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REDE CEGONHA POTENCIALIZANDO MUDANÇAS NA FORMAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA

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Academic year: 2021

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Revista Baiana de Saúde Pública

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DOI: 10.22278/2318-2660.2019.v43.n0.a3215

ARTIGO ORIGINAL DE TEMA LIVRE

REDE CEGONHA POTENCIALIZANDO MUDANÇAS NA FORMAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA

Débora Mouraa

Laíse Rezende de Andradeb Resumo

A Rede Cegonha tem como principais objetivos reduzir a mortalidade materna e infantil, dando atenção ao parto e ao nascimento, à mulher no puerpério e à criança na primeira infância. Entre os desafios colocados para a rede estão a necessidade de mudanças no modelo tecno-assistencial (que perpassam o modelo da formação em saúde) da atenção ao parto e ao nascimento, que ainda produz excesso de medicalização, banalização da cesárea, desrespeito aos direitos da mulher e da criança e cuidado diferenciado aos adolescentes e jovens. Desse modo, este artigo tem o objetivo de descrever e refletir sobre a experiência numa disciplina teórico-prática do curso de graduação em Fonoaudiologia da Universidade Federal da Bahia junto à Rede Cegonha. Nesse sentido, se debruça sobre um relato de experiência, na perspectiva docente, baseado em relatórios discentes, de um componente curricular teórico--prático sobre a Rede Cegonha no curso mencionado. Foram visitados diversos serviços que compõem a RC no município de Salvador, como serviços de gestão, atenção primária à saúde e serviços especializados. Além da contribuição na construção de uma perspectiva prática sobre a Rede Cegonha, as visitas técnicas contribuíram para que os estudantes em formação pudessem refletir quanto ao modelo de profissional que aspiram ser e de que forma podem contribuir para mudanças positivas como sujeitos nos serviços de saúde. As peculiaridades da Rede Cegonha demandam uma formação específica do profissional da saúde para a atuação neste dispositivo inovador, o que ainda representa um desafio para as diferentes profissões.

Palavras-chave: Desenvolvimento de pessoal. Sistema Único de Saúde. Saúde materna. Saúde da criança.

a Fonoaudióloga Sanitarista. Mestre em Saúde Coletiva. Docente substituta do curso de fonoaudiologia e coordenadora

pedagógica da Residência em Saúde Coletiva com ênfase em desenvolvimento infantil na Universidade Federal da Bahia. Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: deborah.moura@hotmail.com

b Doutora em Saúde Pública. Docente do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia. Salvador, Bahia,

Brasil. E-mail: laiseandrade@hotmail.com

Endereço para correspondência: Rua Basílio da Gama, n. 316, Canela. Salvador, Bahia, Brasil. CEP: 40110-040.

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REDE CEGONHA POTENTIALIZING CHANGES IN PHONOAUDIOLOGY TRAINING

Abstract

Rede Cegonha (RC) aims to reduce maternal and infant mortality, and to provide childbirth care, to women in the postpartum period and children during early childhood. Among the challenges posed to RC are the need for changes in the techno-assistential model (which goes beyond the health training model) of childbirth care, as it still leads to over-medicalization, trivialization of cesarean delivery, disrespect for women’s rights and the care for adolescents and young people. The objective was to describe and reflect on the experience of a theoretical and practical discipline from the undergraduate course in Speech and Hearing Therapy at the Federal University of Bahia (UFBA), together with RC. This is an experience report of educational nature based on student reports relative to a theoretical-practical curricular component in RC. Several services constituting the CR in the city of Salvador were visited, such as management services, primary health care and specialized services. In addition to their contribution to training from the practical perspective of RC, the technical visits helped the students in training to reflect on the professional model they wish to achieve and how they can contribute to positive changes as individuals in health services. The peculiarities of the RC require specific training for health professionals to perform in this innovative device, which still represents a challenge for various professions.

Keywords: Staff development. Unified Health System. Maternal health. Child health.

LA RED CIGÜEÑA POTENCIALIZANDO CAMBIOS EN LA FORMACIÓN EN FONOAUDIOLOGÍA

Resumen

La Red Cigüeña tiene como principales objetivos reducir la mortalidad materna e infantil brindando atención al parto y al nacimiento, a la mujer en el puerperio y al niño en la primera infancia. Entre los desafíos planteados a esta red, está la necesidad de cambios en el modelo tecno-asistencial (que atraviesan el modelo de la formación en salud) de la atención al parto y al nacimiento, que aún produce exceso de medicalización, banalización de la cesárea, irrespeto a los derechos de la mujer y del niño, y el cuidado diferenciado a los adolescentes y jóvenes. Este estudio objetivó describir y reflexionar sobre la experiencia en una disciplina teórico-práctica del curso de graduación en Fonoaudiología de la Universidad Federal da Bahia junto a la Red Cigüeña. El presente trabajo es un relato de experiencia desde la perspectiva docente basándose en los

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informes de los estudiantes acerca de la Red Cigüeña para un componente curricular teórico-práctico en el mencionado curso. Se visitó diversos servicios que componen la red en el municipio de Salvador, como servicios de gestión, atención primaria de salud y servicios especializados. Además de la contribución en la formación sobre una perspectiva práctica de la Red Cigüeña, las visitas técnicas contribuyeron a que los estudiantes en formación pudieran reflexionar sobre el modelo de profesional a que aspiran y de qué forma pueden contribuir a cambios positivos como sujetos en los servicios de salud. Las peculiaridades de la Red Cigüeña demandan una formación específica del profesional de la salud para la actuación en este dispositivo innovador, lo que todavía representa un desafío para las diferentes profesiones.

Palabras clave: Desarrollo de personal. Sistema Único de Salud. Salud materna. Salud del niño.

INTRODUÇÃO

A redução das mortalidades materna e infantil tem sido uma preocupação constante na saúde pública mundial nas últimas décadas. No Brasil, várias políticas públicas nacionais têm sido desenvolvidas nesse período, como o Programa de Humanização do Pré-Natal e Nascimento (PHPN), o Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal de 2004, o Pacto pela Redução da Mortalidade Infantil no Nordeste e Amazônia Legal e o Plano de Qualificação das Maternidades e Redes Perinatais do Nordeste e da Amazônia Legal1.

Neste sentido, em março de 2011, em meio à articulação de Redes de Atenção à Saúde (RAS), o Ministério da Saúde lança a Rede Cegonha (RC), tendo entre seus objetivos a redução das mortalidades materna e infantil – em especial a neonatal – sobretudo através da qualificação da Atenção Básica, da atenção ao parto e ao nascimento, à mulher no puerpério e à criança na primeira infância – com ênfase nos seus dois primeiros anos2.

A RC tem por finalidade estruturar e organizar a atenção à saúde materno-infantil no país, respeitando o critério epidemiológico, taxa de mortalidade materno-infantil, razão mortalidade materna e densidade populacional de cada região. Além disso, surge como forma de complementar o PHPN, um programa que adota medidas para melhoria do acesso, da cobertura e da qualidade do acompanhamento pré-natal, da assistência ao parto ao puerpério3.

Entre os desafios colocados para a RC estão a necessidade de mudanças no modelo tecno-assistencial da atenção ao parto e ao nascimento que ainda produz excesso de medicalização; banalização da cesárea; desrespeito aos direitos da mulher e da criança; e o cuidado diferenciado aos adolescentes e jovens, entre outros4.

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Neste contexto, reconhece-se o papel importante das Instituições de Ensino Superior (IES) como uma estrutura social capaz de subsidiar o processo de implementação e consolidação das RAS, uma vez que as especificidades da RC demandam uma formação diferenciada do profissional da saúde para a atuação neste dispositivo inovador, o que representa um desafio para as diferentes profissões da saúde5.

No curso da Universidade Federal da Bahia (UFBA), o último processo de reforma curricular, que ocorreu em 2010, culminou na criação de uma nova matriz que possibilitou a construção de novas práticas de ensino. Essas novas práticas se pautaram na formação em saúde por meio de modelos pedagógicos que valorizam o sujeito e o processo de cuidado à saúde sob o eixo da integralidade, com especial foco na Atenção Primária – ainda que os desafios históricos da formação permaneçam, como a superação da lógica biomédica hegemônica.

Dentre as mudanças ocorridas, foi desenvolvido um componente curricular teórico-prático com ênfase nas RAS, em especial a RC, Rede de Cuidados a Pessoa com Deficiência, Rede de Atenção Psicossocial e Rede de Cuidados à Pessoa com Doença Falciforme. Desse modo, esse artigo tem por objetivo descrever e refletir sobre a experiência de uma disciplina teórico-prática do curso de graduação em Fonoaudiologia da UFBA junto à RC no município de Salvador, Bahia.

MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de um relato de experiência, na perspectiva docente, de um componente curricular teórico-prático do curso de graduação em Fonoaudiologia da UFBA com a temática Saúde Materno-infantil, com ênfase na RC, no município de Salvador, Bahia.

Ressalta-se que a experiência está embasada no entendimento de que a formação é um processo em constante movimento no decorrer da vida. Nesse sentido, a experiência é uma via de acesso à formação, uma vez que particulariza suas atividades formativas6. Desta

forma, enfoca-se neste artigo a experiência formativa inicial na RC vivenciada a partir de dez discentes do 9º semestre do curso de Fonoaudiologia da UFBA.

Parte-se da vivência de uma das autoras, na condição de docente, subsidiada por relatos e registros escritos de discentes em cinquenta diários de campo individuais elaborados ao longo da disciplina – cinco por cada aluno(a) – e um relatório de gestão realizado conjuntamente pelos estudantes ao fim da disciplina, contendo introdução, objetivo, descrição das atividades e visitas, reflexão crítica sobre a experiência vivenciada e sobre a contribuição para a formação em saúde, bem como os pontos facilitadores, limitadores e conclusões.

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O período descrito refere-se ao segundo semestre letivo de 2015, ocorrido entre janeiro e junho de 2016, quando a disciplina foi realizada pela terceira vez no currículo do curso – sendo as atividades desenvolvidas com a frequência de quatro horas semanais. O registro da vivência, realizado pelas discentes, permitiu a construção de narrativas que viabilizariam posteriormente sua análise com vistas à identificação das experiências significativas para a formação dos estudantes no contexto da disciplina.

RESULTADOS

APRESENTAÇÃO DA PROPOSTA

A disciplina Práticas Fonoaudiológicas I (PF I), do curso de graduação em Fonoaudiologia da UFBA, possui 68 horas de carga horária, distribuídas em quatro horas semanais. Apresenta como objetivo conhecer e discutir as principais ferramentas de trabalho e os referenciais teóricos que sustentam a proposta da Saúde Materno-infantil com ênfase da RC, bem como reconhecer limites e potencialidades da proposta para o fortalecimento das RAS no Sistema Único de Saúde (SUS), a partir da inserção dos estudantes na realidade do trabalho que é desenvolvido em Salvador.

É dividida em dois momentos, o teórico (cerca de quatro semanas iniciais) e o prático, através de visitas técnicas realizadas semanalmente na rede pública municipal e estadual, passando pelos mais diversos espaços que compõem uma Rede – como gestão, Atenção Primária à Saúde e serviços especializados.

Ao longo do semestre, as estudantes são estimuladas a registrarem semanalmente as atividades realizadas e suas reflexões sobre estas no diário de campo. Além dos registros em diário de campo, ao final da disciplina é entregue um Relatório de Gestão com a compilação de todas as atividades realizadas e reflexão de como contribuíram no processo de formação.

A FORMAÇÃO TEÓRICA

As atividades da disciplina foram iniciadas com quatro encontros entre os estudantes e a professora, visando discutir de maneira crítica a base teórica e política das RAS, com olhar especial sobre a RC e seus processos de trabalho. Assim, foram debatidos diferentes temas, como Reforma Sanitária, Políticas de Saúde, Modelos de Atenção e RAS, além da saúde Materno-infantil e RC.

Estes momentos permitiram maior apropriação da proposta pelos estudantes, de forma que pudessem, ao momento de realização das visitas, problematizar o que estava sendo

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observado e propor intervenções, de modo a assumirem uma postura participativa e interessada. Ressalta-se que esta disciplina é realizada após uma ampla formação teórica e prática com a temática da Saúde Coletiva em semestres anteriores. Além destes debates iniciais, ao longo da disciplina outros encontros teóricos e de supervisão foram realizados na Universidade, com vistas à análise permanente do trabalho vivenciado, de forma a integrar teoria e prática.

A PRÁTICA VIVENCIADA

As visitas ocorreram nos seguintes serviços: Área técnica da Saúde Materno-Infantil da Diretoria de Gestão do Cuidado da Secretaria Estadual de Saúde (DGC); Unidade de Saúde da Família Úrsula Catharino; Maternidade Tsylla Balbino; Instituto de Perinatologia da Bahia (Iperba); Maternidade José Maria De Magalhães Netto; e Centro de Parto Normal Mansão do Caminho.

Diretoria de Gestão do Cuidado (DGC)

A DGC faz parte da Superintendência de Atenção Integral à Saúde (SAIS/SESAB) e tem por finalidade coordenar processos de formulação, implantação, implementação e avaliação de políticas e programas de saúde voltadas à Saúde da Criança, dos Adolescentes e Jovens, da Mulher, do Homem e do Idoso – ou seja, com o foco nos ciclos de vida e gênero – nos 417 municípios do estado da Bahia.

Durante a visita as alunas foram recebidas por duas profissionais da área técnica da Saúde Materno-infantil que explanaram sobre a RC, a sua prática, as mudanças com a implementação da Rede no estado da Bahia, e, de modo especial, os desafios, que são muitos. Foi relatado ainda que os principais desafios para a implementação da Rede Cegonha estão relacionados à falta de recurso e de comprometimento profissional e ao processo de trabalho.

Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF)

Segundo uma profissional do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) visitado, a proposta de trabalho da equipe do NASF do Garcia referente ao cuidado materno-infantil pressupõe: discussão coletiva de caso clínico; consulta em conjunto; realização de reunião de toda equipe para definição de propostas de ações; definição de metas visando construir propostas de curto, médio e longo prazo; ações intersetoriais; divisão de responsabilidades, na qual compartilha-se ou define-se as tarefas de cada um com clareza, aumentando as possibilidades de identificação dos problemas; reavaliação; e, por fim, um momento em que se discutirá a evolução e se farão os devidos reajustes.

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Com o advento da RC, as equipes de saúde da família, em parceria com as equipes de NASF, passaram a assumir um papel fundamental na organização da Rede, pois o pré-natal passa a ser realizado na Atenção Primária, que está estrategicamente localizada próxima as residências das gestantes. Com isso, a RC prevê a garantia de todas as consultas de pré-natal, no total de sete, bem como acesso às demais ações de saúde – a exemplo do curso para gestantes realizado por esta equipe, com o intuito de auxiliar e empoderar as gestantes do território adscrito.

A integração dos profissionais da equipe e a articulação com os setores da administração pública e demais parceiros é de fundamental importância para efetivação do trabalho de promoção de saúde e prevenção de agravos. Entretanto, ainda não são raras as dificuldades encontradas com a gestão central, que se estrutura de forma verticalizada, dificultando a realização de algumas atividades.

Maternidade Albert Sabin (MAS) e Instituto de Perinatologia da Bahia (Iperba) – serviços especializados

As profissionais que nos recepcionaram nas instituições MAS e Iperba referiram que com a implementação do PHPN e da RC se tornou possível a concretização de várias atividades para a qual não se sentiam empoderadas.

A MAS possui o serviço de Admissão; cardiotocografia; laboratório; farmácia; pré-parto; pré-parto; e enfermaria, com 66 leitos, sendo quatro para mães canguru. O serviço é formado pela regulação, que tem funcionamento ininterrupto, e pelo Acolhimento com Classificação de Risco (ACCR), que ocorre de segunda à sexta, das 7 às 19h, na recepção e é realizado por enfermeiras especializadas em obstetrícia. Após a classificação a usuária é atendida por um médico. A maternidade realiza, em média, 300 partos por mês. Porém, no mês de fevereiro de 2016, registrou 762 partos no mês, permitindo inferir um avanço desordenado de nascimentos.

No Iperba, o serviço é composto por admissão; pré-parto; enfermaria: 53 leitos; berçário de médio risco; laboratório; farmácia; pré-natal de alto risco; ambulatório de ginecologia; ambulatório de prevenção do câncer; ambulatórios de mastologia; cirurgia ginecológica; ambulatório de sexologia; ambulatório de uroginecologia; planejamento reprodutivo; aborto legal; referência em adolescente; e ACCR de segunda à sexta pela manhã.

Evidencia-se a deficiência de leitos para assistência ao parto e nascimento na cidade de Salvador e a necessidade de reavaliar as metodologias e as bases de cálculos para ter melhor clareza do quantitativo de leitos obstétricos/neonatais necessários. Vale salientar que a assistência obstétrica precisa melhorar em todos os aspectos (acesso, acolhimento, qualidade das consultas e resolutividade). Deve-se pontuar que as maternidades de Salvador

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não se restringem à assistência da população desta cidade: gestantes provenientes do interior do estado migram para Salvador em busca de garantia de uma assistência obstétrica mais efetiva ou mesmo de alguma assistência, frente à carência desta na sua região.

A iniciativa da criação da RC convoca os gestores, trabalhadores, estudantes, futuros profissionais da saúde e a sociedade a refletir e transformar o modelo predominante de atenção ao parto e ao nascimento praticado no país, o qual não coloca a gestante/parturiente no centro, como protagonista do processo de gestação e parto.

Maternidade de Referência Prof. José Maria Magalhães Netto (MJMMN) Na visita à MJMMN, localizada no bairro Pau Miúdo, fomos recebidos pela enfermeira e pela fonoaudióloga do local. A maternidade compõe o Sistema Estadual de Referência Hospitalar para atendimento à gestante de alto risco e assistência aos recém-nascidos que demandam cuidados especiais, seja pela prematuridade ou por possuírem alguma patologia. A maternidade é classificada como Organização Social, o que lhe confere faculdade de decidir com autonomia, flexibilidade e transparência, mobilizando recursos e construindo a sustentabilidade dos resultados de gestão.

Durante a visita, a enfermeira nos apresentou toda a maternidade: a triagem das gestantes ainda na recepção (classificação de risco), as enfermarias, os centros obstétricos, as UCI, UTI, os quartos de isolamento para receber bebês, o banco de leite humano (lactáreo), uma sala para receber as mães que são do interior e o setor administrativo. A profissional pontuou que os principais problemas enfrentados pela unidade são a superlotação, quebra de fluxo, movimentação da gestão, desestrutura da equipe e o estresse profissional. A Fonoaudióloga contou como é feito o seu trabalho na unidade Canguru. Informou que cerca de 90% dos bebês saem de alta da Canguru com aleitamento exclusivo, o que é um dado bastante considerável.

De acordo com os relatos dos estudantes, o que mais chamou a atenção na visita foi que a maternidade se preocupa ao máximo em seguir o que preconiza na portaria da RC, a exemplo da livre escolha do aconcsdbempanhante, a escolha do tipo de parto, a presença das Doulas e o uso de equipamentos que possam auxiliar no momento do parto, como o cavalinho, as bolas e a escada.

A gestão se preocupa em gerar e publicizar para o público interno e externo os dados de atendimentos como quantidade de gestantes atendidas e o perfil epidemiológico destas. Além disso, as estudantes observaram que toda a maternidade é sinalizada. Em frente às UCI e UTI são comunicados os horários que os pais e avós podem visitar os bebês e quando podem receber o boletim diário referente aos mesmos – e isto é importante porque orienta a família.

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Centro de Parto Normal (CPN) Marieta de Souza Pereira Mansão do Caminho Na visita ao CPN da Mansão do Caminho, fomos recebidos pela coordenadora que também é enfermeira obstetra no local. Ela explanou a respeito da fundação do serviço, do seu funcionamento, como também sobre as conquistas alcançadas e os desafios enfrentados. Com a proposta de resgatar o valor do parto realizado de forma natural, ou seja, sem necessidade de intervenção cirúrgica, os médicos do centro são especializados em procedimentos que buscam dar o conforto necessário à paciente e garantir a segurança do nascimento.

A unidade foi fundada no ano de 2011 e faz parte do SUS no atendimento de gestantes de baixo risco e incentivo ao parto humanizado, em um ambiente acolhedor e prezando a presença da família. A respeito do modelo assistencial fundamentado na atenção à mulher, ao bebê e à criança, a coordenadora referiu que a organização da assistência ao nascimento deve estar voltada para satisfazer os interesses da mulher e da família através do apoio da equipe, onde ocorre o resgate das características fisiológicas e naturais do nascimento, e que as práticas realizadas são baseadas em evidências científicas.

No decorrer da conversa, foram mencionado os critérios de internação no CPN, que são: ter realizado pelo menos quatro consultas de pré-natal em qualquer unidade; gestação única; apresentação cefálica; níveis pressóricos normais; gestantes com idade gestacional maior de 37 semanas e/ou menor ou igual a 41 semanas e quatro dias; estar em fase ativa do trabalho de parto; ter cerca de três contrações em dez minutos e 4 cm de dilatação; e não ter uma pré-cesariana. O CPN oferece os seguintes serviços: vacinas (Hepatite B e BCG), imunoglobulina Anti-RH, assistência ao recém-nascido, consulta na primeira semana de vida, certidão de nascimento, consulta do perfil das gestantes, consulta puerperal, avaliação da parturiente e internação.

Desta maneira, a vinculação da CPN Mansão do Caminho à RC, além de ser a primeira no Brasil, pode ser considerada um grande ganho para a assistência a gestantes, puérperas e recém-nascidos, pois além de valorizar o processo fisiológico da naturalidade do parto garante segurança ao nascimento e oferece também um cuidado humanizado.

Considerações sobre a contribuição dessa prática no processo de formação em saúde

Uma das estudantes que vivenciou as práticas descritas acima relatou que durante as visitas diversos aspectos teóricos discutidos em sala de aula puderam ser consolidados, assim como possibilitaram visualizar de perto o funcionamento de um serviço público, sendo possível observar o fluxo seguido pelas usuárias no interior das instituições, bem como verificar de perto a influência da estrutura e organização de setores sobre a saúde de usuários.

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Além de contribuir através da percepção de diferentes processos de trabalho em saúde, as visitas permitiram identificar que se faz necessário, como futuros profissionais, adentrar as instituições e conhecer como ocorre o processo de trabalho, subsidiando as concepções teóricas adquiridas em sala de aula.

DISCUSSÃO

Entende-se que a escrita da narrativa, recurso da aprendizagem experiencial, implica em colocar o sujeito em uma prática subjetiva e intersubjetiva do processo de formação a partir das experiências e aprendizagens expressas no texto narrativo, de forma que sua construção se potencializa nas reflexões e perguntas oriundas do processo de aprendizagem e dos conhecimentos implicados na transformação do sujeito em formação7.

O estudante da área da saúde, incluindo o da fonoaudiologia, deve ir além de suas habilidades técnicas, havendo necessidade do aperfeiçoamento de habilidades intra e interpessoais, do compromisso político com a educação e sociedade, bem como a compreensão histórica do momento atual do ensino na área da saúde no Brasil. Dessa forma, a formação desses profissionais deve ser fundamentada em conhecimentos, habilidades, atitudes, sensibilidade ética e integridade moral, equanimidade e autoconhecimento8.

Para Acioli9 a ação educativa é um eixo fundamental para a formação profissional

de saúde no que se refere ao cuidado na saúde púbica. A prática educativa em grupo permite a construção de um espaço compartilhado, ou seja, o conhecimento que tem por finalidade o empoderamento dos indivíduos e dos grupos sobre as relações sociais e fatores que influenciam sua qualidade de vida.

Marran10 aponta que é no período de estágio e das práticas onde se instala o

momento crítico da formação, no qual o acadêmico possui a oportunidade de gerar, construir e/ ou consolidar sua identidade profissional. Desta forma as visitas técnicas realizadas aos serviços de saúde descritos acima contribuíram de forma positiva para os estudantes de graduação. Isto é, os sujeitos em formação puderam refletir quanto ao modelo de profissional que aspiram ser e de que forma podem contribuir para mudanças positivas como sujeitos nos serviços em saúde.

Com a implantação da RC algumas mudanças práticas podem ser vistas, como adequações do ambiente físico e de processos de trabalho de algumas maternidades, incorporando diretrizes a exemplo da garantia do direito à acompanhante de livre escolha da mulher durante todo o processo do parto, previsto pela Lei 11108/2005 – estendendo esse direito também às mulheres em situação de abortamento11. Algumas dessas mudanças puderam

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É válido ressaltar que a implementação da RC é de responsabilidade dos três níveis (federal, estadual e municipal). Assim, se faz necessário pensar o impacto da gestão na execução das políticas públicas de saúde, pois não é possível desvincular a gestão da rede, mas também não é coerente responsabilizar unicamente a gestão pelo não funcionamento de uma certa política e/ou programa, já que existe todo um conjunto que se faz essencial para que estas sejam implantadas – a identificação do problema, notificação dos dados, uma política pensada para tal questão, recurso, planejamento, gestão, modelo adotado, acesso, profissionais comprometidos e a valorização dos mesmos, humanização do cuidado, entre outros12.

O papel da atenção básica na implantação das RAS é de extrema importância, uma vez que este nível de atenção cumpre o papel de centro de comunicação na rede. Diante disse, o NASF visa aumentar a capacidade de cuidado das equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF). O trabalho no NASF é baseado nos princípios da integralidade e da interdisciplinaridade e o que o diferencia dos outros programas já implantados é a possibilidade de trabalhar com a proposta de clínica ampliada13. A operacionalização do NASF adota o

conceito de matriciamento, tendo por objetivo garantir que as equipes estabeleçam relações ou responsabilizem-se pelas ações desencadeadas, garantindo a integralidade da atenção em todo o sistema de saúde14 – contribuindo assim para a implantação da RC com base na integralidade

e longitudinalidade do cuidado.

O reconhecimento de um cuidado digno e de qualidade na atenção à mulher em trabalho de parto é um direito a ser alcançado. Acrescenta-se a esse evento a vontade individual, o envolvimento dos profissionais de saúde e a mobilização política para que a vivência do trabalho de parto seja de cuidado e conforto para a mulher, e não um processo traumatizante em sua vida15.

Para isso, um dos avanças é o PHPN, que tem como principal estratégia assegurar a melhoria do acesso, da cobertura e da qualidade do acompanhamento pré-natal e da assistência ao parto e puerpério das gestantes e ao recém-nascido, na perspectiva dos direitos de cidadania. O Programa fundamenta-se no direito à humanização da assistência obstétrica e neonatal como condição primeira para adequado acompanhamento, além de estabelecer critérios para qualificar a assistência e promover o vínculo entre a assistência ambulatorial e o momento do parto, integrados e com intervenções que tivessem fortes evidências de que são efetivas15. Consonante ao PHPN, a RC surge propondo ações estratégicas, a exemplo da

vinculação da gestante à unidade de referência para o parto, realizada através da equipe de saúde da família, e o transporte seguro2.

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Alguns autores listaram os pontos dificultadores da melhoria do atendimento nas maternidades, tais como: o financiamento insuficiente; a deficiente regulação do sistema de saúde; a fragmentação das ações e dos serviços de saúde; a organização dos serviços (incluindo a gestão do trabalho das equipes de saúde); e, ainda, a produção do cuidado, que tende a “medicalizar” e “intervir” desnecessariamente nos processos de gestação, parto e nascimento2,16. Com isso, apesar

dos avanços alcançados com a Rede Cegonha, há de se reconhecer os desafios que ainda persistem para que haja uma rede com funcionamento efetivo para as mulheres e crianças.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As peculiaridades da Rede Cegonha demandam uma formação específica do profissional da saúde para a atuação neste dispositivo inovador, o que ainda representa um desafio para as diferentes profissões. Observa-se na literatura alguns estudos acerca do trabalho do fonoaudiólogo nas maternidades. No entanto, ao se analisar a Saúde Materno-infantil como espaço de formação de graduandos, não foi identificado nenhum artigo que descrevesse a experiência de estudantes de Fonoaudiologia nesta área, o que evidencia a lacuna existente em relação à temática da integração educação-trabalho no âmbito destes espaços.

A relevância dessa experiência se deve à inserção de estudantes de Fonoaudiologia no espaço que compreende a Saúde Materno-infantil, através da RC, além de proporcionar a esses a possibilidade de se reconhecer como futuro profissional habilitado a propor e executar políticas de saúde no SUS.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos as estudantes do curso de fonoaudiologia da Universidade Federal da Bahia, que participaram do componente teórico-prático Práticas Fonoaudiológicas no semestre 2015.2.

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Débora Moura e Laíse Rezende de Andrade.

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Débora Moura e Laíse Rezende de Andrade.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Débora Moura e Laíse Rezende de Andrade.

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Revista Baiana de Saúde Pública

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Débora Moura e Laíse Rezende de Andrade.

REFERÊNCIAS

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