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As palavras funcionais na chamada fala telegráfica em enunciados de sujeitos afásicos

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Academic year: 2021

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(1)

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

ARNALDO RODRIGUES DE LIMA

AS PALAVRAS FUNCIONAIS NA CHAMADA FALA

TELEGRÁFICA EM ENUNCIADOS DE SUJEITOS AFÁSICOS

CAMPINAS,

2017

(2)

ARNALDO RODRIGUES DE LIMA

AS PALAVRAS FUNCIONAIS NA CHAMADA FALA TELEGRÁFICA

EM ENUNCIADOS DE SUJEITOS AFÁSICOS

Dissertação de mestrado apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestre em Linguística.

Orientadora: Profa. Dra. Rosana do Carmo Novaes Pinto

Este exemplar corresponde à versão final da Dissertação defendida pelo aluno

Arnaldo Rodrigues de Lima e orientada pela Profa. Dra. Rosana do Carmo Novaes Pinto.

CAMPINAS,

2017

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Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): FAPESP, 15/07238-8

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Estudos da Linguagem

Crisllene Queiroz Custódio – CRB 8/8624

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Function words in the so-called telegraphic speech in aphasic subjects’ utterances. Palavras-chave em inglês: Neurolinguistics Aphasia Aphasiacs Speech Language disorders Order (Grammar)

Área de Concentração: Linguística Titulação: Mestre em Linguística Banca Examinadora:

Rosana do Carmo Novaes Pinto [Orientador] Marcus Vinícius Borges Oliveira

Mirian Cazarotti Pacheco Data da defesa: 27-06-2017

Programa de Pós-Graduação: Linguística Lima, Arnaldo Rodrigues de, 1990-

L628p As palavras funcionais na chamada fala telegráfica em enunciados de sujeitos afásicos / Arnaldo Rodrigues de Lima. – Campinas, SP: [s.n], 2017. Orientador: Rosana do Carmo Novaes Pinto.

Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem .

1. Neurolinguística. 2. Afasia. 3. Afásicos. 4. Fala. 5. Distúrbios da

linguagem. 6. Ordem (Gramática). I. Novaes-Pinto, Rosana do Carmo, 19961-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Linguagem. III. Título.

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BANCA EXAMINADORA:

Rosana do Carmo Novaes Pinto

Marcus Vinícius Borges Oliveira

Mirian Cazarotti Pacheco

Maria Irma Hadler Coudry

Roberto Gomes Camacho

IEL/UNICAMP

2017

Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no

processo de vida acadêmica do aluno.

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DEDICATÓRIA

À minha mãe, por eu tê-la deixado chorando na rodoviária quando resolvi sair de casa para estudar e, segundo ela, “ganhar o mundo”

Mãe, sem seu apoio teria sido impossível!

À Rosana Novaes Pinto, por ter me acolhido de braços abertos, por ter me orientado, me ensinado e me apoiado desde o princípio, até quando nem mesmo eu acreditava que seria possível.

Rosana, o resultado desta pesquisa é uma singela homenagem ao seu incansável esforço e brilhante trabalho em solidificar a Neurolinguística enunciativo-discursiva. Se eu for a metade do pesquisador que você é, ficarei imensamente realizado!

(6)

AGRADECIMENTOS

À minha mãe, que sempre me incentivou a continuar estudando. Mãe, aprendo muito com você, nos mínimos detalhes. Obrigado por me ensinar a ser gente!

Aos meus irmãos, Mickaelly, Danielle e Juliano, que sempre se mostraram compreensivos com a minha ausência. E aos meus pequenos, João Pedro e Maria Júlia, por não se importarem de eu os estar vendo crescer por fotos e vídeo-chamadas. O tio ama vocês! À Rosana pela orientação, cuidado e carinho. Enquanto tudo era não, você me presenteou com o seu sim. Desde então, tenho aprendido com você a fazer pesquisa com paixão, responsabilidade e ética.

Aos meus queridos amigos Ricardo Régis, Wanessa Oliveira e Weber Júnio, por sempre terem me apoiado estando de alguma forma presentes na minha vida, apesar da distância. À Enia Pereira, que tem sido meu anjo da guarda desde a primeira vez que eu coloquei os pés em Campinas. Obrigado, por tudo!

Aos irmãos que a vida me deu – Sérgio Maciel e Lucas Allan. Sem vocês ao meu lado, toda essa experiência teria sido bem mais dolorosa. Vocês tornaram tudo um pouco mais leve e harmonioso. Obrigado por terem rido e chorado comigo.

À Milena Nicolas, por ter sido a minha fada madrinha.

Ao meu amigo Márcio Mesquita, que sempre me incentivou e apoiou no que foi preciso. Ao meu amigo Bernardo Mendes Ribeiro, por ter sempre se preocupado com meu bem-estar e tentado ao máximo que pôde minimizar os impactos da minha falta de grana. Obrigado por ter me alimentado!

Às minhas queridas Ana Carolina, Déborah Rangel, Brenda Hada, Gisa, Tereza Rosa e Marisa Araújo, por todos os momentos inesquecíveis que passamos juntos.

À Juliana Carvalho, pelos seus fortes e calorosos abraços.

Ao meu amigo Felipe Nascimento, por compartilhar tanta coisa boa comigo e tornar tudo um pedacinho do céu.

Ao meu grande amigo Sérgio Toledo, que como um irmão mais velho cuidou de mim sempre estando a postos para me fazer companhia quando o medo, a solidão e a saudade de casa me assolavam.

Aos amigos que o IEL me deu, Vinicius Castro, Ricardo Bezerra, Flávio Benayon, Júlia Rosa, Mirielly Ferraça, Lilian Braga e Renata Ortiz-Brandão. Vocês farão parte das minhas mais doces memórias.

Ao querido Alberto Fernando, o Bebetinho, por ser tão fofo, companheiro e presente na minha vida.

(7)

Ao meu querido amigo Guilherme Rodrigues, o Gui, por todo companheirismo, carinho, cuidado e atenção. Fico imensamente feliz que as nossas vidas tenham se cruzado.

À Angelina e Ananias, pelo imenso carinho e pelos conselhos. Vocês são indescritíveis! Ao Lucas Lommez, por ter me ajudado tanto e por sempre ter me feito sentir melhor nos momentos de angústia e incerteza.

Ao meu amigo Eduardo Barbosa, o Cajuru, por ter sido um dos meus portos fortes desde que cheguei em Campinas.

Aos amigos que fiz na Alfredianes: Yeda Endrigo, Emerson Andrade, Felipe Nepomuceno, e Igor Moraes por terem convivido com os meus livros espalhados na mesa da cozinha e por me terem feito companhia madrugada adentro durante a escrita deste trabalho.

À professora Gláucia Vieira Cândido, por ter me convencido de que a UNICAMP era um sonho possível – você não sabe o quanto me influenciou com o seu exemplo de professora! Aos Profs. Drs. Mirian Cazarotti Pacheco e Marcus Vinícius Borges de Oliveira, por toda contribuição para o desenvolvimento desta pesquisa, por ocasião do exame de qualificação. Aos parceiros e amigos do GELEP, Thalita, Larissa, Mirian, Maira, Diana, Nívia e João Pedro por sempre terem compartilhado comigo o que vocês têm de melhor.

Ao Professor Marco Antônio Machado, por ter me proporcionado a primeira oportunidade de desenvolver uma pesquisa em Linguística.

A todos os sujeitos afásicos que frequentam o Grupo 3 do CCA, por terem despertado o meu lado mais humano. Tenho aprendido muito com vocês e prometo continuar fazendo cafezinhos.

Aos sujeitos GB, BM, BS e TR, por terem aceitado participar desta pesquisa. À TR, por ter me dado seu sorriso todas às terças feiras de manhã.

À Francis, da Secretaria de Projetos, que sempre esteve disposta a me ajudar em tudo o que foi necessário, com toda a burocracia envolvida nesta pesquisa.

À Rose – in memorian – por tantas vezes ter me recepcionado no corredor do pavilhão dos docentes com o seu sereno e carinhoso “bom dia!” – Saudades e ótimas lembranças foi o que me restou.

Ao Matheus Schimidt, Henrique Alves e Felipe Martinelli, em extensão a todos da Gamux, por terem contribuído e enriquecido o trabalho que fazemos no CCA. Obrigado por terem aceitado o convite e o desafio!

(8)

A menina sem palavra Mia Couto

A menina não palavreava. Nenhuma vogal lhe saía, seus lábios se ocupavam só em sons que não somavam dois nem quatro. Era uma língua só dela, um dialecto pessoal e intransmissível? Por muito que se aplicassem, os pais não conseguiam percepção da menina. Quando lembrava as palavras ela esquecia o pensamento. Quando construía o raciocínio perdia o idioma. Não é que fosse muda. Falava em língua que nem há nesta actual humanidade. Havia quem pensasse que ela cantasse. Que se diga, sua voz era bela de encantar. Mesmo sem entender nada as pessoas ficavam presas na entonação. E era tão tocante que havia sempre quem chorasse.

Seu pai muito lhe dedicava afeição e aflição. Uma noite lhe apertou as mãozinhas e implorou, certo que falava sozinho:

— “Fala comigo, filha!”

Os olhos dele deslizaram. A menina beijou a lágrima. Gostoseou aquela água salgada e disse:

— “Mar”…

O pai espantou-se de boca e orelha. Ela falara? Deu um pulo e sacudiu os ombros da filha. “Vês, tu falas, ela fala, ela fala!” Gritava para que se ouvisse. “Disse mar, ela disse mar”, repetia o pai pelos aposentos. Acorreram os familiares e se debruçaram sobre ela. Mas mais nenhum som entendível se anunciou.

O pai não se conformou. Pensou e repensou e elaborou um plano. Levou a filha para onde havia mar e mar depois do mar. Se havia sido a única palavra que ela articulara em toda a sua vida seria, então, no mar que se descortinaria a razão da inabilidade.

A menina chegou àquela azulação e seu peito se definhou. Sentou-se na areia, joelhos interferindo na paisagem. E lágrimas interferindo nos joelhos. O mundo que ela pretendera infinito era, afinal, pequeno? Ali ficou simulando pedra, sem som nem tom. O pai pedia que ela voltasse, era preciso regressarem, o mar subia em ameaça.

— “Venha, minha filha!”

Mas a miúda estava tão imóvel que nem se dizia parada. Parecia a águia que nem sobe nem desce: simplesmente, se perde do chão. Toda a terra entra no olho da águia. E a retina da ave se converte no mais vasto céu. O pai se admirava, feito tonto: por que razão minha filha me faz recordar a águia?

— “Vamos filha! Caso senão as ondas nos vão engolir”.

O pai rodopiava em seu redor, se culpando do estado da menina. Dançou, cantou, pulou. Tudo para a distrair. Depois, decidiu as vias do facto: meteu

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mãos nas axilas dela e puxou-a. Mas peso tão toneloso jamais se viu. A miúda ganhara raiz, afloração de rocha?

Desistido e cansado, se sentou ao lado dela. Quem sabe cala, quem não sabe fica calado? O mar enchia a noite de silêncios, as ondas pareciam já se enrolar no peito assustado do homem. Foi quando lhe ocorreu: sua filha só podia ser salva por uma história! E logo ali lhe inventou uma, assim:

Era uma vez uma menina que pediu ao pai que fosse apanhar a lua para ela. O pai meteu-se num barco e remou para longe. Quando chegou à dobra do horizonte pôs-se em bicos de sonhos para alcançar as alturas. Segurou o astro com as duas mãos, com mil cuidados. O planeta era leve como um baloa.

Quando ele puxou para arrancar aquele fruto do céu se escutou um rebentamundo. A lua se cintilhaçou em mil estrelinhações. O mar se encrispou, o barco se afundou, engolido num abismo. A praia se cobriu de prata, flocos de luar cobriram o areal. A menina se pôs a andar ao contrário de todas as direcções, para lá e para além, recolhendo os pedaços lunares. Olhou o horizonte e chamou:

— “Pai!”

Então, se abriu uma fenda funda, a ferida de nascença da própria terra. Dos lábios dessa cicatriz se derramava sangue. A água sangrava? O sangue se aguava? E foi assim. Essa foi uma vez.

Chegado a este ponto, o pai perdeu voz e se calou. A história tinha perdido fio e meada dentro da sua cabeça. Ou seria o frio da água já cobrindo os pés dele, as pernas de sua filha? E ele, em desespero:

— “Agora, é que nunca”.

A menina, nesse repente, se ergueu e avançou por dentro das ondas. O pai a seguiu, temedroso. Viu a filha apontar o mar. Então ele vislumbrou, em toda extensão do oceano, uma fenda profunda. O pai se espantou com aquela inesperada fractura, espelho fantástico da história que ele acabara de inventar. Um medo fundo lhe estranhou as entranhas. Seria naquele abismo que eles ambos se escoariam?

— “Filha, venha para trás. Se atrase, filha, por favor”…

Ao invés de recuar a menina se adentrou mais no mar. Depois, parou e passou a mão pela água. A ferida líquida se fechou, instantânea. E o mar se refez, um. A menina voltou atrás, pegou na mão do pai e o conduziu de rumo a casa. No cimo, a lua se recompunha.

— “Viu, pai? Eu acabei a sua história!”

E os dois, iluaminados, se extinguiram no quarto de onde nunca haviam saído.

(10)

RESUMO

Uma das razões para a Linguística se debruçar sobre as alterações de linguagem nas patologias é que os dados advindos deste campo ajudam a corroborar e a refutar hipóteses sobre seu funcionamento em estados normais. Dentre os tipos de afasia mais estudados está o agramatismo – seja entendido como sintoma ou síndrome –, caracterizado pela presença da fala telegráfica, objeto central desta pesquisa. Na literatura neuropsicológica, agramatismo e fala telegráfica estão associados à afasia de Broca. Os estudos dessa categoria enfatizam as perdas na linguagem verbal, relativas às categorias funcionais: preposições, artigos, conjunções, bem como à morfologia flexional e derivacional. As classes abertas estariam relativamente preservadas: substantivos, adjetivos, alguns advérbios e a forma infinitiva dos verbos. Para Jakobson, o agramatismo se configura como um protótipo das afasias de combinação, mas apontamos também que há dificuldades relativas à seleção das palavras funcionais. Avaliamos, também, as hipóteses de Vygotsky, Luria, Leontiev e Akhutina sobre o papel crucial da linguagem interna para a produção dos enunciados e, sobretudo, as hipóteses desta autora sobre a relação entre a linguagem interna e a produção dos enunciados telegráficos. A pesquisa foi desenvolvida integrando pressupostos teórico-metodológicos de diferentes áreas (i) Neurolinguística enunciativo-discursiva, (ii) as abordagens Neuropsicológicas sócio-histórico-culturais e (iii) a Gramática Funcional. O trabalho teve como principal objetivo refletir sobre as dificuldades de sujeitos afásicos não-fluentes com as palavras funcionais, visando compreender a fala telegráfica – que passamos a conceber como enunciado de estilo telegráfico – e, também, avaliar as hipóteses explicativas acerca das variações entre os casos e as que ocorrem nas produções de um mesmo sujeito. Para atingirmos este objetivo, buscamos analisar, por meio da pesquisa qualitativa de cunho microgenético, enunciados de estilo telegráfico produzidos por quatro sujeitos afásicos (BM, BS, TR e GB) que participam das sessões coletivas e individuais do Grupo 3 do Centro de Convivência de Afásicos (CCA/IEL/UNICAMP). Os episódios dialógicos entre afásicos e não-afásicos foram vídeo-filmados, registrados em diário e discursivamente transcritos. Além da observação dos episódios nas sessões coletivas do CCA. Outros dados foram obtidos por meio do uso de expedientes de caráter metalinguístico. Nas análises nos interessou, sobretudo, compreender as estratégias alternativas desses sujeitos nos processos de significação – isto é, como lidam com a estruturação dos enunciados, face às dificuldades com a produção das palavras funcionais. Concluímos que as abordagens dos autores da vertente sócio-histórico-cultural acima referidos e, principalmente, a reflexão de Akhutina contribuem para a compreensão dos processos envolvidos na produção dos enunciados telegráficos ao considerarem tanto os aspectos neurofisiológicos e as áreas impactadas pela lesão quanto os aspectos neuropsicológicos, com ênfase na linguagem – na produção de enunciados em situações dialógicas e em seu papel mediador e organizador das demais funções cognitivas e do desenvolvimento e organização do pensamento. Acreditamos que esta dissertação possa contribuir também para a prática clínica com sujeitos afásicos, bem como para os estudos sobre as dificuldades de encontrar palavras, tema central de projetos no âmbito do GELEP (Grupo de Estudo da Linguagem no envelhecimento e nas patologias).

Palavras-chave: Neurolinguística. Afasia. Afásicos. Fala. Distúrbios da linguagem. Ordem

(11)

ABSTRACT

One of the reasons that explain the interest of Linguistics on language changes in pathologies is that data from this field help either to corroborate or refute hypotheses about language functioning in the so-called normal states. Agrammatism is one of the most studied types of aphasia, either if taken as a symptom or as a syndrome. It has been described, more specifically, by the presence of a telegraphic speech, which is the central object of analysis of this research. In neuropsychological literature, agrammatism and telegraphic speech are associated with Broca's aphasia. The studies on this category emphasize losses in verbal language, especially regarding the functional categories: prepositions, articles, conjunctions and the inflectional and derivational morphology. Open classes are usually relatively preserved: nouns, adjectives, adverbs and the infinitive form of the verbs. For Jakobson, agrammatism is a prototype of aphasia involving difficulties of combining linguistic elements in the structuring of an utterance. However, we question whether the most relevant difficulties would not be with the selection of functional words. We also evaluated the hypotheses of Vygotsky, Luria, Leontiev and Akhutina about the crucial role of the inner language to the construction of an utterance and, especially, Akhutina’s hypothesis about the relation between the inner language and the telegraphic utterances production. This research was developed articulating theoretical and methodological assumptions of different fields (i) Enunciative-discursive Neurolinguistics, (ii) the socio-historical-cultural neuropsychological approaches, and (iii) Functional Grammar. The work specially aims to reflect on the non-fluent aphasic subjects difficulties with the functional words in order to understand the telegraphic speech – which we began to refer as telegraphic style utterances – and, also, to evaluate Akhutina’s explanatory hypotheses about the variations of this phenomenon among the subjects and those that occur in the productions of each subject. In order to reach its goals, we evaluated – through the microgenetic qualitative research paradigm – telegraphic style utterances produced by four aphasic subjects (BM, BS, TR and GB) who attend both group meetings and individual speech therapy sessions at Centro de Convivência de Afásicos (CCA/IEL/UNICAMP). All the interactive episodes among aphasic and non-aphasic subjects were video-recorded, registered in diaries and, subsequently, discursively transcribed. Besides observing events in the group sessions of CCA, other data were obtained through metalinguistic instruments. In the analysis we were interested, above all, in understanding the alternative strategies in meaning processes – that is, how they deal with language structures in their utterances – given their difficulties with the functional words. We concluded that the approaches of the socio-historical-cultural representatives and, mainly, the reflections of Akhutina, contribute to the understanding of the processes involved in the production of telegraphic utterances, once they consider both the physiological aspects and the brain areas impacted by the lesions, as well as the neuropsychological aspects, with emphasis on language – in the production of utterances in dialogical situations and its mediating role for the development of other cognitive functions and for the development and organization of thought. We believe that this research may also contribute to the clinic practice with aphasic subjects as well as for a broader study about the Word Finding Difficulties, a central theme for the studies in the scope of GELEP (Study Group of Language in Aging and in Pathologies).

(12)

SUMÁRIO

Introdução

15

Capítulo 1

Fala telegráfica: uma reflexão no campo da

Neurolinguística enunciativo-discursiva

18

1. A Neurolinguística enunciativo-discursiva... 18

1.1 Sobre a indeterminação da linguagem e a subjetividade nos estudos das afasias... 21

2. A fala telegráfica no contexto da semiologia das afasias... 22

2.1. A semiologia das afasias: produto da reflexão teórico-metodológica sobre a relação cérebro-linguagem... 22

2.2. A relação entre fala telegráfica e agramatismo... 24

3. O agramatismo no contexto dos estudos neurolinguísticos de orientação enunciativo-discursiva... 31

4. Jakobson e a caracterização das alterações sintagmáticas: o agramatismo como protótipo da afasia de combinação ou sintagmática... 33

Capítulo 2

A contribuição do paradigma funcionalista para o estudo dos

enunciados de estilo telegráfico

37 1. O paradigma funcional como opção teórico-metodológica de investigação do enunciado de estilo telegráfico... 37

1.1.A relação entre léxico e a sintaxe na Gramática Funcional... 46

1.1.1. Uma visão funcionalista do conceito de palavra e de suas classes... 46

2. As palavras funcionais e a fala telegráfica... 51

2.1.As preposições... 52

2.2.As conjunções... 54

2.3.Os artigos... 56

2.4.As flexões verbais... 56

3. O paradigma funcional e a Neurolinguística enunciativo-discursiva: pontos de encontro... 58

4. A contribuição dos conceitos bakhtinianos para a abordagem dos enunciados de estilo telegráfico... 60

4.1. De fala telegráfica para enunciado de estilo telegráfico: uma movimentação (semiológica) necessária... 60

4.1.1. O conceito de dialogia... 61

4.1.2. Enunciado: a unidade de comunicação verbal... 61

4.1.3. O conceito de acabamento... 62

(13)

Capítulo 3

A relação entre fala interna e a produção do

enunciado de estilo telegráfico

64

1. A contribuição da abordagem sócio-histórico-cultural para o estudo do

enunciado telegráfico... 64

1.1. Do pensamento abstrato à produção do enunciado: o papel central da fala interna... 64

1.2. O enunciado de estilo telegráfico: desenvolvendo uma hipótese explicativa... 73

Capítulo 4

Aspetos metodológicos da pesquisa

80 1. A pesquisa qualitativa em Neurolinguística... 80

2. Sobre o registro e a transcrição de dados... 81

3. Centro de Convivência de Afásicos (CCA): relação entre teoria e prática... 82

4. Sujeitos da pesquisa... 83

4.1. O sujeito BM... 83

4.2. O sujeito BS... 84

4.3. O sujeito TR... 84

4.4. O sujeito GB... 84

5. Descrição das atividades experimentais com os sujeitos TR, BM, BS e GB... 85

5.1. Jogo de adivinhação: O que é, o que é?... 85

5.2. Adivinha o que ele está fazendo?... 86

5.3. Provérbios: Não adianta chorar pelo leite derramado... 87

5.4. Atividades de leitura dirigida, desenvolvidas com BS... 88

6. Questões relativas às analises: a análise microgenética dos dados... 89

7. Aprovação da pesquisa no Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)... 90

Capítulo 5

O enunciado de estilo telegráfico interpretado via análise qualitativa/microgenética dos episódios dialógicos 91 Introdução: sobre a organização dos dados... 91

1. Dados do sujeito BM... 92

1.1.Dois moço, um nordeste e um jeep... 92

1.2.Outros grupos do CCA e Romaneio... 94

1.2.1. Outros grupos do CCA... 94

1.2.2. Romaneio... 95

1.3.Chorar pelo leite derramado... 102

(14)

1.4.1. Quanto à produção de palavras funcionais e de morfologia flexional... 104

1.4.2. Quanto às estratégias alternativas de significação... 104

1.4.3. Quanto à relação do sujeito com a sua afasia... 104

1.4.4. Hipótese sobre a produção de enunciados telegráficos... 105

2. Dados do sujeito BS... 105

2.1.Fala pra mim assim... usando verbo... 105

2.2.É DO Brasil ou NO Brasil?... 108

2.3.Qual é o futuro do “falou”?... 113

2.4.O vício de segurar uma coisa para pensar... 115

2.5.Síntese das questões relativas à produção de BS... 119

2.5.1. Quanto à produção de palavras funcionais e de morfologia flexional... 119

2.5.2. Quanto às estratégias alternativas de significação... 119

2.5.3. Quanto à relação do sujeito com a sua afasia... 120

2.5.4. Hipótese sobre a produção de enunciados telegráficos... 120

3. Dados do sujeito TR... 120

3.1.Isso! Um, dois... ... 121

3.2.É importante cuidar da saúde... 125

3.3.TR e a compreensão de palavras funcionais... 127

3.4.O quê ele está fazendo?... 129

3.5.Síntese das questões relativas à produção de TR... 132

3.5.1. Quanto à produção de palavras funcionais e de morfologia flexional... 132

3.5.2. Quanto às estratégias alternativas de significação... 132

3.5.3. Quanto a relação do sujeito com a sua afasia... 133

3.5.4. Hipótese sobre a produção de enunciados telegráficos... 133

4. Dados do sujeito GB... 134

4.1.Boca... não... Fala... não... 134

4.2.Ixi, fi... figura... ãh, ajuda... 138

4.3.Filho de peixe... peixinho é!... 139

4.4.Síntese das questões relativas à produção de GB... 144

4.4.1. Quanto à produção de palavras funcionais... 144

4.4.2. Quanto à morfologia flexional... 144

4.4.3. Quanto às estratégias alternativas de significação... 145

4.4.4. Quanto à relação do sujeito com a sua afasia... 145

4.4.5. Hipótese sobre a produção de enunciados de estilo telegráfico... 145

Considerações Finais: “Eu tô aqui!” ...

146

Referências Bibliográficas ...

153

Anexos...

158

Anexo 1 - TCLE aprovado pelo CEP/UNICAMP e assinado pelos sujeitos da pesquisa.. 158

(15)

Esta dissertação foi desenvolvida articulando os pressupostos teórico-metodológicos de diferentes áreas: (i) a Neurolinguística enunciativo-discursiva, (ii) as abordagens neuropsicológicas sócio-histórico-culturais e (iii) a Gramática Funcional e integra uma pesquisa mais ampla intitulada O funcionamento semântico-lexical: inferências a partir do estudo das afasias1 desenvolvida no âmbito do Grupo de Estudos da Linguagem no Envelhecimento e nas Patologias (GELEP)2.

O trabalho tem como principal objetivo refletir sobre as dificuldades de sujeitos afásicos3 não-fluentes com as palavras funcionais, visando compreender a chamada “fala telegráfica”, bem como avaliar as hipóteses explicativas acerca desse fenômeno. Buscamos analisar, por meio da metodologia de cunho microgenético, enunciados de estilo telegráfico produzidos por quatro sujeitos (GB, TR, BM e BS) que participam das sessões coletivas e individuais do Grupo 3 do Centro de Convivência de Afásicos (CCA)4. Nos interessa, também, compreender as estratégias alternativas desenvolvidas por esses sujeitos nos processos de significação – isto é, como lidam com a estruturação dos enunciados, face às dificuldades com a produção das palavras funcionais.

Novaes-Pinto, (1999) aponta que dentre as categorias clínicas mais estudadas no campo das afasias está o agramatismo, cuja principal característica é a presença da fala

1 Projeto elaborado para concessão de Bolsa PQ, Processo 311777/2014-7, atribuída à Profa. Dra. Rosana do

Carmo Novaes Pinto.

2

O GELEP é cadastrado na Plataforma Lattes-CNPq desde 2010, liderado pela Profa. Dra Dra. Rosana do Carmo Novaes-Pinto. O grupo “visa desenvolver pesquisas acerca dos fenômenos relativos à linguagem no envelhecimento e nas patologias de origem neurológica (como afasias, demências, epilepsias, atrasos de desenvolvimento etc) num esforço conjunto para promover discussões críticas que permitam avançar no conhecimento do funcionamento linguístico-cognitivo. A maioria das pesquisas abrigadas pelo GELEP se vincula à linha Cérebro, mente & linguagem da área Linguagem e Pensamento (subárea Neurolinguística), da Pós-Graduação em Linguística do Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas”. O GELEP se propõe a abrigar pesquisadores com formações diversas, privilegiando abordagens multidisciplinares dos fenômenos tematizados nos trabalhos (Novaes-Pinto, 2013).

3 Afasias são alterações de linguagem decorrentes de lesões cerebrais focais, como AVCs (derrames), tumores e

TCEs (traumas crânio-encefálicos) e, geralmente, comprometem a linguagem em todas as modalidades: oral (produção e compreensão) e escrita (leitura e produção) e em todos os níveis linguísticos: fonético/fonológico, sintático, semântico-lexical, pragmático-discursivo (Coudry, 1986/1988). Pelo fato dos Acidentes Vasculares Cerebrais serem os principais fatores etiológicos das afasias, consideramos relevante destacar que, de acordo com o relatório da PNS (Pesquisa Nacional em Saúde), publicado em 2014 – numa parceria com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e o Ministério da Saúde; no Brasil –, 1,5% da população brasileira foi diagnosticada com algum tipo de AVC, o que representa, aproximadamente, 2,2 milhões de pessoas a partir dos 18 anos de idade. Para mais informações, acessar: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/pns/2013/ e ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.pdf

4 O Grupo 3 do CCA é coordenado pela Profa. Dra. Rosana do C. Novaes Pinto, orientadora desta pesquisa.

Introdução

(16)

telegráfica. Na literatura neuropsicológica, o agramatismo e a fala telegráfica estão associados à afasia de Broca (ou afasia de expressão). O próprio nome – agramatismo – revela a hipótese de que é o funcionamento gramatical (entendido como sintático) que estaria impactado de forma relevante nessa afasia. Os estudos enfatizam as perdas na linguagem verbal, principalmente relativas às categorias funcionais ou classes gramaticais fechadas: preposições, artigos, conjunções, pronomes5, bem como a morfologia flexional e derivacional. As classes abertas, segundo a maioria dos estudos, estariam relativamente preservadas, com a presença de substantivos, adjetivos, alguns advérbios e a forma infinitiva dos verbos.

Com a finalidade de organizar a discussão, apresentamos a estrutura da dissertação, sintetizando o objetivo de cada um dos capítulos.

No Capítulo 1, discutimos os conceitos de fala telegráfica e sua relação com o agramatismo, traçando um breve histórico sobre esses fenômenos nas teorias afasiológicas clássicas. A partir dos pressupostos teórico-metodológicos da Neurolinguística enunciativo-discursiva, desenvolvemos uma crítica à noção de déficit que é bastante presente em trabalhos mais recentes que tentam descrever e analisar o agramatismo.

No Capítulo 2, apresentamos os pressupostos da Gramática Funcional, aproximando alguns conceitos desse campo à Neurolinguística que desenvolvemos, defendendo que a abordagem funcional é a que melhor se adequa tanto teórica, quanto metodologicamente às nossas pesquisas, uma vez que privilegia questões pragmático-discursivas na descrição e explicação dos enunciados telegráficos. Ao final do capítulo, discutimos criticamente a formulação do termo “fala telegráfica”, que aparece recorrentemente na literatura sobre a semiologia das afasias, contrapondo-o a variações terminológicas como fala de estilo telegráfico e fala reduzida, sugerindo a expressão “enunciado de estilo telegráfico”, mais coerente com nossas abordagens.

No Capitulo 3, abordamos a relação entre pensamento e linguagem, destacando a importância da fala interna no processo de produção dos enunciados, na tentativa de avaliar hipóteses clássicas e correntes. A partir dos modelos propostos por Vygotsky, Luria, Leontiev e das mais recentes reflexões de Akhutina (1975, 2003), tentamos relacionar o processo de produção dos enunciados (fala externa) que se inicia com a formulação do pensamento verbal (querer-dizer), mediado pela fala interna. Apresentamos e discutimos esses conceitos, assim como sua relação com as noções de sentido e de significado, culminando com as hipóteses

5 Vale salientar que, embora os pronomes façam parte dessas categorias fechadas, eles não serão objeto desta

pesquisa. Esta decisão foi tomada considerando-se a especificidade que os pronomes têm nos enunciados. Avaliamos que não seria possível dar conta dessas questões no período de desenvolvimento desta dissertação, mas sem dúvida, trata-se de tema relevante para pesquisas futuras. .

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desenvolvidas por Akhtutina, mais intimamente relacionadas às afasias, com destaque para o agramatismo, termo que, para a autora, equivale à produção da fala telegráfica.

No Capítulo 4, apresentamos as questões referentes à metodologia da pesquisa, apresentando os sujeitos GB, BM, BS e TR, bem como os expedientes metalinguísticos desenvolvidos para abordar os enunciados telegráficos produzidos nas sessões coletivas e individuais do Grupo 3 do CCA.

No Capítulo 5, propomos a análise dos enunciados de estilo telegráficos produzidos pelos sujeitos, visando contribuir para a compreensão dos processos linguístico-cognitivos envolvidos na sua produção, dentre os quais as dificuldades com as palavras funcionais e as estratégias desses afásicos para se fazerem compreender.

Nas Considerações Finais da dissertação, buscamos avaliar criticamente a contribuição desta pesquisa no âmbito dos trabalhos já produzidos na temática, na área de Neurolinguística, tanto do ponto de vista das propostas teórico-metodológicas, bem como para a prática clínica com sujeitos afásicos. Apontamos, também, para a necessidade de aprofundamento futuro de algumas questões, sobretudo relativas aos modelos mais recentes como os propostos por Akhutina.

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Capítulo 1

Fala telegráfica: uma reflexão no campo da

Neurolinguística enunciativo-discursiva

Introdução

Antes de apresentarmos as questões relativas à fala telegráfica7, tema central desta dissertação, traremos alguns conceitos teórico-metodológicos da Neurolinguística de orientação enunciativo-discursiva, essenciais para explicitar o cenário no qual desenvolvemos a pesquisa. Essas questões terão fundamental relevância ao longo do trabalho, mas em especial para as discussões apresentadas no Capítulo 3.

1. A Neurolinguística enunciativo-discursiva

Entender as relações entre cérebro e linguagem é uma das questões mais desafiadoras na área das neurociências e se tornou a preocupação central da neurolinguística, também denominada em alguns centros de pesquisa como “neuropsicologia da linguagem”. Os

6 Trecho de um episódio dialógico entre a pesquisadora Its e o afásico BM, em atividade dialógica no Grupo 3 do

Centro de Convivência de afásicos (CCA)..

7 A literatura neuropsicológica, desde o princípio dos estudos sobre as dificuldades com as palavras funcionais

por sujeitos afásicos, tem se utilizado do termo fala telegráfica para se referir ao fenômeno. No entanto, pelos pressupostos teórico-metodológicos que norteiam esta pesquisa propomos o termo enunciado de estilo

telegráfico. Nossa opção será justificada, mais adiante, no capítulo 2. Sendo assim, o termo fala telegráfica

deverá ser visto em nosso trabalho como uma moeda linguística, (Porter 1993), sobretudo, quando estamos fazendo referência aos estudos que assim o definem.

BM Leite derramado6

Its Chorar ...

BM Chorar leite derramado

Its Pelo leite derramado ... O que isso significa? Quando você usa isso?

BM Leite derramado ... puta!

Nossa, faz tempo cara ... Its Que que significa quando

alguém fala assim pra você... Ah, não adianta chorar pelo leite derramado!?

BM Não! ... Ah, tá! É:... tido o AVC,

mas vambora, vamo... vamo seguir a frente

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primeiros trabalhos que mostram a preocupação com os distúrbios de linguagem são datados de aproximadamente 1700 a.C., nos relatos do chamado Surgical Papyrus of Edwin Smith, documento que já postulava o estabelecimento de correlações anátomo-funcionais (Priens & Bastiaanse, 2006).

Apesar dessas correlações terem sido abordadas há tanto tempo, os termos Neurolinguística e Afasiologia Linguística surgiram apenas nas décadas de 60 e 70 do século XIX, referindo-se às áreas que se debruçam sobre questões voltadas tanto para a linguagem e sua relação com o cérebro, quanto para a natureza específica dos déficits linguísticos nas afasias (Caplan, 1998[1987]8).

Nos anos 80, Coudry (1988 [1986]) postulou uma abordagem neurolinguística de orientação enunciativo-discursiva das afasias – também referida, atualmente, como Neurolinguística Discursiva – respaldada nos estudos de Lordat, Vygotsky e Luria – representantes do campo da Neurologia e da Neuropsicologia; em Benveniste, Jakobson, Osakabe e Franchi, dentre outros, na Linguística. A esse respeito, Novaes-Pinto (2012) esclarece:

One of the main features that differentiates our research from the work developed in other centers in Brazil and abroad is its strong connection with linguistic theories, especially the ones developed in the second half of the 20th century, such as Enunciative Semantics, Pragmatics and Discourse Analyses, which strongly influence the way we approach theoretically and methodologically the aphasia phenomena. From a unique locus, we believe Linguistics may contribute to a better description and understanding of how language and its several functions and speech genres can be impacted by brain injuries, considering what has been learnt about normal functioning for almost a century of development of this field as a Science (Novaes-Pinto, 2012, p. 219).

Coudry criticou a aplicação direta de modelos linguísticos formais aos estudos das alterações da linguagem em estados patológicos e o fato de que a complexidade da linguagem é geralmente reduzida à analise das estruturas da língua (aspectos fonético-fonológicos, sintáticos e lexicais). Essa concepção formal deu origem aos protocolos de avaliação de linguagem de natureza exclusivamente metalinguística, expedientes que visam não apenas classificar as afasias e os afásicos, mas também orientar condutas terapêuticas. Segundo a autora, esse tipo de tarefa objetiva “medir” a competência linguística de sujeitos afásicos e revelar os sintomas ou as síndromes afasiológicas (o grupo de sintomas), mas não explicam os processos subjacentes aos fenômenos (Coudry, 1988 [1986]).

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Na abordagem enunciativo-discursiva, fatores extralinguísticos e subjetivos são levados em conta tanto para compreender as alterações de linguagem nas diferentes formas de afasia, como para orientar a conduta terapêutica. A linguagem é concebida como resultado de um trabalho coletivo – com e sobre a linguagem (Coudry, 1988 [1986), 2002; Novaes-Pinto,1999, 2012, 2015), que é contemplada não apenas em seus aspectos sistêmicos – fonético-fonológico, morfológico, sintático e semântico-lexicais –, mas também em suas dimensões pragmáticas e discursivas. Os aspectos históricos e sociais são deslocados para o centro das discussões e são essenciais para o desenvolvimento teórico da área.

A Neurolinguística enunciativo-discursiva, desde sua criação, questiona justamente a correlação direta entre lesão e sintoma, sem análises linguísticas abrangentes, o que leva os pesquisadores a descreverem as afasias em termos de sintomas e déficits (Novaes-Pinto, 1999). Nessa perspectiva, consideramos que aspectos pragmáticos e discursivos sejam relevantes para compreender cada nível linguístico afetado pela afasia.

Segundo Gregolin-Guindaste (1996), a Neurolinguística enunciativo-discursiva considera os resultados obtidos pelo desenvolvimento da linguística e os mobiliza para a análise dos fenômenos de ordem patológica. Nessa perspectiva, se constitui como uma área de entremeio, que articula a Ciência da Linguagem e a Ciência Médica. Na defesa de uma abordagem que lide com a complexidade da linguagem em contextos patológicos, Coudry faz a seguinte afirmação, que optamos por transcrever em seguida, pela sua relevância para esta pesquisa:

Em relação à avaliação de sujeitos cérebro-lesados, segundo nosso ponto de vista, não se trata somente de inventariar os desvios de linguagem em

relação ao sistema linguístico utilizado pelos sujeitos que não são portadores de lesão: não existe, com a prática da linguagem, nenhum sujeito médio ideal, que possa ser tomado como padrão para uma bateria fixa de

estratégias. Não se trata somente de um viés de linguista para o qual a linguagem é certamente, além de uma prática, um objeto de conhecimento. Trata-se sobretudo de apreender no discurso verbal e mental (mesmo

quando fragmentário) os modos pelos quais ele organiza e estrutura os recursos expressivos de que dispõe ou os mecanismos alternativos pelos quais ele supre suas próprias dificuldades, descobrir pelos indícios de sua

fala e pelas suas manifestações explícitas, as hipóteses que ele mesmo faz a respeito dessa estruturação e dos mecanismos que ele põe em jogo para produzir significações, de definir com acuidade o lugar de suas dificuldades, sobre as quais deve operar. Adotando a hipótese da indeterminação radical da linguagem e, portanto, a de que muitos fatores se aliam na produção da significação, não se pode, porém, chegar à posição radical insustentável de que essa significação se produz sem expressões linguísticas, ou que essas expressões se produzem sem regras construídas em uma práxis histórica e

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Coudry (1988) afirma que o foco do trabalho com os sujeitos afásicos não deve ser o déficit. O pesquisador e também o terapeuta devem estar sensíveis àquilo que os sujeitos afásicos revelam nos processos de significação por meio da linguagem que lhes resta. A autora chama a atenção para o fato de que nosso olhar deve alcançar um sujeito e não um paciente.

1.1 Sobre a indeterminação da linguagem e a subjetividade nos estudos das afasias

A Neurolinguística enunciativo-discursiva enfatiza, como um de seus principais pressupostos teóricos, a natureza indeterminada da linguagem. A língua não é um sistema acabado e estável, que se esgota em si mesmo. Não basta combinar elementos linguísticos, seguindo uma ordem gramatical previamente estabelecida, para que se tenha um enunciado. Os sujeitos operam com os elementos linguísticos de que dispõem para a construção da significação. Coudry (1988) destaca que a significação só é possível se fatores co(n)textuais e intersubjetivos forem mobilizados na produção do discurso, já que as expressões linguísticas não carregam em si todos os elementos necessários para a sua interpretação. Nas palavras da autora:

Devo rejeitar uma concepção de teoria linguística que, por razões metodológicas,

exclua sejam os aspectos históricos e sociais da linguagem, seja a atividade do sujeito na situação efetiva da fala. É necessário, portanto, superar dicotomias como língua e fala, sistema e uso, competência e performance para integrar em uma concepção abrangente de linguagem o seu funcionamento, na dimensão contextual e

social em que os homens, por ela, atuam sobre os outros, na dimensão subjetiva em que, por ela, os homens se constituem como sujeito, na dimensão cognitiva em que, por ela, os homens atuam sobre o mundo estruturando a realidade (COUDRY, 1988, p. 47 grifo nosso).

Coudry, portanto, destaca os aspectos subjetivos para os quais a Neurolinguística lança seu olhar: “O sujeito não é alguém que é soberano em relação à língua, nem seu criador. Mas, também não é um repetidor ou reprodutor. Nem deus nem máquina”. Segundo a autora, “o sujeito é sempre incompleto, imaturo, e ao mesmo tempo múltiplo: ao mesmo tempo social, histórico, psicológico e psicanalítico, biológico, linguístico” e todos esses aspectos convivem no sujeito, apesar da especificidade de cada um (Coudry, 1988, p. 67).

A autora fundamenta-se, com relação a esses aspectos, nas afirmações de Franchi (1977), para quem “não há nada universal na linguagem, exceto o processo (sua força criadora e constitutiva)”. Nas palavras do autor,

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A linguagem, pois, não é um dado ou um resultado; mas um trabalho que dá forma ao conteúdo variável de nossas experiências, trabalho de construção, de retificação do vivido que, ao mesmo tempo, constitui o sistema simbólico mediante o qual se opera sobre a realidade e constitui a realidade como um sistema de referências em que aquele se torna significativo. Um trabalho

coletivo, em que cada um se identifica com os outros e a eles se contrapõe,

seja assumindo a história e a presença, seja exercendo suas opções solitárias (Franchi, 1977 apud Coudry, 1988, p. 55 grifo nosso).

A linguagem é concebida como uma práxis, uma atividade que integra o sujeito com o seu meio, com a cultura e com a história. Conforme aponta Franchi (1986), é o lugar único de realização e construção social, histórica, cultural e cognitiva de um sujeito, seja ele afásico ou não, como vemos na seguinte passagem:

Mergulhar nesse processo dialético, de que todos fazemos parte, constituindo as condições de interação, não como um limite dos acontecimentos discursivos, mas como o lugar (e único) “onde eles podem ocorrer”. Contextualização: porque “o reverso dessa atitude, isto é prescindir de quem diz, para quem diz, em que situação se diz, como se diz, etc., coloca uma distância enorme entre os participantes, anula o sujeito afásico que não se integra no processo senão como ‘paciente’ ou objeto de investigação”. Anula, na verdade, as possibilidades mesmas da linguagem (FRANCHI, 1986, p. XIV; aspas do autor).9

Como já afirmamos anteriormente, consideramos essas questões essenciais para explicitar a perspectiva que orienta a reflexão sobre a fala telegráfica, no contexto da Neurolinguística enunciativo-discursiva.

2. A fala telegráfica no contexto da semiologia das afasias

2.1. A semiologia das afasias: produto da reflexão teórico-metodológica sobre a relação cérebro-linguagem

Como vimos no item anterior, a origem da semiologia das afasias é marcada pela preocupação em correlacionar áreas cerebrais lesadas às alterações de linguagem, visando agrupar os sintomas em síndromes e classificar as afasias e os afásicos. As primeiras descrições das afasias foram feitas na segunda metade do século XIX. Em 1861, Broca correlacionou as alterações de linguagem do sujeito Leborgne10 a uma lesão na terceira

9 A reflexão é feita por Franchi como prefácio para o livro Diário de Narciso: discurso e afasia, de Coudry,

publicado em 1988, e que deriva de sua tese de Doutorado homônima, defendida em 1986.

10 Leborgne tinha 51 anos de idade e ficou conhecido como Tan Tan, pois essa era a única forma de expressão

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circunvolução frontal do hemisfério esquerdo, que ficou conhecida como área de Broca, responsável por transformar as imagens mentais em imagens motoras das palavras. O autor utilizou o termo afemia para se referir à perda da linguagem articulada. Alguns anos após o trabalho de Broca, Wernicke (1984) afirmou ter localizado o centro de processamento da imagem sonora das palavras na primeira circunvolução temporal do hemisfério esquerdo, posteriormente nomeada área de Wernicke.

O estudo das afasias só atingiu seu estatuto científico e sistemático a partir desses trabalhos pioneiros, considerados divisores de águas nos estudos da relação entre cérebro e linguagem. As alterações descritas por Broca e por Wernicke correspondem, respectivamente, aos dois tipos clássicos de afasias – motoras e sensoriais (Novaes-Pinto, 1999; Novaes-Pinto e Santana, 2009).

A visão clássica sobre essa relação trouxe, consequentemente, uma vasta nomenclatura para os sintomas – ou sinais – das afasias. Na literatura neuropsicológica, cada alteração é designada por um item semiológico, ou seja, um nome que a identifica, geralmente como um déficit (Novaes-Pinto, 1999; Novaes-Pinto & Santana, 2009, p. 413). O termo semiologia, segundo Novaes-Pinto e Santana, “abarca diferentes sistemas que priorizam aspectos relacionados às ciências em que são criados; sistemas que se entrecruzam na busca de um equilíbrio entre as abordagens de cunho orgânico e as de caráter social das funções complexas, como a linguagem humana”, o que justifica nossa opção pela Neurolinguística de orientação discursiva para fundamentar a análise de fenômenos afasiológicos.

Conforme aponta Novaes-Pinto (2013), uma das razões para a Linguística se debruçar sobre as alterações de linguagem nas patologias é que os dados advindos desse campo ajudam tanto a corroborar quanto a refutar hipóteses sobre o seu funcionamento em estados considerados normais. Segundo Canguilhem (1995[1943], apud Novaes-Pinto, 2013), seria impossível sabermos o que se sabe hoje a respeito do normal sem as lições da doença. Nessa mesma perspectiva, Coudry (1988 [1986]) compara o funcionamento da linguagem nas afasias a uma imagem exibida em “câmera lenta”, por meio da qual é possível observar melhor os aspectos de sua composição e que não poderiam ser percebidos na sua dinâmica natural.

que lhe era dito. O sujeito já apresentava problemas na produção da fala cerca de vinte anos antes de ter sido examinado por Broca (Morato, 2001).

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2.2. A relação entre fala telegráfica e agramatismo

Novaes-Pinto (1999 p. 65) destaca que “dentre as categorias clínicas mais estudadas no campo das afasias está o agramatismo, cuja principal característica é a presença da fala telegráfica”, objeto central de análise desta pesquisa. Esse fenômeno foi inicialmente descrito como uma característica marcante na fala de sujeitos afásicos, sobretudo por sua natureza telegráfica. Novaes-Pinto (1999) sintetiza o que a neuropsicologia destaca como seus principais “sinais”, desde o início de sua teorização:

(i) apagamento de palavras funcionais no discurso, ou seja, de preposições, pronomes, artigos, conjunções, etc. (ii) predominância de substantivos em detrimento dos verbos (iii) perda da flexão verbal e de marcas de concordância nominal, dentre outros (Novaes-Pinto, 1999, p. 76)

Segundo a autora, essa tendência justificaria que o agramatismo tenha sido compreendido, em grande parte dos estudos, como a “perda da gramática”. Apesar de concordarem quanto a um grupo de sintomas (co)ocorrentes que o definem como síndrome, pesquisadores discordam quanto a questões centrais envolvidas nesse fenômeno.

Menn & Obler (1990) destacam que a diversidade de hipóteses emerge dos diferentes interesses dos pesquisadores, dentre os quais questões topográficas das lesões. Outras dizem respeito aos déficits linguísticos específicos. A depender da teoria que o descreve, ora o agramatismo está relacionado a questões fonológicas (Kean, 1985), ora a questões sintáticas (Grozinsky, 1985), além das abordagens que o compreendem como dificuldades com o acesso lexical (Bradley, 1985).

Segundo Goodglass & Menn (1985), os primeiros relatos clínicos de pacientes agramáticos eram apenas pautados pelas características da fala do sujeito, ou seja, pela sua produção oral. No entanto, a partir do momento em que os pesquisadores começaram a perceber indícios de outras dificuldades linguísticas além da fala (compreensão e leitura/escrita), começaram a questionar se o agramatismo não seria um fenômeno bem mais complexo, que ultrapassa os limites de um sintoma e passaram a concebê-lo como síndrome. Goodglass & Menn (1985), por exemplo, utilizam-se do termo distúrbio panlinguístico para caracterizá-lo.

Grande parte dos neurocientistas passaram a assumir, a partir dos estudos do agramatismo, que há um centro de representação gramatical responsável pelo processamento da sintaxe e da morfologia. Uma lesão cerebral que impactasse esse centro comprometeria toda a organização sintática e, portanto, todas as modalidades seriam envolvidas. O

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agramatismo, nessa concepção, é tido como um Déficit Sintático Central e entendido como síndrome.

Segundo Luzzatti &Whitaker (1996, apud Prins & Bastiaanse, 2006), o primeiro registro de um caso de agramatismo foi feito por Johannes Wepfer, em 1683. As dificuldades do paciente de Wepfer estavam relacionadas ao acesso das palavras (WFT – Word Finding Difficiulties) e à estruturação sintáticas, mais especificamente com as palavras funcionais e com as estruturas sintáticas da língua, conforme vemos na passagem a seguir:

R.N.N is a 53-year-old man […]. In July 1683 he complained he had suddenly forgotten all names, and in fact he could not even express his own name. He could not designate any object with his name, neither in Latin nor in German. He gave the impression he could recognize things and people, but names did not occur; he tried and tried with all his will to explain what he was thinking on various topics, but he was destitute of his words; those he could utter were alien and incoherent […]. [August 14th

] Sometimes, however he could not find proper names for people and places as quickly as customary, and from time to time he could not find some of the little

words. [August 17th]. When he was talking, I could observe him from time to time to violate syntactic rules and against the structure of German sentences, he would pre-pose one word to another and sometimes he could not complete a word (Luzzatti & Whitaker, 1996, p. 161-162 apud Prins & Bastiaanse, 2006, p. 773 grifos nossos).

Para Deleuze (1819), a quem a neurolinguística moderna atribui a primeira descrição de um caso típico de agramatismo (Goodglass & Menn, 1985; Grodzinsky, 1990), essa falta de palavras gramaticais resultava em enunciados com características marcantes na fala de alguns afásicos. O autor descreveu o caso de uma senhora que falava apenas verbos na sua forma infinitiva – em formas nominais/substantivadas – e que não usava pronomes. Nessa época, o fenômeno não tinha recebido ainda um nome para designá-lo.

Segundo Grodzinsky (1990), foi Kussmaul, em 1876, quem criou o termo “akataphasia” para se referir à incapacidade de produzir palavras gramaticais e construir frases lógicas e sintaticamente bem organizadas. A partir da criação do termo, desenvolveu-se uma vasta discussão no campo da afasiologia sobre as questões envolvidas na dificuldade de formular sentenças, por sujeitos afásicos.

Alguns anos depois, em 1898, Pitres propôs que a afasia resulta em um problema de memória. Fez esse estudo baseado na descrição da paciente de Deleuze e de um de seus pacientes. Para ele, a dificuldade com a formação de sentenças seria, na verdade, um problema com a memória envolvida na construção de frases.

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De acordo com Eling & Whitaker (2010), o linguista Steinthal (1823-1899) desenvolveu uma teoria psicolinguística e a aplicou aos casos de afasia. A linguagem seria um meio para expressar ideias através de sentenças. Uma ideia (ou mensagem) é indissociável de processos psicológicos e requer palavras. Nessa linha de raciocínio, para Steinhal, a afasia causaria uma interrupção nos processos psicológicos relacionados ao nível de representação e seria, portanto, uma desordem no nível da palavra. Já a akataphasia seria uma desordem no nível da sentença e relacionada à dissolução da ordenação lógica do pensamento.

Arnald Pick, autor que cunhou o termo agramatismo em 1913, deu à sentença um papel mais central nas questões de processamento da linguagem e se interessou pelos “defeitos” na formação das frases – ou, seja, a falta das palavras. Pick se baseou nos postulados de Jackson (1874), autor que acreditava que a linguagem se organizava por proposições. Para Jackson, os sentidos das proposições não estavam centrados nas palavras que as compõem, mas nas relações que essas palavras estabelecem entre si, dentro de uma frase. Por isso, segundo o autor, a sentença deveria ser vista como a unidade de análise nas afasias.

Pick postulou um modelo de produção de sentença que colocava a sintaxe de um lado e a morfologia de outro. A partir disso, afirmou que a ordem das palavras nas sentenças construídas pelos sujeitos estava intacta. Para ele, os enunciados agramáticos são mais curtos e sintaticamente simplificados, o que requer menos esforço na sua formulação. Ou seja, Pick chegou à conclusão de que o sujeito que produzia essas frases “defeituosas” não tinha nenhum problema com o raciocínio e com a formação lógica das sentenças. Postulou uma explicação psicológica para o fenômeno, segundo a qual a formulação de uma sentença precede a seleção dos itens lexicais e funcionais. As palavras de classes abertas seriam selecionadas primeiro e as palavras de classe fechada selecionadas posteriormente. Friederici (1994) sintetiza o estudo de Pick e conclui:

[Pick assumes] that the schematic formulation of the sentence precedes the choice of words, as well as the syntactic formulation and the portion of the grammatical functions that corresponds to it, is shown by the fact that the meaning of a single word, whatever it may be, is determined only by the position it takes or interacts with; therefore the mental framework should in principle to be ready in a grammatical sense as well: before the choice of words ensues, the plan has to be determined before the different pieces are put together (Friederici, 1994, p. 267).

Essa formulação de Pick, apesar de considerada pré-moderna por alguns (Thompson e Bastiaanse, 2012), rompeu com crenças clássicas e bem difundidas desde o início dos

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questionamentos sobre a localização da linguagem no corpo do homem. A partir desse raciocínio, que não considera o agramatismo como resultado de um déficit cognitivo causado por uma lesão cerebral, a concepção sobre a natureza do fenômeno também teve que ser reformulada.

Pick afirmou que o agramatismo deveria ser entendido como “Notsprache” (do alemão fala emergencial) ou, em outras palavras, como um recurso adaptativo em função do déficit com a seleção de palavras gramaticais. Partindo dessa concepção, o termo fala telegráfica11 foi cunhado como uma metáfora para se referir a uma produção econômica e simplificada, principais características do gênero textual telegrama (Thompson e Bastiaanse, 2012).

Segundo Thompson e Bastiaanse (2012, p. 2), Pick sugeriu que a gramática “mais empobrecida” dos agramáticos seria uma “regression from conventional syntax to the syntax of thoughts and the typical telegraphic speech was the consequence of an economy principle of the damaged cerebral organ resulting in omission of reductant elements [...]”. Nesse sentido, suas ideias podem ser concebidas como predecessoras da Teoria da Adaptação formulada por Kolk (1990) e têm muito em comum com a interpretação de Vygotsky, retomada e reinterpretada mais recentemente por Akhutina (2003,2014), que discutiremos no Capítulo 3. Vale lembrar que Kolk (1985) ainda afirma que os sujeitos seriam overgrammatics, considerando que se fazem compreender pelos seus interlocutores pela competência que têm para selecionar as palavras de conteúdo e colocá-las em uma ordem adequada.

Kolk (1985) acredita que, em consequência da dificuldade com a seleção de morfemas gramaticais, os sujeitos afásicos produziriam enunciados de estilo telegráfico para driblar suas dificuldades comunicativas; ou seja, a fala telegráfica seria resultado de uma operação (pragmática) do afásico para se comunicar. Nessa perspectiva, a fala telegráfica é um recurso que o sujeito utiliza para se aproximar o máximo possível da interface da sintaxe convencional, apesar de ela ser apresentada de forma “defeituosa” pela falta dos elementos gramaticais que não foram selecionados.

Atualmente, tanto na neuropsicologia como na neurolinguística, ainda se recorre à metáfora de fala telegráfica para se referir aos enunciados produzidos no contexto das afasias. Conforme apontam Tesak & Niemi (1997), a própria metáfora se relaciona à fala elíptica gerada por sujeitos com agramatismo. Muitos autores na neuropsicologia criticam essa

11 Termo originário do alemão Telegrammstilagrammatismus. Como o alemão é uma língua aglutinadora, há três

palavras na formação desse termo: Telegramm – telegrama stil – estilo agrammatismus – agramático. Corresponderia, então, em português à fala de estilo telegráfico, termo utilizado por Novaes-Pinto (1999), em sua tese de doutorado, para explicar os enunciados de sujeitos considerados agramáticos em sua pesquisa.

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metáfora por não verem uma correspondência direta entre a produção afásica e a escrita de um telegrama (Tesak & Dittmann, 1991 Niemi et al. 1992 Menn & Obler, 1990a Tesak & Niemi, 1997 e Kleppa, 200812). Kleppa (2008), por exemplo, propõe o termo fala reduzida, pela semelhança com as small clauses que caracterizam os enunciados de crianças em processo de aquisição da linguagem e porque, com o advento das novas tecnologias, ninguém mais escreve “telegramas”. Novaes-Pinto (1992; 1999) prefere o termo fala de estilo telegráfico para se referir à dificuldade com esses morfemas funcionais na produção dos enunciados pelos sujeitos afásicos, tal como o fez Pick.

Na literatura neuropsicológica, o agramatismo e a fala telegráfica estão associados à afasia de Broca (ou afasia de expressão). Por conceber o agramatismo, em geral, como um déficit sintático central, os estudos enfatizam as perdas na linguagem verbal, principalmente relativas às classes gramaticais fechadas, sejam morfemas livres: preposições, artigos, conjunções, seja a morfologia flexional e derivacional.

Na Neuropsicologia e na Linguística há uma diversidade de propostas para a compreensão do que seja a fala telegráfica e sobre sua relação com o fenômeno do agramatismo. A esse respeito, seguem algumas definições clássicas, a fim de demonstrar a variedade de perspectivas teóricas subjacentes aos estudos:

Definição 1:

The deletion of function words in discourse, that is, the deletion of conjunctions, prepositions, articles, pronouns, and auxiliary verbs, and copulas (notable exceptions to this are the conjunctions and and because) 2. The predominance of nouns, at the expense of verbs, in some forms of agrammatic speech. 3. The loss of verb inflection, with substitution of the infinitive for finite verb forms. 4. Loss of agreement of person, number, and gender, most notable in inflected languages (Tissot et al 1973 apud Goodglass & Menn, 1985, p. 2; grifos nossos).

Definição 2:

Agrammatism is hard to define other than by the essential fact which the patient’s speech makes evident: reduction of the sentence to its skeleton, relative abundance of substantives, almost invariable use of verbs in the infinitive, with the suppression of the small words (the function words of a language) and loss of grammatical differentiation of gender, number. (Alajouanine, 1968, p. 84 apud Goodglass & Menn, 1985, p. 4; grifos nossos).

12 O trabalho de Kleppa (2008), também desenvolvido no âmbito da Neurolinguística enunciativo-discursiva,

buscou entender o funcionamento das preposições ligadas a verbos na fala de sujeitos agramáticos, comparando seus achados aos que foram obtidos por crianças em processo de aquisição de linguagem. Baseada nos resultados do estudo, Kleppa (2008) questiona a hipótese do espelho invertido proposta por Jakobson (1954).

Referências

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