• Nenhum resultado encontrado

A tecnologia e uma nova configuração do brincar: da atividade para passividade

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "A tecnologia e uma nova configuração do brincar: da atividade para passividade"

Copied!
59
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - UNIJUÍ

DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO CURSO DE PSICOLOGIA

MARCIÉLI MARON

A TECNOLOGIA E UMA NOVA CONFIGURAÇÃO DO BRINCAR: DA ATIVIDADE PARA PASSIVIDADE

SANTA ROSA/RS 2019

(2)

MARCIÉLI MARON

A TECNOLOGIA E UMA NOVA CONFIGURAÇÃO DO BRINCAR: DA ATIVIDADE PARA PASSIVIDADE

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Graduação em Psicologia do Departamento de Humanidades e Educação da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – Unijuí, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Psicologia.

Orientadora: Ms. Betina Beltrame

Santa Rosa/RS 2019

(3)

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho de conclusão de curso à minha família e amigos, que me incentivaram e deram-me apoio em todos os momentos da minha caminhada acadêmica, fazendo-se possível com a compreensão e amor de todos a realização desse sonho.

(4)

AGRADECIMENTOS

Primeiramente gostaria de agradecer a minha mãe Neida I. Baungartner Maron que esteve comigo desde o início dessa caminhada. Principalmente ao decorrer do Trabalho de Conclusão de Curso, onde lutou bravamente contra o câncer, mostrando que não devemos desistir no primeiro obstáculo que surgir no caminho. Sou eternamente grata por ter você ao meu lado todo esse tempo, e agora mesmo não a tendo mais fisicamente aqui, sei que continuará viva no meu coração pelo resto da minha vida. Te amo eternamente!

Ao meu pai Irineu Maron, que esteve ao meu lado nesse momento de desafio, e que sempre esteve presente durante a minha caminhada acadêmica. Por todo amor, paciência e incentivo ao longo desse percurso. Obrigada por ser esse pai dedicado.

Ao meu noivo pela atenção, compreensão e amor, e não podendo esquecer todas as caronas dadas para que fossem possíveis as orientações. Obrigada por entender quando precisei me afastar para que a escrita desse trabalho fosse realizada. A todo abraço dado nos momentos de superação e tristeza.

A minha orientadora Betina, que primeiramente fiquei super feliz por ter a oportunidade de construir o TCC com sua orientação, esta que considero uma pessoa maravilhosa e de um conhecimento enorme. Agradecer a todos os apontamentos feitos, a toda sabedoria transmitida e compartilhada em todos os momentos desta escrita. Sem deixar de lado o ótimo acolhimento que recebi desde o início, a qual escutou todas as minhas angústias pelo adoecimento da minha mãe, a todas as palavras de carinho e conforto recebidas nesse percurso que foi tão doloroso. O meu muito obrigada por ter me acompanhando e toda a compreensão durante essa etapa. A Sônia Aparecida da Costa Fengler, por ter aceitado fazer parte da banca do meu TCC, e agradecer a todo ensinamento transmitido ao longo deste percurso.

A minha amiga Sandra R. Geist, serei para sempre grata pela tua compreensão em todos os momentos que tive que faltar ao trabalho e tirar folgas para os estágios. Obrigada pela oportunidade que me destes, pois foi daí que obtive o dinheiro para pagar a minha faculdade. Obrigada por estar sempre disposta a me ajudar.

Aos meus amigos que sempre estiveram ao meu lado com uma palavra de apoio e carinho. A todos aqueles que de uma maneira ou de outra, torceram,

(5)

RESUMO

Sabe-se que o brincar tem grande importância para a constituição do sujeito, pois através deste, a criança pode trabalhar os aspectos psíquicos, cognitivos e motores. O presente trabalho de conclusão de curso tem como objetivo trazer algumas questões acerca da nova configuração do brincar, e a passividade da criança diante dessa questão. Com o tempo o brincar foi se modificando, e atualmente o brincar tem tomado uma nova configuração, onde os objetos eletrônicos invadem a cena. Dentro deste contexto, busca-se direcionar o olhar e contribuição da Psicologia para esse tema, e trazer a importância e os diferentes contextos aos quais a Psicologia se encontra dando suporte necessário. Para tanto, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, com aporte histórico sobre as questões que cercam a relação da criança com o brincar desde a antiguidade até a contemporaneidade. Autores como: Freud (1920); Piaget (1932); Winnicott (1975); Ariès (1978); Vygotsky (1984); Bee (1997); Kishimoto (2007); Jerusalinky (2009); entre outros, foram estudados a fim de investigar os temas aqui indagados. Ao final, a presente pesquisa busca compreender a transformação do brincar ao longo dos anos, e a relação entre a infância e tecnologia estabelecida na contemporaneidade e suas possíveis consequências para essa fase da vida.

(6)

ABSTRACT

It is known that playing has great importance for the constitution of the subject, because through it, the child can work on the psychic, cognitive and motor aspects. The present course conclusion paper aims to bring some questions about the new configuration of play, and the passivity of the child in face of this question. Over time the play has changed, and now the play has taken a new configuration, where electronic objects invade the scene. Within this context, we seek to direct the look and contribution of Psychology to this theme, and bring the importance and the different contexts to which Psychology is providing necessary support. To this end, a bibliographic research was conducted, with historical background on the issues surrounding the relationship of children with play from ancient times to contemporary times. Authors such as: Freud (1920); Piaget (1932); Winnicott (1975); Ariès (1978); Vygotsky (1984); Bee (1997); Kishimoto (2007); Jerusaleminky (2009); among others, they have been studied in order to investigate the topics here. In the end, this research seeks to understand the transformation of play over the years, and the relationship between childhood and technology established in contemporary times and their possible consequences for this phase of life.

(7)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 7

1. O LUGAR DA INFÂNCIA E SUA CONSTRUÇÃO NA SOCIEDADE ... 9

1.1. A importância do brincar e sua elaboração ... 9

1.2. Assegurando os direitos na infância ... 16

2. DESDOBRAMENTOS DO BRINCAR NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL ... 23

3. UMA NOVA CONFIGURAÇÃO DO BRINCAR ... 33

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 51

(8)

7

INTRODUÇÃO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso refere-se a uma pesquisa sobre a passividade da criança diante do brincar na contemporaneidade, fazendo uma reflexão acerca da substituição do brincar pelos objetos eletrônicos. Compreender assim, essa transição do brincar e a relação entre a infância e tecnologia estabelecida na contemporaneidade, e suas possíveis consequências para essa fase da vida.

O desejo pelo tema surgiu a partir da experiência de Estágio em Psicologia e Processos Educacionais, no qual a acadêmica acompanhou a rotina de uma escola estadual nos turnos matutino, vespertino e noturno, no período de março a dezembro no ano de 2018. Nesta oportunidade, observou-se a falta de interação entre as crianças e adolescentes em decorrência ao uso de aparelhos eletrônicos, havendo raros os momentos de rodas de conversa, ou de brincadeiras, por exemplo. Os alunos permaneciam quase que o tempo de intervalo sentados ao lado um do outro, mas em silêncio pois encontravam-se “capturados” pelas telas dos celulares ou tablets. Assim sendo, surgiu a necessidade de compreender a relação entre a infância e tecnologia presentes na contemporaneidade e suas possíveis implicações para esta fase da vida. Para o desenvolvimento deste estudo, foi necessário realizar uma pesquisa bibliográfica de abordagem qualitativa e exploratória, que proporcionou aprofundar conhecimentos sobre o tema aqui investigado. A pesquisa qualitativa consiste na escolha pertinente de métodos e teorias congruentes, transcorrendo assim entre diferentes perspectivas e análises. Abrange na pesquisa variedade de abordagens e métodos, tendo as reflexões do pesquisador como parte do processo de conhecimento. Já a pesquisa qualitativa é de suma relevância quando se trata de estudos das relações sociais, devido à pluralização e abrangência diferentes culturas atuais (FLICK, 2009). Sendo que a pesquisa de cunho exploratório propicia uma aproximação maior com o problema de pesquisa, permitindo assim que sejam definidas hipóteses. Portanto, a pesquisa com caráter exploratório possibilita ao pesquisador que o mesmo venha a delinear um maior conhecimento sobre o seu respectivo tema (GIL, 1996).

Para tanto, foi realizado um levantamento bibliográfico utilizando livros, artigos acadêmicos publicados na internet e/ou jornais/revistas a partir de autores que versam sobre os temas relacionados à: criança e ao seu conceito, o ciclo vital, o brincar na infância e o uso excessivo de objetos eletrônicos na contemporaneidade. No primeiro

(9)

8

capítulo foram utilizadas os seguintes autores, leis e organizações: Winnicott (1975),

Estatuto da Criança e Adolescente

(ECA - Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990), Bee (1997), Ariès (1978), Chateau (1987), Constituição Federal de 1988, Papalia e Feldman (2013), Organização das Nações Unidas 2018, entre outros. Estes materiais irão abordar sobre: o lugar da infância e sua construção na sociedade; a importância do brincar e sua elaboração e; os direitos que são assegurados na infância.

Já o segundo capítulo, irá apresentar os desdobramentos do brincar no desenvolvimento infantil a partir de autores como: Piaget (1975), Vygosky (1984), Aberastury (1982) e Kishimoto (2007). E por fim, o terceiro capítulo versa sobre uma nova configuração do brincar, sendo utilizados o Conselho Federal de Psicologia (2008), Gueller (2015), A Sociedade Brasileira de Pediatria (2016), Jerusalinsky (2017), Bernardino (2017) a Organização Mundial da Saúde (2019), entre outros materiais.

Desta forma, proporcionando uma melhor compreensão do tema, a pesquisa divide-se em três capítulos. O primeiro vindo a ser uma abordagem sobre o lugar da infância e sua construção na sociedade; a importância do brincar e sua elaboração; e os direitos que são assegurados na infância. O segundo capítulo pretende abordar sobre os desdobramentos do brincar no desenvolvimento infantil, e por conseguinte o terceiro capítulo versa sobre uma nova configuração do brincar.

E por final, trata-se de não somente considerar as desvantagens do uso precoce da tecnologia, mas de gerenciar de forma favorável o uso dessas ferramentas importantes, e dar a devida atenção enquanto aos riscos e aos benefícios, atentando as contribuições da Psicologia. Assim, na continuação do trabalho estão as considerações finais e as referências bibliográficas que compõem o presente trabalho.

(10)

9

1. O LUGAR DA INFÂNCIA E SUA CONSTRUÇÃO NA SOCIEDADE

O brincar está presente em todas as épocas da humanidade, não sendo um privilégio somente das crianças. A história do brincar e dos jogos mostra que o brincar já fazia parte da vida de crianças e adultos desde a antiguidade. Para aprofundarmos sobre o tema brincar, faz-se necessário explorar sobre essa trajetória, seu histórico e sua transformação ao longo dos anos. Desta forma, este capítulo visa apresentar questões relacionadas à história do brincar, como a criança e a infância foram sendo conceituadas com o passar dos anos, até os dias de hoje.

1.1. A importância do brincar e sua elaboração

Para abordar sobre o tema infância, se faz necessário compreender que ocorre um processo de desenvolvimento humano, no qual se encontram diferentes fases pelas quais passamos. Gonçalves (2016) faz uma abordagem sobre o ciclo vital, o qual se inicia pela questão do desenvolvimento, passando pela concepção e ao período pré-natal, percorrendo pela infância, à adolescência e à idade adulta, incluindo o idoso, para chegar na questão da morte. Essa por final, que designa o fim do ciclo vital, processo que tem um início, passando por algumas fases, até então chegar ao seu final. Enfatizando que o foco do presente trabalho é a fase da infância. A infância nem sempre teve um lugar de reconhecimento no social, esse conceito de infância foi uma transformação na estrutura social e histórica, e, conforme Ariès (1978), surgiu por volta do século XIII. Em torno do século XII era provável que não houvesse lugar para a infância, uma vez que a arte medieval a desconhecia e a idade não fazia parte desse período. A criança não passava pelos estágios da infância estabelecidos pela sociedade atual. A ideia de infância estava ligada a ideia de dependência, só se saía da infância ao se sair da dependência, sendo assim a partir do momento em que elas apresentassem independência física, eram inseridas no mundo adulto.

Nos textos da Idade Média a infância é trazida como a primeira idade, que teria início quando a criança nasce e durariam até os sete anos, nessa idade aquilo que nasce é chamado de enfant (criança), que quer dizer não falante. Conceituavam como a primeira idade sendo a infância que planta os dentes, pois nessa idade era considerado que a pessoa não poderia falar bem nem formar perfeitamente suas palavras na justificativa de que não tinham seus dentes bem ordenados e firmes.

(11)

10

Através da arte em pinturas de tela do século XI, que pode-se observar como eram vistas as crianças daquela época. Não havia nenhuma característica de criança nas pinturas e nenhuma diferença de representação ou de traços que diferenciassem crianças de adultos, o artista trazia homens com tamanhos reduzidos como forma de representação da criança. Isso vem a significar que os homens dos séculos X-XI não se detiam diante da imagem da infância, que para eles não havia interesse, nem realidade, não havendo assim, reconhecimento da infância (ARIÉS, 1978).

A partir desta base, Ariès (1978) aborda que a descoberta da infância teve início no século XIII, podendo perceber sua evolução através da arte e da história dos séculos XV e XVI. Na Idade Média a maneira de se vestir era a mesma para todas as classes de idade, não havendo diferenciação entre crianças e adultos, tendo a vestimenta como o único propósito evidenciar os degraus da hierarquia social.

Em outro direcionamento, Ariès (1978) menciona que no início do século XVII não havia uma separação tão severa como hoje entre as brincadeiras e os jogos que eram direcionados às crianças e os jogos dos adultos, os mesmos jogos eram compartilhados por ambos. Através das pinturas era possível observar as representações que eram feitas pelos artistas de brinquedos como cavalo de pau, cata-vento e raramente apareciam bonecas. Com o passar do tempo a brincadeira tornou-se mais direcionada às crianças, a boneca não se destinava apenas às meninas, os meninos também brincavam com elas.

Em torno de 1600 eram designadas brincadeiras da primeira infância para crianças com idade até três ou quatro anos, a partir dessa idade, a criança jogava os mesmos jogos e participava das mesmas brincadeiras dos adultos. Na sociedade antiga, os jogos eram um dos principais meios que a sociedade utilizava para estreitar seus laços coletivos, sentiam-se assim unidos. No decorrer dos séculos XVII e XVIII, surgiu uma preocupação com as crianças em relação com os jogos, estariam preocupados em reservar a moralidade das crianças e também de educá-la, proibindo os jogos que eram designados como maus e permitindo-lhes os jogos classificados como bons (ARIÈS, 1978).

Por volta do século XVII se inicia uma nova preocupação com a educação e a moral da criança, esta que era desconhecida na Idade Média. Período esse em que a criança ganha um traje de acordo com a sua idade, as diferenciando agora dos adultos. Esse acontecimento se tornou um marco na formação do sentimento de

(12)

11

infância, assim a fase inicial da vida humana gradativamente passou a ser diferenciada da fase adulta, surgindo o afeto em relação à criança e uma nova forma de tratá-la (ARIÈS,1978).

Sendo assim, a infância apresenta características distintas de acordo com a idade, assim como em todas as fases da vida, podendo caracterizar-se em três momentos. A primeira Infância se dá do nascimento aos três anos de idade. É nessa fase que a criança passa a adquirir duas habilidades importantes e que segundo Papalia e Feldman (2013), que são essenciais para a sua sobrevivência, são elas a fala e o andar. A habilidade de engatinhar, e em seguida caminhar sozinho, caracteriza uma autonomia para a criança no que se refere a sua locomoção. A aquisição dessas duas habilidades que são adquiridas na primeira infância, sendo de suma importância para garantir a independência da criança, tornando possível que elas possam externalizar com mais clareza suas necessidades físicas e emocionais.

A segunda infância é designada dos três a seis anos de idade, de acordo com Bee (1997). As habilidades motoras continuam a se desenvolver e nessa fase se dá à descoberta da sexualidade, descobrindo seu próprio corpo. Tais aquisições permitem que a criança passe a se conhecer melhor, diferenciando-se assim dos outros e interagindo melhor socialmente. A terceira infância dá-se dos seis aos onze anos de idade. Na perspectiva de Papalia e Feldman (2013), nessa fase ocorre uma alteração na altura e peso da criança, também é possível notar uma amplitude nas suas relações sociais. Passando a ter importância nessa fase os grupos de amigos e colegas.

Lebovici e Diatkine (1985), trazem contribuições sobre as atividades funcionais, para os autores, por mais significante que consideravam as atividades funcionais, as mesmas não se converteriam em jogo posteriormente se não tivesse a intervenção do outro. “É essa relação mãe-filho, chamada relação objetal, que constitui toda a originalidade do jogo” (p. 26).

Para os autores, os jogos funcionais que são enriquecidos com o aparato dos processos circulares, são então denominados de atividades pré-lúdicas, atividades estas que permitiriam em consequência da carga libidinal, da função, atuar sobre a mãe num primeiro momento de forma direta e indireta mais tarde, quando se transforma então em jogo substitutivo. Trazem também que o jogo tem início com os brinquedos, quando a mãe presenteia a criança com os objetos.

(13)

12

Desta forma, o brinquedo vem a ser um tipo de relação com o adulto, e por essa razão a criança tem a possibilidade de se expressar, podendo se opor à sua dependência ou de adquirir autonomia, simbolizando uma reação positiva, pois vem a ser uma das formas mais variadas e construtivas de se relacionar com o adulto. Segundo os mesmos autores, através do jogo, a criança em utilização do objeto transicional pode alucinar o objeto que lhe está internalizado. Possibilitando a criança se defender diante do mundo do adulto, quando permite-se negar-se a parar de jogar e negar-se a ordenar seus brinquedos. De acordo com o estudo de Lebovici e Diatkine (1985, p. 43):

[...] a importância dos jogos nos quais- especialmente os meninos- se entregam a exageros guerreiros, o que permite, em certa medida em controlar o medo. Não se exclui que a menina, brincando de boneca, também aprenda, neste jogo, a controlar seu medo e sua culpa frente à da mãe, vivida como uma rival edípica.

Neste sentido, Winnicott (1975) conceitua sobre os fenômenos transicionais, que seriam uma ampla variação na sequência que a criança produz ao colocar o punho ou o polegar na boca. Mais tarde passará a ligar-se a um ursinho, uma boneca, um paninho, ou outro brinquedo mais macio os quais são chamados de objetos transicionais. O objeto transicional vem a ser um mediador entre mãe e filho, mundo interno e mundo externo, qual é utilizado pela criança para suportar a ausência materna. O objeto transicional vem auxiliar a elaboração dos aspectos conflitantes que perpassam com o bebê, possibilitando que ele experimente uma nova realidade sem que ocorra um excesso de tensão que poderia ocasionar uma quebra nesse processo de "vir a ser".

A organização do brinquedo representativo vem a ser aquele onde a criança coloca em cena a imaginação e criatividade, é considerada como importante e significativa da organização psíquica, tendo a possibilidade de simbolizar os seus conflitos. O valor desses jogos, também conhecidos como “faz de conta”, originam-se do caráter mais direto do seu simbolismo, e decorrente das associações verbais que suscitam. Lebovici e Diatkine (1985) trazem a concepção da personificação no brinquedo, no qual, o conteúdo do brinquedo vem a ser idêntico as fantasias masturbatórias, cuja descarga se torna possível. Podendo assim ser comparado ao sonho, tendo como função a satisfação dos desejos infantis. No entanto, o brinquedo

(14)

13

não vem a ser somente uma satisfação dos desejos, mas também é uma via pela qual a criança se apropria para conseguir suportar a realidade frustrante, através do processo de projeção dos perigos internos sob o mundo externo. Os autores abordam que o jogo transforma a angústia da criança normal em prazer, diferente do que apontam com crianças esquizofrênicas. “Portanto, a personificação do brinquedo é uma amostra da não-inibição das fantasias. Normal na criança sadia, não existe no esquizofrênico, cujo desejo é negar a realidade” (LEBOVICI e DIATKINE, 1985, p. 49). Nessa perspectiva, a imaginação é para a criança um espaço onde há liberdade, levando sua criação imaginária em direção ao possível, sendo esse de seu desejo e escolha em realizá-lo ou permanecer na sua fantasia. A imaginação é também uma dimensão em que a criança vislumbra coisas novas, pressente ou elabora futuros possíveis. Ela tem necessidade da emoção imaginativa que vive por meio da brincadeira, das histórias que a cultura lhe oferece ou do contato com a arte. As histórias ou os contos de fadas são importantes mediadores para que as crianças possam imaginar e fantasiar dando a oportunidade de criar possibilidades para lidar com seus sentimentos. Assim como brincar, os contos permitem que a criança possa transitar no mundo da imaginação e da fantasia, trazendo em cena seus desejos inconscientes (GIRARDELLO, 2011).

Chateau (1987) também aborda sobre os jogos funcionais. Referindo-se aos gestos dos bebês, e os nomeia como jogos funcionais sobre os quais menciona que não são gestos inúteis. Cada atividade antecede para que haja o desenvolvimento de uma nova função, possibilitando que surjam funções mais difíceis como a palavra ou o andar. Sendo assim, atividade dos jogos funcionais permite a cada função explorar sua área e explorar assim novos resultados. O autor enfatiza sobre os jogos funcionais ao observar os bebês:

Basta observar durante alguns minutos um bebê de oito meses em seu carrinho para constatar tais jogos: ele bate o pé no carrinho, balbucia ladainhas de sons incompreensíveis, move os braços como se fizesse ginastica sueca, movimenta a cabeça, pega objetos e os deixa cair. Nenhum desses gestos tem, em si mesmo, uma significação; parece que a criança “não faz nada”. Entretanto, ela cumpre um trabalho capital: ela se molda a si mesma, se exercita movendo as pernas (o que lhe permitirá andar mais tarde), esboça em seus murmúrios a linguagem que se aproxima, forma as suas mãos para manipulação (p. 16).

(15)

14

O jogo, para Chateau (1987), possibilita a criança exercitar-se no plano imaginário para a realização concreta futura, temos assim como exemplo a criança que brinca de mãe e filha. Preparando dessa maneira a criança para a vida séria, através do jogo a criança vai criando essa autonomia, personalidade e também esquemas que são necessários para a vida adulta. A criança disponibiliza primeiramente de substitutos imaginários, onde opera numa situação simulada para mais tarde vir a ser algo concreto. O mundo do jogo é considerado uma antecipação do mundo das ocupações sérias. É necessário então, ver no jogo um substituto de trabalho futuro que a criança anuncia e prepara. O autor ainda relata que a seriedade ao brincar é a sua característica essencial.

Não há a menor dúvida de que essa pseudo-seriedade não tem vigor. Deve-se dizer também que o jogo é sério, essa é sua característica esDeve-sencial. E por essa seriedade ambígua, o jogo aproxima-se ao mesmo tempo do trabalho que ela copia através de sua aplicação e do sonho pela limitação do campo cognitivo. Ora o jogo tem características do trabalho, ora do sonho. O jogo transita entre a pura ficção do sonho e a realidade do trabalho. Ou antes, ele participa dos dois ao mesmo tempo; e às vezes acontece ser a um só tempo trabalho e sonho, como no caso da criança que cozinha seriamente. A seriedade do jogo não se revela, entretanto, nos jogos relacionados a existência real (amigos, bicicleta etc); ela se encontra igualmente nos jogos de ficção (p.26).

O autor destaca que assim como o sonho, o jogo é um caminho pelas quais tendências inibidas encontram uma válvula de escape, pois através do ato de jogar, a criança se revela inteiramente, através da sua espontaneidade ela não consegue esconder nada dos seus sentimentos. O jogo vem a exprimir certas tendências subjetivas, podendo servir às vezes como fuga, um meio de evasão, permitindo através do jogo liberação de desejos. Chateau (1987) ainda aborda que o jogo representa para a criança o mesmo papel que o trabalho representa para o adulto. A criança coloca à margem dos trabalhos reais e sociais, vindo a achar um substituto no jogo. Considera que uma criança que não brinca, não joga, é uma criança que a personalidade não se afirma, que passa a se contentar numa posição pequena e fragilizada, sendo um ser sem propósito.

No que se refere à criança pequena, a participação ativa para ela significa a sua ação física, pois o pensamento ainda não foi completamente diferenciado da ação. A participação ativa refere-se à atividade mental e envolvimento do ponto de vista da criança, sua participação num jogo dependerá de seu nível de

(16)

15

desenvolvimento. O importante é que o jogo possa proporcionar um enredo estimulador da atividade metal da criança e de sua capacidade de cooperação, sendo ele jogado ou não de acordo com regras previamente determinadas (CHATEAU, 1987).

Neste sentido Piaget (1932), em seus estudos sobre os jogos identificou quatro estágios na maneira como as crianças jogavam: Jogo motor e individual; Jogo egocêntrico (idade de 2 a 5); Cooperação incipiente (aparece entre 7 e 8 anos de idade) e Codificação de regras (aparece entre 11 e 12 anos). No primeiro estágio, que é nomeado como jogo motor e individual é caracterizado pela criança jogar sozinha, esse jogo motor e individual é referente a tudo o que a inteligência da criança lhe permite fazer, isso porque na idade de três anos a criança não é cognitivamente capaz de sentir a necessidade de seguir regras.

O segundo estágio é onde acontecem os jogos egocêntricos, nesse estágio que as crianças imitam seus colegas mais velhos, porém jogam muitas vezes sozinhos, ainda não está implicado a questão de ganhar ou perder o jogo. Mais tarde, entre cinco e seis anos de idade as crianças passam a se descentrar e a se perceber em questão aos outros, vindo a aparecer à comparação. No terceiro estágio, chamado de cooperação incipiente, evidencia-se o fato de cada jogador tentar vencer. Surgindo dessa maneira a competição e fazendo então com que as crianças tenham que cooperar para chegar a um acordo diante das regras impostas. O quarto estágio é denominado de codificação de regras, na justificativa de as crianças cooperam na tentativa de unificar as regras. Surgindo assim um prazer especial em imaginar e criar regras para todas as situações que se desenrolam durante os jogos (PIAGET, 1932). De acordo com Piaget (1932) a forma com que as crianças lidam com as regras em situações de jogos e dilemas morais, pode constatar que a construção do sentido de justo e injusto tem ligação com o desenvolvimento cognitivo. As crianças passam por diferentes tipos de compreensão de regras, a regra motora, a regra coerciva e a regra racional. Conforme as crianças amadurecem, vão tendo cada vez mais condições de se relacionar com elas de maneira crítica.

A habilidade crescente de jogar jogos em grupo é considerada uma conquista em nível cognitivo e social das crianças, os jogos em grupo têm como objetivo estimular o desenvolvimento da autonomia, possibilitando a criança a coordenar seus pontos de vista. Além de promover desenvolvimento cognitivo e social, através dos

(17)

16

jogos com regras as crianças se desenvolvem também política e emocionalmente. Kamii e De Vries (1991), ressaltam que além dos jogos em grupos contribuírem para a construção de regras, também traz a vantagem de estimular ações físicas, mantendo assim as crianças mentalmente ativas.

Percebe-se que a criança não tinha lugar na sociedade há algum tempo atrás, pensando nessa questão não se pôde deixar de trazer como a criança foi ganhando espaço e sendo vista de uma maneira diferente. Dessa maneira, esta evolução torna-se um marco importante para as crianças. Diante disso, estorna-se tema torna-será melhor aprofundado a seguir, onde será apresentado uma nova visão da infância.

1.2. Assegurando os direitos na infância

Fez-se necessário abordar os principais marcos históricos que passaram a assegurar os direitos das crianças no Brasil, evidenciando as leis e órgãos para assim poder compreender como as crianças estão protegidas. Utilizando dados importantes para subsidiar o presente trabalho, como a Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente 1990, dados sobre a Organização das Nações Unidas 2018, Fundo das Nações Unidas para a Infância 2018, O Plano Decenal dos Direitos Humanos da Criança e do Adolescente do Rio Grande do Sul, feito pelo governo do Rio Grande do Sul (RS), através da Secretaria de Desenvolvimento Social, Trabalho, Justiça e Direitos Humanos, direcionando assim um novo olhar para as crianças.

No Brasil em cinco de outubro de 1988, se lançava um novo olhar para a criança diante da promulgação da nova Constituição da República Federativa do Brasil. A partir desse marco, a criança passou a ser vista como uma pessoa em especial condição de desenvolvimento, sendo digna de receber proteção integral e de ter garantido seu melhor interesse. A proteção integral refere-se a garantia que crianças e adolescentes terão a sobrevivência, ao desenvolvimento pessoal e social e também a integridade física, psicológica e moral. O caput do art. 227 da Constituição Federal traz que:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988, EMENDA CONSTITUCIONAL nº 65, de 2010, s/p).

(18)

17

A nova Constituição de 1988 possibilitou a abertura de caminho para a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), um documento formado por um conjunto de leis que garantem os direitos das crianças e dos adolescentes no Brasil. O ECA foi criado através da lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, com base nas diretrizes previstas na Constituição Federal de 1988 e nas normativas internacionais propostas pela Organização das Nações Unidas (ONU). Em seu Art. 2º o ECA considera a criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos.

Conforme as definições estabelecidas pela ONU são entendidas como crianças todos os indivíduos menores de dezesseis anos, podendo haver alteração conforme legislação de cada país. As crianças devem ser asseguradas pelos direitos essenciais, como o direito à família, moradia, alimentação, saúde e educação, sendo responsabilidade designada aos adultos assegurar que esses direitos sejam cumpridos. Visando o reconhecimento da peculiar condição de pessoa em desenvolvimento da criança e do adolescente, a família, a sociedade e o Estado possuem o dever de assegurar-lhes o direito à vida, à educação, à saúde, à convivência familiar, ao lazer, entre outros.

O ECA, conta também com o fator importante, que vem a ser o direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer, onde se tem o objetivo de preparar a criança e o adolescente para o exercício da cidadania, e posterior qualificação para o trabalho. O Estado é o responsável por garantir o ensino fundamental obrigatório e gratuito, oferecendo também creches e pré-escolas para crianças de até 6 anos, sendo dos pais a obrigação e dever de manter os filhos na rede regular de ensino. O ECA assegura às crianças e adolescentes que gozem do direito à liberdade, preocupando-se com o desenvolvimento sadio e pleno dos mesmos. Enfatizando que com o direito à liberdade o sujeito se tornará comprometido com as realidades da sociedade na qual está inserido. O art. 16 do ECA, refere-se ao direito à liberdade, o qual compreende os seguintes incisos:

Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos: I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;

II - opinião e expressão; III - crença e culto religioso;

(19)

18 V - participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;

VI - participar da vida política, na forma da lei;

VII - buscar refúgio, auxílio e orientação (DIGIÁCOMO, 2013, p. 20).

Os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e os Conselhos Tutelares, são órgãos centrais do sistema de garantia de direitos. Os Conselhos de Direitos são instâncias de deliberação e controle da política de atendimento a esse segmento da população, sendo que sua atuação dá-se em três níveis, sendo eles: municipal, estadual e nacional. Enquanto que, os Conselhos Tutelares, como prevê o ECA, tem a sua atuação municipalizada e a sociedade é encarregada de garantir que sejam cumpridos os direitos da criança e do adolescente.

A partir desses marcos no Brasil, percebe-se a preocupação ainda hoje existente, em garantir um futuro adequado para as crianças. Pensando nessa questão, várias organizações lutam em defesa de uma vida melhor para as crianças. Lutando assim contra a pedofilia, o analfabetismo, o abuso infantil, o abandono, entre outros. Nota-se também o avanço no processo de inclusão de crianças e adolescentes nas políticas públicas atuais. As políticas públicas são caracterizadas por um conjunto de normas, que orientam práticas e respaldam os direitos dos indivíduos em todos os níveis e setores da sociedade. Elas devem ter como base o princípio da igualdade, disseminando o sentido de justiça social, garantindo o direito coletivo e atendendo às demandas da sociedade. Elas surgem em resposta aos problemas sociais. Devendo assim, refletir soluções às necessidades identificadas na vida coletiva, nas suas diversas áreas: educação, saúde, trabalho, social, entre outras (VERONESE, 2015).

De acordo com O Plano Decenal dos Direitos Humanos da Criança e do Adolescente do Rio Grande do Sul (RS, 2018), feito pelo governo do RS, através da Secretaria de Desenvolvimento Social, Trabalho, Justiça e Direitos Humanos, o ECA passou a definir uma nova concepção, organização e gestão das políticas para infância e adolescência. Preconizando a descentralização político-administrativa, por meio da municipalização da atenção direta, da articulação dos diferentes segmentos da sociedade, das diferentes políticas e da participação popular no processo decisório e de gerenciamento das ações. No sentido de dar efetividade aos princípios da integração e da intersetorialidade entre as políticas públicas previstos na Constituição, no ECA, gradativamente foram sendo criadas leis, planos e serviços, especialmente

(20)

19

nas áreas de saúde, educação e assistência social, buscando a universalização do acesso e a garantia dos direitos assegurados em lei.

Visando colocar em ação as políticas públicas que no ano de 1990 foi criado o Sistema Único de Saúde (SUS), que teve um impacto significativo sobre a questão da saúde de crianças e adolescentes, pois possibilitou a ampliação do acesso à atenção básica. Na sequência, em 1993, foi exposto o Plano Decenal de Educação para Todos, cuja concepção e objetivos foram incorporados pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), aprovada em 1996. A LDB foi alterada em 2007, por meio da Lei nº 11.527, passando a determinar a inclusão obrigatória, no currículo do ensino fundamental, de conteúdos que tratem dos direitos das crianças e dos adolescentes, tendo o ECA como diretriz. A LDB é a legislação que define e regulamenta o sistema educacional brasileiro, sendo ele privado ou público, criada com base nos princípios presentes na Constituição Federal, que reafirma o direito à educação desde a educação básica até o ensino superior.

No ano de 1993, foi promulgada a Lei Orgânica de Assistência Social, que trazia entre seus objetivos primeiros a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e o amparo às crianças e adolescentes carentes. Já o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), instituído pela Política Nacional de Assistência Social (PNAS) em 2004, foi regulamentado em 2011, com a aprovação da Lei nº 12.435, modificando a Lei Orgânica da Assistência Social. O SUAS está organizado na perspectiva de um sistema público que organiza os serviços de assistência social no país, com um modelo de gestão participativa, descentralizada e não contributiva, padronizando a oferta dos serviços sócio-assistenciais de forma continuada e universal.

Através do Plano Estadual e o Plano Decenal Nacional, observou-se que existem alguns princípios entendidos como valores universais e permanentes, valorizados e incorporados pela sociedade que devem orientar sua formulação e implementação. Estes princípios estão contidos na Política Nacional dos Direitos Humanos da Criança e Adolescente e refletem as premissas da Convenção sobre os Direitos da Criança e de outros acordos internacionais das Nações Unidas na área, da carta constitucional brasileira e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Pode-se destacar então, alguns dos princípios que são acentuados como valores universais e permanentes para o pleno desenvolvimento das crianças e dos

(21)

20

adolescentes. No que se refere à proteção integral, se compreende o conjunto de direitos que são assegurados exclusivamente à criança e ao adolescente. São direitos específicos que visam assegurar plenas condições para o seu desenvolvimento integral, priorizando os mesmos em função de sua peculiar condição de pessoas em desenvolvimento.

O Plano Decenal Nacional aborda sobre a promoção da cultura do respeito e da garantia dos direitos humanos da criança e do adolescente no âmbito da família, da sociedade e do Estado, se identifica também, a proteção especial para crianças e adolescentes com seus direitos ameaçados ou violados. Considerada as condições de pessoas com deficiência e as diversidades de gênero, orientação sexual, cultural, étnico-racial, religiosa, geracional, territorial, de nacionalidade e de opção política. Visando o protagonismo e participação de crianças e adolescentes nos espaços de convivência e de construção da cidadania, inclusive nos processos de formulação, deliberação, monitoramento e avaliação das políticas públicas. Através de estratégias e mecanismos que facilitem a participação organizada e a expressão livre de crianças e adolescentes, em especial sobre assuntos à eles relacionados.

Enfatiza também, sobre a prioridade absoluta para a criança e o adolescente. A garantia de prioridade absoluta assegurada à criança e ao adolescente implica a sua prioridade em receber socorro, proteção e cuidados, bem como a sua precedência no atendimento e preferência na formulação e execução de políticas e ainda na destinação privilegiada de recursos públicos. Ao reconhecer a criança e o adolescente como sujeitos de direitos, possibilita compreendê-los como detentores de todos os direitos da pessoa humana. Mas com a priorização da proteção integral, que se refere somente para as crianças e adolescentes, pela sua condição de desenvolvimento.

Entre as organizações que lutam pelos direitos das crianças e dos adolescentes destaca-se o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). Tendo como objetivo promover a defesa dos direitos das crianças e suprir suas necessidades básicas e contribuir para o seu desenvolvimento, dando prioridade para os mais vulneráveis, focando também nas crianças que são vítimas de formas extremas de violência. Ela é a única organização mundial que se dedica especificamente às crianças. Desde 1950, a UNICEF vem apoiando as mais importantes transformações na área da infância e da adolescência no Brasil. Nos últimos anos, obtiveram-se avanços significativos na garantia dos direitos de crianças e adolescentes, no entanto,

(22)

21

ainda há uma significativa parcela da população que não tem acesso aos seus direitos e permanecem excluídos. É por essa população que a UNICEF dedica sua atenção, voltando seu olhar aos meninos e meninas mais excluídos, vulneráveis e vítimas de formas extremas de violência.

O trabalho do UNICEF no Brasil apresenta uma grande relevância, pois trabalham pelos direitos de crianças, adolescentes e famílias em situação de vulnerabilidade, identificando, monitorando, coletando e produzindo dados para atender as necessidades dessa população. Essas crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade encontram-se espalhados por todo o Brasil, mas sua maior parte se concentra na Amazônia, no semiárido e nos grandes centros urbanos. Através do Selo UNICEF fomenta compromissos para a garantia dos direitos de crianças e adolescentes no Semiárido e na Amazônia legal brasileira. O Selo UNICEF é uma estratégia para fortalecer as políticas públicas e reduzir as desigualdades que afetam a vida das crianças e dos adolescentes brasileiros que vivem na Amazônia e no Semiárido. Já nas grandes cidades, o UNICEF, atua com foco na redução das desigualdades intramunicipais, por meio da Plataforma dos Centros Urbanos. Esta Plataforma vem para promover os direitos de cada criança e adolescente, especialmente aqueles mais afetados pela desigualdade dentro de cada cidade.

As desigualdades sociais ainda afetam grande parte das crianças e adolescentes do país, violando seus direitos e fazendo com que muitos não cheguem à vida adulta. Isso porque, ao serem excluídos das políticas públicas, esses meninos e meninas correm o risco de serem vítimas de formas extremas de violência. Essas violências são identificadas como: homicídios, negligência, agressões físicas psicológicas e sexuais, entre outras. Segundo pesquisas feitas pelo site do UNICEF, há um perfil traçado de adolescentes mortos:

Desde 2012, a taxa de homicídios de adolescentes tem sido mais alta do que a da população em geral. E há um perfil claro dos adolescentes mortos: são, em sua maioria, meninos negros, pobres, moradores das periferias dos grandes centros urbanos, muitos dos quais estavam fora da escola há pelo menos seis meses antes de ser assassinados (RIPPER, S/d, S/p).

Percebe-se então, que a infância nem sempre teve lugar diante do social. Foi necessário percorrer uma longa trajetória para que se firmassem os direitos e o reconhecimento da criança. Modificações se fizeram necessárias para garantir um

(23)

22

lugar digno para a criança diante da família, do social e do Estado. Diante disso, pôde-se pensar na criança com um novo olhar, visando pôde-seu depôde-senvolvimento e suas fapôde-ses.

Foi preciso articular em torno das leis, políticas públicas, órgãos responsáveis e ações que amparam e asseguram que as crianças possam percorrer sua infância, com garantia de possuir uma família, saúde, educação, lazer entre outros. Para poder entender um pouco mais sobre a criança e o adolescente foi necessário compreender e explorar: O Plano Decenal dos Direitos Humanos da Criança e do Adolescente do Rio Grande do Sul; CRFB/88; ECA; ONU; UNICEF; LDB; e SUAS. Tendo como foco principal a criança, se fez necessário explanar sobre os órgãos, leis e instituições citadas à cima para esclarecer que estas estão protegidas, passando a serem reconhecidas como sujeito de direitos.

Sobre o brincar, destaca-se a importância que este tem na vida das crianças. Pode-se observar nos bebês, que desde cedo eles produzem seus jogos, os quais são nomeados de jogos funcionais. Esses jogos funcionais tem uma grande importância para os bebês, pois são gestos e ações que antecedem e possibilitam posteriores evoluções, como o falar e o caminhar. É através do brincar que a criança tem a possibilidade de se expressar e simbolizar seus conflitos internos. Percebe-se a importância do brincar para a constituição e desenvolvimento da criança, para isso, o tema brincar será mais aprofundado posteriormente nos próximos capítulos.

(24)

23

2. DESDOBRAMENTOS DO BRINCAR NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Ao brincar a criança possibilita que ocorra o desenvolvimento de habilidades, autonomia e criatividade podendo vir a comunicar-se, conviver e aprender. O brincar é uma atividade constitutiva que permite e também favorece a elaboração psíquica, estimula a imaginação e possibilita a criação de recursos para poder lidar com as angústias e os conflitos da vida. Por meio dessas afirmativas, nesse capítulo será abordado como ocorrem os desdobramentos do brincar e sua importância no desenvolvimento infantil, considerando algumas definições de autores que são essenciais para o desdobramento desse trabalho.

A ação do brincar se dá anterior à ação de jogar, isso porque o brincar é uma forma mais livre e individual, e o jogar é uma conduta social que supõe regras, o qual só é possível depois de um determinado tempo. De acordo com Dantas (2002), o termo lúdico abrange tanto o brincar que é a atividade individual e livre, quanto o jogo, que vem a ser uma atividade mais coletiva e regrada. Podendo-se dizer que toda a motricidade infantil é lúdica, pois contém uma expressividade que passa a superar a instrumentalidade.

O brincar está presente na vida da criança desde muito cedo, o recém-nascido ao exercitar suas possibilidades sensoriais já está brincando, o ato de reações circulares primárias também são brincadeiras funcionais. A criança entre um e três anos tem seu desenvolvimento atravessado em um período sensório motor, ou seja, sensorial e simbólico. A criança tem necessidade de um espaço onde ela possa explorar e objetos os quais ela consiga manipular, onde lhe será permitido o avanço da autonomia motora (DANTAS, 2002).

Aberastury (1982) traz que um dos primeiros jogos que a criança produz é o de esconder-se ou o laleio, nos quais se percebe claramente o significado de perder e reencontrar, assim como anteriormente citado sobre o Fort-Da. A autora apresenta que o movimento e o jogo são necessidades tão básicas quanto a alimentação. Em torno do terceiro mês de vida da criança a atividade do jogo se torna possível através de um processo mental, esta vem a ser uma das consequências da elaboração de sua fase depressiva, a função simbólica. Sem a capacidade de simbolizar, não seria possível que o bebê projetasse os símbolos nos objetos e assim a atividade do jogo não teria sentido.

(25)

24

Dá-se início com os jogos constituintes do sujeito que se produzem como delineamento de um litoral entre o gozo1 e saber. Tais jogos são produzidos através

do laço mãe-bebê, a mãe é quem vem a sustentar as possíveis produções do bebê, e quando o bebê entra em jogo se fazendo gozar do momento, a mãe lhe passa a autoria e o saber diante de tais produções. Através dessa operação se da à inscrição de um litoral que vem a oportunizar a passagem do gozo ao saber, do objeto ao sujeito, no decorrer em que a mãe e o bebê transitam em tais jogos sem permanecer em uma, ou em outra dessas posições. Jerusalinky (2014) aborda que diante do brincar a criança produz uma resposta, transformando uma passagem da passividade para a atividade. A autora aponta que o brincar é constituinte do sujeito na infância:

O brincar é sintoma constituinte do sujeito na infância. Com ele a criança produz resposta ao paradoxo temporal ao qual está confrontada: entre a antecipação simbólica – que situa desde o inconsciente parental, seu lugar na filiação, sexuação e identificação- e a imaturidade real de seu corpo (p. 232).

Frente a esse paradoxo, que se dá o desenrolar do faz-de-conta, a criança ensaia respostas fazendo movimento que a tiraram de um lugar de passividade frente ao Outro2. O brincar é algo sério, pois ao brincar a criança cria, elabora, transforma

de forma singular acontecimentos de sua vida, fazendo também articulações significantes diante de situações do real. O marco do brincar simbólico é marcado pelo faz-de-conta, do eu era, do como se, esse seria o tempo em que a criança goza desse deslocamento imaginário, das metáforas que ele possibilita, onde uma coisa pode ser tomada por outra. A autora, destaca sobre o faz-de-conta:

1Na obra freudiana a noção de gozo jamais foi elevada à categoria de conceito. Incontestavelmente, devemos a

Lacan grande avanço nessa questão. No entanto; embora não tenha chegado a conceituar o gozo, Freud delimitou seu campo, situando-o como o mais-além do princípio do prazer. O uso comum do vocábulo gozo faz dele sinônimo do prazer. Lacan se opõe a essa ideia e o considera tanto um excesso insuportável de prazer, como uma manifestação no corpo que traga sofrimento. Disponível em: https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/29070/29070_4.PDF Acesso em: 26/10/2019.

2 Em janeiro de 1956, Lacan (1955-56/2008) afirma que o Outro, “que é de natureza simbólica” pode ser definido

como o “sistema de referenciação” da experiência analítica e que é no interior deste sistema que “podemos situar as diversas manifestações fenomênicas com as quais lidamos. Não compreendemos nada aí se não levamos a sério essa estrutura”. O Outro comparece nesta ocasião como o nome que Lacan confere à estrutura da linguagem, terreno que situa e delimita o campo em que se inscreve a experiência teórico-clínica da psicanálise. Este modo de conceber o conceito é herdeiro da apropriação lacaniana do pensamento estrutural, iniciada nos anos 50, e tem sua origem no contexto das relações estabelecidas entre inconsciente e linguagem, bem como entre o campo da

psicanálise e o campo linguístico. Disponível em:

(26)

25 [...]Na dimensão metafórica do faz-de-conta a criança goza dos jogos em que se projeta enquanto realizadora dos ideais-do-eu, buscando apropriar-se de traços identificatórios que lhe garantiriam encarnar o desejo do Outro. Se o desejo é o desejo do Outro, por meio de tal brincar a criança se joga, se lança a ocupar a posição de senhora do (seu) desejo (p. 233).

Portanto, o brincar de faz-de-conta é o tempo do vir-a-ser, um tempo o qual é dado coerência à projeção imaginária de um futuro. Tornando evidente que, na produção do faz-de-conta, aparece o desejo de ser grande. Esse momento do brincar se torna essencial, essa produção do faz-de-conta é central para a constituição da criança. Na medida em que a brincadeira é materializada imaginariamente, é possibilitando ao sujeito a garantia ficcional de que poderá vir a ser. Jerusalinsky (2014) aponta que o brincar é algo sério, pois comporta um gozo da infância, e ao brincar ela comporta também um árduo trabalho psíquico para construir suas brincadeiras, levando em consideração que a criança é um sujeito em constituição. O brincar de faz-de-conta é uma atividade que pode ser realizada, produzida de modo individual ou pode ser compartilhada com outros parceiros. Sendo que quando se brinca em grupos é necessário que ocorra uma negociação para chegar num acordo entre os parceiros.

Ao brincar em coletividade, é necessário que haja certa mobilidade psíquica, para que possam ocorrer assim troca e inversão de papéis e personagens. Os personagens e seus desenlaces fantasiosos representam os próprios conflitos da criança, sendo também uma forma de tentativa de elaboração diante desses conflitos. O brincar implica uma posta em cena, uma encenação lúdica, assim como no caso de uma encenação teatral. Possibilitando dessa forma acesso a um gozo, é um jogo que possibilita um deslocamento de posição entre ator e espectador do seu próprio drama, deslocando assim a um marco ficcional. Sendo possível dessa maneira uma dilatação imaginária com essas inversões e troca de personagens, dessa maneira, brincar em pares ou grupos é constituinte para a criança. Jerusalinsky (2014, p. 236) aborda que o brincar é próprio trabalho da constituição do sujeito, dizendo que “brincar, portanto, não é simplesmente chafurdar sem direção no gozo da infância. Brincar é o próprio trabalho de constituição do sujeito na infância, da inscrição da letra na borda entre gozo ao saber”.

A mesma autora ainda faz uma importante contribuição ao abordar sobre o Fort-Da que está situado no texto Além do princípio do prazer, de Freud (1920), na qual ele interpreta como jogo uma produção de seu neto Ernest de 18 meses, o qual

(27)

26

arremessa um carretel para trás da borda do acortinado do seu berço. Ao lançar o carretel, ele faz com que saísse do alcance da sua visão, onde desaparecia e depois o puxava de volta para que o carretel reaparecesse, acompanhava esses movimentos com uma produção fonética de “ooo” quando lançava e “aaa” quando puxava. Freud lê essa produção fonética nas palavras alemãs como “ooo” sendo (Fort= foi, vai embora) e “aaa” como (Da= cá, aqui está). Seu neto se punha a jogar dessa maneira quando a sua mãe se ausentava, estabelecendo assim uma série de ausência e presença. Essa experiência Freud chamou de "Fort-da", sendo interpretado como um jogo que a criança fazia para suportar a ausência da mãe.

Percebe-se que o neto de Freud, já produzia nessa produção uma simbolização, no lugar de ficar chorando quando a mãe se ausentava, elaborava um jogo que operava uma passagem do gozo ao saber-fazer. Dessa maneira o jogo permite operar uma passagem do real para um jogo constituinte presença-ausência, na medida em que a criança se engaja no jogo possibilita uma passagem em sua constituição psíquica. A autora evidencia que o Fort-Da apresenta todas as características que possibilitam denomina-lo como marco inicial do brincar simbólico. Jerusalinsky (2014, p. 242) aponta sobre a apropriação de decisão que a criança toma diante da ausência de sua mãe “[...] a criança agora pode apoderar-se da situação: se na vivência era passivo, era afetado por ela, agora se punha em um papel ativo, repetindo com o jogo, apesar de que fosse desprazerosa”.

O Fort-Da permite compreender sobre o brincar simbólico, pois nele ocorre a substituição de um sofrimento vivido de maneira passiva através da elaboração de um jogo em que a criança se toma como criadora reelaborando seu sofrimento de forma ativa. O que passa a estar em jogo nesse brincar simbólico é o jogo de oposição significante a que a criança passa a dar lugar. Diante das articulações de presenças e ausências a criança começa a sustentar-se de maneira breve diante da ausência do olhar do Outro primordial sobre si (JERUSALINSKY, 2014).

O objeto brinquedo oferece uma relação mais próxima com a criança, podendo ser utilizado de formas indeterminadas, pois não possuem um sistema de regras que delimitam suas atividades e criações a partir do brinquedo. O brinquedo vem como forma de substituir os objetos reais, para que assim as crianças possam manipulá-los e dar novas significações para suas vivências cotidianas. O brinquedo enquanto objeto vem a ser um importante suporte para a brincadeira, sendo um

(28)

27

material estimulante que contribui para fluir o imaginário infantil. Ao brincar a criança pode se distanciar da vida cotidiana, entrando num mundo imaginário onde pode criar e despertar suas fantasias. Dessa maneira o jogo é um instrumento de desenvolvimento da linguagem e do imaginário (KISHIMOTO,2007).

Piaget (1967) chama a atenção para o fato de que o jogo é algo sério, e não tem como sua única finalidade o divertimento. Através do jogo a criança é favorecida para o seu desenvolvimento físico, cognitivo, social e moral, sendo assim o jogo passa a ser construção do conhecimento. Ao jogar as crianças ficam mais motivadas a usar a inteligência, querendo dessa forma dar o seu melhor, esforçando-se para conseguir ultrapassar obstáculos tanto cognitivos como emocionais com a finalidade de jogar bem. Essa motivação durante o jogo faz com que as crianças fiquem mais ativas mentalmente. Nesse sentido Winnicott (1975) traz que o brincar é essencial, pois através dele a criança manifesta a sua criatividade, e também beneficia a criança em vários aspectos:

[...] é a brincadeira que é universal e que é própria da saúde; o brincar facilita o crescimento e, portanto, a saúde; o brincar conduz aos relacionamentos grupais; o brincar pode ser uma forma de comunicação na psicoterapia; finalmente, a psicanálise foi desenvolvida como forma altamente especializada do brincar, a serviço da comunicação consigo mesmo e com os outros (p. 61).

De acordo com Vygosky (1984) ao jogar nem sempre é o prazer que predomina durante a atividade, em determinados casos há o desprazer no jogo e esforço na busca do objetivo da brincadeira. Embora o desprazer venha a ser um elemento constitutivo no jogo, mostrando como a criança representa esse momento para ela. Torna-se evidente no desenvolvimento da criança a sua transição nas formas de jogar, isso ocorre devido a sua capacidade de imaginação. Para isso a criança necessita de tempo e espaço para poder desenvolver a construção do real pelo exercício da fantasia.

O autor argumenta que para a criança a imaginação vem a ser um processo psicológico novo, sendo essa uma atividade consciente da criança, mas que em criança muito pequena não se encontra presente em sua consciência. Surgindo então primeiro em forma de jogo, a qual é a imaginação em ação. Essa imaginação em ação vem a ser a primeira possibilidade de ação da criança na questão cognitiva que a permite que ultrapasse a dimensão perceptiva motora do comportamento. No

(29)

28

decorrer do desenvolvimento da criança, acontece uma modificação no seu brincar, num primeiro estágio o que predomina é situação e a regra fica ocultada, quando a criança passa a ficar mais velha são as regras que passam a ser predominantes e a situação imaginária fica oculta.

A imaginação para Piaget (1975) se dá através da representação em atos, mediante do jogo simbólico, a qual estaria à primeira possibilidade de pensamento propriamente dito, evidenciando a passagem de uma inteligência sensório-motora, que estaria baseada nos sentidos e na motricidade. Dessa forma, a imaginação criadora na criança surge em forma de jogo, o qual seria o primeiro instrumento de pensamento da criança no enfrentamento da realidade. Então, o jogo sensório-motor posteriormente se converte em jogo simbólico, o que irá ampliar as possibilidades de ações e compreensão do mundo.

Para a teoria piagetiana a brincadeira é reconhecida com uma ação assimiladora, aparecendo como uma expressão de conduta, na qual tem a capacidade de produzir espontâneas características metafóricas. Piaget (1975) direciona a brincadeira como pertencente ao conteúdo da inteligência por ela encontrar-se no processo assimilativo. No que diz respeito a brincadeira metáfora, o autor traz que a criança expressa por sua vontade e pelo prazer que a brincadeira lhe proporciona, também caracteriza como sendo de uma conduta livre e espontânea. O jogo vem a ser então um processo metafórico, no qual a criança pode transformar o real por meio da fantasia, se conduzir a um futuro, transformar e criar por meio do imaginário. Através da brincadeira a criança constrói conhecimento, e acaba revelando ao se expressar o nível de seus estágios cognitivos.

Ainda sobre o faz-de-conta Kishimoto (2007) traz que essa brincadeira é denominada como simbólica, ela possibilita que a criança represente diferentes papéis, sendo a maneira mais clara que a criança apresenta a situação imaginária. Por volta dos dois/três anos de idade surge o aparecimento da linguagem e representações, nessa fase a criança começa a expressar seus sonhos e suas fantasias, assumindo assim papéis presentes diante do contexto social. É através do faz-de-conta que a criança tem a possibilidade de dar entrada no imaginário, o autor ainda ressalta que o conteúdo do imaginário decorre de experiências adquiridas em tempos anteriores de vida da criança.

(30)

29

O mesmo autor também apresenta uma importante modalidade do brincar, que são os jogos de construção. Estes possuem grande importância, pois enriquecem a experiência sensorial, estimulando a criança a desenvolver suas habilidades e sua criatividade. Os jogos de construção estimulam para que a criança, construa, transforme, destrua e recrie, colocando em cena seu imaginário, trazendo assim seus problemas e questões internas. Diante disso, quando a criança está construindo, ao mesmo tempo ela está expressando as suas representações mentais e também está trabalhando com a manipulação de objetos.

De acordo com Vygotsky (1984), crianças com menos de três anos de idade não teriam a capacidade de envolver-se em situações imaginárias, pois ela ainda não consegue separar a situação imaginária do brincar. Somente através da brincadeira é que ela começará a perceber o objeto, não da forma que ele é, mas sim da forma com que ele desejaria que fosse. Assim a criança pode lhe dar um novo significado, assim como um simples pedaço de madeira pode virar uma espada. Dessa maneira a criança estará lhe conferindo um novo significado ao objeto, sendo assim o significado que é dado ao objeto pode se tornar mais importante que o objeto em si.

O autor constata que a origem do brincar está na situação imaginária na qual a criança cria, onde os desejos considerados impossíveis podem se realizar, tendo como função reduzir a tensão e também como forma de enfrentar os conflitos e frustrações da vida real. O brincar caracteriza uma fase no desenvolvimento da inteligência da criança, onde é marcado o domínio da assimilação sobre a acomodação, a qual tem como função firmar a experiência passada. Enquanto o brinquedo vem a ter grande importância no desenvolvimento, visto que à partir dele a criança consegue criar novas relações entre situações no pensamento e situações que são reais.

Na mesma linha de pensamento, Bomtempo (2007), contribui que através do brincar torna-se possível que a criança consiga lidar com complexas dificuldades psicológicas. Diante do brincar conseguem enfrentar experiências de perda, medo e dor. Através da fantasia as brincadeiras que são criadas à partir dela, possibilitam que a criança dê um novo direcionamento para compensar as pressões que sofrem na realidade do dia a dia. Bomtempo acrescenta que o brincar oportuniza para que

(31)

30

a criança consiga lidar com situações desagradáveis e superar obstáculos do cotidiano:

Brincando, portanto, a criança coloca-se num papel de poder, em que ela pode dominar os vilões ou as situações que provocariam medo ou que a fariam sentir-se vulnerável e insegura. A brincadeira de super-herói, ao mesmo tempo que ajuda a criança a construir autoconfiança, leva-a a superar obstáculos da vida real, como vestir-se, comer um alimento sem deixar cair, fazer amigos, enfim, corresponder às expectativas dos padrões adultos (p. 66).

Brincadeiras que são interativas contribuem ao desenvolvimento cognitivo e também ao aprendizado das frases que acompanham de maneira estimulante. Ao brincar a criança não se preocupa com o resultado, sendo o prazer e a motivação que impulsionam a ação para a criança fazer explorações livres. O brincar contribui para o processo de aprendizagem, pois brincando ela aprende a solucionar problemas. Embora seja muito importante o brincar de maneira livre, a exploração demanda um ambiente proporcione estímulo e orientação (KISHIMOTO, 2002).

A brincadeira facilita efetuar a maturação de rotinas, num sentido de sua integração aos programas de ações mais amplas, vindo a ser uma espécie de ensaio de rotinas. Sendo importante que a criança brinque e elabore imitações de esquemas de adultos. O jogo possibilita para a socialização que passa a preparar a criança para ocupar um lugar na sociedade adulta. O jogo elaborado é considerado aquele mais prolongado, onde se dá um desenrolar, para Kishimoto (2002) este jogo vem a ser mais útil para o ser humano. Pois esse seria um espaço no qual a criança pode usar a inteligência, podendo experimentar formas de combinar o pensamento, linguagem e fantasias.

Segundo Ide (2007) o jogo vem a ser um recurso do qual o seu mediador pode fazer uso com finalidade de ajudar as crianças que possuem dificuldades de aprendizagem a se tornarem então sujeitos pensantes, participativos, ativos e felizes. O jogo livre não menos importante oferece a criança oportunidade inicial e a mais importante para atrever-se a pensar, a falar e acima de tudo ser ela mesma. De acordo com Kishimoto (2002), foram realizadas pesquisas nas quais apontam que a brincadeira contribui para o desenvolvimento mental. A chamada brincadeira de papéis é uma atividade que favorece a criação de situações imaginárias e que torna possível a reorganização de experiências vividas pela criança.

(32)

31

Percebe-se a importância da brincadeira desde o nascimento da criança, este como elemento constitutivo de ações sensório-motoras, que respondem pela estruturação dos primeiros conhecimentos construídos a partir do que é denominado de saber-fazer. Através da brincadeira a criança aprende a se movimentar, falar e desenvolver estratégias para que possa solucionar problemas, proporcionando também uma aprendizagem exploratória (KISHIMOTO, 2002).

O brincar da criança não se caracteriza apenas por um simples ato espontâneo de um determinado momento. Ao brincar a criança revela a sua história, trazendo quais foram os efeitos de linguagem e da fala de cada sujeito através de um circuito transferencial específico. É através da linguagem e da fala que se desencadeia o processo de desenvolvimento de cada criança, podendo se considerar que sem a linguagem e a fala os chamados processos de desenvolvimento não seriam acionados (MRECH, 2002).

Uma das maiores descobertas da psicanálise, segundo Mrech (2002) foi o uso da atividade lúdica como uma das formas de acesso aos conflitos interiores das crianças. A autora aborda que os adultos revelam seus conflitos através da fala e as crianças revelam seus conflitos através da brincadeira. Para a criança há uma distinção entre a realidade psíquica e a realidade concreta, não podendo confundir os objetos concretos que são os brinquedos e jogos, com as suas simbolizações e imagens.

Para a autora, ao brincar, a criança não se situa apenas no momento presente, traz consigo seu passado e projeta seu futuro. As crianças apresentam nos seus pensamentos, nas emoções e na maneira de brincar a maneira como foram olhadas e percebidas pelos outros. Na atividade terapêutica, o brincar possibilita que a criança supere a situação que lhe fora traumática. Através da simbolização, trazendo através da fala e representando os conteúdos que a perturbaram, a criança consegue nomear e perceber melhor as situações, coisas, ideias e pessoas.

Pode-se considerar como os melhores representantes psíquicos dos processos interiores da criança o brinquedo e o brincar. O brinquedo, assim como o brincar não podem ser caracterizados como um objeto neutro, pois são eles que condensam a história da criança com outros objetos. Mrech (2002) acrescenta ainda que é devido às cadeias de gozo, que a criança faz a repetição de jogos ou brincadeiras, não sendo então devido ao seu sentido ou significado que ela faz a

Referências

Documentos relacionados

Área das Atividades Físicas (AF)) (níveis Introdutório, Elementar acordo com a avaliação inicial e o Projeto Plurianual de Educação Física da escola).  Jogos

Para nortear todas as discussões que conduziriam a elaboração da primeira versão do planejamento, foram realizadas duas pesquisas: de clima organizacional (avaliação interna)

Ao rever todas as análises e discussões que realizamos neste trabalho, embasadas nos preceitos funcionalistas aplicados à tradução e nos paradigmas bakhtinianos,

A sala de aula deixa de ser, então, o espaço das certezas e dos dogmas e passa a ser vista como um espaço de investigação constante, enquanto o professor deixa de ser um mero

Este trabalho teve como objetivo descrever a terapia dietética via oral para pacientes portadores de Síndrome do Intestino Curto seguidos na Unidade Metabólica da Divisão de

O que é valor FOB*: Free on Board, expressão inglesa aplicada ao valor bruto de uma mercadoria, sem levar em consideração impostos e outros custos que são agregados ao preço final

Received: 29 August 2020; Accepted: 1 October 2020; Published: 4 October 2020    Abstract: Chrysoperla carnea (Stephens) (Neuroptera: Chrysopidae) is a

Solução de desnaturação: Líquido incolor transparente Tampão de lavagem: Líquido incolor transparente Tampão SAPE: Líquido incolor transparente.. Densidade do vapor: Não