UNIVERSIDADE DO MINHO
ESCOLA DE DIREITO
DIREITO PROCESSUAL CIVIL DECLARATÓRIO
(3.º Ano – 2.ª Chamada – 27 de Junho de 2007)
Leia atentamente as questões que lhe são colocadas e, só depois, responda às mesmas de forma sucinta e sempre fundamentada. Cada resposta não pode ultrapassar 10 linhas.
Os alunos que fazem exame devem responder a todas as questões, excepto à questão 11. Os alunos que fazem frequência devem responder a todas as questões, excepto à questão
10.
António, casado com Berta no regime de comunhão de adquiridos e residente em Marselha, França, é proprietário de um terreno com 200 m2 situado em Vila Nova de Famalicão. Em 15 de Janeiro de 2007 celebrou um contrato promessa de compra e venda com eficácia real e por escritura pública com Carlos, casado com Daniela no regime de comunhão geral de bens e residente em Braga, mediante o qual aquele prometia vender e este prometia comprar o referido terreno pelo valor global de € 150.000,00, tendo sido entregue um sinal de € 12.500,00.
Sucede que, embora António se tenha comprometido a marcar a escritura pública de compra e venda do referido imóvel até 28 de Fevereiro de 2007, a qual teria lugar no Cartório Notarial de Vila Nova de Famalicão, o certo é que a referida escritura nunca chegou a ser marcada, não obstante as constantes insistências nesse sentido por parte de Carlos.
Face a essa situação, Carlos contactou um advogado, o qual lhe sugeriu o recurso a uma acção de execução específica do contrato promessa de compra e venda.
1. Que tipo de acção será intentada e qual a forma de processo? (1 valor)
- A todo o direito corresponde a acção adequada a fazê-lo valer em juízo (art. 2.º, n.º 2 do CPC);
- As acções declarativas podem ser de simples apreciação, de condenação ou constitutivas (art. 4.º, n.º 2 do CPC);
- No caso em concreto, o autor pretende recorrer à execução específica do contrato promessa de compra e venda celebrado com os réus;
- Uma vez que pela via da execução específica se pretende introduzir uma alteração na ordem jurídica, pela constituição de uma nova relação jurídica, deve ser intentada uma acção declarativa constitutiva-constitutiva [art. 4.º, n.º 2, c) do CPC];
- O processo pode ser comum ou especial (art. 460.º do CPC);
- O processo especial aplica-se apenas aos casos expressamente previstos na lei, sendo que o processo comum tem uma aplicação residual, dado que se aplica a todos os casos restantes (art. 460.º, n.º 2 do CPC);
- No caso em concreto não está previsto nenhum processo especial;
- O processo comum pode ser ordinário, sumário ou sumaríssimo (art. 461.º do CPC); - Tendo em conta os critérios para a determinação da forma de processo comum, é necessário atender ao valor da alçada dos tribunais (art. 24.º da LOFTJ) e ao valor da acção (arts. 305.º e ss. do CPC);
- A toda a acção deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica do pedido;
- No caso em análise, o autor pretende que a ré cumpra com a sua obrigação contratual de pagamento do preço relativo ao contrato de compra e venda;
- Quando a acção tenha por objecto a apreciação do cumprimento de um contrato, deve ser aplicado o critério do acto jurídico, previsto no art. 310.º, n.º 1 do CPC, em função do qual o valor da acção é determinado pelo preço estipulado pelas partes;
- Tendo as partes convencionado o preço de € 150.000,00, será esse o valor da acção;
- A alçada do tribunal da 1.ª instância é de € 3.740,98 e a alçada do Tribunal da Relação é de € 14.963,94;
- Excedendo a acção o valor da alçada do Tribunal da Relação, a acção segue a forma de processo comum ordinário, nos termos do art. 462.º do CPC;
- Assim, deve ser intentada uma acção declarativa constitutiva-constitutiva, sob a forma de processo comum ordinário.
2. Qual o tribunal competente para a apreciação do mérito da causa? (2 valores) - No caso em apreço, estamos perante uma relação jurídica plurilocalizada, uma vez que os réus residem em França e o terreno sem encontra localizado em Portugal (país onde os autores têm a sua residência);
- A determinação do tribunal competente para a apreciação da acção deve ser feita em função das regras de competência internacional;
- As normas de competência internacional previstas na ordem jurídica interna (arts. 65.º, 65.º-A e 99.º do CPC) cedem perante as normas de competência internacional previstas em tratados, convenções, regulamentos comunitários e leis especiais (art. 8.º, n.º 3, da CRP e 65.º, n.º 1 do CPC);
- O Reg. (CE) 44/2001 regula a competência internacional em matéria civil e comercial;
- Âmbito objectivo: o Reg. (CE) 44/2001 aplica-se em matéria civil e comercial, ficando excluídas da sua aplicação as matérias previstas no n.º 2 do art. 1.º do Reg.
- Âmbito temporal: o Reg. (CE) 44/2001 aplica-se apenas às acções judiciais intentadas e aos actos autênticos exarados posteriormente à sua entrada em vigor 1 (art. 66.º);
- Âmbito subjectivo (arts. 2.º e ss.);
- Em regra, a acção deve ser intentada no tribunal do lugar do domicílio do réu, independentemente da sua nacionalidade (art. 2.º, n.º 1);
- As pessoas domiciliadas no território de um Estado-Membro só podem ser demandadas perante os tribunais de um outro Estado-Membro por força das normas previstas nas secções 2 a 7 do capítulo II do regulamento;
- Em regra, pelo art. 2.º, são competentes os tribunais do Estado-membro onde o réu tem o seu domicílio ou sede (Tribunais Franceses);
- Todavia, no caso em análise está em causa uma acção em matéria de direitos reais sobre um bem imóvel situado no território de um Estado-membro;
- Assim, são exclusivamente competentes os tribunais portugueses (art. 22.º, n.º 1 do Reg. 44/2001)
- Sendo competentes os tribunais portugueses para o conhecimento da causa, torna-se necessário determinar qual o tribunal português internamente competente para o conhecimento da causa;
- A competência interna reparte-se em razão da matéria, da hierarquia, do valor e forma do processo e do território;
Competência em razão da matéria (arts. 66.º e 67.º do CPC):
- Os tribunais judiciais têm uma competência residual, sendo que têm competência para o conhecimento de todas as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurídica (art. 66.º do CPC);
- No caso sub iudice, não é competente nenhum tribunal de competência especializada (art. 67.º do CPC);
Competência em razão do valor e forma do processo (arts. 68.º e 69.º do CPC) Tribunais singulares/tribunais colectivos (art. 68.º do CPC)
- Nos termos do art. 106.º, b) da LOFTJ, os tribunais colectivos têm competência para o conhecimento das causas cujo valor exceda a alçada do Tribunal da Relação;
- Todavia, nos termos do art. 646.º do CPC, o tribunal colectivo só intervém quando ambas as partes assim o tiverem requerido, sendo que o tribunal colectivo nunca pode intervir quando esteja em causa alguma das situações previstas no n.º 2 do art. 646.º do CPC;
Tribunais de competência genérica/tribunais de competência específica (art. 69.º do CPC)
- As leis da organização judiciária definem quais as causas que, em razão da forma de processo aplicável, competem aos tribunais de competência específica (art. 69.º do CPC);
- Os tribunais de competência específica têm o seu regime jurídico previsto nos arts. 96.º e ss. da LOFTJ;
- Estando em causa uma acção cujo valor excede a alçada do Tribunal da Relação (forma de processo comum ordinário), esta causa deve ser apreciada e julgada pelas varas cíveis [art. 97.º, n.º 1, a) da LOFTJ];
Competência em razão da hierarquia (arts. 70.º a 72.º do CPC)
- A acção deve ser intentada no tribunal judicial de 1.ª instância (art. 70.º do CPC), sendo que o Tribunal da Relação e o supremo Tribunal de Justiça conhecem em regra, apenas dos recursos interpostos das decisões proferidas pelos tribunais inferiores.
Competência em razão do território (arts. 73.º e ss. do CPC)
- Estando em causa uma acção de execução específica de um contrato promessa de compra e venda de um imóvel localizado em Vila Nova de Famalicão, a acção deve ser intentada no tribunal da situação do bem, ou seja, no Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão (art. 73.º, n.º 1, do CPC);
Assim, a acção deve ser intentada nas varas cíveis do Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão.
3. Suponha que, depois de António ter sido citado para a acção, este veio intentar uma acção judicial contra Carlos invocando que o incumprimento foi imputável ao promitente comprador e em que pede a execução específica do mesmo. Quid iuris? (2 valores)
- Análise dos efeitos processuais e substantivos da citação (art. 481.º do CPC);
- Com a citação, o réu fica inibido de propor uma acção contra o autor destinada à apreciação da mesma questão jurídica [art. 481.º, al. c), do CPC];
- Noção de litispendência (repetição da causa estando a anterior ainda em curso) – art. 497.º, n.º 1, do CPC;
- A repetição dos sujeitos, do pedido e da causa de pedir (arts. 497.º e 498.º do CPC).
4. Em hipótese autónoma da anterior, sabendo que António foi citado para contestar a acção por carta registada com aviso de recepção assinado por Berta em 9 de Março de 2007, qual o último dia do prazo, sem multa, para a apresentação da sua contestação? (2 valores)
- A citação é o acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele uma acção judicial e se chama ao processo para se defender (art. 228.º, n.º 1 do CPC);
- A citação pode ser pessoal ou edital (art. 233.º, n.º 1 do CPC);
- A citação pessoal é efectuada, em regra, através da entrega ao citando de carta registada com aviso de recepção [art. 233.º, n.º 2, a) do CPC];
- Os prazos podem ser peremptórios ou dilatórios (art. 145.º, n.º 1 do CPC);
- O prazo peremptório é aquele em que o decurso do mesmo extingue o direito de praticar o acto (art. 145.º, n.º 3 do CPC);
- O prazo dilatório é aquele que difere para um momento posterior a possibilidade de praticar o acto ou o início da contagem do prazo (art. 145.º, n.º 2 do CPC);
- No caso em concreto, o réu foi citado através de carta registada com aviso de recepção assinado pela sua mulher Berta no dia 09 de Março de 2007;
- O prazo peremptório para a apresentação da contestação, estando em causa um processo ordinário, é de 30 dias (art. 486.º, n.º 1 do CPC);
- Ao prazo para a apresentação da defesa do citando podem acrescer as dilações previstas no art. 252.º-A do CPC;
- No caso em análise, tendo o aviso de recepção sido assinado por pessoa diversa do réu, ao prazo peremptório da contestação acresce o prazo dilatório de 5 dias [art. 252.º-A, n.º 1,a ) do CPC);
- Por outro lado, o réu foi citado no estrangeiro (uma vez que a acção está a decorrer no Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão), pelo que, ao prazo peremptório para a apresentação da contestação, acresce um prazo dilatório de 30 dias (art. 252.º-A, n.º 3);
- A dilação prevista no art. 252.º-A, n.º 1, a) acresce à dilação prevista no n.º 2 do mesmo artigo (art. 252.º-A, n.º 4, do CPC);
- Assim, o prazo dilatório para a apresentação da contestação é de 35 dias;
- Quando a um prazo peremptório acresce um prazo dilatório, os dois prazos contam-se como se fossem um só (art. 148.º do CPC) – o prazo para a apresentação da contestação é de 65 dias;
- O dia em que ocorre o evento (citação da ré) não se conta, pelo que o prazo só começa a correr no dia seguinte ao da citação do réu [art. 279.º, b) do Cc], ou seja, no dia 10 de Março de 2007;
- O prazo conta-se de forma contínua, mas suspende-se nas férias judiciais, salvo quando esteja em causa um prazo superior a 6 meses ou um processo com natureza de urgente (art. 144.º, n.º 1 do CPC);
- O período de férias judicias decorre de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro, do Domingo de Ramos a 2.ª Feira de Páscoa e de 1 a 31 de Agosto;
Assim:
- O prazo começa a correr no dia 10 de Março de 2007;
- Conta-se de forma contínua, ou seja, contam-se todos os dias, sejam estes úteis ou não;
- Suspende-se nas férias judiciais, ou seja, desde 1 a 9 de Abril; - O prazo, sem multa, termina no dia 22 de Maio de 2007.
5. Suponha que António, na sua contestação, invocou os seguintes fundamentos: 1) O tribunal português é internacionalmente incompetente para o julgamento da causa uma vez que o réu reside em França e a acção devia ser proposta no Estado do domicílio do réu.
2) A acção devia ser proposta por Carlos e Daniela uma vez que está em causa a alienação de um bem imóvel;
3) A petição inicial é “ilegal” uma vez que o autor veio peticionar, simultaneamente, o cumprimento do contrato promessa de compra e venda e a restituição do sinal em dobro;
4) O réu procedeu à marcação da escritura pública e compareceu na data e hora convencionadas, tendo sido o autor quem se recusou a comparecer;
5) Em consequência da falta de comparência à escritura pelo Autor, peticiona António que seja reconhecido o incumprimento do contrato promessa de compra e venda por parte de Carlos
Caracterize a defesa apresentada pelo Réu em cada um do pontos, e diga quais as consequências processuais que resultariam da sua eventual procedência (25 linhas) (2 valores)
- A contestação defesa pode ser por impugnação, por excepção ou por reconvenção (arts. 487.º, 493.º, 494.º e 501.º do CPC);
1) Defesa por excepção dilatória, uma vez que a incompetência internacional gera uma incompetência absoluta, a qual constitui uma excepção dilatória nos termos do art. 494.º, alínea a) do CPC;
- Sendo esta defesa julgada procedente, o réu deve ser absolvido da instância, nos termos do art. 288.º, n.º 1, a) do CPC, sem prejuízo da possibilidade de remessa do processo para o tribunal competente (Princípio da Economia Processual) no caso previsto no n.º 2 do art. 105.º do CPC;
2) Defesa por excepção dilatória, uma vez que a ré invoca que é parte ilegítima na acção, sendo que a ilegitimidade plural constitui uma excepção dilatória, nos termos do art. 494.º, e) do CPC;
- Sendo esta defesa julgada procedente, o réu, seria absolvido da instância, embora o juiz, nos termos do n.º 2 do art. 265.º do CPC, deva convidar o autor a chamar à acção a parte em falta através de um incidente de intervenção principal provocada (art. 325.º do CPC);
3) A petição inicial diz-se inepta, nos termos do art. 193.º, n.º 2, c) do CPC, quando se cumulem pedidos substancialmente incompatíveis entre si;
- A ineptidão da petição inicial gera a nulidade de todo o processo, nos termos do art. 193.º, n.º 1 do CPC;
- A invocação da nulidade de todo o processo constitui uma defesa por excepção dilatória, nos termos da alínea b) do art. 494.º do CPC;
- Sendo esta excepção dilatória procedente, deve a ré ser absolvida da instância, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 288.º do CPC;
4) A imputação do incumprimento ao autor configura, por um lado, uma defesa por impugnação da matéria de facto e, por outro, uma defesa por excepção peremptória, na medida em que o réu vem trazer ao processo novos factos que, sendo provados, vão determinar a sua absolvição do pedido;
5) O réu pretende conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe obter [art. 274.º, n.º 2, c) do CPC];
- Análise dos pressupostos formais (art. 501.º do CPC) e materiais – positivos e negativos – da reconvenção (art. 274.º do CPC).
6. Sabendo que o mandatário de Carlos foi notificado da apresentação da contestação por carta registada em 24 de Maio de 2007, como poderá reagir face à defesa apresentada, em que prazo e quais as cominações em que incorre se nada fizer? (2 valores)
- Tendo sido deduzida uma defesa por excepção e reconvenção, o autor pode responder a essa defesa através de uma réplica por está em causa um processo ordinário (art. 502.º do CPC);
- A não dedução da réplica tem o efeito previsto no art. 490.º do CPC (ex vi art. 505.º do CPC), ou seja, consideram-se admitidos por acordo os factos que não tenham sido impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, não for admissível confissão sobre eles ou se só puderem ser provados através de documento escrito (art. 490.º, n.º 2 do CPC)
- O prazo para replicar é de 30 dias porque foi deduzida uma defesa por reconvenção (art. 502.º, n.º 3, 2.ª parte, do CPC);
- A notificação presume-se feita no dia 28 de Maio (2.ª feira) porque o dia 27 de Maio é um Domingo (art. 254.º, n.º 3 do CPC);
- O prazo para replicar começa a correr no dia 29 de Maio de 2007 [art. 279.º, b) do Cc];
- O prazo conta-se de forma contínua, mas suspende-se nas férias judiciais, salvo quando esteja em causa um processo urgente ou um prazo superior a 6 meses (art. 144.º, n.º 1 do CPC);
- Sem multa, o prazo termina no dia 27/06/2007 (4.ª feira);
7. Tendo o processo sido concluso ao juiz, que decisão deverá este tomar face ao alegado no ponto 2) da contestação? (2 valores)
- O réu veio alegar que é parte ilegítima porquanto a acção teria de ser proposta por Carlos e Daniela por estar em causa a alienação de um bem imóvel;
- Nos termos do art. 28-A do CPC, devem ser propostas por marido e mulher, ou por um deles com o consentimento do outro, as acções de que possa resultar a perda ou oneração de bens que só por ambos possam ser alienados ou a perda de direitos que só por ambos possam ser exercidos, incluindo as acções que tenham por objecto a casa de morada de família (art. 28.º-A, n.º 1, do CPC);
- No caso em análise, não está em causa a oneração ou alienação de bens imóveis pelos autores, mas sim a sua aquisição, motivo pelo qual não se configura a verificação de um litisconsórcio necessário entre os cônjjuges;
- De qualquer modo, se o juiz entendesse que seria necessário que a acção fosse proposta por Carlos e Daniela, ele pode convidar Carlos a chamar à acção Daniela através de um incidente de intervenção principal provocada (art. 265.º, n.º 2, do CPC);
8. Face à resposta dada à questão anterior, suponha que Carlos não se pronunciou nem praticou qualquer acto processual face à decisão do juiz. Poderá o juiz, ainda assim, conhecer do mérito da causa? (2 valores)
- Se Carlos não responder ao convite do juiz no sentido de ser chamado á acção o seu cônjuge, nos termos do n.º 2 do art. 265.º do CPC, a excepção dilatória da ilegitimidade processual plural, não tendo sido sanada, implicará que o réu seja absolvido da instância;
- Distinção entre o princípio da descoberta da verdade material e da verdade formal;
- Mesmo subsistindo uma excepção dilatória não sanada (no caso, a ilegitimidade processual do autor), o juiz, ainda assim, pode conhecer do mérito da causa quando se encontrem preenchidos os pressupostos do n.º 3 do art. 288.º do CPC (quebra do dogma do conhecimento prévio dos pressupostos processuais).
9. Suponha que o juiz verificou que o autor não havia apresentado com a petição inicial o contrato promessa de compra e venda e que não foram alegados todos os factos necessários quanto ao incumprimento da obrigação de marcação da escritura pública. Que atitude deverá ser tomada pelo juiz e através de que mecanismo processual? (2 valores)
- Findo os articulado, o processo é concluso ao juiz, podendo este proferir um despacho saneador destinado a (art. 508.º, n.º 1 do CPC):
- providenciar pelo suprimento de excepções dilatórias, nos termos do n.º 2 do art. 265.º do CPC;
- convidar as partes ao aperfeiçoamento dos seus articulados;
- O articulado diz-se irregular quando não observa os requisitos legais, ou quando não seja acompanhado de documento essencial ou de que a lei faça depender o prosseguimento da causa;
- O articulado diz-se deficiente quando este contém insuficiências e imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada;
- No caso em análise, não tendo o autor apresentado com a petição inicial o contrato promessa de compra e venda, a petição inicial diz-se irregular, sendo que o juiz, nos termos do n.º 2 do art. 508.º do CPC, deve convidar o autor a juntar aos autos o referido contrato;
- Por outro lado, não tendo o autor articulado na sua petição inicial todos os factos que são essenciais para o conhecimento do mérito da causa, o articulado diz-se deficiente, pelo que o juiz, ao abrigo do Princípio da Cooperação e à luz do Princípio da Descoberta da Verdade Material, bem como da prevalência das decisões de mérito sobre as decisões de forma, deve convidar a parte em causa a corrigir a deficiência da petição inicial por não exposição de elementos
considerados essenciais para o conhecimento do mérito da causa (art. 508.º, n.º 3 do CPC);
- Breve referência à divisão doutrinal e jurisprudencial quanto à questão de saber se se trata de um mero poder, ou de um verdadeiro dever vinculado do juiz na descoberta da verdade material e na primazia das decisões de mérito sobre as decisões de forma.
10. Suponha que Carlos teve conhecimento que António pretende vender o terreno a Daniel, tendo já sido marcada a escritura pública de compra e venda. Como poderá Carlos reagir perante esse facto? (3 valores)
- No caso em análise, verifica-se uma situação de perigo quanto à possibilidade de dissipação ou alienação do bem imóvel cuja execução específica se encontra a ser discutida nesta acção;
- Estando em causa uma situação de urgência extrema no sentido de impedir a alienação do terreno pela ré, o advogado da autora deve intentar no Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão uma providência cautelar;
- Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause uma lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência, conservatória ou antecipatória, concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito (art. 381.º, n.º 1 do CPC);
- O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou num direito emergente de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor (art. 381.º, n.º 2 do CPC);
- Análise das características das providências cautelares; - Análise dos pressupostos das providências cautelares:
- periculum in mora – fundado receio de que a demora normal do processo possa vir causar ao requerente da providência um dano grave e dificilmente reparável;
- fumus boni iuris: apreciação sumária (summario cognitio) do direito do requerente, uma vez que uma apreciação exaustiva desse direito não se coaduna com o carácter urgente da providência;
- interesse processual: necessidade de assegurar o direito em causa através desta via processual, não existindo nenhum outra via menos gravosa susceptível de proteger o direito do requerente;
- As providências cautelares dividem-se em comum e especificadas;
- No caso sub iudice, estando em causa o fundado receio de extravio, dissipação ou ocultação do bem imóvel objecto do litígio, deve ser intentada uma providência cautelar de arrolamento (art. 421.º e ss do CPC);
Pode justificar-se o arrolamento de uma fracção de um prédio se a mesma é objecto de um contrato-promessa de compra e venda (susceptível de execução específica) e há risco de o promitente-vendedor a vender a outrem (vide, nesse sentido, o
Ac. do TRC, de 02.11.1988, in BMJ, 381.º-755)
- O arrolamento é dependência da acção à qual interessa a especificação dos bens ou a prova da titularidade dos direitos relativos às coisas arroladas (art. 421.º, n.º 2 do CPC);
- Análise da tramitação e do regime jurídico do arrolamento. 11.
a) Imagine que o advogado de António pretende juntar apenas na audiência de julgamento um documento comprovativo da marcação efectiva da escritura pública. Poderia fazê-lo só agora nesta fase processual? (1 valor)
- Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes (art. 523.º, n.º 1 do CPC);
- Todavia, se não forem apresentados com o articulado respectivo, os documentos podem ser apresentados até ao encerramento da discussão em 1.ª instância, mas a parte
será condenada em multa, excepto se provar que os não pôde oferecer com o articulado (art. 523.º, n.º 2 do CPC).
b) Suponha ainda que o advogado de António pretende aditar uma nova testemunha no dia anterior ao julgamento. Quid iuris?
- No final da petição, o autor pode apresentar o rol de testemunhas e requerer outras provas (art. 467.º, n.º 2 do CPC);
- Não o fazendo nesse momento, o autor pode apresentar o seu rol de testemunhas em sede de audiência preliminar (art. 508.º-A, n.º 2 do CPC) ou no prazo de 15 dias a contar da notificação do despacho saneador (art. 512.º, n.º 1 do CPC);
- Tendo apresentado o seu rol de testemunhas num destes momentos, o autor tem a faculdade de alterar ou aditar o rol até vinte dias antes da data em que se realize a audiência de julgamento, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias (art. 512.º-A, n.º 1 do CPC).
- Para além do regime previsto no art. 512.º-A do CPC, a parte tem ainda a faculdade de substituir testemunhas nos termos do disposto no art. 629.º do CPC.
c) Tendo em conta que Filipe e Gonçalo, testemunhas, respectivamente, de Carlos e de António, vieram invocar factos incompatíveis entre si, o que poderia fazer o advogado de Carlos perante esse facto? (1 valor)
- Havendo oposição directa sobre um determinado facto entre os depoimentos das testemunhas ou entre eles e o depoimento da parte, pode ter lugar, oficiosamente ou a requerimento de qualquer das partes, a acareação das pessoas em contradita (art. 642.º do CPC).
- Análise do processamento da acareação (art. 643.º do CPC).