Células com Extensão Espacial: O Modelo do Cabo
Para neurônios com extensão espacial, o potencial de membrana varia de ponto para ponto ao longo da célula, de maneira que ela não pode ser tratada como uma estrutura isopotencial. Um modelo que leve em consideração a geometria do neurônio deve ser construído.
Boa parte de uma célula nervosa, seu axônio e dendritos, pode ser modelada por finos e longos cabos cilíndricos condutores de eletricidade revestidos por uma membrana isolante. Em particular, os dendritos costumam ser modelados como cabos elétricos passivos, ou seja, cujas condutâncias não dependem da voltagem. A teoria a ser desenvolvida aqui se aplica a eles.
A propagação de corrente elétrica por cabos condutores cilíndricos foi estudada no Século XIX por Lord Kelvin e outros com o intuito de modelar a propagação do potencial elétrico nos cabos telegráficos submarinos que uniam a Grã-Bretanha aos Estados Unidos. A equação obtida por eles para descrever o comportamento do potencial elétrico ao longo de um cabo assim é conhecida como equação do cabo.
Essa equação começou a ser usada na modelagem do fluxo de corrente em axônios por Matteucci e Herman, no início do Século XX, dando origem ao modelo conhecido como modelo do condutor central (Kernleitermodel em alemão, ou core conductor model em inglês). Nas décadas de 1960 e 1970, o modelo do condutor central foi aplicado com grande sucesso por Rall à modelagem da propagação de potenciais de membrana por dendritos passivos, dando origem aos modernos modelos quantitativos de neurônios individuais com estrutura espacial.
Modelo do condutor cilíndrico para uma célula
Como o sistema de coordenadas natural para a modelagem de um cabo cilíndrico é o sistema cilíndrico, no qual as coordenadas de um ponto no espaço são descritas pela tríade (r, θ, z), dá-se abaixo um desenho ilustrando este sistema de coordenadas.
Hipóteses do modelo (para uma discussão mais detalhada dessas hipóteses, recomenda-se
a leitura do capítulo 2 do livro de Koch (1999), indicado na Bibliografia):
1. Os campos magnéticos podem ser desconsiderados.
2. A membrana celular é uma fronteira anular cilíndrica que separa dois condutores de
corrente elétrica, as soluções intracelular e extracelular, que serão consideradas como homogêneas, isotrópicas e obedecendo à lei de Ohm.
3. Todas as variáveis elétricas têm simetria cilíndrica, ou seja, não dependem do ângulo θ
(veja a figura acima).
4. As correntes nos condutores externo e interno fluem apenas na direção longitudinal z.
A corrente pela membrana flui apenas na direção radial r.
5. Em uma dada posição longitudinal z ao longo da célula, os condutores interno e externo
são equipotenciais. Portanto, a única variação de potencial na direção radial r acontece através da membrana.
A partir dessas hipóteses, pode-se construir um modelo como o ilustrado na figura a seguir.
Variáveis usadas para descrever as propriedades elétricas do modelo:
• ie
( )
z,t = corrente total fluindo longitudinalmente na direção positiva de z pelo condutorexterno (unidades: µA).
• ii
( )
z,t = corrente total fluindo longitudinalmente na direção positiva de z pelo condutorinterno (unidades: µA).
• Jm
( )
z,t = densidade de corrente de membrana fluindo do condutor interno para oexterno (unidades: µA/cm2).
• Km
( )
z,t = corrente de membrana por unidade de comprimento fluindo do condutorinterno para o externo (unidades: µA/cm).
• Ke
( )
z,t = corrente por unidade de comprimento devida a fontes externas fluindoradialmente pelo condutor externo (unidades: µA/cm). A inclusão desta corrente nos
permite representar a corrente aplicada por eletrodos externos à superfície da célula. Um termo similar também poderia ser adicionado para representar a corrente radial aplicada por eletrodos internos.
• Vm
( )
z,t = Potencial de membrana, definido como o potencial no interior da célulamenos o potencial no exterior (unidades: mV).
• Ve
( )
z,t = Potencial do condutor externo (unidades: mV).• re = Resistência específica por unidade de comprimento do condutor externo (unidades:
Ω/cm).
• ri = Resistência específica por unidade de comprimento do condutor interno (unidades:
Ω/cm).
• a = Raio do anel cilíndrico.
Para se lembrar do significado das resistências específicas por unidade de comprimento, pense num condutor cilíndrico de comprimento l e área da base A; a sua resistência R pode
ser escrita como: rl
A l
R=ρ = . Portanto, r = ρ/A. (unidades de ρ: Ω.cm; unidades de r:
Ω/cm). r é uma resistência por unidade de comprimento.
A partir dessas variáveis, podemos construir um modelo de circuito elétrico equivalente para o modelo do cilindro condutor:
As variáveis elétricas têm que obedecer às leis de Kirchoff, assim como à lei de Ohm. Aplicando a lei da corrente de Kirchoff para o nó (a):
( )
z t i(
z z t)
K( )
z t zii , = i +∆ , + m , ∆ . (1)
Para tornar mais clara a relação entre o modelo de circuito elétrico e a geometria do modelo do condutor cilíndrico, considere o desenho abaixo:
O desenho mostra um detalhe do condutor interno para o cálculo da lei das correntes de Kirchoff para o nó (a), Equação (1). A corrente longitudinal fluindo pelo meio interno que
passa pela “tampa” em z do cilindro acima é
(
ii( )
z,t)
e a que passa pela “tampa” em z + ∆zé
(
ii(
z+∆z,t)
)
. A corrente que passa radialmente pela superfície do cilindro é indicada peladensidade de corrente de membrana
(
Jm( )
z,t)
, de maneira que a corrente total passandopela membrana pode ser expressa como:
( )
z
,
t
2
a
z
J
( )
z
,
t
K
( )
z
,
t
z
.
i
m=
π
∆
m=
m∆
A Equação (1) representa o fato de que a carga não se acumula no elemento de volume cilíndrico: a soma das correntes que entram e que saem do elemento cilíndrico tem que ser zero: ii
(
z,t)
= ii(
z + ∆z,t)
+ im(
z,t)
.A lei da corrente de Kirchoff aplicada ao nó (d) nos dá:
( )
z
,
t
K
( )
z
,
t
z
i
(
z
z
,
t
)
K
( )
z
,
t
z
.
i
e+
m∆
=
e+
∆
+
e∆
. (2) Aplicando a lei de Ohm ao pedaço de circuito entre (a) e (b):( )
z
t
V
(
z
z
t
)
r
z
i
(
z
z
t
)
V
i,
−
i+
∆
,
=
i∆
.
i+
∆
,
. (3)Esta equação também pode ser interpretada em termos do desenho para um pedaço do condutor interno feito acima. Lembrando que a resistência do pedaço condutor deve ser
2
a z
Ri =ρi∆ π , onde ρi é a resistividade do meio interno (citoplasma): 2
a z R ri i i π ρ = ∆ = e
( )
z
,
t
V
(
z
z
,
t
)
R
i
(
z
z
,
t
)
r
z
i
(
z
z
,
t
)
.
V
i−
i+
∆
=
i i+
∆
=
i∆
i+
∆
( )
z
,
t
V
(
z
z
,
t
)
r
z
i
(
z
z
,
t
)
.
V
e−
e+
∆
=
e∆
e+
∆
(4)Rearranjando os termos nas equações (1), (2), (3) e (4) e dividindo por ∆z:
(
)
( )
( )
t z K z t z i t z z i m i i , , =− , ∆ − ∆ + ; (5)(
) ( )
( )
( )
t z K t z K z t z i t z z i e m e e , , = , − , ∆ − ∆ + ; (6)(
)
( )
(
)
t z z i r z t z V t z z V i i i i , , =− +∆ , ∆ − ∆ + ; (7)(
)
( )
(
)
t z z i r z t z V t z z V e e e e , , =− +∆ , ∆ − ∆ + . (8)Tomando o limite ∆z → 0 nas equações acima obtemos equações diferenciais que
expressam a relação entre corrente e voltagem para todos os pontos do modelo do condutor cilíndrico.
(
)
(
)
t z K z t z i m i , , − = ∂ ∂ ; (9)(
)
(
)
(
)
t z K t z K z t z i e m e , = , − , ∂ ∂ ; (10)(
)
(
)
t z i r z t z V i i i , , − = ∂ ∂ ; (11)(
)
(
)
t z i r z t z V e e e , = − , ∂ ∂ . (12)As equações (9) e (10) indicam que as variações nas correntes longitudinais externa e interna são causadas pela corrente radial (pela membrana ou pelo meio externo) por unidade de comprimento.
Já as equações (11) e (12) expressam as relações entre potencial e corrente para os meios intra- e extra-celular.
O potencial de membrana em um ponto z do condutor cilíndrico em um dado instante de tempo t é definido por:
(
z t)
V(
z t)
V(
z t)
Vm , = i , − e , (potencial dentro menos potencial fora).
Tomando a derivada parcial de Vm
( )
z,t em relação a z:(
)
(
)
(
)
z t z V z t z V z t z Vm i e ∂ ∂ − ∂ ∂ = ∂ ∂ , , ,Substituindo nesta equação as equações (11) e (12),
(
)
(
)
(
)
t
z
i
r
t
z
i
r
z
t
z
V
e e i i m,
=
−
,
+
,
∂
∂
. (13) Note o que a Equação (13) nos diz: que a variação do potencial de membrana se dá no sentido oposto ao do fluxo de corrente interna e no mesmo sentido do fluxo de corrente externa ao condutor. Isto decorre do fato de se ter definido o potencial de membrana como o potencial dentro da célula menos o potencial fora da célula.Seria desejável, no entanto, ter uma equação que relacionasse o potencial de membrana Vm
à corrente passando através da membrana Km. Esta equação pode ser obtida da seguinte
maneira:
Tome a derivada da Equação (13) em relação a z,
(
)
(
)
(
)
z
t
z
i
r
z
t
z
i
r
z
t
z
V
i i e e m∂
∂
−
∂
∂
=
∂
∂
,
,
,
2 2 .Substitua nesta equação as equações (9) e (10),
( )
(
( )
( )
)
( )
( ) (
,
)
( )
,
( )
,
.
,
,
,
,
2 2 2 2t
z
K
r
t
z
K
r
r
z
t
z
V
t
z
K
r
t
z
K
t
z
K
r
z
t
z
V
e e m i e m m i e m e m−
+
=
∂
∂
⇒
⇒
+
−
=
∂
∂
(14)A Equação (14) incorpora as equações (9), (10), (11) e (12). Ela é chamada de equação do cilindro condutor, pois representa uma síntese do modelo do condutor cilíndrico proposto para modelar a célula.
A Equação (14) é completamente geral, independente das propriedades elétricas da membrana (capacitância, resistência etc.). Combinando o modelo construído aqui com o construído na aula 5 para uma membrana passiva temos o seguinte esquema.
Neste desenho:
- gm = condutância específica da membrana por unidade de comprimento (unidades:
S/cm);
- cm = capacitância específica da membrana por unidade de comprimento (unidades:
F/cm).
Note que gm = Gm.πa = (1/Rm).πa e que cm = Cm.πa, onde Gm é a condutância específica da
membrana por unidade de área (unidades: S/cm2), Rm é a resistência específica da
membrana por unidade de área (unidades: Ωcm2) e Cm é a capacitância específica da
membrana por unidade de área (unidades: F/cm2).
A corrente de membrana por unidade de comprimento, Km
( )
z,t , pode ser escrita como:( )
( )
(
( )
, rep)
, , g V z t V t t z V c K K t z K m m m m R m C m m + − ∂ ∂ = + = . (15)Substituindo esta equação na equação do cilindro condutor, Equação (14), temos uma combinação dos dois modelos construídos até o momento:
( ) (
)
( ) (
r
r
)
g
(
Vm
( )
z
t
V
)
r
K
( )
z
t
t
t
z
Vm
c
r
r
z
t
z
Vm
e e m i e m i e,
,
,
,
rep 2 2−
−
+
+
∂
∂
+
=
∂
∂
. (16) Esta é a chamada Equação do Cabo.Definindo duas constantes: m m m m
R
C
g
c
=
=
τ
(constante de tempo) e(
r
e+
r
i)
g
m= 1
λ
(constante de espaço),a equação do cabo pode ser reescrita como:
( )
( )
( )
( )
t
z
k
r
V
t
z
Vm
t
t
z
Vm
z
t
z
Vm
e e,
,
,
,
2 rep 2 2 2λ
τ
λ
+
−
−
∂
∂
=
∂
∂
. (17)Como já visto antes, a constante de tempo τ não depende das dimensões da célula. Isto
quer dizer que a constante de tempo é a mesma para células grandes ou pequenas feitas com uma membrana do mesmo material.
Já a constante de espaço λ depende das dimensões da célula. Para ver isso, vamos assumir,
por simplicidade, que re << ri, de maneira que λ = 1/(ri.gm)
1/2 . Como ri = ρi/πa 2 e gm = Gm.2πa, obtemos:
(
)
,
2
2
2
1
1
2 i m m i m i m iR
a
G
a
a
G
a
g
r
ρ
ρ
π
π
ρ
λ
=
=
=
=
onde Rm é a resistência específica da membrana e ρi é a resistividade do meio interno à
célula (citoplasma). Esta equação mostra que λ depende do raio do cilindro:
aumentando-se a aumenta-aumentando-se λ. Usando Rm = 10 4 Ω.cm2 e ρi = 10 2 Ω.cm, temos:
d
a
25
50
=
=
λ
,onde d é o diâmetro do cabo.
Se um dendrito tiver um diâmetro de 10 µm (10-3 cm), a constante espacial será λ = 0,15
cm ou 1,5 mm. Já se um dendrito tiver um diâmetro de 1 µm (10-4 cm), a constante
A constante espacial determina quão rapidamente o potencial varia ao longo do cabo (dimensão z), enquanto que a constante de tempo determina quão rapidamente o potencial varia ao longo do tempo t.
A equação do cabo é uma equação diferencial parcial de primeira ordem no tempo e de segunda ordem no espaço, de mesmo tipo que a equação de difusão. A sua solução permite que se calcule o potencial de membrana para cada ponto da membrana de um neurônio a partir de uma distribuição espacial inicial de voltagem (condição inicial, V(z, t) = V(z, 0)) e de condições de contorno apropriadas impostas. As condições de contorno especificam o que acontece com o potencial de membrana em um nó, onde o cabo se ramifica, ou em um
terminal, onde ele acaba.
Concretamente, em um nó de ramificação o potencial V deve ser contínuo e a corrente longitudinal (ao longo do cabo) deve ser conservada, de maneira que a corrente chegando em um nó deve ser igual à corrente saindo pelos ramos partindo do nó. Já em um terminal, as condições de contorno são diferentes. Por exemplo, uma condição de contorno razoável para um terminal é a de que não deve haver fluxo de corrente longitudinal para fora do terminal.
Soluções da Equação do Cabo para Alguns Casos
Vamos assumir que re << ri e considerar que o zero de potencial é definido em Vrep, o que
equivale a definir V = Vm − Vrep. Sendo assim, a equação do cabo (Equação 17) pode ser
reescrita como:
( )
( )
2 2 2,
,
z
t
z
Vm
V
t
t
z
Vm
∂
∂
+
−
=
∂
∂
λ
τ
. (18)Vejamos agora soluções da equação do cabo no caso em que o potencial de membrana não varia no tempo (soluções de estado estacionário).
Suponhamos que num dado instante injetemos uma corrente constante através da membrana em um dado ponto (que tomaremos como z = 0, sem perda de generalidade).
Após um período inicial em que a voltagem V se comporta de forma transiente, vamos supor que ela atinge um estado estacionário em que os valores de V ao longo do espaço não variem mais no tempo pelo restante do período em que a corrente constante permanecer aplicada. Neste caso, podemos escrever V(z, t) = V(z).
Neste caso, podemos desprezar a parte temporal da equação do cabo e obter a sua versão de estado estacionário (note que agora a derivada parcial em relação a z vira uma derivada total), 0 2 2 2 = − V dz V d
λ
. (19)A solução geral para esta equação diferencial ordinária pode ser expressa na forma (teste que ela é de fato solução derivando-a duas vezes e substituindo na equação):
λ λ / /
)
(
z
Ae
zBe
zV
=
−+
, (20)onde as constantes A e B dependem das condições de contorno. Vamos considerar dois casos com condições de contorno diferentes, o caso do cabo semi-infinito, que se estende de z = 0 a z = ∞, e o caso do cabo finito, que se estende de z = 0 a z = l.
Cabo semi-infinito
Vamos supor para este caso que, para z = 0, V está fixo em V0. Para garantir que o
potencial permaneça finito à medida que a distância z vá para o infinito, deve-se fazer a constante B igual a zero em (20). Desta forma, a solução final para este caso é (note que A
deve ser igual a V0)
λ / 0
)
(
z
V
e
zV
=
− . (21)Esta solução deixa claro porque λ é chamada de constante de espaço, a voltagem é
atenuada exponencialmente com a distância de acordo com λ.
Por outro lado, poderíamos ter considerado que a corrente em z = 0 é mantida em um valor
constante I0. Da Equação (13), temos que
( )
( )
z i r dz z V d i i m = − . (22)Substituindo (20) nesta equação (de novo, fazendo B = 0) e considerando que quando z = 0, ii = I0, obtemos: λ
λ
r
iI
e
zz
V
(
)
=
0 − . (23)Define-se a resistência de entrada de um cabo como o potencial de estado estacionário dividido pela corrente constante injetada. Portanto, para z = 0 a resistência de entrada vale,
i i r I I r I V R = =
λ
=λ
0 0 0 in ) 0 ( , ou i m i m i m i R d R a R a a R ρ π ρ π ρ π ρ 2 3 2 3 2 in 2 2 1 2 = = = . (24)A condutância de entrada para o cabo semi-infinito é, portanto:
i m R d G ρ π 2 2 3 in = . (25)
Estas quantidades, resistência e condutância de entrada de uma célula, são úteis para quem trabalha com modelagem de células neurônios (como veremos mais adiante).
Cabo finito
Vamos supor de novo para este caso que V(0) = V0. Com relação à outra
extremidade do cabo, existem várias possíveis condições de contorno. Três delas são:
(i) Extremidade selada, em que nenhuma corrente longitudinal pode passar pela
extremidade, de maneira que (dV/dx)|x=l = 0;
(ii) Curto circuito ou extremidade aberta, em que o valor da voltagem na extremidade
está fixo em 0 para permitir a passagem de qualquer corrente;
(iii) Extremidade com vazamento, que é uma mistura das duas anteriores em que alguma
Para facilitar a análise e evitar as divisões por λ nas exponenciais, é conveniente passar
para a variável adimensional Z ≡ z/λ. A variável Z é chamada de distância eletrotônica ao
longo do cabo. Nesta nova variável, a solução (20) fica escrita como
Z Z
Be
Ae
Z
V
(
)
=
−+
. (26)Outra variável adimensional útil é o chamado comprimento eletrotônico do cabo: se um
cabo tiver comprimento l e constante de espaço λ, o seu comprimento eletrotônico L é
definido como a razão entre o seu comprimento e a sua constante de espaço: L = l/λ. Note
que na extremidade do cabo Z = L.
Para a condição de extremidade selada, a condição de contorno fica (lembre-se que
def(x)/dx = (df(x)/dx).ef(x)): L L L L Z
Ae
B
Be
Ae
dZ
dV
20
− − ==
⇒
=
+
−
=
.Substituindo este resultado na equação (26),
( )
(
)
2
cosh(
)
)
(
Z
Ae
e
e
Ae
L
Z
V
=
−L L−Z+
− L−Z=
−L−
,onde se usou a identidade cosh(x) = (ex + e-x)/2. Usando agora a condição V(0) = V0,
) cosh( 2 ) cosh( 2 0 0 L e V A L Ae V L L = ⇒ = − .
Substituindo este valor de A na equação para V(Z), chegamos à solução final para este caso
) cosh( ) cosh( ) ( 0 L Z L V Z V = − . (27)
Para a condição de extremidade em curto-circuito ou aberta, as condições de contorno são
V(L) = 0 e V(0) = V0, de maneira que um cálculo similar ao feito acima resulta na solução,
)
senh(
)
senh(
)
(
0L
Z
L
V
Z
V
=
−
, (28)onde se usou a identidade senh(x) = (ex - e-x)/2.
A figura abaixo mostra o comportamento de V(Z) para as três situações estudadas, cabo semi-infinito (equação 23), cabo finito com extremidade selada (equação 27) e cabo finito com extremidade em curto-circuito ou aberta (equação 28). Nos casos dos cabos finitos, com extremidade selada e extremidade aberta, usou-se L = 1. Note que a condição de extremidade selada implica numa atenuação menos acentuada que a condição de cabo infinito, enquanto que a condição de extremidade aberta implica numa atenuação mais acentuada.
Bibliografia:
• Koch, C., Biophysics of Computation: information processing in single neurons.
Oxford University Press, Oxford, 1999.
• Rall, W. and Agmon-Snir, H., Cable theory for dendritic neurons. In: Koch, C. and
Segev, I., Methods in Neuronal Modeling: from ions to networks. (2nd Ed.), MIT Press, Cambridge, MA, 1998. Chapter 2, pp. 27-92.
Apêndice 1: Resistência de entrada para o cabo finito
A definição operacional de resistência de entrada é a seguinte: insere-se na membrana de
uma célula um eletrodo que injeta corrente Ii e, a uma distância pequena comparada com
λ, insere-se outro eletrodo para medir a voltagem de membrana. No limite em que a
distância entre os dois eletrodos vai para zero, podemos escrever,
) ( ) ( z I z V R i in = .
Como visto acima, a resistência de entrada para o cabo semi-infinito é
i m i R d r R
ρ
π
λ
32 in 2 = = .Note que a resistência de entrada do cabo semi-infinito é constante para todo o cabo
infinito e homogêneo. Vamos passar a escrevê-la como R∞:
i m i R d r R R
ρ
π
λ
32 in 2 = = ≡ ∞ ∞ .De maneira equivalente, temos a condutância de entrada do cabo semi-infinito:
i m i R d r G ρ π λ 2 1 32 = = ∞ .
Para a situação mais realista de um cabo finito, podemos calcular a sua resistência de entrada da maneira apresentada a seguir:
Da equação (13) temos,
( )
( )
z i r dz z V d i i − = ,que implica que,
(
)
( )
−
=
dz
z
V
d
r
t
z
i
i i1
,
.Escrevendo esta equação em termos de Z = z/λ (dz = λdZ):
(
)
( )
− = dZ Z V d r t z i i i 1 ,λ
.Lembrando que riλ é a resistência de entrada de um cabo semi-infinito com as mesmas
características do nosso cabo finito, podemos escrever,
(
)
( )
−
=
∞dZ
Z
V
d
G
t
z
i
i,
. (A1)Em particular, supondo que a corrente é injetada no ponto Z = 0,
( )
−
=
= ∞ 0 0 ZdZ
Z
V
d
G
I
. (A2)A partir desta equação pode-se deduzir uma expressão para a condutância (e a resistência) de entrada de um cabo finito. Por exemplo, para o caso de um cabo com extremidade selada para o qual, segundo a equação (27),
) cosh( ) cosh( ) ( 0 L Z L V Z V = − ,
obtemos, derivando esta expressão (lembre-se que dcosh(x) = senh(x)),
( )
( )
L G V( )
L L V G I tanh cosh senh 0 0 0 = ∞ = ∞ , o que nos dá,( )
L G V I G tanh 0 0 in = = ∞ , (A3) e, para Rin,( )
L
R
I
V
R
coth
0 0 in=
=
∞ . (A4)Um raciocínio análogo nos dá, para a condição de extremidade aberta em que V(Z) é dado pela equação (28),
( )
L
G
G
in=
∞coth
(A5) e( )
L
R
R
in=
∞tanh
. (A6)Apêndice 2: Solução para o cabo finito com extremidade com vazamento
Para a condição de extremidade com vazamento, fica mais conveniente escrever a solução geral (equação 26) na forma,
(
L
Z
)
B
(
L
Z
)
B
Z
V
(
)
=
1cosh
−
+
2senh
−
, (A7)que pode ser obtida de (26) usando as definições de cosh(z) e senh(z),
( )
( )
2 senh ; 2 cosh z z z z e e z e e z − − − = + = e fazendo A = (B1 – B2)/2 e B = (B1 + B2)/2.Aplicando as condições de contorno, V(0) = V0 e V(L) = VL à equação (A7), obtemos
(mostre como exercício),
( )
(
)
( )
( )
L Z V Z L V Z V L senh senh senh 0 − + = . (A8)A corrente que vaza pelo cabo em Z = L é dada por,
L L L
R
V
i
=
.Com o auxílio da equação (A1), ela também pode ser escrita como,
(
)
L Z LdZ
t
Z
V
d
R
i
= ∞−
=
1
,
.Igualando as duas expressões para iL:
L Z L L
dZ
t
Z
dV
R
R
V
=∞
−
=
(
,
)
. (A9) De (A8) temos,)
senh(
)
cosh(
0L
L
V
V
dZ
dV
L L Z+
−
=
= , que substituída em (A9) nos dá, + = ∞ senh( ) cosh( ) 0 L R L R R V V L L L . (A10)
Substituindo (A10) em (A8) e utilizando algumas identidades para as funções trigonométricas hiperbólicas (senh(a-b) = senh(a)cosh(b) – senh(b)cosh(a); cosh(a-b) =
cosh(a)cosh(b) – senh(a)senh(b); senh2(a) + cosh2(a) = 1), obtemos finalmente:
(
)
(
)
+
−
+
−
=
∞ ∞)
senh(
)
cosh(
)
senh(
)
cosh(
)
(
0L
R
R
L
Z
L
R
R
Z
L
V
Z
V
L L . (A11)Esta é a solução geral para a voltagem de estado estacionário em um pedaço de cabo finito de comprimento eletrotônico L.
A partir dela podemos deduzir uma expressão para a resistência de entrada do cabo finito.
A resistência de entrada, Rin, é definida como
0 in
I V
R = .
Usando a equação (A1),
(
)
0 0,
1
= ∞−
=
ZdZ
t
Z
V
d
R
I
.Derivando (A11) em relação a Z, depois fazendo Z = 0 e substituindo na equação acima, obtemos:
+
+
=
∞ ∞ ∞)
tanh(
)
tanh(
L
R
R
L
R
R
R
R
L L in . (A12)As equações (A11) e (A12) são as expressões gerais para a voltagem e a resistência de
entrada de um cabo finito. Note que as soluções particulares para V(Z) e Rin para a
extremidade fechada e a extremidade aberta podem ser obtidas a partir de (A11) e (A12)
fazendo RL igual a ∞ ou 0, respectivamente. Além disso, no limite em que L → ∞