticos, etc.

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Por outro lado, as conseqüências podem ser adversas, sobretudo se as empresas domésticas não estiverem prontas para enfrentar a competição e se os governos se mostrarem frágeis ou omissos enquanto agentes reguladores.

Dentre os possíveis riscos aos países em desenvolvimento que alojam subsidiárias em P&D estão o desvio de profissionais e fontes de financiamento dos hospedeiros para as subsidiárias; a perda do conhecimento tradicional; o bloqueio ou abafamento dos investimentos em P&D de empresas nacionais; a limitação do desenvolvimento tecnológico dos países hospedeiros, caso a confiança nos investimentos externos seja excessiva e não se concretize. Além disso, há o risco de aumentar a marginalização dos países em desenvolvimento que não são alvos da globalização da P&D, uma vez que a sociedade do conhecimento tem se construído sobre bases econômicas, científicas e, sobretudo, tecnológicas.

Desta forma, para atrair o capital externo relacionado à P&D e maximizar sua utilidade para o desenvolvimento do país, os governos devem criar ambientes que proporcionem uma forte base científica; que ofertem capital humano qualificado; que encorajem alianças entre as universidades e as empresas; que assegurem o direito à propriedade intelectual; que sejam regulados por políticas fiscais, industriais, comerciais e científicas consistentes; e que favoreçam a antecipação de tendências e oportunidades futuras. O respaldo da sociedade também é muito importante neste sentido.

Bibliografia

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Referências

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