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A prática do «relatório de aula» no contexto da escrita processual

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UNIVERSIDADE DO PORTO

FACULDADE DE LETRAS

A PRÁTICA DO «RELATÓRIO DE AULA» NO

CONTEXTO DA ESCRITA PROCESSUAL

Relatório/dissertação apresentado(a) à Faculdade de Letras da Universidade do Porto para obtenção do grau de Mestre em Ensino do Português 3º Ciclo Ens. Básico e Ens. Secundário e Língua Estrangeira – Francês – no Ens. Básico e Ens. Secundário

Teresa Sofia Neves Alves Castela da Costa Setembro de 2010

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UNIVERSIDADE DO PORTO

FACULDADE DE LETRAS

A PRÁTICA DO «RELATÓRIO DE AULA» NO

CONTEXTO DA ESCRITA PROCESSUAL

Relatório/dissertação apresentado(a) à Faculdade de Letras da Universidade do Porto para obtenção do grau de Mestre em Ensino do Português 3º Ciclo Ens. Básico e Ens. Secundário e Língua Estrangeira – Francês – no Ens. Básico e Ens. Secundário

Teresa Sofia Neves Alves Castela da Costa

Sob a orientação de: Professora Doutora Isabel Margarida Duarte

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III Agradecimentos

A realização de qualquer trabalho assenta na participação, a diferentes níveis, de vários intervenientes. Chegou, assim, o momento de agradecer àqueles que, de forma directa ou indirecta, concorreram para que o presente trabalho fosse concluído.

Apresento, publicamente, a mais profunda gratidão à Professora Doutora Isabel Margarida Duarte por ter assumido a responsabilidade de orientar esta investigação, mostrando-se atenta à evolução da mesma e apresentando uma disponibilidade inigualável para prestar todo o auxílio que se afigurou necessário. O apoio humano e a precisão científica evidenciados foram elementos essenciais para o desenvolvimento, adequado, do meu trabalho. Vejo no entusiasmo, no rigor e na perspectiva construtiva que sempre transpareceram nas intervenções profissionais da Professora Doutora Isabel Margarida Duarte, de que tive o privilégio de beneficiar, uma referência, que beneficiaríamos em seguir durante a prática docente, em qualquer nível de ensino.

Agradeço aos docentes que intervieram tanto na parte curricular do curso, como na sua parte prática, pelo colaboração e a disponibilidade com que me atenderam.

Aos alunos da Escola Secundária de Gondomar, sem a participação dos quais a parte teórica do presente trabalho não teria sido possível, manifesto a minha sincera gratidão.

Aos colegas, que demonstraram companheirismo e amizade, deixo aqui o meu agradecimento.

À minha família e amigos agradeço todo o apoio prestado e os encorajamentos evidenciados.

Aos meus pais agradeço a motivação que sempre me incutiram e que nunca deixaram de alimentar.

Ao meu filho agradeço a paciência e o bom senso com que encarou a agitação familiar, decorrente da realização deste Mestrado.

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IV Resumo

O conhecimento da língua materna, na sua vertente escrita, assume particular relevância nos campos da construção pessoal, social e profissional do indivíduo, determinado assim, de forma não negligenciável, o seu percurso. Ao longo da sua formação escolar é, pois, essencial que adquira os conhecimentos exigidos nesta área do saber, para que beneficie de um desenvolvimento equilibrado ao longo de toda a vida.

No contexto escolar, o carácter transversal do saber em causa, usado como forma de veicular o conhecimento das áreas leccionadas em língua materna, é evidente. Este factor reforça, a nosso ver, a urgência de trabalhar aprofundadamente a escrita no quadro do ensino da língua materna, sob pena de dificultar o acesso dos discentes a outras áreas do saber. Considerando o campo das línguas estrangeiras, o conhecimento aprofundado da língua materna representa, também, uma mais-valia significativa, dado que o domínio dos mecanismos que regulam uma língua de referência, como é a língua materna, facilita a compreensão e interiorização daqueles que pertencem a uma língua que se pretenda adquirir na fase de escolarização.

Se é certo que a oralidade, tanto em língua materna como estrangeira, deve ser trabalhada, não se pode estimar que os conhecimentos adquiridos neste domínio sejam suficientes para garantir um bom desempenho no contexto da escrita. Esta exige o domínio de saberes que lhe são próprios e que requerem um treino regular, ao longo de toda a formação. A oralidade é, e deve ser, a base de um grande número de aprendizagens, que contribuem para o domínio da escrita. Mas é essencial criar momentos específicos dedicados ao exercício da escrita para que os aprendentes possam, um dia, dominar as suas técnicas, tanto em língua materna como estrangeira. É escrevendo que o aluno se encontrará perante as dificuldades que o universo da escrita apresenta, que poderá reler, reescrever, reflectir, com ou sem auxílio, sobre as suas opções, o seu percurso. Desta forma poderá aplicar, em situações posteriores, os saberes resultantes da experiência vivenciada, que o treino aperfeiçoará, gradualmente.

A análise que aqui apresentamos, baseada na produção de relatórios redigidos no quadro de aulas de Português e de Francês, visa verificar em que medida o treino sistemático de um dado exercício de escrita permite aumentar a proficiência dos escreventes.

Os resultados obtidos permitem-nos verificar progressos encorajadores nas produções dos aprendentes nos domínios frásico e textual, tanto em português como em

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V francês. O grau de clareza e de profundidade conferido à correcção dos erros detectados revelou-se, todavia, determinante para a evolução dos discentes. A progressão dos aprendentes foi mais evidente na disciplina em que a correcção do erro se realizou de forma mais pormenorizada.

Apesar de a explicação da regra, que permite evitar o erro, exigir que se despenda uma parte considerável da aula na realização desta actividade, sobretudo no início do ano lectivo, que atrasa, numa primeira fase, a evolução dos conteúdos a ministrar, é de salientar que o trabalho em causa diminui, efectivamente, os erros linguísticos e textuais que os discentes habitualmente cometem na escrita. A actividade implementada permite uma evolução efectiva, que consideramos determinante para a progressão dos aprendentes, tanto no contexto escolar, imediato, como no espaço social e profissional que virão a integrar um dia e para o qual a escola os deve preparar.

Sendo as vantagens da aplicação do «relatório de aula», no contexto lectivo das línguas, materna e estrangeira, superiores aos inconvenientes detectados, defendemos que práticas semelhantes à que estudámos se generalizem, para que o nosso ensino responda, directamente, às necessidades daqueles que forma.

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VI Résumé

Le fait de dominer sa langue maternelle, du point de vue de l’écrit, a un impact significatif sur la construction personnelle, sociale et professionnelle de l’individu et détermine, de manière considérable, son parcours. Au cours de sa formation scolaire il est donc essentiel qu’il acquière les savoirs exigés dans ce domaine, afin qu’il bénéficie d’un développement équilibré, tout au long de son existence.

Dans le contexte scolaire, le côté transversal du domaine en cause, qui surgit comme moyen de transmission des connaissances propres à chaque matière enseignée en langue maternelle, est évident. Cette réalité renforce, selon nous, l’urgence de travailler de manière approfondie l’écrit, dans le contexte de l’enseignement de la langue maternelle, sous peine de rendre difficile l’accès des apprenants à d’autres domaines du savoir. Considérant le contexte des langues étrangères, la connaissance approfondie de la langue maternelle représente, également, une plus-value significative, étant donné que le domaine des mécanismes qui régissent une langue de référence, comme l’est la langue maternelle, rend plus facile la compréhension et l’assimilation de ceux qui appartiennent à une langue dont l’apprentissage est initié durant la scolarité.

S’il est certain que l’oralité, aussi bien en langue maternelle qu’en langue étrangère, doit être travaillée, nous ne pouvons pas considérer que les connaissances acquises dans ce domaine suffisent à garantir un bon niveau en ce qui concerne l’écriture. Celle-ci exige une connaissance pleine de savoirs qui lui sont propres et qui requièrent un entrainement régulier, tout au long de la formation de l’individu. L’oralité est, et elle doit être, la base d’un grand nombre d’apprentissages, qui contribuent à améliorer l’écriture. Mais il est essentiel d’envisager des moments spécifiquement consacrés à l’écriture, si nous voulons que les élèves puissent, un jour, dominer les techniques qui lui sont propres, aussi bien en langue maternelle, qu’en langue étrangère. C’est en écrivant que l’apprenant rencontrera les difficultés propres à l’écriture, qu’il pourra se relire, réécrire, réfléchir, avec ou sans aide, face à ses options ou à son parcours. De cette manière il pourra appliquer, en de nouvelles circonstances, les savoirs construits grâce à sa propre expérience, que l’entrainement perfectionnera de façon graduelle.

L’analyse que nous proposons dans ce travail, basée sur la production de comptes-rendus rédigés dans le contexte de plusieurs cours de Portugais et de Français,

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VII vise vérifier en quelle mesure l’entrainement systématique d’un exercice d’écriture donné permet d’augmenter la qualité du produit de ceux qui écrivent.

Les résultats obtenus nous permettent de constater que, grâce à la pratique du compte-rendu, les apprenants ont réalisé des progrès considérables, aussi bien au niveau de la construction phrastique que textuelle, en portugais et en français. Le degré de netteté et de profondeur avec lequel la correction des fautes a été réalisée détermina toutefois, en grande mesure, l’évolution des élèves. Les progrès ont été plus évidents au niveau de la matière où la correction de la faute s’est réalisée de manière plus détaillée.

Quoique l’explicitation de la règle, qui permet d’éviter la faute, occupe une partie considérable du cours, surtout au début de l’année scolaire, retardant l’enseignement des matières prévues dans les programmes, il est important de souligner que l’exercice en cause diminue, effectivement, les fautes habituellement commises par les apprenants, au niveau linguistique et textuel. L’activité testée permet une évolution effective que nous considérons déterminante pour l’évolution des apprenants, aussi bien dans l’immédiat, au niveau scolaire, qu’à long terme, dans l’espace social et professionnel qu’ils intègreront un jour, avec l’aide que l’école se doit de leur fournir.

Considérant les avantages associés à la pratique du compte-rendu dans le contexte des cours de langue, maternelle et étrangère, qui dépassent largement les inconvénients détectés, nous soutenons que des pratiques similaires à celle que nous avons étudiée devraient être généralisées, afin que l’enseignement réponde, directement, aux besoins de ceux qu’il forme.

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VIII Índice

Índice ... VIII

Introdução ... 9

I - Fundamentação teórica ... 11

1- A expressão escrita no contexto da aprendizagem ... 12

2- Uma técnica de ensino deficitária ... 20

3- Procedimentos a adoptar, por parte do professor, no domínio do ensino da escrita... 25

4- Escrita para a apropriação de técnicas e modelos ... 32

II- Implementação do projecto ... 39

1- Contexto de realização da investigação ... 40

2- Aplicação do projecto ... 45

3- Análise qualitativa de alguns relatórios de aula ... 49

A-Relatórios de Português – 1º período ... 49

a) Correcção oral da primeira versão, com a participação da turma ... 49

b) Correcção escrita da segunda versão, por parte do docente ... 54

c) Verificação da terceira versão escrita, por parte do docente ... 57

B-Relatórios de Português – 2º período ... 57

a) Primeira produção e respectivas indicações do corrector/aluno ... 58

b) Produção final entregue ao professor ... 61

C-Relatórios de Francês ... 62

Conclusão ... 69

Bibliografia ... 73

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9 Introdução

A necessidade, por parte do indivíduo, de adquirir um conhecimento seguro e reflectido no âmbito da escrita, nomeadamente em língua materna, verifica-se em vários contextos.

Considerando a dinâmica escolar, o domínio da língua materna é essencial não só na disciplina em que representa um fim, enquanto objecto de estudo, tal como acontece nas aulas de Português, mas também naquelas em que representa um meio, como sucede no caso das restantes disciplinas em que os conteúdos são apresentados/trabalhados na língua nacional. Mesmo no quadro das línguas estrangeiras, o conhecimento sólido da língua mãe é essencial, na medida em que esta surge como uma referência para a construção e aquisição de novos saberes linguísticos e não linguísticos.

Tendo em conta as diferentes vertentes do uso da língua, a recepção e a produção, nos campos da oralidade e da escrita, é de salientar a importância que esta assume no meio escolar, na medida em que representa o processo de avaliação mais frequente e, geralmente, mais valorizado nas diferentes áreas disciplinares.

No campo socioprofissional, verifica-se uma forte intolerância face ao erro que tenderá a ser proporcional ao estatuto do indivíduo. Quanto mais elevadas forem as expectativas criadas a seu respeito, mais penalizadoras se revelarão as suas lacunas. Se as falhas, em termos de oralidade, são por vezes minoradas, tendo em conta o imediatismo a que está obrigada esta forma de expressão, a mesma tolerância não se aplica à escrita, dada a possibilidade de reflexão e de revisão que oferece.

Apesar da importância dada à escrita nas circunstâncias em que o indivíduo é chamado a expor os seus conhecimentos ou a sua opinião, tanto durante como após a sua formação, e malgrado as fortes penalizações resultantes do deficiente conhecimento dos seus mecanismos, verifica-se que os métodos de ensino tradicionais, seguidos ainda hoje por inúmeros docentes, não prevêem a explicitação dos processos de escrita, nem ensinam verdadeiramente a escrever. Perante o contra-senso identificado urge, pois, intervir procurando estratégias que nos permitam tornar a avaliação mais coerente e preparar os sujeitos para corresponderem às exigências que lhes são feitas.

Sendo a escola a instituição encarregue de preparar os indivíduos para a sua integração futura e plena na vertente socioprofissional tentámos, em contexto de estágio, verificar em que medida a prática sistemática da escrita com o recurso a uma

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10 tipologia textual dada, aplicada no quadro das aulas de língua, materna e estrangeira, bem como o recurso à explicitação e correcção dos erros identificados, permitem melhorar as competências dos alunos a este nível.

Ao longo do presente trabalho, procuraremos apresentar algumas vertentes da problemática referida, que nos permitirão reflectir sobre a situação da expressão escrita no contexto da aprendizagem; sobre as limitações das técnicas de escrita praticadas no âmbito do ensino tradicional; bem como sobre os procedimentos a adoptar, por parte do docente, no campo da competência em causa, tendo em vista um ensino eficaz da escrita. São, pois, estas as questões de investigação a que o presente trabalho obedecerá.

Após a abordagem teórica e a descrição do contexto escolar em que foi posto em prática o nosso projecto, será apresentada a tipologia textual seleccionada, referindo-se: as características específicas da mesma, os mecanismos da sua dinamização, bem como os objectivos a alcançar com a sua implementação. Por fim, serão apresentados os resultados obtidos, com base numa análise qualitativa de trabalhos escritos produzidos pelos discentes. Será este, portanto, o plano do presente relatório de Mestrado.

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12 1- A expressão escrita no contexto da aprendizagem

A disciplina de Língua Portuguesa desempenha, no contexto escolar, um papel fundamental, tendo em conta o seu carácter transversal. O Português está e, de acordo com a legislação, deve estar presente em todas as áreas disciplinares. Branca Rodrigues desenvolve amplamente esta questão na sua tese, apoiando as observações feitas nas normas vigentes. Assim menciona, entre outros, o artigo 47º-7 da Lei de Bases do Sistema Educativo onde é referido que «O ensino/aprendizagem da língua materna deve ser estruturado de forma que todas as outras componentes curriculares dos ensinos Básico e Secundário contribuam de forma sistemática para o desenvolvimento das capacidades do aluno ao nível da compreensão e produção de enunciados orais e escritos em português.»1.

As capacidades de compreensão e de expressão em língua portuguesa determinam, em grande medida, o acesso ao conhecimento que se pretende transmitir nas mais diversas disciplinas leccionadas em língua materna, mas também em língua estrangeira. O domínio adequado de um universo linguístico de referência permite aquisições mais rápidas e sólidas no campo das línguas estrangeiras. Nesta área, o aluno será levado, não raras vezes de forma intuitiva, a estabelecer comparações, relações de similitude ou de divergência, em relação à língua materna, que acelerarão os mecanismos de memorização e assimilação de que dispõe e que o contexto de aprendizagem activa. Um bom conhecimento do funcionamento da língua-mãe representa assim um factor potenciador do processo que conduz ao conhecimento de uma nova língua. O domínio de um registo linguístico elevado, em língua materna, será ainda garante de um desenvolvimento acrescido em língua estrangeira, já que o aprendente terá tendência para alcançar, neste contexto, o registo correspondente àquele de que faz uso na sua própria língua.

No campo social, a importância atribuída ao domínio da língua materna é não menos marcada. O erro linguístico, cometido em contexto público, condiciona o sucesso profissional, social e até pessoal do indivíduo. Mesmo enquanto veículo de conhecimentos pertencentes a outros domínios, a língua materna quer-se utilizada de forma correcta, sob pena de desprestigiar aquele que dela faz uso e, por conseguinte, de diminuir a credibilidade da sua mensagem. A intolerância social face ao erro, em língua

1

Rodrigues, Branca, Práticas de integração do Português como disciplina transversal, Tese de Mestrado, Lisboa, Universidade Católica Portuguesa, 2009, p.17.

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13 materna, tenderá a ser proporcional ao nível atribuído ao indivíduo: quanto mais elevados forem o seu grau de escolaridade e o seu prestígio, maiores são também as expectativas criadas relativamente aos seus conhecimentos linguísticos e menor é a condescendência perante possíveis falhas. Quando as expectativas são elevadas e a correspondência entre os dois domínios apresenta lacunas, o descrédito social ou profissional é imediato e irreversível. Como refere Aida Santos, a capacidade ortográfica é importante pelo desprestígio que o seu não domínio acarreta:

«Seja a que nível for, a capacidade ortográfica é um pressuposto que não pode ser descurado sob nenhum pretexto. É que a “hipoteca da ortografia” compromete, quanto mais não seja pelo desprestígio, qualquer plano de intervenção nesta área.»2.

Se o domínio da expressão oral é motivo de prestígio, o conhecimento aprofundado da escrita institucionalizada, mais sujeita a normas do que o discurso oral é, ainda nos nossos dias, tido como um forte instrumento de acção social, conferindo um poder reconhecido a quem o possui. Segundo Dabene: « (…) l’écrit produit par le scripteur contribue de façon décisive aux marques de sa distinction sociale.»3.

Em certos contextos, onde a intervenção oral implica uma actuação trabalhada, como é o caso dos discursos ou das apresentações públicas, o texto é previamente preparado por escrito. Sendo o tempo de reflexão previsto para a expressão escrita mais alargado do que o da expressão oral espontânea, que deve ocorrer em tempo real, as manifestações orais expositivas, que por se apresentarem sob a forma de um monólogo seguido, de acordo com uma temática pré-estabelecida, permitem uma preparação antecipadamente, são delineadas por escrito, para que se trabalhem, de acordo com a intenção pretendida, a ordem, o sentido, a clareza, o desenvolvimento ou a concisão que se deseja conferir ao discurso a proferir.

Este procedimento, que consiste em partir do registo por escrito com o intuito de alcançar o domínio oral, justifica-se pelo rigor e pela objectividade que a escrita permite atingir, garantindo uma maior precisão de linguagem e, por conseguinte, um melhor alcance dos objectivos traçados. O domínio da escrita continua assim a usufruir de um estatuto privilegiado, intervindo até em contextos, pertencentes ao domínio formal, em

2 Santos, Aida, «A escrita no ensino secundário», in Pedagogia da escrita, perspectivas, Porto, Porto. Ed.,

1994, p.40.

3

Dabene, Michel, «L’adulte et l’écriture», in Apprendre/enseigner à produire des textes, Bruxelles, De Boeck-Wesmael s.a., 1998, p.15.

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14 que a apresentação pública será oral. Como constata Dabene, apesar da prevalência aparente do audiovisual, na sociedade que conhecemos, os actos de maior destaque continuam a passar pela escrita: «(…) en dépit de la montée de l’image et de l’audio-visuel, rien de ce qui est important, sur le plan individuel et social, ne se fait autrement que par écrit (…).»4

.

Considerando o campo pessoal, o domínio da escrita reveste-se de vantagens notórias. É através do recurso à grafia textual que o pensamento adquire uma forma organizada, geradora de um raciocínio novo, mais elaborado e aprofundado do que o projectado mentalmente. Como refere Graciete Vilela:

«(…) no acto de escrever surge muitas vezes a descoberta de um “eu” que, à partida, era para nós desconhecido. E essa descoberta é, necessariamente, intimidante. As palavras procuram dar forma ao pensamento, criar a materialidade do imaterial (…).»5.

Apesar dos esforços que a boa prática da escrita exige, uma vez que só se escreve melhor escrevendo de forma regular, consciente e continuada, e embora o seu domínio se manifeste somente após um amadurecimento progressivo e longo6, é sem dúvida compensadora a sensação pessoal que o escrevente experimenta ao sentir desenvolver-se uma facilidade crescente em encontrar a palavra certa para transcrever a sua ideia, a estrutura que, mais claramente, reproduz o seu raciocínio. A capacidade de dominar a linguagem, sobretudo no campo da escrita, dando clareza ao pensamento e desenvolvendo o poder argumentativo, garante a possibilidade de gerar e de fazer valer ideias pessoais, de as partilhar com outrem, de agir sobre o universo que rodeia o indivíduo. O domínio da escrita é, pois, um instrumento essencial para a formação equilibrada e completa do cidadão das sociedades modernas, cada vez mais abertas às iniciativas e manifestações pessoais, desde que devidamente fundamentadas. A capacidade de escrever representa, consequentemente, uma fonte de poder7.

4 Ibid. A mesma ideia é apresentada por Fernanda Irene Fonseca em A urgência de uma pedagogia da escrita. Fonseca, F. I., A urgência de uma pedagogia da escrita, “Máthesis”, vol. I, Viseu, Universidade

Católica, 1992.

5 Vilela, G., «Metamorfose no ensino da escrita, alguma crítica de alguns programas de Português das

últimas décadas», in Pedagogia da escrita, perspectivas, Porto, Porto. Ed., 1994, p.47.

6 Graciete Vilela lembra que a aprendizagem da escrita se faz «(…) por etapas, de forma gradual e

planificada, numa assimilação de processos que, por vezes, pode parecer lenta e desesperante (…).». Ibid., p.49.

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15 Escrever é pois muito mais que construir frases, é estabelecer novas relações consigo, com o mundo concreto, ou ainda entrar no domínio do imaginário, do lúdico, da criatividade8, estabelecendo até relações com a própria língua em que comunicamos. Apesar das vantagens que o domínio da escrita apresenta em campos fulcrais e não obstante o sistema democrático em que vivemos, que preconiza a igualdade de oportunidades para todos, a faculdade de escrever de forma interventiva permanece apanágio de uma pequena minoria, o que é revelador de uma prática escassa desta actividade. Em contrapartida, considerando o panorama actual, será possível referir que a oralidade beneficia de uma forte presença, tanto no contexto social como escolar9.

Na era da comunicação, em que a quase totalidade das famílias tem acesso aos audiovisuais, desde cedo as crianças estabelecem contacto com o português padrão oral, mesmo que este não corresponda exactamente à variedade adoptada pelos membros que a rodeiam. Todavia, é através da aprendizagem escolar que estas tomarão consciência da existência de diversas variedades linguísticas e, mais particularmente, dos mecanismos associados à norma culta, que deverão passar a utilizar sempre que se encontrem num contexto formal. Como salienta Isabel Duarte:

«(…) quando uma criança entra na escola, já aprendeu, de forma espontânea e por mera imersão num determinado meio linguístico, a língua da sua comunidade. A responsável por esta aquisição espontânea e natural é a famosa competência linguística inata de que fala Chomsky, ou a vocação para a linguagem que todo o ser humano possui. Mas se, ao iniciar o seu percurso escolar, a criança já fala e compreende enunciados orais, de acordo com o meio sociocultural e a variante diastrática na qual cresceu, é na escola que irá ter contacto com outras variantes, eventualmente diferentes daquela que conhece, nomeadamente com o português padrão, a norma culta e escolarizada e com o português escrito, através da aprendizagem da leitura e da escrita. Aqui sim, estamos perante aprendizagem, dado que há uma intencionalidade de ensinar coisas novas à criança, num percurso que se desenha e se segue programadamente e, do outro lado, num esforço necessário para aprender novos fatos sobre a língua.»10.

8 José António Carvalho alerta, no entanto, para a tendência tradicionalmente seguida, mas errada, de se

valorizar a escrita lúdica numa perspectiva de prazer, sem se trabalharem os processos inerentes à escrita. Segundo o autor, é essencial « (enfatizar) a explicitação dos diferentes aspectos envolvidos no acto de escrever no sentido de, pela reflexão, proporcionar a aquisição de técnicas de escrita por parte dos alunos.». Carvalho, José António., O ensino da escrita da teoria às práticas pedagógicas, Braga, Universidade do Minho, 1999, p.115.

9

De salientar, todavia, que a comunicação verbal praticada e trabalhada em contexto lectivo corresponde à oralidade formal, que obedece a um grau de exigência e de regulação mais elevado do que aquele que se aplica ao domínio familiar.

10

Duarte, Isabel Margarida, «Ensino da língua portuguesa em Portugal: o texto, no cruzamento dos

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16 No contexto escolar moderno, a oralidade corresponde ao domínio da língua que é mais utilizado. Considerando o tempo dedicado a actividades cuja base é a oralidade e aquele em que se recorre à escrita, verifica-se um desequilíbrio que privilegia as primeiras em detrimento da segunda, contrariando a realidade do ensino tradicional essencialmente baseado no exercício da escrita. Ora, é de notar que existe uma distinção notável entre as formas de expressão aceites no domínio da oralidade e as regras, mais exigentes do ponto de vista normativo, associadas ao campo da escrita. Não sendo estas trabalhadas, os alunos tendem a transpor para as suas produções escritas a linguagem normalmente adoptada na oralidade, dando conta de dificuldades que a sua expressão oral, muitas vezes conforme às exigências do nível em que se encontram, não deixava prever. A este propósito Isabel Margarida Duarte salienta:

«A distinção entre oral e escrito, não sendo essencial em termos de tipologia dos discursos, parece-nos, no entanto, muito funcional do ponto de vista da língua materna. Esta ideia é corroborada pela constatação de que algumas das falhas frequentes dos alunos ao escreverem vêm de não se terem apercebido das características específicas da comunicação escrita.»11.

A evolução dos discentes no domínio da oralidade não é, pois, acompanhada de um desenvolvimento equivalente no campo da escrita, se este não for especificamente exercitado.

Assim, as dificuldades apresentadas pelos aprendentes revelam que, malgrado o seu prestígio social e apesar de representar o meio através do qual se realiza a maioria das avaliações dos alunos12, a expressão escrita é pouco trabalhada no espaço onde deveria ser particularmente exercitada, a escola, criando nos alunos lacunas que nem todos conseguem superar autonomamente. Fernanda Irene Fonseca não hesita em responsabilizar esta entidade pelas falhas que os aprendentes apresentam afirmando que

http://aleph.letras.up.pt/exlibris/aleph/a18_1/apache_media/679XPXJRXD38PQ7J5GEY9KL46ITQ2F.pd f, p.2, (consultado em 28 de Julho de 2010).

11

Duarte, Isabel Margarida, «O oral no escrito: abordagem pedagógica», in Pedagogia da escrita,

perspectivas, Porto, Porto. Ed., 1994, p. 81.

12 Graciete Vilela alerta para a incoerência desta realidade, que temos o dever de corrigir. Vilela, G.,

«Metamorfose no ensino da escrita, alguma crítica de alguns programas de Português das últimas décadas», in Pedagogia da escrita, perspectivas, Porto, Porto. Ed., 1994, p.51.

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17 «(…) os alunos não aprendem a escrever pela simples razão que, na escola, não se ensina a escrever.»13.

Importa sublinhar que o domínio do funcionamento da língua escrita, por parte dos alunos, é da responsabilidade da Escola. No contexto educativo que conhecemos, tendo em conta as dificuldades que os jovens apresentam no domínio da expressão escrita, deixa de ter sentido trabalhar exclusivamente competências pertencentes a outros domínios, ignorando lacunas basilares do público-alvo. O exercício da escrita não deve ser tido como uma actividade menor, própria dos primeiros anos de ensino; deve iniciar-se desde cedo, prolongar-se e ser treinado ao longo de todo o percurso escolar do aluno, num grau de exigência crescente, que acompanhe a evolução do mesmo. O trabalho assente no domínio progressivo, não só da estrutura da frase, mas também na estrutura do texto, sensibilizando os alunos para a importância da coesão textual, será aplicável ao campo da língua materna, mas também ao domínio da língua estrangeira, garantindo uma aquisição mais rápida das competências a desenvolver neste campo. No Quadro europeu comum de referência para as línguas é salientada a importância de trabalhar a língua nas suas várias vertentes: a linguística, a sociolinguística e a pragmática, tendo em vista o desenvolvimento das competências necessárias a uma comunicação eficaz14. A exploração textual é, sem dúvida, uma ocasião privilegiada para dar ao estudo da língua a abrangência que lhe é devida.

É essencial trabalhar com os alunos, de forma continuada e em contexto de aula, a prática da escrita, caso contrário, as insuficiências manifestadas pelos discentes não poderão ser superadas, restando ao professor a alternativa de prosseguir a apresentação das matérias programadas, sendo somente acompanhado por uma escassa minoria. Este quadro, não só deixa antever a frustração da maioria, impedida de progredir devido à sua falta de pré-requisitos, como também anuncia situações de indisciplina que a desvinculação dos alunos, face ao contexto de aprendizagem, tende a provocar. Torna-se assim urgente encarar a realidade tal como ela Torna-se nos apreTorna-senta, para que possamos traçar planos de acção fundamentados, pedagogicamente alicerçados, capazes de suprir as falhas detectadas e de dar um sentido real às aulas de língua materna. Nesta perspectiva, Aida Santos propõe que se proceda a uma redução do currículo, que se

13

Fonseca, Fernanda Irene, A urgência de uma pedagogia da escrita, in “Máthesis”, Viseu, Universidade

Católica, 1992, p.226. Disponível em:

http://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/19971/2/irenefonsecamathesis1992000083609.pdf (consultado em

15/06/2010).

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18 aposte nas qualificações básicas em detrimento da quantidade de conteúdos15. O exercício da escrita, sob forma de texto, representa uma prática fundamental para a formação do indivíduo, da qual os docentes não se podem alhear. Na sua comunicação do colóquio: «Apprendre/enseigner à produire des textes», Laurent, baseando-se em trabalhos apresentados anteriormente, refere que esta actividade corresponde a um «campo estratégico» na luta contra o insucesso escolar16. A escrita apresenta um grau de exigência superior ao da oralidade que, desadequadamente, marca o discurso escrito dos alunos de hoje17. Aquela merece pois ser exercitada, muito para além da questão da ortografia, já que o acto de bem escrever ultrapassa largamente, em nosso entender, a simples capacidade de não cometer erros ortográficos.

Se em tempos passados a expressão escrita, ao nível do ensino Secundário, não surgia como um problema, já que este domínio do saber era trabalhado em anos anteriores18 e porque os alunos que alcançavam tal nível pertenciam, geralmente, a meios favorecidos do ponto de vista intelectual, promotores de uma evolução autónoma em diversos domínios, entre os quais a escrita, após a democratização do ensino, o perfil dos alunos, tendo em conta a maioria, mudou, assim como se alteraram as carências reveladas. O público-alvo que encontramos hoje nos estabelecimentos de ensino, em níveis avançados, é pois diferente do de outrora, as suas dificuldades são distintas, mas as práticas pouco evoluíram nos últimos anos, tendendo a perpetuar um modelo em vários aspectos disfuncional, que não permite colmatar deficiências básicas que os alunos revelam em termos de expressão, sobretudo no domínio da escrita. A este problema acresce o facto de a sociedade necessitar, hoje, de trabalhadores com melhores qualificação do que outrora, capazes de se expressar num nível linguístico cuidado, tanto no domínio oral como escrito.

É certo que, até um passado recente, os professores não possuíam directivas claras que lhes permitissem saber de que forma, e em que momento, a prática da escrita

15 Santos, A., “A escrita no ensino secundário”, in Pedagogia da escrita, perspectivas, Porto, Porto. Ed.,

1994, p.27.

16 Laurent, J-P., « Présentation du colloque : Apprendre/enseigner à produire des textes écrits», Apprendre/enseigner à produire des textes écrits, Actes du 3ème colloque international de didactique du français Namur 09-1986, Bruxelles, De Boeck, 1988, p.7.

17 Apesar de ter baseado o seu estudo em alunos cabo-verdianos, cujas dificuldades de expressão em

língua portuguesa diferem, em certos aspectos, daquelas que encontramos em Portugal, Benjamim Moreira alerta para a tendência que os escreventes têm de se exprimirem, por escrito, recorrendo às normas aceites no campo da oralidade. Moreira., B., Para escrever melhor, ESSE-IPVC, 2007, p.46.

18

Santos, A., “A escrita no ensino secundário”, in Pedagogia da escrita, perspectivas, Porto. Ed., Porto, 1994. P.26.

(20)

19 devia ser desenvolvida, no quadro lectivo. Fazendo uma leitura crítica de alguns programas de Português das últimas décadas, Graciete Vilela salienta:

«Os professores (de língua materna), sem orientações programáticas precisas no domínio da expressão escrita e com referentes teóricos escassos, que, além do mais, se encontram em contínua mutação, não sabem que percurso hão-de realizar para que os seus alunos produzam textos escritos correctos.»19.

Nos manuais escolares as propostas de actividades baseadas no processo de escrita são raras. A este propósito, Carvalho constata:

«(…) nos manuais escolares de Língua Portuguesa, por razões que terão a ver, por um lado, com a complexidade da questão e da sua abordagem em contexto pedagógico, e por outro lado, com o peso de uma tradição que dificulta a opção por novas formas de abordagem, pouco se ensina a escrever.»20.

Por outro lado, a perspectiva de vir a corrigir, de forma diária, trabalhos correspondentes ao elevado número de alunos que cada professor tem a seu cargo, assusta estes profissionais, que acabam por evitar o exercício da escrita individual promovendo, antes, a oralidade, apesar de esta não compensar, de forma alguma, a actividade em falta.

Face aos problemas apresentados, que marcam o contexto escolar que conhecemos, urge sugerir medidas didácticas capazes de melhorar o nosso ensino. Trata-se de modificar o panorama institucional actual, no campo do ensino/aprendizagem, tendo como base as carências detectadas e como perspectiva as competências visadas. Pretende-se que, da análise dos factos, resultem medidas a implementar nas aulas de língua, que desenvolvam nos alunos as competências exigidas no campo social. Não devemos esquecer que à Escola compete formar para a vida, para uma integração plena no mundo profissional. Será, como tal, fundamental que se mantenha atenta às mudanças que a rodeiam, que active as suas capacidades de renovação, para que permaneça à altura dos novos desafios.

19

Vilela, G., «Metamorfose no ensino da escrita, alguma crítica de alguns programas de Português das últimas décadas», in Pedagogia da escrita, perspectivas, Porto, Porto. Ed., 1994, p.50. Salientamos que o programa de 2009, coordenado por Carlos Reis, veio melhorar este quadro.

20

Carvalho, José António, «A escrita nos manuais de Língua Portuguesa», in Escrita percursos de

(21)

20 2- Uma técnica de ensino deficitária

No espaço onde deveria ser trabalhada, a Escola, e mais especificamente a aula de língua, a escrita individual é raramente praticada numa dimensão que exceda a frase. Se uma tarefa mais extensa é pretendida, remete-se para trabalho de casa ou exige-se no teste.

O método convencional, habitualmente seguido ainda hoje no domínio do ensino da escrita, adoptado pelos docentes há décadas, carece de um diálogo explícito entre quem ensina e quem aprende.

De uma forma geral, a composição corresponde ao tipo textual que o docente, mais frequentemente, solicita ao aluno, sobretudo em anos que antecedem o ensino secundário. O tema da mesma poderá estar relacionado com um texto lido, com uma experiência vivenciada pelo aluno, com uma ocorrência experimentada pelo grupo… sendo a prática do tema livre também adoptada, em certos momentos. A proposta de trabalho parte, na maioria dos casos, de quem ministra.

Os alunos são assim colocados diante da página branca, sem que lhes tenham sido comunicadas informações explícitas sobre os mecanismos de organização e de construção textual a adoptar. Estando habituados a uma exploração do texto quase unicamente assente na compreensão da mensagem que o mesmo transmite, não têm um conhecimento claro, objectivo, dos recursos usados pelo autor para comunicar a sua mensagem. Assim, muitos não conseguem interiorizar e consequentemente utilizar, com rapidez, estratégias de escrita que lhes permitam exprimir-se de forma correcta e organizada.

As pistas dadas aos alunos, no contexto da produção textual tradicional, são assim mínimas. No melhor dos casos, os discentes têm, como ponto de partida para a escrita, um tema.

O sistema que promove este método de ensino acredita que é a prática repetida da escrita que conduz ao domínio dos seus mecanismos. Conta assim com uma aprendizagem autónoma e implícita, cujos processos obscuros permanecem inexplicados. Todavia, através deste método, aumenta o mistério que envolve o acto de escrever, na mente daqueles que não apreendem nem dominam as suas regras. Estes tenderão assim a desanimar face a uma actividade geradora de tensão que, provavelmente, não desenvolverão de forma eficaz durante anos, por não saberem, nem lhes ser dito, como melhorar.

(22)

21 Os seus erros estruturais serão repetidos porque, apesar de serem alvo de avaliação não são, habitualmente, assinalados nem corrigidos. Também não é apontado, aos alunos, o caminho para que os evitem. A rectificação do docente limita-se, tradicionalmente, às questões de pontuação ou de ortografia, apesar de se entender que o bom escrevente não é aquele que se cinge ao conhecimento destes saberes. Como observa Manuela Cabral:

«A prática escolar da escrita mais frequente no 3º ciclo básico e no ensino secundário pode ser resumida nas etapas seguintes: o professor solicita um trabalho (…), o aluno produz o texto pedido, entrega-o ao professor, este corrige-o, anota-o, classifica-o e devolve-o ao aluno. Por vezes chama a atenção para um ou outro erro mais grave, geralmente ortográfico ou sintáctico, faz um elogio genérico aos trabalhos melhores, e o aluno guarda o texto, quantas vezes sem ter lido sequer com atenção as anotações ou correcções do professor que, ao fazê-las, teve um trabalho insano totalmente inútil.»21.

Assim, aluno e docente realizam trabalhos isolados, desenvolvidos em momentos e espaços diferentes. O ponto de encontro entre os dois intervenientes limita-se, não raras vezes, ao tempo de leitura que o escrevente deverá dedicar às escassas observações, gerais e/ou pontuais, acrescentadas pelo docente ao trabalho sujeito a avaliação. No caso dos alunos menos preocupados, ou mais desmotivados, como refere Manuela Cabral, a mensagem do docente não terá, provavelmente, qualquer efeito, já que ela poderá não ser sequer lida.

O texto acaba por representar, para o aluno, uma tarefa realizada num momento pontual, de forma habitualmente não planeada e seguida, como se de nada servisse investir em tal trabalho22. Se um momento de releitura ocorre, tem geralmente a função de corrigir possíveis erros ortográficos, de acentuação ou de pontuação, para a qual os docentes frequentemente alertam os alunos. Após a correcção do professor, o trabalho do aluno não costuma ser revisto pelo mesmo, à luz das observações do docente. Assim, como salienta Manuela Cabral, os textos produzidos são unicamente avaliados pelo professor, cuja intervenção ocorre tardiamente, depois de o aluno ter terminado a tarefa de que fora incumbido. Este procedimento clássico, que não contempla a intervenção do docente durante o processo de construção textual, nem coloca o aluno numa situação

21 Cabral, Manuela, «Avaliação e escrita: um processo integrado», in Pedagogia da escrita perspectivas,

Porto, Porto Editora, 1994, p.112.

22

Este procedimento é revelador da ideia de espontaneidade que tão comummente quanto erradamente se associa à prática da escrita.

(23)

22 que lhe permita compreender e corrigir as suas falhas reduz, segundo a autora, as oportunidades de aprendizagem do aluno, tornando inútil a intervenção do professor23. Num trabalho posterior, o aluno cometerá assim os erros apresentados em fases anteriores, e não se questionará sobre eles, porque não chega a tomar consciência de que os comete nem de que existem formas mais correctas de exprimir as ideias expostas. Não consegue olhar para o seu texto com o recuo que a autocorrecção exige, porque nunca presenciou um trabalho de correcção de fundo.

O método habitualmente seguido deve pois ser alterado, se pretendemos efectuar intervenções, nomeadamente ao nível da correcção, capazes de contribuir para o progresso dos alunos no domínio da escrita. Só uma reorganização das actuações permitirá, aos formandos cujas aquisições não são intuitivas, adquirir mecanismos concretos, que lhes possibilitem melhorar os seus textos e compreender que é possível aprender a exprimir-se melhor.

Nesta perspectiva, Manuela Cabral defende que a escrita seja apreciada enquanto processo24, através de uma avaliação formativa e não pelo recurso à avaliação sumativa como, erradamente, a seu e nosso ver, costuma fazer-se. A nossa atenção não deve mais focalizar-se, exclusivamente, no produto final; todo o percurso seguido pelo aluno deve ser tido em consideração, sendo a visibilidade dada ao seu progresso motivo de satisfação e de motivação para o discente. A avaliação contínua parece-nos pois representar aquela que melhor se adequa ao projecto que aqui traçamos, já que permite acompanhar e valorizar uma aprendizagem que deve passar a fazer-se por etapas a definir claramente junto dos discentes. Assim, a investigadora propõe uma fase de explicitação/construção de critérios de escrita, uma segunda de produção/reformulação de textos, uma terceira de avaliação formativa (auto-avaliação e/ou socialização dos textos co-avaliados), seguida de um momento destinado à apresentação de propostas de melhoramento dos textos ou de sessões de estruturação complementar ao projecto de escrita, traçadas em função dos critérios definidos no primeiro momento25.

Os critérios de avaliação da escrita devem, também eles, basear-se em padrões claramente definidos e que acompanhem os ensinamentos e os exercícios anteriormente desenvolvidos. A pedagogia da escrita actual deve, pois, evoluir de acordo com

23 Cabral, Manuela, «Avaliação e escrita: um processo integrado», in Pedagogia da escrita perspectivas,

Porto, Porto Editora, 1994, pp.112, 113.

24

Ibid. P.113.

(24)

23 objectivos claramente definidos, seguindo uma progressão organizada por níveis. É indispensável que o docente saiba exactamente quais são os critérios da escrita sobre os quais incide a sua avaliação, para que os possa trabalhar com os alunos. Só assim estes poderão verdadeiramente compreender quais são os pontos em que apresentam lacunas, que devem como tal exercitar, para que a sua prática da escrita resulte numa progressão efectiva, alcançada de forma consciente, com base num trabalho orientado.

Para corresponder ao que dele se espera, o aluno deve ser claramente esclarecido quanto aos objectivos que deve atingir. Caso contrário, por falta de uma orientação clara, corre um risco elevado de insistir na adopção de um percurso errado, mesmo que possua as capacidades cognitivas necessárias para atingir o nível que o contexto educativo exige. O sucesso do aluno, no domínio da escrita, depende assim, em múltiplos casos, do grau de explicitude com que são apresentados e trabalhados os objectivos a alcançar.

A par de uma maior clareza em todo o processo que envolve a aquisição dos saberes inerentes ao domínio da escrita, será ainda necessário rever o contexto em que a produção escrita ocorre no meio escolar. Geralmente, esta parece só ter sentido no contexto em questão. É elaborada pelo aluno, corrigida pelo professor, para posteriormente ser, no melhor dos casos, arquivada. O trabalho do discente tem assim um alcance prático muito reduzido, o que o leva a desvalorizar a actividade em questão. Não assumindo que a escrita é um instrumento indispensável para a vida no contexto social, não lhe reconhecendo uma utilidade imediata, os alunos desinteressam-se da sua prática, tanto mais que esta lhes exige esforços específicos de um nível elevado.

Assim, torna-se urgente que a relação entre a escrita e o contexto social seja reforçada. Tanto quanto possível, deve evitar trabalhar-se, exclusivamente, a escrita pela escrita. Este procedimento é causa de desmotivação para muitos alunos. Segundo autores como Charolles deve-se pois optar por uma escrita funcional e socializada26. A redacção textual tem um carácter interventivo no meio social, destina-se a um público, devendo ser elaborado em função deste, para garantir a sua compreensão. É pois indispensável que os alunos compreendam este facto e o vivenciem desde cedo, verificando que o tipo de trabalho escrito que desenvolvem tem uma utilidade prática e é um meio de comunicação no qual não deve surgir qualquer espaço para a dúvida ou a

26 Charolles, M., L’analyse des processus rédactionnels: aspects linguistiques, psychologiques et didactiques in «Pratiques», p.49, cit. in Cabral, Manuela, «Avaliação e escrita: um processo integrado», in Pedagogia da escrita perspectivas, Porto, Porto Editora, 1994, pp.119-120.

(25)

24 incompreensão. Nesta perspectiva, será pertinente levá-los a produzir textos cujo destinatário final não seja exclusivamente o docente. Os alunos poderão começar por adquirir o hábito de escrever para a comunidade escolar, através da dinamização de um jornal da turma ou de escola, vindo a divulgar o seu trabalho até junto de uma comunidade mais alargada. Poderão ser dinamizados concursos de escrita, organizados entre turmas ou entre escolas, tendo por base tipologias textuais que vão ao encontro das necessidades dos jovens. O texto de opinião é um campo a explorar junto dos estudantes, dada a possibilidade que lhes confere de aprender a formular, a organizar ideias pessoais e de encontrar mecanismos para as defender de maneira sustentada. Os temas propostos deverão ser adequados ao desenvolvimento cognitivo do aluno. O uso da escrita no campo das novas tecnologias, nomeadamente no mundo da internet, tão apelativa para os jovens, deve também ser trabalhado reforçando, junto destes, o carácter útil e sempre actual, da prática textual. Em contexto de sala de aula, mais comum no domínio escolar, a socialização da escrita pode fazer-se recorrendo à leitura, diante da turma, de um texto produzido por um aluno, que os ouvintes deverão apreciar criticamente, do ponto de vista formal. Assim, o grau de compreensibilidade do documento em causa é testado, consciencializando-se o seu autor das suas fragilidades e criando-se a oportunidade de solicitar propostas de melhoramento textual junto da turma.

O professor desempenhará o papel de animador, no sentido em que deverá propor aos alunos actividades que os cativem, potenciando as probabilidades de estes terem um papel activo no campo da sua própria aprendizagem e de guia, que ajudará o aprendente a atingir o nível exigido no contexto social. Ele será um intermediário a quem caberá a função de preparar para uma integração futura plena. Assim, será conveniente que as actividades de escrita abranjam os diferentes tipos textuais utilizados no meio onde os jovens virão a desempenhar as suas funções enquanto profissionais e cidadãos capazes de opinar e de intervir oralmente, mas também através do uso de uma escrita correcta, segura e eficaz.

(26)

25 3- Procedimentos a adoptar, por parte do professor, no domínio do

ensino da escrita

O trabalho que o professor desenvolve com os seus alunos no campo da escrita tem como objectivo claro melhorar a performance destes no domínio em causa. A estratégia de aperfeiçoamento das aptidões dos discentes deve pois partir das suas características, dos conhecimentos e das dificuldades que apresentam. Assim, antes de iniciar o ensino da escrita, será necessário que o professor faça um diagnóstico da situação em que se encontra o grupo, e cada elemento que o constitui, para que defina prioridades e estratégias de acção adequadas ao contexto em causa. Como refere Aida Santos, é necessário partir do real para traçar estratégias pedagógicas viáveis, cessando assim uma prática corrente, em que a falta de correspondência entre o que os professores apontam como mais necessário e aquilo de que se ocupam durante as aulas é notória e generalizada27.

O trabalho de contextualização, que deve anteceder a acção do docente, implica a observação de diversos domínios, pertencentes tanto ao plano geral como particular.

A caracterização do meio físico e humano onde se insere o grupo com o qual o docente trabalhará (tendo em conta a localidade onde se situa a escola, a dinâmica da própria instituição, da turma, o ano em que se encontram os alunos, a sua idade, o contexto social e familiar em que vivem…)28 é essencial para que este compreenda os interesses, as dificuldades, as expectativas e necessidades do seu público. No campo específico da língua, será ainda necessário verificar qual o nível de conhecimento que os alunos têm da mesma nos domínios da compreensão e da expressão escrita e oral, será preciso compreender qual destas áreas apresenta maiores dificuldades para os discentes e quais os aspectos particulares, de cada uma delas, que maiores entraves apresentam.

Só um diagnóstico atento e completo permitirá, ao docente, detectar e compreender os potenciais e as limitações dos elementos que se lhe apresentam, por forma a que venha a traçar estratégias de ensino adequadas ao contexto, capazes de promover o sucesso dos alunos a seu cargo29. Este trabalho de análise não deve limitar-se às primeiras oblimitar-servações, deve antes proslimitar-seguir e pormenorizar-limitar-se ao longo do tempo

27

Santos, Aida, «A escrita no ensino secundário», in Pedagogia da escrita perspectivas, Porto, Porto Editora, 1994, p.27.

28 Esta contextualização será introduzida na segunda parte do nosso trabalho. 29

Figueiredo, Olívia, «Escrever: da teoria à prática», in Pedagogia da escrita perspectivas, Porto, Porto Editora, 1994, pp.160, 161.

(27)

26 dedicado ao ensino/aprendizagem. Os textos produzidos pelos alunos serão uma rica fonte de análise dos problemas que os mesmos apresentam, ou vão corrigindo, em termos de escrita, permitindo traçar planos de intervenção ajustados.

As deficiências de escrita apresentadas pelos alunos com dificuldades são frequentemente semelhantes. À margem dos erros de pontuação, de acentuação e de ortografia, sobejamente referidos e habitualmente assinalados e até corrigidos pelos professores, surgem outros, habitualmente menos salientados, que se prendem com a construção textual. Os alunos revelam dificuldades em traçar e organizar subtemas, a partir de uma dada temática. Frequentemente, limitam-se a referir repetidas vezes a mesma ideia, apresentada de forma diferente, construindo textos que não apresentam uma estrutura evolutiva lógica e clara, como seria de esperar. Devem pois ser levados a alargar o seu horizonte mental, para verificarem que cada assunto suscita diversas perspectivas, diferentes problemáticas que interessa assinalar e discutir, de acordo com as normas estabelecidas para o realizar eficazmente, fazendo impreterivelmente evoluir a informação textual.

É-lhes penoso encontrar e organizar ideias, mas também estabelecer ligações entre elas. Assim, torna-se essencial trabalhar com os discentes o uso dos conectores, para que as suas reflexões sejam apresentadas de forma mais clara e coesa, revelando expressamente o tipo de relação que o autor pretende estabelecer entre elas. O ensino das conjunções e de outros articuladores discursivos é, neste contexto, pertinente.

As repetições são, também elas, frequentes, e devem ser evitadas através de um trabalho de sensibilização para identificação das mesmas e o recurso ao uso de pronomes, de sinónimos, de hipónimos, de hiperónimos, de paráfrases, consoante os casos, ou seja, de elementos anafóricos que confiram coesão ao discurso.

O ensino da gramática deve enquadrar-se no contexto da procura de um discurso correcto. Esta área do conhecimento, tantas vezes tida pelos alunos como enfadonha e estéril, surge assim no seu aspecto utilitário. Ela passa a ser sentida como algo necessário, aumentando as probabilidades de uma rápida aquisição por parte dos aprendentes. No contexto exposto, a gramática apresenta-se como um saber ao serviço de um projecto de dimensão superior: o discurso. Mais importante do que memorizar conceitos, é assim prioritário conhecê-los, saber usá-los, estando ciente das mais-valias que a gramática representa, quando se procura adquirir uma expressão nítida e

(28)

27 aprazível30. Todavia, se o texto é utilizado como ponto de partida para a consciencialização da importância que o conhecimento gramatical representa no contexto da correcção do erro, a prática sistematizada de exercícios gramaticais não deixa de ser aconselhada, desde que devidamente enquadrada. Esta medida permitirá reforçar, pela realização de exercícios específicos, conhecimentos que devam ser adquiridos, contrariando reflexos linguísticos incorrectos. O número de pontos gramaticais a exercitar, em cada sessão, deve no entanto ser limitado, para que a quantidade de conhecimentos a adquirir não ultrapasse as capacidades do aluno, correndo o risco de o fazer atingir um nível indesejado de saturação. Benjamim Moreira sugere, a nosso ver acertadamente, que sejam seleccionados unicamente, em cada aula, alguns pontos, dando prioridade aos erros mais comummente cometidos e apresentando estratégias pedagógicas adequadas para os corrigir31. Entende-se assim que estas devam dar a conhecer aos alunos a regra em falta e permitir-lhes exercitar o conceito em causa, através da sua aplicação repetida, em contextos diferentes.

A rápida e sólida aquisição de conhecimentos é, em grande medida, determinada pelo grau de necessidade, que o indivíduo vivencia, relativamente a esses mesmos saberes32. Cabe pois ao professor consciencializar o aluno para a importância de uma escrita isenta de ambiguidades, uma vez que só esta atingirá o seu objectivo. A escrita destina-se a ser lida, como tal o escrevente deve preocupar-se em facilitar a tarefa daquele que pretende alcançar. É necessário que aprenda a colocar-se na situação do leitor, que adquira a capacidade de recuo necessária para poder testar o nível de clareza do seu discurso e melhorá-lo, clarificando-o, sempre que necessário. Esta capacidade pode ser desenvolvida através do recurso ao trabalho de pares, sendo cada aluno convidado a ler o trabalho de um colega, questionando o autor do texto, sempre que este apresente informações em falta, geradoras de incoerência e, consequentemente, de dúvidas por parte do leitor. Esta prática, para além de desenvolver o espírito analítico dos discentes (numa primeira fase em relação aos colegas para que posteriormente o saibam fazer em relação a si, já que lhes é naturalmente mais fácil detectar erros de outrem do que os seus) e de os consciencializar para a dificuldade que representa ler

30 Cabral, Manuela, «Avaliação e escrita: um processo integrado», in Pedagogia da escrita perspectivas,

Porto, Porto Editora, 1994, pp. 109-111.

31 Moreira, Benjamim, Para escrever melhor, ESE-IPVC, 2007, P.65.

32 Schneuwly refere a necessidade de a criança sentir o conhecimento da escrita como indispensável para

que a sua motivação seja potenciada. Schneuwly, B., La conception vygotskienne du langage écrit, «Etudes de Linguistique Appliquée», nº73, 1989.

(29)

28 textos deficientes, corresponde a um momento de quebra na rotina escolar, dado que os alunos passam, durante o desenrolar da sua actividade crítica, de orientandos a orientadores, adquirindo novo ânimo.

Assim, o discente deve ser levado a compreender que a escrita não representa o mero resultado da intuição ou da inspiração, que só alguns privilegiados possuem, e que surge, desde a primeira versão, no seu estado mais perfeito. Ela é, antes de mais, o produto da conjugação e aplicação de saberes concretos, pertencentes a diversos domínios, que é possível e necessário distinguir, adquirir, treinar e melhorar. Perante esta perspectiva, a prática da reescrita deve passar a ser encarada como indispensável. Esta actuação, posterior à intervenção de um leitor crítico, que numa fase inicial será representado pelo professor, e numa fase avançada, de escrita autónoma, pelo próprio escrevente, visará o melhoramento progressivo do texto, a realizar por etapas, começando com questões relacionadas com a correcção frásica (verificação da ortografia, da acentuação, da pontuação, da sintaxe), para posteriormente tratar aquelas que se prendem com a chamada gramática do texto (verificação da aplicação das normas próprias do género textual, levantamento e correcção de repetições, redundâncias, organização textual evolutiva, ligação entre as diferentes ideias apresentadas)33. O processo de escrita em várias fases, através da reformulação textual, permitirá despertar nos discentes, como refere Fernanda Irene Fonseca, uma maior consciência dos problemas que a produção escrita implica e activar as suas capacidades para os resolver34.

Numa fase de aprendizagem, é essencial que o aluno seja orientado pelo docente durante todo o processo de redacção. Só uma prática capaz de confirmar a teoria virá a validar a mesma. Com a ajuda do docente, o aluno compreenderá que é possível melhorar a sua produção escrita, e verá que existem mecanismos concretos para o fazer, ao acompanhar os passos claramente indicados ou até exemplificados pelo docente.

Uma vez que a escrita, tendo em conta o domínio do texto, é uma prática altamente regulamentada, não deve ser pedido ao aluno que se limite a seguir a sua imaginação, utilizando uma linguagem adequada, para realizar a tarefa solicitada. Existem diversos tipos textuais, cada um deles obedecendo a normas instituídas35. É

33

Chiss, Jean-Louis, «Articulation langue/textes (grammaire/écriture)», in Lauret, J. P., Chriss, J-L. (Dir.), Apprendre/enseigner à produire des testes écrits, Bruxelles, De Boeck-Wesmael s.a., 1988, p.100.

34 Fonseca, F. I., Pedagogia da escrita perspectivas, Porto, Porto Editora, 1994, p.12. 35

Cabral, Manuela, «Avaliação e escrita: um processo integrado», in Pedagogia da escrita perspectivas, Porto, Porto Editora, 1994, pp.114, 115. Sobre o exercício da escrita baseado em tipologias textuais,

(30)

29 pois necessário que os alunos as adquiram. Para tal, devem ser levados a construir o seu conhecimento, já que esta é a forma mais viável de consolidação e assimilação do mesmo. As normas da escrita podem ser identificadas pelos discentes, através de uma análise, orientada pelo docente, de um ou mais textos característicos do género que se pretenda trabalhar. É necessário que os alunos aprendam a desconstruir um texto dado, para verificarem o seu processo de funcionamento. É fundamental que aprendam a desligar-se do conteúdo para melhor verem a forma36. Assim, saberão quais os mecanismos que terão de adoptar, para realizarem a sua própria produção. Em função do género de texto que venham a escrever, serão conhecedores das regras que terão de seguir e da parte de criatividade que o mesmo lhes concede. É essencial desenvolver, gradualmente, nos alunos, capacidades de análise e de aquisição autónoma dos conhecimentos. Só assim se garante a sua progressão para além do período em que se encontrem integrados no sistema educativo, assegurando-lhes capacidades necessárias para progredirem ao longo de toda a sua existência, e para se adaptarem às mudanças que possam vir a encontrar. As metodologias modernas, nas mais diversas áreas, como no domínio da língua, querem-se activas e dinâmicas, visando o desenvolvimento cognitivo dos alunos, que pretendem autonomizar. No domínio da escrita, salienta-se a importância de desenvolver capacidades de uma leitura orientada no sentido da identificação de estruturas, uma vez que a escrita e a leitura, devidamente conjugadas, representarão uma mais-valia para um progresso mútuo. Aida Santos defende:

«(…) leitura e escrita vão-se construindo mutuamente, numa aprendizagem paralela que essa mesma interacção sustenta. Explorar, por exemplo, no decurso da leitura, o processo de enunciação, verificando as suas marcas (…), pode servir projecções muito úteis à escrita.»37.

A escrita deve pois ser preparada, fazendo-se preceder de uma fase de leitura, mas também de pré-escrita, onde as normas do género em causa devem ser claramente apresentadas ou relembradas. Nesta etapa, traçar-se-á uma estrutura textual que respeite o género solicitado, onde constarão, de forma sumária mas organizada, os pontos a

Manuela Cabral refere os autores Adam (Quel type de textes?, in «Le Français dans le Monde», 1985, p.192) e Amor (Sobre a exploração didáctica das tipologias de texto, in «Actas do Seminário Internacional – Português como Língua Estrangeira», Macau, 1991).

36

Como refere Olívia Figueiredo, o importante não é o que o texto diz, mas como o diz. Figueiredo, Olívia, «Escrever: da teoria à prática», in Pedagogia da escrita perspectivas, Porto, Porto Editora, 1994, p.159.

37

Santos, Aida, «A escrita no ensino secundário», in Pedagogia da escrita perspectivas, Porto, Porto Editora, 1994, p.41.

(31)

30 desenvolver na fase de redacção (experiência pessoal, leituras realizadas ou outras fontes). Indo ao encontro do exposto, Manuela Cabral distingue três fases no processo de escrita: a pré-escrita, a formalização da escrita e a reescrita, considerando o processo de maior importância que o produto em si38. Apoiando-se num estudo de Garcia-Debanc baseado no modelo de Hayes e de Flower (1981), a autora refere que só uma exposição clara de todos os mecanismos e etapas que a escrita inclui (tendo em conta operações de planificação, de textualização e de revisão), seguida de uma manipulação activa de todos os processos, devidamente acompanhada pelo docente, poderá despertar o interesse dos alunos pela escrita, que assim lhes parecerá mais compreensível e como tal mais acessível39.

Numa fase de aprendizagem, será de evitar a escrita livre que, na ausência de conhecimentos sólidos, lança os alunos para o desconhecido40, sem lhes trazer saberes concretos que lhes permitam evoluir de acordo com o pretendido. Solicitar dos alunos aquilo que não se lhes ensinou poderá acarretar frustração e desânimo, sentimentos contrários aos que uma actividade complexa como a escrita exige. Inversamente ao que as práticas tradicionais preconizavam, a escrita livre será pois um exercício mais apropriado para peritos do que para iniciantes. Deve assim ser afastada das práticas lectivas correntes, já que procuramos hoje, essencialmente, formar escreventes competentes, capazes de redigir textos funcionais e não escritores de elite. Como constatam Hélène Romian e Frank Marchand, a escrita não é forçosamente literária, erudita, pode também ser objectiva, directa, em determinados contextos, mantendo o seu valor41. Devemos alargar o leque de registos e de situações de escrita pois, segundo os autores referidos:

« (…) une assimilation par trop étroite de l’écrit à un genre sérieux, austère, complexe, excluant toute spontanéité, outre son caractère appauvrissant, n’est peut-être pas étrangère à ces

38

Cabral, Manuela, «Avaliação e escrita: um processo integrado», in Pedagogia da escrita perspectivas, Porto, Porto Editora, 1994, pp.113, 114.

39 Ibid., pp.117, 118. Conf. Garcia-Debanc, C., Une évaluation formative en pédagogie de l’écriture, in

«Pratiques», 44, Dezembro 1984.

40 Cabral, Manuela, «Avaliação e escrita: um processo integrado», in Pedagogia da escrita perspectivas,

Porto, Porto Editora, 1994, p.115.

41 Romian, Hélène, Marchand, Frank, «Présupposés des pratiques scolaires de production de textes

écrits», in Laurent, J-P., Chriss, J-L. (Dir.), Apprendre/enseigner à produire des textes écrits, Actes du

3ème colloque international de didactique du français Namur 09-1986, Bruxelles, De Boeck, 1988, pp. 91,

(32)

31

situations de blocage face à l’écrit que l’on observe – trop souvent – tant chez l’adulte que chez l’enfant.»42.

Os conteúdos trabalhados, em termos de escrita, no contexto escolar devem, pois, aproximar-se do contexto real, prático. Só assim conseguiremos corresponder às necessidades de formação requeridas pela sociedade actual, conferindo às aulas de língua a importância que merecem e garantindo maior entusiasmo, adesão e sucesso por parte dos discentes.

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