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A TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL EM DISSERTAÇÕES E TESES ACADÊMICAS SOBRE O ENSINO FUNDAMENTAL DE 9 ANOS

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A TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL EM DISSERTAÇÕES E TESES

ACADÊMICAS SOBRE O ENSINO FUNDAMENTAL DE 9 ANOS

Sara Janaina Alves Batista

Faculdade de Educação

CCHSA

sara.jab@puccampinas.edu.br

Maria Silvia Pinto de Moura Librandi da

Rocha

Grupo de Pesquisa: Formação e Trabalho Docente. Linha de Pesquisa: Práticas Pedagógicas e

Forma-ção do Professor. CCHSA

msilvia@puc-campinas.edu.br

Resumo: trata-se dos resultados de pesquisa biblio-gráfica realizada na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) em 2010-2012 sobre o tema Ensino Fundamental de 9 anos (EF), com obje-tivo de localizar trabalhos que analisassem a implan-tação/implementação do EF partindo da teoria Histó-rico-cultural. Deste conjunto, buscamos aqueles que apresentavam obras de Vigotski nas referências bi-bliográficas. O material selecionado foi lido na íntegra com o objetivo de identificar: (i) modos pelos quais estas obras são incorporadas aos textos; (iii) concei-tos da teoria Histórico-cultural abordados; (iv) práti-cas pedagógipráti-cas e/ou aspectos do processo de ensi-no-aprendizagem analisados à luz destes conceitos e (v) problemas e/ou contribuições que estas disserta-ções e teses trazem para o entendimento do EF, considerando a articulação com a teoria focalizada. O material foi analisado de modo qualitativo e quantita-tivo. A partir das análises, pudemos identificar que (i) apesar de mencionarem a teoria vigotskiana, muitas teses e/ou dissertações utilizavam-na de forma inci-dental, citando apenas 1 ou 2 vezes os autores Vi-gotski, Luria ou Leontiev; (ii) a bibliografia destes au-tores tomada como referência concentra-se em pou-cas obras; inter-relacionando os (iii) conceitos da teo-ria Histórico-cultural abordados e as (iv) práticas pe-dagógicas e/ou aspectos do processo de ensino-aprendizagem analisados à luz destes conceitos, en-contramos vinculações, prioritariamente, nos temas da escrita e processos/práticas a ela associadas e da linguagem. A partir dos resultados, problematizamos: (i) as obras mais referenciadas, considerando as crí-ticas a que tem sido submetidas entre estudiosos da bibliografia da teoria Histórico-cultural; (ii) a impor-tância de trabalhos discutindo as questões relativas à escrita, a partir da teoria Histórico-cultural no cenário de construção do novo EF e (iii) as razões da baixa frequência de pesquisas sobre o tema “atividade lú-dica” (no qual agrupamos as menções dos termos

brincar, brincadeira e jogos com regras), dada a rele-vância desta prática no desenvolvimento infantil, se-gundo matriz teórica focalizada.

Palavras-chave: Teoria Histórico-cultural, ensino

fundamental de 9 anos, atividade lúdica.

Área do Conhecimento: Ciências Humanas – Edu-cação – CNPq.

1. INTRODUÇÃO

A pesquisa teve início com o tema de estudo o Ensi-no Fundamental de 9 aEnsi-nos (EF). Oficializado pela Lei no 11.274, publicada em 06 de fevereiro de 20061, o novo EF define-se pela antecipação das matrículas das crianças na escola (que, a partir de então, deve ocorrer aos 6 anos de idade e não mais aos 7, como vigorava anteriormente) e a extensão de duração de permanência das crianças neste segmento educa-cional (que passa a ser de, no mínimo, 9 anos). Po-rém, análises dos documentos publicados pelo go-verno federal [1,2,3,4,5,6] que apresentam esta nova forma de conceber o EF permitem identificar que não se trata apenas de antecipação do ingresso das cri-anças nas escolas e extensão de sua permanência nelas: espera-se que as alterações sejam mais am-plas e que seja possível construir uma educação de melhor qualidade. Pesquisas realizadas sobre a im-plantação/implementação do novo EF têm evidencia-do, entretanto, importantes obstáculos para sua im-plantação e implementação seguindo estas diretrizes [cf. 7, 8; 9, 10, 11, 12, 13]. As poucas oportunidades de brincar no cotidiano de turmas de primeiros anos e a construção de um cotidiano escolar marcado por “carteira, lápis e caderno” tem sido uma realidade encontrada pelos pesquisadores. Este fato pode

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O texto desta lei pode ser encontrado na íntegra no site do Ministério da Educação, disponível em http://portal.mec.gov.br/seb/index.

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percutir na constituição de processos psicológicos que são de extrema importância para o desenvolvi-mento infantil. Referimo-nos aqui, especialmente, às brincadeiras de faz-de-conta, sem dúvida a menos prestigiada dentre todas as modalidades de ativida-des lúdicas da nossa cultura2.

2. A PESQUISA

Iniciamos a pesquisa realizando uma busca na BDTD selecionando as teses e/ou dissertações que tratas-sem do tema Ensino Fundamental de nove anos de forma nuclear. Para tanto, utilizando os descritores “Ensino Fundamental de nove anos” e “Escola de nove anos”. Através da leitura dos títulos, das pala-vras-chave e dos resumos, selecionamos 30 traba-lhos que continham o tema como núcleo central, sendo 27 deles dissertações de mestrado e 3 teses de doutorado.

No término dessa primeira pesquisa, percebemos um aspecto nos trabalhos que nos interessou, particu-larmente, para aprofundamento da pesquisa no perí-odo de 2011-2012: a adoção da teoria Histórico-cultural (e, mais particularmente de trabalhos de L. S. Vigotski) como referência teórica. Ou seja, em busca de atendermos a um dos objetivos específicos da primeira pesquisa, (identificar as abordagens teóricas dos trabalhos e/ou autores citados como referên-cias), pudemos localizar forte prevalência de indica-ção do autor mencionado. Dos 30 trabalhos localiza-dos através da pesquisa inicial, 15 dissertações e 2 teses continham em suas referências as obras de Vigotski. A frequência de menções ao fundador da teoria Histórico-cultural é, portanto, considerável, so-bretudo quando se tem em mente que nos outros casos há uma dispersão de autores tomados como referências teóricas. Sendo assim, entendemos que havia elementos para aprofundarmos nossos estudos sobre as formas como ele tem sido incorporado às pesquisas sobre o nosso tema. Duas questões, a-presentadas a seguir, orientaram nossas reflexões. A primeira diz respeito a um problema identificado por autores que têm estudado a apropriação dos tra-balhos de Vigotski, de seus colaboradores e dos au-tores contemporâneos que buscam fazer avançar a

2

Tomamos como referência para a diferenciação entre as brincadeiras a forma mais clássica de categorizá-las, pro-posta pelo sistema ESAR [14], em que os jogos podem ser subdivididos em jogos de exercício (mais típicos da fase inicial de desenvolvimento, até 2 anos de idade), jogos simbólicos ou jogos de faz-de-conta (que, na nossa cultu-ra, as crianças tendem a começar a realizar por volta dos 2 anos de idade), jogos de acoplagem e jogos de regras (mais comuns a partir de 4 ou 5 anos de idade).

teoria Histórico-cultural. Embora por caminhos dife-rentes e tomando como base trabalhos publicados em diversos meios de divulgação científica, Oliveira [15], Freitas [15, 16]; Duarte [17], Tuleski [18], Silva & Davis [19] evidenciaram que as menções às publica-ções de autores da abordagem Histórico-cultural nem sempre se configuram como adoção aprofundada de seus fundamentos e conceitos. Isto tem se mostrado particularmente frequente no que diz respeito aos trabalhos de L. S. Vigotski.

Algumas características da obra deste autor (dentre as quais destacamos a densidade teórica, a profusão de interlocutores, a incompletude, dada sua morte precoce) e do modo como tem circulado entre nós (a publicação ainda parcial de seus trabalhos no Brasil, problemas nas traduções dos textos já publicados)3 trazem grandes desafios para sua apropriação. Sen-do assim, esforços para analisar, de moSen-do mais mi-nucioso, a coerência entre fazer constar nas referên-cias bibliográficas trabalhos de Vigotski, os conceitos trabalhados e os procedimentos metodológicos ado-tados têm se mostrado bastante produtivos. Assim, perguntamos: de que modo a incorporação dos tra-balhos de Vigotski foi realizada nos 17 tratra-balhos que o indicam como referência bibliográfica? Tratou-se de uma inclusão incidental ou este autor foi tomado como principal interlocutor (ou, pelo menos, um dos principais) do/a autor/a da tese ou dissertação? Tra-tou-se de uma inclusão em que predominam textos básicos (e com problemas de tradução) ou incorpora-ram-se também os trabalhos mais recentemente tra-duzidos e publicados no Brasil? Tratou-se de refe-rências restritas à obra deste autor ou contemplaram-se também os autores contemporâneos (nacionais e estrangeiros) que têm dado continuidade à obra i-naugural de Vigotski?

A segunda questão diz respeito a identificar que con-tribuições os/as autores/as das teses e dissertações entenderam que a Teoria Histórico-cultural e os tra-balhos de Vigotski poderiam trazer para discutir a implantação e implementação do Ensino Fundamen-tal de 9 anos.

Desta forma, nossa segunda pesquisa teve como objetivo geral o de analisar, em profundidade, teses e

3

Os cortes na tradução de Pensamento e Linguagem e Formação Social da Mente (as duas obras mais referen-ciadas de L. S. Vigotski), realizados, assumidamente, por seus tradutores nas primeiras versões publicadas no Brasil, já foram bastante divulgados. Mais recentemente, Prestes [20] debruçou-se sobre as traduções de diversos textos e de conceitos da teoria Histórico-cultural, mos-trando haver outros problemas graves neste campo, im-plicando, frequentemente, em limites e/ou distorções na compreensão das idéias de seu arcabouço teórico.

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dissertações sobre o Ensino Fundamental de 9 anos que incluíam Vigotski nas referências bibliográficas. A partir disso, buscamos identificar nestes trabalhos as obras referenciadas (de Vigotski, de seus colabo-radores, dos prosseguidores da teoria Histórico-cultural); os modos pelos quais estas obras são in-corporadas aos textos (incidental ou nuclear); os conceitos da teoria Histórico-cultural abordados; as práticas educativas e/ou aspectos do processo de ensino-aprendizagem analisados à luz destes concei-tos; e problemas e/ou contribuições que estas teses e dissertações trazem para o entendimento do Ensi-no fundamental de 9 aEnsi-nos, considerando a articula-ção com a teoria em estudo.

A pesquisa foi desenvolvida através de análises qua-litativa e quantitativa dos textos encontrados e seguiu os passos apresentados a seguir.

Iniciamos com uma análise do material levantado a partir de nosso trabalho investigativo de 2010-2011, localizando as referências bibliográficas de cada dis-sertação ou tese buscando quais trabalhos conti-nham em suas referências os autores L. S. Vigotski, Luria e/ou Leontiev. Analisamos também se esses autores eram incorporados na tese/dissertação de forma nuclear ou incidental; nosso interesse específi-co era o de específi-construir elementos que posteriormente nos auxiliassem a ter critérios de exclusão/inclusão dos trabalhos que analisaríamos em profundidade (os que adotassem as obras dos autores menciona-dos de maneira nuclear). Para realizar esta etapa, iniciamos leituras minuciosas de cada trabalho, vi-sando localizar os principais autores utilizados de forma consistente em cada um deles. Dos autores identificados, analisamos caso a caso as ocorrências bibliográficas e selecionamos as pertencentes à teo-ria Histórico-cultural. Também buscamos identificar quais os conceitos da teoria Histórico-cultural esta-vam sendo abordados por esses autores.

3. RESULTADOS

Iniciamos a apresentação dos resultados, registrando os trabalhos que selecionamos para um estudo mi-nucioso. Elaboramos quadro foi feito para funcionar como organizador geral dos trabalhos encontrados. Continuamos o trabalho focalizando as referências bibliográficas de cada dissertação ou tese, elencando quais trabalhos continham em suas referências os autores L. S. Vigotski, A. R. Luria e/ou A. N. Leontiev. Das 17 dissertações/teses, 14 citam obras de Vigots-ki, 7 citam Luria e 8 citam Leontiev. Alguns trabalhos citavam um ou mais destes autores no corpo do tex-to, mas não os tinham incluído em suas referências bibliográficas. Assim, a identificação deste item

tor-nou-se mais custosa e exigiu atenção constante para localizar inconsistências formais.

A partir dessa análise, buscamos verificar quais o-bras de Vigotski, Luria e Leontiev estavam sendo citadas ao longo dos trabalhos analisados. Os resul-tados podem sem consulresul-tados na tabela a seguir: Tabela 01 – obras dos autores Vigotski, Luria e Leontiev refe-renciadas nas teses e dissertações analisadas.

Obra Ano Autor (es)

Fre- quên-cia Linguagem, desenvolvi-mento e aprendizagem. 2001 Vygotsky, Luria e Leontiev 9 A Formação social da mente. 1991 Vygotsky 8 A construção do pensamen-to e da linguagem 2001 Vygotsky 8 O desenvolvimento do Psiquismo. 1978 Leontiev 6

Pensamento e linguagem. 1993 Vygotsky 5

A formação social da men-te: o desenvolvimento dos

processos psicológicos

superiores.

1998 Vygotsky 3

Psicologia Pedagógica. 2004 Vygotsky 3

Psicologia e Pedagogia: bases psicológicas da a-prendizagem e do desen-volvimento. 2005 Luria e Leonti-ev 2

Estudos sobre a história do comportamento: o macaco, o primitivo e a criança.

1996 Vygotsky e

Luria 1

A construção da mente. 1992 Luria 1

Teoría de las Emociones:

estúdio histórico-psicológico. 2004 Vygotsky 1 Imaginación y el arte en la infancia. 1987 Vygotsky 1 Pensamento e linguagem: as últimas conferências de Luria. 1987 Luria 1

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O desenvolvimento

psico-lógico na infância. 1998 Vygotsky 1

Obras Escogidas. Volume

III 1995 Vygotsky 1

La imaginación y el arte em

la infância. 2003 Vygotsky 1

Actividad, conciencia y

personalidad. 1984 Leontiev 1

Os conceitos encontrados nos trabalhos que, de a-cordo com nossas análises, são conceitos vinculados à teoria Histórico-cultural, estudados pelos autores Vigotski, Luria e/ou Leontiev. Podemos verificar suas ocorrências a partir da tabela abaixo.

Tabela 02 – Conceitos da Teoria Histórico-cultural en-contrados nos trabalhos analisados.

Conceitos Frequência de vezes em que foram mencionados

Leitura e Escrita 38

Linguagem 36

Processos de Aprendizagem e desenvolvi-mento

30

Desenvolvimento 23

Processos psicológicos humanos 19

Atividade Lúdica 14 Mediação 14 Relações sociais 8 Formação de Conceitos 7 Infância/Criança 6 Cultura 3 Educação 3 Internalização 3 Métodos de Pesquisa 3 Crise da psicologia 1 Pensamento marxista 1

Unidade Corpo e mente 1

Inter-relacionando os conceitos da teoria Histórico-cultural abordados e as práticas pedagógicas e/ou aspectos do processo de ensino-aprendizagem ana-lisados à luz dos mesmos,encontramos vinculações, prioritariamente, com o tema da aprendizagem de

leitura e escrita (38 ocorrências) e

proces-sos/práticas a ela associadas (tais como: alfabetiza-ção e letramento, desenho como pré-história da es-crita e eses-crita como processo culturalmente constitu-ído e desenvolvido, entre outros) e da linguagem (com 30 ocorrências, nas quais agrupamos a

abor-dagem da linguagem como instrumento de comuni-cação, expressão e compreensão, como discurso, a linguagem egocêntrica, as relações com o pensa-mento e os conceitos de signos, sentidos e significa-dos). Por fim, cabe destacar que a atividade lúdica é também bastante focalizada (14 ocorrências, nas quais computamos reflexões sobre os termos ativi-dade lúdica, brincadeira, brincar, brinquedos e jogos com regras).

4. DISCUSSÕES

A partir das análises realizadas, pudemos identificar que, apesar de mencionarem a teoria Histórico-cultural, das 17 teses ou dissertações, 6 utilizavam-na de forma incidental, citando apeutilizavam-nas 1 ou 2 vezes os autores Vigotski, Luria ou Leontiev. Verificamos também que a bibliografia destes autores tomada como referência concentrou-se em poucas obras, dentre elas, o livro “Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem” de Vigotski, Luria e Leontiev, é o mais mencionado (aparecendo em 9 trabalhos), seguido pelos títulos “A formação social da mente” e “A cons-trução do pensamento e da linguagem”, ambas de Vigotski (com 8 ocorrências cada um).

Vale a pena aqui chamar a atenção para alguns pon-tos. Considerando as referências bibliográficas, o panorama geral das teses e dissertações pode nos dar uma impressão enganosa sobre a difusão dos trabalhos do fundador da teoria Histórico-cultural, já que, através da leitura integral do material percebe-mos que a simples menção na bibliografia não signi-fica adoção real da matriz teórica; em certos casos, pareceu-nos que citar Vigotski tornou-se uma prática recorrente a serviço, talvez, de imprimir efeito de modernidade aos trabalhos acadêmicos. Parece-nos, assim, ter razão Duarte [17] ao dizer que

o número crescente de publicações sobre a teoria de Vigotski não tem [...] significado um aprofundamento e um detalhamento nos estudos dos escritos desse autor. Atualmente muito se escreve sobre Vigotski, mas muito pouca atenção se dá ao que o próprio Vi-gotski escreveu [17].

Além disso, o fato de ser o livro “Linguagem, desen-volvimento e aprendizagem” o mais referenciado nas teses e dissertações causa-nos certa estranheza, já que trata-se de uma coletânea de textos de Vigotski, Leontiev, Luria, sendo o conjunto da obra de pouca densidade teórica. Articulando este fato às recorren-tes menções aos textos “Formação Social da Mente” e “Pensamento e Linguagem” (em sua edição de 1993) e à praticamente ausência de adoção de vo-lumes da coleção Obras Escogidas (desta, apenas o volume III aparece em um trabalho dos analisados) parece-nos ficar evidenciado que alguns problemas

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apontados aos modos pelos quais a teoria Histórico-cultural é apropriada nos trabalhos acadêmicos – publicadas já há mais de uma década - permanecem presentes. Duas questões precisam ser formuladas neste ponto: porque os pesquisadores brasileiros permanecem utilizando obras que, sabidamente, tem graves problemas de tradução e de edição dos textos originais, com cortes e adaptações que contribuem para distorções do pensamento destes autores – so-bretudo o de Vigotski? Em contrapartida, pergunta-mo-nos por que a coleção Obras Escogidas, publica-das em 1996 e disponíveis em várias bibliotecas de Programas de Pós-graduação, não são incorporadas às reflexões e pesquisas feitas tão recentemente, já que os trabalhos que analisamos não foram iniciados antes de 2006?

Outro ponto de discussão em nossa pesquisa é a questão da atividade lúdica, um conceito importante da teoria vigotskiana e também uma questão que nos instiga, particularmente. Através da pesquisa, pude-mos verificar que o tema em relação ao qual centra-mos nosso interesse na primeira pesquisa, vinculan-do-o ao novo Ensino Fundamental brasileiro, também têm sido eleito por outros pesquisadores como objeto de estudo. Vale ressaltar que esta tendência faz sen-tido, tanto do ponto de vista teórico quanto no que se refere às diretrizes para a construção do processo de escolarização das crianças.

Do ponto de vista teórico, basta lembrar que a ativi-dade lúdica - e, para Vygotsky [21], especialmente o jogo de faz-conta - constitui-se em zona de

de-senvolvimento proximal por excelência para as

crianças de 2 a 6 anos (incluindo, portanto, a faixa etária das crianças que atualmente estão no primeiro ano do Ensino Fundamental). Ao definir desta manei-ra esta prática, o autor destaca que é atmanei-ravés dela que se desenvolvem os processos psicológicos mais importantes da infância, com especial ênfase para a capacidade de operar no plano simbólico, a indepen-dência do campo perceptual imediato, a apropriação de formas culturais de relações e ações sobre o mundo, a linguagem e a imaginação. Entretanto, ao contrário do que costuma ser mais comum nas abor-dagens psicológicas e pedagógicas sobre tal ativida-de, entende este autor que ela não é natural, decor-rente apenas de aspectos maturacionais; antes, as-sim como todas as competências propriamente hu-manas, a capacidade de brincar se constitui nas re-lações concretas das crianças com as outras pesso-as que compõem seu entorno social. Importante co-laborador de Vigotski, Elkonin nos ajuda a entender que a “impressão de espontaneidade no desenvolvi-mento do jogo de papéis nas crianças surge como conseqüência de que os adultos não se dão conta da

direção que eles, de uma forma natural, realizam” [22]. Sendo assim, apontam estes autores – de modo direto ou indireto - para a importância da participação dos professores na constituição e desenvolvimento da capacidade de brincar, o que, sem dúvida, requer investimentos na sua formação. Estas questões têm sido discutidas por nós em artigos publicados sobre o Ensino Fundamental de 9 anos [10, 23].

Porém, consideramos importante ressaltar que a fo-calização da atividade lúdica ocorre em frequência quase três vezes menor do que a dedicação das pesquisas para analisar os processos de aprendiza-gem de leitura e escrita e que nem sempre nestes trabalhos os pesquisadores centram-se de forma mais rigorosa na modalidade de faz-de-conta, ha-vendo, frequentemente, uma abordagem genérica de jogos e brincadeiras. Por fim, mas talvez como ponto mais importante neste tópico, nos trabalhos que te-matizam a atividade lúdica há mais esforços para evidenciar a falta de espaço e tempo para brincadei-ras no cotidiano escolar do que para argumentar so-bre a importância do papel dos professores na cons-tituição e desenvolvimento desta prática. Considera-mos, por isso, que a natureza social das brincadeiras de faz-de-conta pode ficar em segundo plano, o que não nos parece ser muito adequado quando se con-sidera o modelo teórico focalizado.

As considerações do parágrafo anterior não signifi-cam que consideremos inadequado o destaque en-contrado nos trabalhos para questões relativas à a-prendizagem da leitura e da escrita. Sem dúvida, a implementação do Ensino Fundamental de nove a-nos requer sistemáticas e consistentes discussões sobre práticas pedagógicas referentes a este campo de conhecimento e os resultados das pesquisas ana-lisadas sinalizam preocupantes questões neste âmbi-to.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Antes de encerrarmos este artigo, consideramos inte-ressante destacar duas questões que foram se apre-sentando ao longo da realização da pesquisa de revi-são bibliográfica feita. De um modo geral, o trabalho foi importante, no que diz respeito à oportunidade de iniciação no campo científico, contribuindo para a compreensão de que toda investigação requer rigor, paciência e fundamentação teórica sólida. Por outro lado, constatamos pela leitura integral das teses e dissertações analisadas que nem sempre estes crité-rios são obedecidos. Um fator dificultador para o desenvolvimento do trabalho foi que em muitos tex-tos não encontramos coerência nas referências bibli-ográficas indicadas: em vários deles havia no corpo do texto obras referenciadas que não estavam

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lista-das na parte final da bibliografia e vice-versa; em vários encontramos na bibliografia obras que não foram realmente utilizadas no trabalho. Esta caracte-rística dificultou o processo de análise de nossa pes-quisa e nos parece que precisa ser objeto de cuidado mais criterioso, principalmente em função de tratar-se de produções que – espera-tratar-se – tenham alto cali-bre de consistência interna.

AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradecemos à oportunidade dada pelo PIBIC/CNPQ de nos possibilitar a presente pes-quisa, através de bolsa de estudos. Em segundo lu-gar, agradeço à minha orientadora Profª. Drª. Maria Silvia P.de M.L. da Rocha por mais uma vez me es-colher para fazer parte desse gratificante trabalho, que me proporcionou aprimoramento profissional e pessoal de suma importância. Agradeço também a atenção, explicações e oportunidades de aprendiza-gem que recebi no desenvolvimento desta Iniciação Científica e é claro à sua imensa paciência com mi-nha pessoa.

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Referências

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