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Cenários macroeconômicos e as políticas sociais no Brasil pós-constituição de 1988 : uma análise dos governos de Fernando Henrique Cardoso e Luís Inácio Lula da Silva

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA

MONOGRAFIA DE BACHARELADO EM CIENCIAS ECONÔMICAS

Cenários Macroeconômicos e as Políticas Sociais no

Brasil pós-Constituição de 1988: uma análise dos

governos de Fernando Henrique Cardoso e Luís

Inácio Lula da Silva

Ilana Stein 107326791

PROFESSOR ORIENTADOR Lena Lavinas

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2 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE ECONOMIA

MONOGRAFIA DE BACHARELADO EM CIENCIAS ECONÔMICAS

Cenários Macroeconômicos e as Políticas Sociais no

Brasil pós-Constituição de 1988: uma análise dos

governos de Fernando Henrique Cardoso e Luís

Inácio Lula da Silva

__________________________________ ILANA STEIN

107326791

PROFESSOR ORIENTADOR Lena Lavinas

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3 As opiniões expressas neste trabalho são de exclusiva responsabilidade do autor.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Prof.ª Doutora Lena Lavinas, do Instituto de Economia da Universidade Federal o Rio de Janeiro (IE/UFRJ), por todo apoio prestado durante a orientação deste trabalho e, principalmente, por todos os ensinamentos dentro e fora da sala de aula.

Igualmente gostaria de agradecer aos meus pais por sempre acreditarem no meu potencial e me apoiarem nas decisões, além de todo o carinho e educação que me deram. Ao meu irmão, por ser sempre um amigo presente e aos demais familiares.

Ao querido Adam, por todos os bons momentos, além da ajuda na revisão da monografia. E, por fim, aos meus queridos amigos, porque sem eles a vida teria menos graça.

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Resumo

A partir das conquistas expressas na Constituição de 1988, o Estado brasileiro passou a ter novos deveres em relação aos seus cidadãos, contemplados com novos direitos. A ampliação dos direitos de cidadania exigia uma nova política macroeconômica, para sua consolidação.

O período que compreende a promulgação da Carta Magna e o triunfo da estabilidade política e econômica – que ocorrem em momentos convergentes, com a eleição de Fernando Henrique e o Plano Real em 1994 – é marcado por passos lentos em direção a concretização dos direitos sociais ampliados. Por este motivo, optou-se, nesta monografia, por estudar os dois mandatos que se seguiram à conquista da estabilidade econômica em ambiente democrático, isto é, os governos dos presidentes FHC e Luiz Inácio Lula da Silva, entre 1995 e 2010.

Será analisado como se deu a condução da Política Social nos mandatos de Fernando Henrique Cardoso (FHC) e de Luís Inácio Lula da Silva, com foco na relação que se estabeleceu entre ela e as Políticas Macroeconômicas do período. Serão estudados os oito anos de cada um dos governos – o que possibilita uma comparação simétrica no tempo – abordando as crises e os desafios que ambos enfrentaram em nível político e econômico, e a relevância que teve o Gasto Social em suas gestões.

O objetivo é mostrar os principais pontos desses dois mandatos, de forma a situar o leitor no debate. São apresentadas as políticas desenvolvidas no período e alguns resultados – tais como variação no Índice de Gini, PIB, desemprego, etc. – para que essas variáveis contribuam na elaboração de um termômetro de avaliação dos respectivos governos.

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Abstract

After the achievements of the 1988 Constitution, the State was awarded new duties and obligations towards the Brazilian citizens, which were contemplated with new rights. The extension on the civil rights required a new macroeconomic policy, for its consolidation.

The period that comprises the promulgation of the Magna Carta and the triumph of politic and economic stability – that occurred at the same time, when Fernando Henrique was elected and the Real Plane was launched, in 1994 – is marked by slow steps on the direction of the extended civil rights. For these reason, at these monograph was chosen to study just the two mandates that preceded these attainment of economic stability in a democratic environment, this is, on the FHC and Luiz Inácio Lula da Silva governments, between 1995 and 2010.

This monograph intends to analyze how Social Policies were conducted under those administration, focusing on their relation with Macroeconomic Policies. Eight years of each president will be studied – enabling a symmetric comparison in time – covering the crises and the challenges that both of them faced in political and economical contexts, and the relevance of Social Expenditures on their agendas.

The purpose is to show the main points from each management, in a way that the reader understands the different sides of the debate. Some of the politics developed in the period and various results – like the Gini Index, GDP (Gross Domestic Product), unemployment taxes, etc. - will be presented, so an evaluation on the respective governments can be formed.

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Sumário

INTRODUÇÃO... .8

METODOLOGIA...10

CAPÍTULO 1 - A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E A INTRODUÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS...11

1.1 – UMA BREVE COMPARAÇÃO ENTRE AS ESTRUTURAS ANTERIORES E A ATUAL...11

1.2 – O QUE MUDOU NO ÂMBITO DA ASSISTÊNCIA SOCIAL...15

1.3 – O QUE MUDOU NO ÂMBITO DA SAÚDE...17

1.4 – O QUE MUDOU NA PREVIDÊNCIA SOCIAL...19

CAPÍTULO 2 - A GESTÃO DE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO (1995-2002)...22

2.1–O TRIPÉ DA POLÍTICA MACROECONÔMICA...22

2.2 – POLÍTICAS SOCIAIS: DISTRIBUIR PARA NÃO UNIVERSALIZAR...29

2.3 – UM BALANÇO GERAL DO GOVERNO...37

CAPÍTULO 3 - A GESTÃO DE LUIS INÁCIO LULA DA SILVA (2003-2010)...40

3.1– PANORAMA GERAL: CONTINUIDADE OU RUPTURA?...40

3.2 – POLÍTICA SOCIAL: E AGORA, LULA?...49

3.3 – A CRISE FINANCEIRA E A MAROLINHA...56

3.4 – RESULTADOS GERAIS DO GOVERNO LULA...58

CONCLUSÃO...64

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Introdução

A ideia de que cabe ao Estado a proteção de todos os seus cidadãos ganha forma quando Beveridge, ex-ministro da Inglaterra, publica em 1942 um documento que ficou conhecido como Relatório Beveridge. A Seguridade Social universal é o ponto de partida para este estudo.

Este tema ganha força a partir da bem sucedida experiência dos Welfare States na Europa do pós-guerra, levando depois de então, as políticas sociais a um destaque maior na agenda de muitos governos. Junto a este fenômeno, observa-se a ascensão de um Estado mais presente na economia e que buscava, em conjunto com a sociedade, instrumentos de promoção de emprego, crescimento e desenvolvimento.

O objetivo do trabalho é estudar a relação existente entre as políticas econômicas e sociais, de um ponto de vista analítico no caso brasileiro e, mais especificamente, nos últimos dezesseis anos de governo. A escolha temporal não é à toa: ela permite uma comparação simétrica entre dois ex-presidentes de partidos oposicionistas e que representaram gestões, até certo ponto, distintas neste tema.

Como políticas sociais são planos que exigem, essencialmente, gastos públicos, é importante analisar em que sentido caminha a política econômica, já que esta possui a capacidade de impor restrições ao uso orçamentário. Em experiências anteriores, já se comprovou que o gasto social costuma ser um dos primeiros dispêndios a ser cortado quando surgem restrições financeiras ao poder público (Sicsú, 2006). Esta análise pode ser importante para entender se o social desempenha um papel periférico ou central na esfera administrativa.

Pelo lado das políticas econômicas – considerando as três principais: monetária, cambial e fiscal – cabe aqui um breve resumo sobre como cada uma delas pode afetar diretamente o plano social.

A política monetária no Brasil tem como principal ferramenta a escolha da taxa básica de juros da economia, a Selic. Se estes juros são os mesmos que remuneram os títulos públicos (pagos pelo governo aos investidores) então a política monetária tem papel decisivo na determinação de recursos disponíveis para a realização do gasto social. A política cambial contribui para a questão pois, para um governo que não atua com um

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9 câmbio totalmente flutuante, é necessário fazer reserva de moeda internacional para intervir no mercado de dólares quando este escapar do patamar aceitável. O custo embutido nisso é a diferença entre a taxa de juros doméstica e a taxa de juros internacional, o que exige uma capacidade orçamentária para este fim, podendo comprimir o espaço para o gasto social. Por último, analisemos a política fiscal, que tem um impacto mais amplo e complexo e que, em linhas gerais, pode ser explicada como a orientação que o governo segue referente aos gastos públicos. Quando a dívida pública está alta ou existem pressões por austeridade, o governo aumenta impostos e corta gastos, configurando a chamada política contracionista. Do contrário, quando está autorizado a gastar com mais liberdade, chama-se de política expansionista.

A seguir serão detalhados os assuntos de cada capítulo explicando o racional por trás deles.

No Capítulo 1 será traçado um panorama das conquistas da Constituição de 1988, destacando os principais pontos que tangem os direitos sociais e a organização dessa estrutura. A intenção é entender a transformação do papel do Estado frente o bem estar dos seus cidadãos.

O Capítulo 2 refere-se ao período presidencial sob a gestão de Fernando Henrique Cardoso. Uma análise geral das principais políticas macroeconômicas, dos conflitos enfrentados na época e das soluções escolhidas para melhorar o nível de vida da população semeará o debate sobre, até que ponto, as duas dimensões centrais que guiam o estudo foram convergentes ou divergentes.

No Capítulo 3 uma análise análoga ao Capítulo 2 ocorrerá sob a perspectiva da gestão Lula. Nesta parte, coube dedicar uma seção à crise financeira internacional e seu enfrentamento, por se apoiar em uma posição divergente do mainstream econômico e obter resultados que foram considerados positivos.

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Metodologia

A discussão a que se propõe este trabalho foi estruturada de forma a inicialmente analisar a aprovação na Carta Magna e o caminho para a consolidação dos direitos sociais ao longo dos governo que assumiram neste período. Tal abordagem se faz necessária para que o leitor entenda o novo cenário e as novas demandas que surgiram à época, diferentes do discurso de alívio da pobreza e da fome que sempre existiu.

Em um segundo momento, a análise se volta para a condução das políticas e para a direção em que caminharam os objetivos econômicos e os objetivos sociais.

Nesse sentido, o trabalho consiste em um ensaio empírico a partir de extensa literatura sobre o tema, que busca analisar as diferentes políticas adotadas e seus resultados. Foram consultados textos de diversas publicações tais como artigos, livros, dissertações e teses, procurando equilibrar diferentes visões partidárias a fim de que o estudo tivesse uma perspectiva pluralista apesar do viés natural de qualquer trabalho científico. Além disso, foram utilizados dados a fim de ilustrar mudanças na estrutura social, no padrão de desigualdade, nas receitas e gastos da União, e etc.

Adotou-se uma metodologia comparativa com a intenção de colaborar para ensaios conclusivos sobre quais tipos de políticas possuíram objetivos convergentes e quais tiveram intenções divergentes, além de esclarecer um ponto importante: se isto gera influência ou não no sucesso dos objetivos sociais.

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Capítulo 1- A Constituição de 1988 e a introdução dos Direitos Sociais

A data em que foi promulgada a Constituição de 1988 é celebrada por vários autores como uma ruptura histórica, fruto de um longo processo de redemocratização do país. Já se passaram mais de duas décadas e ainda encontra-se em pauta a discussão do porquê este documento ter representado tal marco para a cidadania. Segundo Lavinas (2006), a nova Carta veio refundar o sistema de proteção social brasileiro ao instituir a Seguridade Social, pois, até então, o Brasil possuía um modelo bastante limitado, de caráter exclusivamente contributivo e restrito aos trabalhadores formais.

Este capítulo visa esclarecer quais as principais mudanças decorridas com o advento da Constituição de 88, contrastando com o que existia anteriormente.

A seção 1.1 tecerá um panorama das características gerais das Constituições anteriores para que, em um momento seguinte, seja possível entender porque esta foi considerada uma grande mudança jurídico-institucional no cenário brasileiro.

Na seção 1.2 será abordado mais especificamente o tema da Assistência Social na Carta Constitucional. A seção 1.3 será dedicada a descrever os avanços na área da Saúde e, por fim, a Previdência Social - terceiro ramo que forma a Seguridade Social - será contemplada na seção 1.4.

Seção 1.1 – Um histórico da criação do sistema de proteção social brasileiro

A elaboração de uma Constituição é um processo permeado de embates políticos e influência de grupos dominantes. As constituições anteriores a de 1988, tais como a de 1967 e 1945, foram pautadas na expressão dos interesses de determinadas classes poderosas em suas respectivas épocas. Em linhas gerais, a Era Vargas - marcada pela forte ideologia trabalhista - foi responsável pela criação de um esboço de um sistema de proteção social na Constituição de 1945. Já a Constituição de 1967, fruto de um período de ditadura, representava uma classe política marcada pela ideologia de Segurança Nacional.

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12 Apesar de existir um grande potencial de discussão acerca destes assuntos devido a sua amplitude, este trabalho focará apenas na mudança do papel do Estado frente às políticas sociais e nas novas estruturas criadas para assegurar os direitos.

Os mecanismos de equidade social quase sempre ocuparam posições periféricas nas agendas dos governos. Isto porque havia um entendimento de que, na sociedade, existiam dois grupos de pessoas: os merecedores, que tinham condições de se proteger das inseguranças do mercado, e os não merecedores, que se encontravam em situação de necessidade por não terem capacidade e mérito de se alocar no mercado de trabalho. Diversos autores concordam que o caráter das políticas sociais no Brasil até a Carta Magna de 88 era baseado na meritocracia e no corporativismo. Segundo o Relatório do IPEA (2009), podemos definir este modelo através da concepção de um Estado que atua para corrigir as distorções do mercado, mas no sentido de complementar e não substituir, e cujo financiamento se dá mediante contribuição do trabalhador e de seu patrão. Isto é, a proteção social era pensada na lógica de um seguro praticamente voltado àqueles que se encontravam no mercado de trabalho formal, seguindo o modelo bismarkiano1.

Assim, tal sistema pode ser considerado conservador, pois apesar de proteger em certo grau os indivíduos, mantém o status de desigualdade da sociedade.

Fagnani (2008) analisa a estrutura das políticas sociais pós-64, anterior à nova constituição, e enumera quatro características marcantes:

• Caráter regressivo no financiamento do gasto social – As contribuições sociais, difundidas nos diversos setores, tornaram-se a principal fonte de financiamento. Estas incidem sobre a folha de salários, sendo pagas por empregados e empregadores. Em termos efetivos, porém, elas incidiam apenas sobre o salário dos trabalhadores, pois a parte que cabe às empresas é entendida como um custo adicional na produção, e repassada para o preço final das mercadorias;

• Processos decisórios centralizados na União – Condicionado principalmente pelo contexto de autoritarismo. Materializou-se na criação de mecanismos

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Por modelo bismarkiano entende-se um sistema onde os benefícios estão condicionados a uma contribuição individual. Esta nomenclatura faz referencia as políticas adotadas por Otto Von Bismarck, chanceler da Alemanha no século XIX.

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13 burocráticos com prevalência do Poder Executivo, que contribuiu para que a sociedade civil ficasse alheia aos processos desencadeados pelo Estado;

• Privatização do espaço público – Permeabilidade das políticas e programas sociais aos interesses particulares, empresariais e clientelistas. A fragilidade dos mecanismos democráticos possibilitou que este movimento se desse tanto por meio de influência direta quanto pela ocupação de posições privilegiadas nos processos decisórios;

• Fragmentação institucional – Demonstrava a falta de preocupação com a coordenação institucional, tendo como consequência ações fragmentadas e de pouca efetividade. Não atingiu a todos os setores da política social, ficando restrita aos segmentos relativamente periféricos (alimentação e assistência); O autor acredita que este modelo tinha objetivo de, ao mesmo tempo, demonstrar preocupação com a questão de distribuição de renda e legitimar o regime vigente junto às camadas mais pobres, sem causar grandes impactos que violassem os interesses das classes mais privilegiadas.

O resultado das ações sociais implementadas nesta época, tendo em vista as características apontadas anteriormente, foi irrelevante na redistribuição de renda para a população mais pobre. Seus impactos se deram apenas na expansão da oferta de bens e serviços, alavancada pela criação de novos mecanismos institucionais e financeiros. Esta estrutura, então, se caracterizava como um entrave a ser superado pela nova Constituição para que a reforma do sistema de proteção social pudesse produzir efeitos significativos.

O artigo 194 da Carta Magna de 88 definiu os princípios e diretrizes dessa nova política integrada:

“A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único. Compete ao poder público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

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14 I - universalidade da cobertura e do atendimento;

II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;

V - eqüidade na forma de participação no custeio; VI - diversidade da base de financiamento;

VII - caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e aposentados.”

Além deste grande avanço nos direitos sociais, a Constituição também criou uma nova institucionalidade para o financiamento das políticas e programas sociais. Este ficou conhecido como “Orçamento da Seguridade Social” e junto do Orçamento Fiscal e do Orçamento das Estatais, passou a integrar o Orçamento da União. Isto representou a criação de um fundo público com canalização de recursos próprios e exclusivos para as políticas de saúde, assistência social e previdência, distinto daquele que financia as demais políticas de governo. Ou seja, os recursos destinados ao Orçamento Social não podem ser utilizados para outros fins, que não os supracitados. Cabe destacar, entretanto, que este princípio constitucional foi “alterado” em 1994 com um projeto de emenda que criou a FEF (Fundo de Estabilização Fiscal), posteriormente denominada como DRU – Desvinculação das Receitas da União. Este mecanismo está autorizado a desvincular 20% de todos os impostos e arrecadações sociais2, sob o argumento de dar mais flexibilidade aos recursos do governo federal.

Segundo Teixeira (1991), o neologismo criado para traduzir a intenção desta nova política (do inglês, security; do francês, securité; do espanhol, seguridad) diz respeito exatamente a construção de um sistema de proteção social, concebido como instrumento indispensável ao processo de reprodução da força de trabalho. A noção de seguro (insurance; assurance; seguro) estava sendo deixada para trás, ainda que restassem alguns traços deste modelo.

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Cabe ressaltar que a DRU não incide sobre o Orçamento da Previdência Social, pois está previsto em lei que todos os recursos destinados para este fim não podem ser desviados. Em 2009, aprovou-se uma Emenda que levou ao cancelamento da DRU na Educação.

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15 Ainda à luz de Fagnani (2008), em seu texto “Direitos sociais no fio da navalha”, a redefinição do papel do Estado no Brasil como aquele que garante os direitos sociais foi na contramão da corrente neoliberal que proliferava à época na maioria dos países em desenvolvimento. Este movimento, que se iniciou no final dos anos 70, no bojo da luta pela redemocratização, estruturou um projeto de reformas progressistas apoiadas em três questões centrais: restauração do estado democrático de direito; construção de um sistema de proteção social, inspirado nos princípios do estado de bem-estar social implantado nos países europeus nos “anos de ouro” do pós-guerra (1945/75); e na concepção de uma nova estratégia macroeconômica, plenamente direcionada para o crescimento econômico com distribuição de renda.

O olhar inovador sobre as classes menos favorecidas, deixou para trás o julgamento de merecedores e não merecedores, e caminhou em direção a um alargamento dos direitos sociais através de um modelo redistributivista. O princípio bismarkiano de contribuição para proteção social estava para ser acrescido de uma dimensão beveridgiana- universal e compulsório – no caso de alguns grupos sociais.

Seção 1.2 - O que mudou no âmbito da assistência social

A Assistência Social no Brasil sofreu grandes mudanças após a introdução da Nova Carta Constitucional. Embora já existisse, a assistência esteve desde sempre atrelada ao populismo, vocação religiosa ou sentimento de caridade. Neste contexto, era composta por ações residuais, fragmentadas e com pouca clareza quanto a seus objetivos.

De acordo com Jaccoud (2008), as transferências monetárias compensatórias ainda não haviam sido introduzidas, com uma única exceção que era a Renda Mensal Vitalícia, criada em 1974. Este era um benefício concedido a idosos ou deficientes sem condições de sobrevivência. Contudo, seguindo a lógica bismarkiana do sistema de proteção social, a RMV era restrita àqueles que houvessem efetuado no mínimo doze meses de contribuições ao INSS.

Em 1988, porém, a Assistência Social passou a ser considerada uma política pública de Seguridade Social ao lado da saúde e previdência. Isto configurou um novo status, alterando a concepção da oferta dos serviços assistenciais, que passam a ser entendidos como responsabilidade do Estado cuja execução deve se fazer em parceria com

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16 organizações da sociedade civil. Desta forma, as principais atuações se dão pela desmercantilização de bens e serviços e transferências monetárias.

Cabe ressaltar que as grandes mudanças no campo da Assistência tiveram início com a criação da LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social), em 1993, que regulamentou o texto constitucional e “estabeleceu os objetivos, princípios, e diretrizes das ações. Ela determinou, ainda, que a assistência social seja organizada em um sistema descentralizado e participativo, composto pelo poder público e pela sociedade civil”3

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Diversas fontes - tal como o artigo do IPEA (2008) - enumeram, quatro grandes avanços da CF88 para a Assistência Social. São eles:

• A ampliação do sentido da Assistência como Seguridade Social, integrada a previdência e a saúde.

• Garantia de atendimento a quem necessitar, independente de contribuição prévia; sujeito, entretanto a controle de recursos. Isto constituiu um direito de acesso a seus bens e serviços.

• O Benefício de Prestação Continuada, antiga RMV, que distribui benefícios no valor de um salário mínimo para deficientes e idosos com 65 anos ou mais que possuem renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo. As duas principais mudanças neste ponto foram a não obrigatoriedade de contribuição prévia e a vinculação do benefício ao salário mínimo4.

• Diz respeito às novas regras de organização institucional, agora descentralizada e com participação social na elaboração e no controle dessa política.

Este segmento da Seguridade Social passou a contar com uma Secretaria Nacional de Assistência Social, um Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome. A partir de 2004, este ficou responsável pela elaboração do PNAS – Plano Nacional de Assistência Social – cuja função é direcionar as ações do Sistema Único de Assistência Social. O SUAS, que só teve sua base de implantação consolidada em 2005, “organiza a oferta da assistência social em todo o Brasil, promovendo bem-estar e proteção social a

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Retirado do site do Ministério do Desenvolvimento Social - http://www.mds.gov.br/assistenciasocial 4

Esta conquista é alvo de diversos ataques. Muitos acreditam que a vinculação do beneficio ao salário mínimo traz rigidez para a política, o que pode acarretar problemas em períodos de contenção de gastos.

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17 famílias, crianças, adolescentes e jovens, pessoas com deficiência, idosos”, segundo o site do MDS. Dentro de toda esta estrutura integrada, e como parte da estratégia de descentralização, existem os CRAS – Centros de Referência de Assistência Social – e os CREAS – Centros de Referência Especializados de Assistência Social – que são centros de acolhimentos diretos, localizados em tese em cada município brasileiro.

Seção 1.3 – O que mudou no âmbito da saúde

Antes de 1988, apenas trabalhadores com carteira assinada tinham acesso à saúde.

Todos têm o direito a um padrão de vida adequado à saúde e ao bem-estar individual e de sua família, incluindo alimentação, vestimenta, habitação e cuidado médico, além dos indispensáveis serviços sociais; e o direito à segurança no caso de desemprego, doença, incapacidade, viuvez, velhice ou outra carência dos meios de subsistência em circunstâncias que estejam além de seu controle (DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, 1948, Art. XXV).

Diferente de outros campos de reforma da Constituição, as mudanças na saúde foram estruturais. À luz da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a saúde passou por uma mudança de paradigma, sendo encarada como uma política para além do tratamento médico. Passaram a integrar este conceito medidas como segurança alimentar, prevenção, condições de higiene, etc. Segundo Relatório do IPEA (2009), “os movimentos sociais procuram consagrar a universalização de direitos mediante leis e, sobretudo, por meio de sua inclusão nas constituições nacionais”. E de fato, este direito foi alcançado mais adiante no caso brasileiro, com a criação do Sistema Único de Saúde.

Ainda de acordo com o texto, antes do SUS, o sistema de saúde podia ser considerado excludente, segmentado, de oferta hegemonicamente privada, com ênfase em ações “ex-post”, ou seja, de recuperação e não de prevenção. Além disso, era altamente

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18 centralizado no nível federal e marcado pela vinculação da assistência à condição de trabalhador formal.

Um dado interessante, segundo o mesmo relatório, é que até a década de 70 mais da metade dos leitos e instalações hospitalares eram de posse de entidades filantrópicas. Este número expressa a ausência do sistema público de provisão de saúde, tornando-se dependente da caridade de entes privados.

Ao longo deste período, algumas políticas foram desenvolvidas a fim de expandir a cobertura da saúde e na tentativa de mudar o perfil das ações anteriores - restritas ao controle de doenças transmissíveis e de vigilância sanitária. Como exemplos, temos: a vinculação do atendimento à previdência rural (Funrural em 1971), posteriormente ampliando o acesso a qualquer pessoa que se encontrasse em situação de urgência (Plano de Pronta Ação, em 1974); a tentativa frustrada de aprovação do Prevsaúde em 1981, que buscava uma hierarquização e integração dos serviços, aliados a participação comunitária; dentre outros. Estima-se, porém, que mesmo após estes esforços, metade da população não possuía qualquer tipo de cobertura.

Este cenário é reestruturado com a nova Carta Magna que:

• Determina a saúde como direito de todos e dever do Estado (Art. 196).

• Define o caráter de relevância pública de ações e serviços de saúde (Art. 197), com o que ficam justificadas sua regulamentação e fiscalização pelo poder público, especialmente pelo Ministério Público (MP).

• Declara a saúde livre à iniciativa privada (Art. 199).

• Define a forma de organização, os princípios, o financiamento e as competências do SUS e o caráter complementar da participação do setor privado (Arts. 198, 199 e 200).

O amplo processo de descentralização permitiu maior participação de Estados e Municípios no financiamento, na gestão e na provisão dos serviços de saúde, diminuindo as desigualdades inter-regionais que prevaleciam no sistema pré-CF88.

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19 A fim de evidenciar a ampliação do leque de serviços oferecidos, frente às ações restritas do período anterior, podem ser destacados alguns programas e diretrizes inovadoras:

- ampliação do acesso à atenção básica – Programa Saúde da Família (PSF) - a ampliação do acesso a transplantes – Programa Nacional de Imunização (PNI) - o acesso a medicamentos de alto custo

- o controle das doenças sexualmente transmissíveis e AIDS - Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu)

- o acesso a tratamento dentário – programa Brasil Sorridente - o controle do tabagismo

Apesar destes avanços, a área da saúde pública ainda enfrenta muitos gargalos. Os próximos capítulos irão se ocupar em descrever, dentre outras, uma perspectiva atual desta área, destacando seus avanços e problemas na gestão FHC e Lula.

Seção 1.4 – O que mudou na Previdência Social

O terceiro pilar da seguridade social – a previdência – será retratado a seguir, ainda que sua história se misture com os outros dois pilares e que seus avanços não estejam restritos a 1988.

Segundo Tamburi (1987) appud Vianna (1998), por função previdenciária geral entende-se um regime legal obrigatório – que pode não ser único – estabelecido em lei para garantir um rendimento substitutivo no momento que o indivíduo se retira da atividade laboral.

A história da Previdência no Brasil tem início com a Lei Eloy Chaves, em 1923, que deu origem às Caixas de Aposentadorias e Pensões. Segundo Teixeira (1991), as CAPs cobriam apenas os trabalhadores dos ramos de atividades considerados indispensáveis ao funcionamento dos setores agroexportadores, tais como ferroviários e portuários. Porém, foi na década de 30, com a ascensão de Vargas e a lógica de uma estrutura sindical corporativa, que se estruturou um Sistema Previdenciário com a criação dos

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20 Institutos de Aposentadorias e Pensões. Setorizados, os IAPs filiavam trabalhadores de determinada categoria, recolhiam fundos e atuavam sob o regime de capitalização. Vianna (1998) afirma que este sistema reforçava a desigualdade social no país pois dava a cidadãos estratificados em categorias profissionais benefícios desiguais. Consagrou, além disso, a excludente vinculação entre contribuição e distribuição, além de transformar em pré-cidadãos todos aqueles cujo trabalho não era reconhecido por lei: autônomos, domésticas, trabalhadores rurais, entre outros.

O seguro por categoria contribuía para fortalecer o corporativismo e a forte ligação que existiu - rompida apenas em 1988 - entre direitos sociais e a condição de trabalhador formal. Esta vinculação cunhou o termo “cidadania regulada”, onde o exercício da cidadania acontecia via regulamentação das profissões (IPEA, 2009).

Cabe ressaltar alguns dos benefícios oferecidos pelos Institutos: aposentadoria por idade ou por invalidez; pensão; assistência médica hospitalar; auxílio funeral; auxílio detenção, etc.

Em 1960, a Lei Orgânica da Previdência Social uniformizou os benefícios dos contribuintes mantendo, contudo, a estrutura dos IAPs. Evoluído para o regime de repartição simples, desde o início apresentou uma tendência crônica ao desequilíbrio financeiro (Teixeira, 1991).

Em 1966, os IAPs são unificados no INPS (Instituto Nacional de Previdência Social), que filiavam toda mão de obra urbana com carteira assinada, independente de sua categoria, além dos então excluídos do sistema – autônomos, domésticas, rurais, etc. É neste cenário que o caráter exclusivo de seguro é parcialmente abandonado para ceder espaço a um sistema com viés mais distributivo e assistencial.

Do ponto de vista administrativo, observou-se a União cada vez menos contribuindo para o custeio do sistema. Segundo dados de Teixeira (1991), caiu de 11% no início da década de 70 para menos de 4% em 80.

O mesmo autor acrescenta ainda que mesmo com a metamorfose do sistema de capitalização para o de repartição simples, permaneceram práticas, conceitos e procedimentos que mantinham o sistema híbrido:

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21 - a base da folha de salários para as contribuições sociais, que eram responsáveis por 85% das receitas previdenciárias no período;

- a receita vinculada e a administração autônoma dos recursos arrecadados;

Cabe destacar que a participação da União no custeio do sistema reduz de 11% no início da década de 70 para menos de 5% no final.

É em 1988 que, com a promulgação da nova Constituição, ocorreram algumas importantes mudanças no Sistema Previdenciário, principalmente no sentido de universalização e manutenção do valor real dos benefícios (IPEA, 2009). A determinação do salário mínimo como piso para os benefícios; o cálculo da aposentadoria com base na média dos últimos 36 salários de contribuição; e a uniformização e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais com a inclusão dos então “segurados especiais” são algumas das conquistas enumeradas por Teixeira (1991).

O próprio texto constitucional previa uma revisão das decisões cinco anos após sua promulgação. Em 1993, então, uma comissão da Câmara – a Comissão Especial para Estudos do Sistema Previdenciário – reuniu-se para elaborar um diagnóstico que explicitou as fragilidades do sistema, propondo sugestões que o tornassem mais estável e seguro. Os pontos levantados neste documento ecoaram pelos anos seguintes, tornando o assunto Previdência bastante polêmico por muito tempo. Como a intenção deste capítulo é analisar a ruptura decorrida da chamada Constituição Cidadã, as alterações posteriores serão tratadas mais adiante.

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Capítulo 2 – A gestão de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002)

“(...) Não fui eleito para ser o gerente da crise. Fui escolhido pelo povo para superá-la e para cumprir minhas promessas de campanha. Para continuar a construir uma economia estável, moderna, aberta e competitiva. Para prosseguir com firmeza na privatização.” (F.H.C., 1995)

No seu discurso de posse em 1995, Fernando Henrique Cardoso falou dos objetivos e expectativas em relação ao mandato que iniciava. Com um viés neoliberal, estabeleceu como compromisso formal - que nortearia as ações de seu governo - a superação da inflação, trazendo de volta a estabilidade para o Brasil. Além disso, completa Giambiagi (2005), devido ao turbulento período político que o antecedeu, pretendia retomar a tradição de um presidente concluir o mandato na data prevista para passá-lo ao seu sucessor.

Compartilhando as ideias de Fagnani (2005) em seu artigo “Política Social no Brasil (1964-2002): Entre a Cidadania e a Caridade”, o argumento central a ser demonstrado neste capítulo é que, na gestão FHC, não houve compatibilidade entre estratégia macroeconômica e possibilidades efetivas de desenvolvimento e inclusão social. Isto não quer dizer que os objetivos em si fossem divergentes, mas a sua condução acabou minando as chances de sucesso em ambos, em razão do perfil da política macroeconômica e social adotadas.

A chamada contrarreforma liberal (1993-2002), que norteou o governo FHC, promoveu uma real desestruturação das bases de financiamento da União, estados e municípios, estreitando as possibilidades de elevação do gasto social – na contramão do que se esperava frente à promulgação da nova Constituição Cidadã - e, então, retardando a recuperação econômica do país.

Seção 2.1 – O tripé da política macroeconômica

O período que se pretende analisar ficou conhecido por uma importante inovação na condução das políticas econômicas. Dado o objetivo central do governo de trazer a estabilidade monetária de volta, consolidando o Plano Real e deixando a memória inflacionária para trás, foram desenvolvidos mecanismos, principalmente a partir de

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23 1999, que se tornaram a base de sustentação das políticas cambial, monetária e fiscal. O tripé da política econômica, como ficou conhecido, previa um câmbio flutuante valorizado, um sistema de metas de inflação controlado por elevadas taxas de juros e a obtenção de elevados superávits primários (IPEA, 2008).

A seguir será retratado de forma sucinta o percurso de cada uma das políticas macroeconômicas na gestão FHC.

Seção 2.1.1 - Política fiscal

Giambiagi (2005) afirma que este período caracterizou-se por uma grave crise fiscal, reflexo principalmente de:

• Um déficit primário consolidado do setor público

• Um déficit nominal de 7% do PIB na média de 1995-1998 • Uma dívida pública crescente

A tabela 2.1 retrata a trajetória da dívida total líquida do setor público em % do PIB. De 1995 a 2002, o indicador cresceu quase 90% puxado principalmente pela dívida interna.

Tabela 2.1: ASCENSÃO DA DÍVIDA GOVERNAMENTAL 1995-2002 (% PIB)

Fonte: Banco Central, 2011. Vários Relatórios.

Segundo Sicsú (2006), para que a dívida pública não aumente continuamente, um governo deve adotar uma combinação das seguintes medidas: (I) aumento da arrecadação; (II) redução dos gastos correntes e de investimento; e (III) redução das despesas financeiras.

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24 O governo Fernando Henrique utilizou a primeira alternativa, aumentando a carga tributária de 28,6% para 35,9% do PIB entre 1995 e 2002, segundo relatório da Receita Federal de Abril de 20035.

A segunda alternativa também foi acionada com cortes no âmbito da saúde e da assistência social. No contexto liberal do governo FHC, dentro da lógica de redução dos custos e superávits primários, os programas focalizados de transferência de renda para as populações extremamente pobres ganharam destaque por representarem um incremento pequeno no gasto social (Moreira, 2011). O caráter universal é deixado de lado, contrariando diversos direitos assegurados em 88.

Vale lembrar que é uma garantia constitucional que a contribuição de empregados e empregadores - parte que compõe o orçamento da previdência - não pode ser desviada para outros fins. Dessa forma, tanto a DRU quanto outros cortes no orçamento atingem apenas os outros dois pilares da seguridade (Saúde e Assistência Social).

A terceira alternativa, porém, não foi concretizada. É evidente que qualquer governo deseja reduzir suas despesas, mas é importante ressaltar que a medida proposta acima refere-se à perseguição deste objetivo de forma efetiva e prioritária. A contínua elevação dos juros como fonte de captação de reservas demonstrou que existia outra prioridade: a estabilidade econômica, segundo o próprio governo.

Este quadro fez com que a obtenção de superávits primários fosse um dos objetivos centrais e quase exclusivos do governo FHC, posteriormente integrando o tripé que caracterizou a política do período. Este critério de análise do resultado fiscal – o resultado primário - consiste no total das receitas arrecadas pelo nível federal, menos as despesas não-financeiras, mais especificamente, os gastos com os juros da dívida pública tanto interna quanto externa. Ou seja, quando um governo obtém superávits primários, ele está mostrando ao mercado que possui recursos para arcar com as despesas financeiras e, quanto maior o resultado, mais o país fortalece, em tese, sua credibilidade (Sicsú, 2006).

A questão é que muitas vezes a obtenção deste superávit exige um grande esforço das contas públicas com corte de gastos em diversos âmbitos. Um dos facilitadores deste processo foi o FEF (Fundo de Estabilização Fiscal, 1996 – antigo FSE (1994 e 1995)),

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25 criado na primeira etapa do Plano Real – durante o ajuste fiscal – posteriormente chamado de DRU (Desvinculação das Receitas da União, 2000). Este mecanismo, já citado no capítulo anterior, foi criado com o intuito de dar mais flexibilidade ao orçamento da União e permite ao governo desviar até 20% das receitas vinculadas (como é o caso das contribuições sociais) para outros fins. É neste sentido que o gasto social é prejudicado.

Seção 2.1.2 - Política cambial

A política cambial desempenhou importante função no governo FHC, sendo a âncora cambial uma das principais formas pela qual a inflação era combatida no primeiro mandato. O grande defensor desta política, o presidente do Banco Central Gustavo Franco, acreditava que manter o câmbio valorizado seria eficaz para inibir o aumento dos preços domésticos devido à concorrência dos importados. Em meados de 1994, o dólar valia R$0,86.

Como se pode imaginar, a manutenção do real em patamares tão valorizados frente ao dólar era um processo “artificial” no sentido em que havia um controle que inibia grandes variações no preço do dólar e, por isso, exigia imensos esforços das contas do governo. Além disso, causou grandes impactos na indústria e na estrutura industrial do país.

Para Fagnani (2005), o Plano Real atrelou a estabilidade de preços à abertura comercial, à sobrevalorização cambial e aos recursos externos, o que custou caro para os brasileiros. Segundo o Banco Central, o déficit em Transações Correntes saltou de R$ 1,8 milhão para R$ 33,5 milhões entre 1994 e 1998.

O forte desequilíbrio das contas externas, resultado direto da política adotada ampliou a vulnerabilidade da economia. O preço dos produtos importados tornou-se mais acessível para a população enquanto os nacionais perdiam competitividade externa. A combinação de um grande aumento das importações, em torno de 22% a.a. entre 1995 e 1997, contra um desempenho pouco empolgante das exportações, apenas 6,8% a.a. neste mesmo período, foi prejudicial para a Balança Comercial.

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26 A dependência em relação às reservas internacionais residia no fato de ser necessário ao governo ter um estoque de moedas internacionais para poder intervir quando o Real se desvalorizasse, vendendo dólares no mercado cambial para trazer a moeda de volta ao patamar desejado. Isso fez com que o regime de âncora cambial fosse enfraquecendo até chegar a uma situação crítica que, impulsionada pelos efeitos da moratória Russa6, tornou-se insustentável em 1999. Neste momento o governo viu-se obrigado a deixar o cambio flutuar, fazendo o dólar subir de R$1,20 para R$2,00 em menos de 45 dias.

A balança comercial conseguiu se recuperar após a desvalorização ocorrida logo no início do ano, o que favoreceu uma mudança de cenário no segundo mandato do presidente Fernando Henrique. O gráfico 2.1, compilado com base em dados do IBGE (Contas Nacionais Trimestrais, acessado em 2011), mostra a mudança de rumo das exportações e das importações a partir de 1999.

Gráfico 2.1: BALANÇA COMERCIAL 1995-2002 (US$ mil)

Fonte: Banco Central (2011) – Contas Nacionais

A cobertura dos desequilíbrios na Balança Comercial dependia da acumulação de reservas cambiais. Além do financiamento na forma de investimento direto externo (IDE), que acabava por gerar novos endividamentos, uma das principais estratégias implicava em elevar a taxa de juros para que se tornasse atrativa aos olhos do mercado mundial.

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27 Sicsú (2006) alerta que o problema neste caso é que o custo para a formação e obtenção de reservas é a diferença entra a taxa de juros doméstica (que remunera os títulos públicos) e a taxa de juros internacional (pois os dólares adquiridos pelo BC são aplicados em títulos de outros governos, em sua maioria nos títulos do tesouro americano).

Quando comparamos a trajetória da taxa de juros doméstica frente à internacional no período (gráfico 2.2), percebe-se a disparidade que havia entre elas e, portanto, os altíssimos custos gerados para bancar esta política.

Gráfico 2.2: DIFERENÇA ENTRE A TAXA DE JUROS DOMÉSTICA E INTERNACIONAL (%)

Fonte: FMI e BC – Carta de Conjuntura (IPEA) 2011

Conforme pode-se observar no referido gráfico os juros brasileiros chegaram a níveis exorbitantes. Podemos perceber um movimento de escalada a partir da adoção do regime de âncora cambial. Com isso, o objetivo de formar reservas internacionais foi alcançado passando de um patamar de U$30 para U$60 bilhões (Fagnani, 2005).

A próxima seção tratará de forma mais detalhada sobre este assunto, abordando a política monetária no governo FHC, cujo principal ator foi a taxa de juros.

Seção 2.1.3 - Política monetária

Convidado a assumir a presidência do Banco Central em meio à confusão da desvalorização cambial em 1999, Armínio Fraga, cuja especialidade era o mercado

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28 financeiro internacional, anunciou, de início, duas providências: a elevação da taxa de juros básica e a adoção do sistema de metas de inflação (Giambiagi, 2005).

Segundo o mesmo autor, este último mecanismo, que vinha apresentando bons resultados em outros países, foi entendido como uma “troca de âncora” devido à derrocada da âncora cambial.

O sistema de metas de inflação foi descrito por Giambiagi (2005) como um regime onde o Conselho Monetário Nacional (CMN) define um alvo para a variação do IPCA e a partir disso passa a balizar as decisões de política monetária do Copom. Trabalha com a margem de tolerância (acima e abaixo da meta) para acomodar impactos de variáveis exógenas. Quando a inflação fica fora da meta estabelecida, o presidente do Banco Central deve enviar ao Ministro da Fazendo uma Carta Aberta explicando as causas do não cumprimento e listar as medidas a serem tomadas para o próximo ano.

A tabela 2.2 demonstra quais foram as metas estabelecidas em cada ano a partir da adoção do sistema em 99 e qual foi a inflação efetiva alcançada.

Tabela 2.2: METAS DE INFLAÇÃO E RESULTADOS VERIFICADOS

Fonte: Bacen–IPEA/Dimac – Carta de Conjuntura Março/2011

Nota-se que o ano de 2002 extrapolou a meta em 7 pp. Isto foi descrito na carta do Ministro da Fazenda como efeito sobre a incerteza política sobre o capital estrangeiro. Mais explicitamente, este resultado representou o medo dos investidores internacionais frente à iminente vitória do candidato à presidência, Luis Inácio Lula da Silva.

A fuga de capitais gerou uma forte desvalorização do câmbio, encarecendo os preços dos importados e refletindo no IPCA.

Sobre este método de controle da inflação – o sistema de metas – ainda há muita divergência entre economistas. Alguns (como João Sicsú) acreditam que deu certo no Brasil e em outros países pelo fato de que a inflação já se apresentava em queda

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29 enquanto outros (como Giambiagi, por exemplo) acreditam que este foi o responsável pelo domínio do dragão da inflação.

Apesar de controverso, é aparente que a economia finalmente apresentou bons resultados no controle dos preços após um longo período de instabilidade. Isto, porém, exigiu a subordinação da taxa Selic – além da base monetária e da taxa de câmbio - à política monetária.

Biasoto (2004) appud Fagnani (2005, pag 425) acredita que a explosão do endividamento público deveu-se a isso, que, na prática, manifestou-se através da manutenção de juros elevados para o controle dos preços. Junto a isso, pode-se dizer que outros fatores também contribuíram em menor escala para esta situação. Entre eles: a desvalorização cambial que aumenta o valor em moeda nacional da dívida que está indexada ao dólar; a parcela de juros que foi rolada nos anos anteriores e incorporada ao estoque da dívida e, em menor medida, a “federalização” das dívidas de estados e municípios.

Dessa forma, e levando em conta o que foi explicado na parte referente à política fiscal, pode-se entender como a política monetária esteve na contramão da promoção social e da consolidação dos princípios e direitos estipulados na nova Constituição.

A seguir, serão narrados os principais pontos da política social de Fernando Henrique.

Seção 2.2 – Políticas Sociais: Distribuir para não universalizar

Fagnani (2005) acredita que o atraso de 40 anos do Brasil para incorporar o modelo de welfare state europeu comprometeu o sucesso deste sistema aqui, pois nosso sistema de proteção social terminou ocorrendo em um momento em que este paradigma não era mais dominante e, ainda pior, estava na contramão do capitalismo liberal que vingava em todo o mundo. Ou seja, muitas conquistas da Constituição expressas no capítulo anterior como, por exemplo, uma política universal e equitativa (art. 194), já nasceram com poucas chances de sobrevida.

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30 As contradições entre a Carta Magna de 1988 e o ideário neoliberal que se instalara na política brasileira eram marcantes e são importantes para explicitar a forma como o Estado se portou frente às questões sociais. O quadro 2.1 ilustra este cenário:

Quadro 2.1: MUDANÇAS DE PARADIGMAS

Constituição 88 Gestão FHC

Fonte: elaboração própria baseado em Vianna (2008)

Vianna (2008) afirma que os anos 90 deram luz a uma institucionalidade avessa à concepção da Seguridade Social. Este estaria traçado em “raias pararelas”, por fora do que estava previsto na Constituição. Quais os rebatimentos de tal institucionalidade às avessas no desenho das políticas sociais? Pretende-se responder a tal questão analisando os grandes programas e políticas sociais da era FHC.

Seção 2.2.1 – Assistência social - Programa Comunidade Solidária e PRODEA

A política social direcionada para a Assistência Social na gestão de Fernando Henrique seguiu duas linhas distintas: a primeira, impelida pelas conquistas da Constituição e implementadas através da LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social) e a segunda que atuou à margem da nova institucionalidade, que buscava combater a pobreza e a desnutrição, teve como principais atores o Programa Comunidade Solidária e, no segundo mandato, o Programa Comunidade Ativa, o Projeto Alvorada e a Rede de Proteção Social.

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31 Sobre a primeira frente, faz-se importante destacar o papel que a LOAS teve sobre a política no período que se segue, pois a implantação de suas medidas independe das diretrizes do governo em questão. Logo no início foi criado um dos principais mecanismos de transferência de renda - o Renda Mensal Vitalícia - posteriormente chamado de BPC (Benefício de Prestação Continuada), que era responsável por transferências monetárias a idosos carentes e pessoas portadoras de deficiências físicas, que, em 2002, cobria cerca de 1,5 milhões de pessoas.

A segunda frente e, talvez a principal, integrou uma das primeiras medidas tomadas por Fernando Henrique como novo presidente: o Programa Comunidade Solidária foi criado em 12 de janeiro de 1995. Um importante conceito embutido no programa era a necessidade de parceria sociedade-governo devido aos limites da ação estatal (Peres, 2005), pois se defendia a ideia de um Estado mínimo. Ligado ao Gabinete Civil e presidido pela então primeira-dama Ruth Cardoso, o Comunidade Solidária previa o combate à pobreza através dos princípios da descentralização e da solidariedade. Situava-se fora da Seguridade Social e esse era um ponto criticado por aqueles que defendiam a institucionalidade da Constituição7.

Segundo Peres (2005), o programa definia suas ações a partir dos critérios de focalização, necessidades, parcerias, urgências e solidariedade. Alguns destes, como a focalização e a urgência, referem-se a cobertura apenas das camadas mais pobres da população e, contrariamente ao previsto, não combate de maneira eficiente as desigualdades sociais e a pobreza.

Ao longo do tempo, porém, o governo passou a receber duras críticas devido à percepção de que sua estratégia social estaria basicamente restrita ao Comunidade Solidária. Em sua defesa, o presidente afirmava que, para além deste programa, era preciso entender o papel social da estabilidade econômica que estava sendo alcançada através do Plano Real. Para reduzir a vulnerabilidade, a meta era acabar com a inflação.

Neste sentido é preciso destacar o caráter regressivo da inflação e explicar por que penaliza de forma mais intensa a população com menor poder aquisitivo: A inflação é usualmente definida como um aumento generalizado dos preços da economia. Como as camadas mais pobres são aquelas que gastam a quase totalidade de sua renda no

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Isso quer dizer que os benefícios pagos não obedeciam ao piso do salário mínimo instituído pela Constituição nem configuram uma cesta de direitos, como é o caso das aposentadorias rurais e urbanas ou do Benefício de Prestação Continuada (BPC).

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32 consumo, sendo caracterizada por uma maior propensão marginal a consumir (Keynes, 1936), esta população tem sua renda quase integralmente atingida pelos preços em alta. Em contrapartida, as outras camadas, que têm uma razão consumo/renda menor, conseguem poupar parte do que ganham ou deixar de gastar quando os preços estão inflacionados, aplicando tais recursos e, por isso, acabam protegendo-se da ciranda inflacionária.

Os anos 80, por exemplo, foram de intensa concentração de renda, dentre outros fatores, por causa do processo inflacionário.

“Nunca houve uma distribuição de renda equivalente a que está sendo feita no Brasil, hoje. Não existe separação entre econômico por um lado e social por outro. (...) Não queremos um Brasil de migalhas.” (Cf. Discurso do Presidente Fernando Henrique Cardoso em Corumbá. O Estado de São Paulo, 19/4/1996)

No inicio de 1996, foi criada uma Secretaria-Executiva que ficou responsável pela coordenação do plano social. O órgão se apressou em publicar o documento “Uma estratégia de desenvolvimento social” cuja intenção era sistematizar as diretrizes básicas e apresentar as políticas e programas previstos para esta área. A proposta era exercer uma política que garantisse o direito social, a igualdade de oportunidades e a proteção dos grupos mais vulneráveis (Draibe, 2003).

De inspiração social-democrata e visando uma sociedade de bem-estar social, a proposta abrangia atuação nas áreas de educação, saúde e nutrição, previdência social e seguro-desemprego, trabalho, habitação e saneamento (cf. Brasil, Presidência da República, 1996 – pag.9).

A política era constituída por três conjuntos:

• Serviços básicos de vocação universal e de responsabilidade pública – Melhoria nos serviços de educação, saúde, habitação, previdência, etc.;

• Programas básicos – Seleção de 45 programas prioritários que receberiam atenção especial;

• Programa de enfrentamento da pobreza – liderado pelo então Programa Comunidade Solidária.

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33 Com este documento o governo procurou se defender das críticas, mas os recursos continuaram em declínio e cada vez mais eram criados programas fragmentados que buscavam atingir uma parcela muito focalizada da população – os extremamente pobres e vulneráveis.

O período em questão foi marcado por uma imensidão de programas que pretendiam combater a fome, a miséria, a erradicação do trabalho infantil, a baixa qualificação profissional, entre outros, que geravam desorganização e ineficiência. Este arranjo de diversos programas picotados e sem unidade deu margem para casos como o de famílias que recebiam mais de um benefício do mesmo programa enquanto, por outro lado, existiam famílias elegíveis que não conseguiam se inscrever em nenhum programa. A título de exemplificação, Lavinas (2006) lista algumas destas medidas, exaltando o impacto reduzido e o peso quase insignificante que representavam nos gastos governamentais:

Tabela 2.3: PROGRAMAS SOCIAIS DO PERÍODO

Fonte: elaboração própria baseada em Lavinas (2006)

Outro aspecto essencial para descrever as políticas sociais no período FHC, foi o combate à fome. Segundo o Mapa da Fome elaborado pelo IPEA em 1993, mais de 30 milhões de brasileiros encontravam-se em condições de indigência. Este dado alarmante chamou a atenção do governo para esta carência e aumentou a visibilidade de programas como o PRODEA - Programa de Distribuição Emergencial de Alimentos -, criado em 1993 e inicialmente destinado apenas para a população carente do norte de

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34 Minas e do Nordeste. Representava a nível federal um retrato do que já ocorria em diversas políticas locais, e tinha como objetivo aumentar o grau de acessibilidade alimentar da população carente no curtíssimo prazo. Em 1995, passou a integrar o Comunidade Solidária e foi expandido para outras regiões, sob operacionalização da Conab (Lavinas, 2004).

O PRODEA atuava na distribuição de cestas de alimentos (em 1995, arroz, feijão e flocos de milho; em 1997, foi acrescido de farinha de mandioca e macarrão) e para ser beneficiário do programa eram necessárias algumas contrapartidas, geralmente ligadas à educação, saúde e trabalhos comunitários. É importante citar que, segundo Lavinas (2004), apesar do acréscimo dos 2 alimentos de 1995 para 1997, o aporte calórico diminuiu quase 20% devido a redução na quantidade de macarrão.

Este programa passou por diversas crises, principalmente devido às criticas que colocavam em cheque sua eficiência. A questão da distribuição de produtos in natura era agravada pelas notícias de que por diversas vezes os produtos haviam perecido e, além disso, pelos custos administrativos de todo o processo de estocagem e distribuição.

Seção 2.2.2 - Saúde

No período pós-Constituição surgiram ações com ênfase na prevenção e acesso à saúde que estavam previstas como direito universal. Cabe lembrar que antes de 88 a gama de serviços estava voltada quase exclusivamente para o tratamento de doenças, restritas ao modelo “hospitalocêntrico” (Draibe, 2003) e ainda muito vinculada ao trabalho formal.

A seguir são destacados alguns programas e diretrizes inovadores que a ampliaram o leque de serviços oferecidos e tentaram reverter o foco do Sistema de Saúde:

• Ampliação do acesso à atenção básica – Programa Saúde da Família (PSF); • Ampliação do acesso a transplantes – Programa Nacional de Imunização (PNI); • Acesso a medicamentos de alto custo;

• Controle das doenças sexualmente transmissíveis e AIDS; • Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU); • Acesso a tratamento dentário – programa Brasil Sorridente; • Controle do tabagismo

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35 A saúde ocupa o terceiro maior volume de recursos no Gasto Social Federal (entre 1995-2002), mas possui uma trajetória de dispêndios irregular (IPEA, 2008). Entre o primeiro e o último ano do mandato FHC, perdeu espaço na composição do GSF passando de 15,9% em 1995 para 13% em 2002 e também em relação ao PIB, caindo de 1,79% para 1,68%, entre os mesmos anos.

Conforme citado anteriormente, a saúde teve o orçamento afetado pela opção de políticas macroeconômicas do período. Isto ocorreu, segundo o Comunicado n°98 do IPEA (2011), porque a criação da CPMF em 1997 que tinha o objetivo de servir de fonte adicional para a saúde, acabou cobrindo a saída de recursos para alocação em outros setores. Ou seja, tornou-se uma fonte substitutiva ao invés de uma fonte adicional.

Seção 2.2.3 - Reformas da previdência

Em matéria da Revista Veja de 14/04/99, FHC declarou: "Essa obsessão de parar de trabalhar a uma certa idade vai criar problemas na Previdência, que já são desagradáveis por causa do aspecto financeiro".

Esta frase ilustra o sentido que orientou a reforma parcial da Previdência ocorrida nesta gestão. Draibe (2003) descreve os principais pontos da reforma:

Através da EC n°20 de 98, ocorreram mudanças nos critérios de elegibilidade pela determinação de uma idade mínima para as aposentadorias, além da substituição do conceito de “tempo de serviço” por “tempo de contribuição”. Com as novas regras, o acesso à aposentadoria passou a estar vinculado à comprovação de 35 anos de contribuição para os homens e de 30 anos para as mulheres exigindo-se, adicionalmente, idade mínima de 60 anos (mulher) e 65 anos (homem).

Destaca também a lei 9.876/99, responsável por aprovar o fator previdenciário para o INSS, através do qual era feito o cálculo do valor dos benefícios e onde se buscava desestimular as aposentadorias precoces e “premiar” os trabalhadores que contribuíssem por um tempo maior.

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36 Apesar da tentativa de reduzir os custos da Previdência Social com reformas parciais que tentaram prorrogar o tempo de contribuição dos trabalhadores, esta área ampliou a participação de seus gastos no PIB, passando de 4,98% para 6,08%.

Uma das explicações para isso seria a inclusão dos trabalhadores rurais em 1996 nos benefícios previdenciários8. Como foi dito no capítulo anterior, uma das importantes mudanças da Constituição Cidadã no âmbito da previdência foi equalizar os benefícios de trabalhadores urbanos e rurais, substituindo o FUNRURAL pela previdência rural.

Seção 2.2.4 – Desemprego e desregulamentação

O pensamento liberal da época foi responsável por lançar como foco da política trabalhista a redução dos encargos sociais e a flexibilização do mercado de trabalho. Isto porque havia a ideia de que o alto desemprego e informalidade decorriam do alto custo do trabalho, fruto da elevada incidência de encargos sociais sobre a folha de salários. Este fato comprometia a competitividade da indústria à nível internacional além de ser um desincentivo ao aumento do emprego (Fagnani, 2005).

Merece esclarecimento a incoerência destas ideias: Segundo Maria da Conceição Tavares (1995) appud Fagnani (2005), não existiam evidências de que a regulamentação fosse um obstáculo ao mercado de trabalho, assim como nada confirmava o pensamento de que a redução de salários contribuiria para aumentar o nível de emprego. No mesmo sentido, quando observados outros países considerados competitivos no cenário mundial, os encargos sociais encontravam-se no mesmo patamar (ou até inferior). Inclusive, contrariando o argumento do alto custo da mão de obra, o Brasil era um dos países com menor participação dos salários no custo de produção. Ou seja, o fracasso dos indicadores do mercado de trabalho deveria ser explicado através dos reflexos negativos da política econômica – ausência de investimento, de financiamento, câmbio super valorizado – ao invés de argumentos institucionais.

Embasado neste ideal e buscando enfrentar o desemprego - indicador que gera impopularidade e revolta social - Fernando Henrique declarou: “O primeiro ano de

8

Criada pelas Leis 8.212 e 8.213 de 1991, extinguiu o tratamento administrativo-institucional separado dado até então ao setor rural na Previdência Social e incluiu os trabalhadores rurais e os “segurados especiais” no plano de benefícios normal do Regime Geral de Previdência Social. Além disso, estabeleceu o piso de benefícios para aposentadorias e pensões em um salário mínimo e reduziu a idade para se aposentar em 60/55 anos para homens/mulheres no meio rural.

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37

governo foi do frango, o segundo do iogurte. Acho que 1997 tem de ser o ano do investimento e do emprego."(Revista Veja, 08/01/1997)

Infelizmente o desejo expresso no discurso do então presidente não se concretizou. Medidas como criação do contrato de trabalho em tempo parcial (MP n°1709/98), a extinção do índice de correção do salário mínimo através da MP n°1906/97 e a liberação para o trabalho aos domingos no comércio varejista (MP n°1878/99) mostram como a flexibilização afetou o âmbito das contratações, das remunerações e da carga horária (Fagnani, 2005).

Segundo Lavinas (2011), no primeiro mandato foram eliminados trezentos mil postos de trabalho no setor formalizado, seguido de relativa recuperação na segunda gestão. O desemprego alcançou taxas altíssimas, chegando a 11,7% em 2002, um aumento de 7pp frente ao primeiro ano de mandato, o que contribuiu para a impopularidade de Fernando Henrique e enfraqueceu seu futuro candidato às eleições, José Serra, que acabou derrotado pelo candidato da oposição, Luis Inácio Lula da Silva.

Seção 2.3 – Um balanço geral do governo

Os oito anos de governo Fernando Henrique não foram marcados por crescimento, como indica a tabela 2.4. A preocupação prioritária com a estabilidade dos preços levou à adoção de uma série de medidas - tais como a elevação dos juros - que tiveram como contrapartida esfriar a economia.

Tabela 2.4: TAXAS DE CRESCIMENTO DO PIB NO BRASIL (1995-2002)

Ano 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

Crescimento

do PIB 4,2% 2,7% 3,3% 0,1% 0,8% 4,4% 1,3% 1,9%

Fonte:Bacen–IPEA/Dimac – Carta de Conjuntura Março/2011

Para Lavinas e Cavalcanti (2008), “O resultado conhecido desta combinação de políticas foi a manutenção de patamar elevado de desemprego e das relações de trabalho com alta participação da informalidade na ocupação, além de um

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