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Paradoxos da implementação da lei de cotas para cargos no legislativo paulista nos partidos PT, PSDB e PFL 1

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Florianópolis, de 25 a 28 de agosto de 2008

Paradoxos da implementação da lei de cotas para cargos no legislativo paulista nos partidos PT, PSDB e PFL1

Terezinha Richartz (Centro Universitário do Sul de Minas) Relações de gênero; Cotas; Partido político

ST 57 - Políticas de mulheres e políticas de gênero.

Introdução

A persistência da baixa participação das mulheres nos cargos proporcionais, em todas as esferas de representação política, tem levado os legisladores a proporem leis para facilitar o acesso feminino aos espaços do poder em que as normas são discutidas e aprovadas. Em 1995, por meio da Lei nº 9.100, em seu artigo 11, § 3°, foi estabelecida cotas de 20% de mulheres candidatas à Câmara de Vereadores. Em 1997, a Lei nº 9.504 instituiu cotas de 30% e estendeu as cotas para todas as eleições proporcionais: Câmara de Vereadores, Assembléias Legislativas Estaduais e Câmara Legislativa do Distrito Federal e Câmara dos Deputados. Agora, cada partido ou coligação deverá reservar o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada categoria de sexo. Apesar da lei mulheres estão, ainda, longe de se aproximar da porcentagem por elas representada no seio do eleitorado – por volta de 50%. Esse resultado acontece na vigência da lei de cotas. Portanto, é fundamental entender porque isto acontece.

Para a realização deste artigo foram entrevistados atores que estavam exercendo mandato parlamentar na Assembléia Legislativa de São Paulo – parlamentares eleitos no pleito de 2002 - e representantes partidários que ocupavam na ocasião algum tipo de cargo na direção do partido.

a) PT

a) Dirigente partidária (mulher); b) Dirigente partidário (homem); c) Deputada Estadual - 2º mandato; d) Deputada Estadual - 1º mandato; e) Deputado Estadual - 1º mandato.

b) PSDB

a) Dirigente partidária (mulher); b) Dirigente partidário (homem); c) Deputada Estadual -

4º mandato; d) Deputada Estadual - 1º mandato; e) Deputado Estadual - 4º mandato.

c) PFL

a) Dirigente partidária (mulher); b) Dirigente partidária (mulher); c) Dirigente partidário

(homem); d) Deputado Estadual - 1º mandato.

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A lei de cotas traz, no seu bojo, as contradições de um sistema marcado pela dominação-exploração: o patriarcado. Mas, para entender o patriarcado é necessário compreender o conceito de gênero.

Gayle Rubin (1975), feminista norte-americana, definiu gênero como um conjunto de convenções mediante as quais uma sociedade transforma a sexualidade biológica em produto da atividade humana. A natureza define dois sexos biológicos (homens e mulheres), cada sociedade agrega a esse dado natural valores, significados e atributos diferentes que deverão ser respeitados. A maioria das sociedades humanas transforma as diferenças anatômicas em desigualdades sociais e políticas.

Já o patriarcado tem presentes “relações hierarquizadas entre seres socialmente desiguais” (SAFFIOTI, 2004). Enquanto que, nas relações de gênero, também é possível o estabelecimento de relações igualitárias, isso é impossível no sistema patriarcal.

Saffioti defende a idéia de usar, simultaneamente, os conceitos de gênero e de patriarcado, esquema que também será adotado neste artigo. Apesar de algumas feministas rejeitarem o conceito de patriarcado, ele está “no coração da engrenagem de exploração-dominação” (2004), e serão importantes para entender os resultados da pesquisa apresentados a seguir.

Relações de gênero e patriarcais

As pesquisas realizadas com deputadas (os) estaduais e lideranças partidárias, apontam que o nó da exclusão é cultural: 1º) a divisão de papéis sociais que destina ao homem o espaço público e à mulher, o âmbito privado; 2º) dupla jornada de trabalho gerada pelo papel social que atribui à mulher o cuidado dos filhos, marido, idosos, casa. Ao sobrecarregar a mulher, diminui o tempo livre que poderia ter, para atuar na política; 3º) proibição de concorrer a cargos públicos durante um longo período. Como as relações de gênero e patriarcado são estruturas pesadas, não mudam com leis criadas há tão pouco tempo. Séculos foram necessários para sedimentar o domínio masculino. Um período relativamente longo será necessário para mudar as bases dessa relação desigual.

Cotas são paradoxais

Cotas são paradoxais porque as relações de gênero e patriarcado são relações que desafiam uma certa tendência existente, que polariza o debate, insistindo em que as mulheres ou participam intensamente da política ou não participam. Na verdade, participação e não participação estão em tensão permanentemente e o cenário vai melhorando à medida que as micropoliticas vão sendo instituídas, para combater a historicamente determinada ausência da mulher na política.

A seguir, serão apresentadas algumas situações em que o paradoxo aparece nesta investigação.

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a) Ser contra ou a favor das cotas

Cotas são paradoxais porque os argumentos que foram e estão sendo usados para manter ou acabar com elas apontam para a inexistência de consenso sobre a medida. Desde o surgimento da proposta até hoje, não foi possível estabelecer certa unanimidade em relação à lei.

b) Envolvimento das mulheres do PT, PSDB e PFL na discussão e na votação do projeto

Cotas são paradoxais porque houve envolvimento diferenciado das mulheres dos partidos na apresentação, discussão e votação do projeto.

O Partido dos Trabalhadores propôs a norma, discutiu no parlamento e votou a favor; parte do Partido da Social Democracia Brasileira participou da discussão da viabilidade da norma e votou favoravelmente; e, finalmente, o Partido da Frente Liberal não teve nenhuma participação.

c) As cotas são negativas ou positivas

Não é possível polarizar o debate e concluir que ela é totalmente positiva ou negativa. Essas posições são interdependentes e devem ser analisadas no momento histórico porque o Brasil passa, em relação ao envolvimento da mulher na política. O cenário era e continua sendo, de reduzida participação feminina. Essa medida ampliou o debate a respeito dos espaços de representação política ocupados pelas mulheres, levando efetivamente alguns partidos, a criarem canais específicos, para investir em candidaturas e contemplar a norma.

O PT já possuía desde 1991 cota de 30% de mulheres na composição dos Conselhos Deliberativos e das Comissões Dirigentes de nível municipal, estadual e nacional. O PSDB-Mulher publicou em 2000 Cartilha de Formação Política para as mulheres tucanas; em 2003 entra em funcionamento a Rede Nacional de Militantes Tucanas com o objetivo de aproximar o partido das bases eleitorais; em 2005 PSDB Mulher criou os Cadernos de Formação Política para capacitas as militantes. Já o PFL criou em 2005 o PFL Mulher.

d) Número de candidatas e eleitas na Assembléia Legislativa de São Paulo

Em São Paulo, os resultados não foram animadores. Com o advento da lei, a quantidade de mulheres que conquistaram uma cadeira diminuiu e se estabilizou negativamente no período. No pleito de 2006, o escore foi igual ao de 1994 – eleição anterior ao estabelecimento de cotas. As possíveis explicações para o fraco desempenho paulista estão na magnitude do distrito. Como São Paulo é a unidade da federação com mais cadeiras em disputa – 94 ao todo - as mulheres tendem a ter mais dificuldades para se elegerem. Outra possível explicação reside na profissionalização das campanhas. Em São Paulo, por ser um grande centro econômico, a profissionalização das

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campanhas tem aumentado a cada eleição, num ritmo, provavelmente, mais acelerado que nas outras unidades da Federação. As estratégias de marketing e propaganda têm maior impacto do que compromissos e projetos de governo. Os partidos políticos não investem de forma diferenciada nas campanhas femininas, muito pelo contrário, priorizam os candidatos considerados “nomes fortes”, na sua grande maioria, homens. Como as campanhas são caras e o financiamento é privado, as mulheres são as mais atingidas.

e) Impacto de cotas no PT, PSDB e PFL

O PT, PSDB e PFL, na Assembléia Legislativa de São Paulo, tiveram impactos diferenciados com a incorporação de cotas. O PSDB foi o partido que mais elegeu mulheres com o advento da norma. Essa agremiação partidária teve o seu melhor desempenho registrado no pleito de 2002 – cinco deputadas estaduais. O PT manteve relativa estabilidade nos quatro pleitos analisados, talvez decorrente da política de cotas internas para cargos deliberativos. O PFL apresentou melhores resultados antes da vigência da lei. Tudo indica que, por falta de uma política estruturada em relação à incorporação da mulher na política, as cotas não tiveram impacto. As mulheres que se elegeram foram aprovadas por mérito individual e não por esforço do partido.

Quando se avalia individualmente cada deputada eleita, percebe-se que a obrigatoriedade de cotas no legislativo paulista não contribuiu para sua eleição. Os processos políticos para inclusão feminina em São Paulo na legislatura 2003-2007 se deram basicamente pela participação em movimentos organizados que acabaram dando visibilidade política para essas mulheres. A maioria vem de sindicatos, movimentos de igreja e movimentos sociais. A experiência política anterior como secretárias municipais, vereadoras e deputadas estaduais contribuiu para que essas mulheres tivessem o nome reconhecido pelo eleitorado e conquistassem uma cadeira no legislativo. Não foi a obrigatoriedade de cotas que contribuiu para a eleição dessas deputadas, conforme afirmaram em depoimentos.

Até mesmo o PT, que historicamente investiu mais na ampliação da participação feminina, não tem conseguido resultados satisfatórios, quanto ao número de candidatas, muito menos, quanto ao percentual de eleitas.

A ideologia e a dinâmica organizacional de cada agremiação partidária são importantes para que haja política de gênero, mas no Brasil, essas dimensões são ofuscadas pela lógica eleitoral, contribuindo para diminuir a eficácia das cotas. O principal deles é o sistema eleitoral. O sistema proporcional de listas abertas favorece a candidatura das mulheres, mas, como a competição tende a ser mais individualizada, terão que disputar votos com os homens, que geralmente, têm mais recursos financeiros e visibilidade política - porque grande parte já concorreu em outros pleitos.

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Como os partidos não investem, de forma diferenciada nas candidaturas femininas, as mulheres acabam sendo preteridas na hora do voto.

f) Áreas de atuação das parlamentares

As parlamentares no legislativo paulista ainda estão prioritariamente nas áreas socialmente destinadas ao seu cuidado na vida privada: educação, saúde e assistência social. Projetos de gênero foram apresentados, mas poucos foram aprovados. Como estão em número reduzido na assembléia, precisam do apoio da bancada masculina para aprovação. Mas, por outro lado, o comportamento das deputadas é apontado como o grande diferencial na política: são mais responsáveis, mais rápidas, determinadas, objetivas, falam menos e fazem mais. Essas características, inclusive, são o contrário do que é apregoado socialmente sobre a conduta da mulher. Uma das possíveis explicações, pode ser a incorporação de atitudes masculinas para serem respeitadas no parlamento. As relações patriarcais e de gênero ainda determinam espaços e comportamentos. A mulher carece de um jeito novo de fazer política. Essa maneira diferenciada provavelmente só acontecerá quando relações mais igualitárias forem possíveis entre os sexos.

De todo modo, o objetivo das cotas não foi possibilitar à mulher implantar um jeito novo de fazer política. A luta é para estar nos espaços decisórios levando toda sua experiência de dominação/exploração.

Em vez de valorizar só o que é apresentado pelas parlamentares nos projetos, destacando o comportamento feminino na Assembléia, é correto pensar que é mais democrático a mulher estar no parlamento, já que metade da população é composta por esse sexo.

Conclusão

A positividade das cotas reside na capacidade que tiveram e têm de começar a provocar inquietação, debate, de apontar para a necessidade de se criarem outras estratégias para ajudar a superar a exclusão. Toda transgressão feminina contribui para sabotar a cultura machista dominante. A ênfase da política de cotas não pode recair sobre os números de candidatas e eleitas, mas sim no sentido conjuntural da presença da mulher na política. Até agora os números ainda são pequenos em relação ao ideal desejado, mesmo assim, servem de uma forma embrionária, como reflexão e motivação para mudar a postura de homens e mulheres em relação à participação política.

As cotas foram importantes para impulsionar a entrada da mulher na política. Foram eficazes, principalmente, na primeira eleição depois da aprovação da norma. Naquele pleito, aumentou substancialmente o número de mulheres concorrendo às eleições. Hoje, porém, mostra-se inócua para ampliar o número de candidatas para a porcentagem desejada. Todos os partidos investigados apontam para a dificuldade de preencher cotas para candidaturas. Mais difícil ainda é

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atingir a paridade de gênero na política, ideal democrático já perseguido por alguns países e discutido por alguns setores no Brasil. Outro problema a ser enfrentado é transformar as candidaturas em mulheres eleitas. O efeito de cotas sobre as eleições de mulheres é praticamente nulo. O número de eleitas não cresceu na mesma proporção que o de candidatas. Todas as deputadas estaduais paulistas entrevistadas afirmaram que cotas não contribuíram para a sua eleição, mas ajudaram a ampliar a discussão dentro do partido. Então é necessário criar outras ações positivas para incrementar o percentual de mulheres candidatas e eleitas e, quem sabe, um dia chegarmos à igualdade, ou em outras palavras à paridade. Quando isso acontecer, as cotas perderão a função.

É necessário implementar redes de estruturas alternativas para combater o patriarcado: movimento de mulheres, palestras, passeatas, documentos informativos, debate teórico entre os intelectuais e entre quem sofre a discriminação de gênero, etc, para ajudar a permear a estrutura e melhorar a compreensão e o discurso em torno da desigualdade. É como o “caruncho” que corrói por dentro. Quando é descoberto, já destruiu praticamente todo o interior do móvel ou da semente.

Referência bibliográfica

RUBIN, Gayle: The traffic in women. Notes on the political economy of sex. Toward an Antropology of Women, ed. Rayna Reitre. Nueva York: Monthly Review Press, 1975

RICHARTZ, Terezinha. Cotas e autonomia: paradoxos da implementação da lei de cotas para cargos no legislativo paulista nos partidos PT, PSDB e PFL. 2007. 273 f. Tese de Doutorado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007.

SAFFIOTI, Heleieth I. B. Gênero, patriarcado, violência. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2004. 151 p. (Coleção Brasil Urgente)

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