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O quotidiano da formação de estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda: potências e limites

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

CURSO DE GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM

LUCAS ANDREOLLI BERNARDO

O QUOTIDIANO DA FORMAÇÃO DE ESTUDANTES DE GRADUAÇÃO PARA O CUIDADO À PESSOA SURDA: POTÊNCIAS E LIMITES

FLORIANÓPOLIS 2020

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LUCAS ANDREOLLI BERNARDO

O QUOTIDIANO DA FORMAÇÃO DE ESTUDANTES DE GRADUAÇÃO PARA O CUIDADO À PESSOA SURDA: POTÊNCIAS E LIMITES

Trabalho de Conclusão de Curso, referente à disciplina: Trabalho de conclusão de curso II (INT5182), do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do Grau de Enfermeiro.

Orientadora: Dr.ª Adriana Dutra Tholl.

FLORIANÓPOLIS 2020

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Dedico este trabalho a minha querida mãe, por todo amor e carinho em minha criação.

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AGRADECIMENTOS

Inicialmente, gostaria de agradecer a minha mãe Jucelei, por todo amor, carinho e esforço em me criar. Meu exemplo! Obrigado por sempre me apoiar e acreditar em mim. Sem você, nada disso teria acontecido. Te amo, mãe!

A minha sobrinha Lívia, por me lembrar da doçura da vida. O tio te ama!

Aos meus tios Pelé e Mari, por terem me recebido em sua casa quando cheguei em Florianópolis e por todo apoio nesses anos. Gratidão!

A minha querida orientadora prof.ª Dra. Adriana Dutra Tholl, obrigado por todo carinho, paciência e dedicação a mim. És uma pessoa, professora e enfermeira iluminada! Te carrego no meu coração! Obrigado por ter me guiado neste trabalho.

A minha querida prof.ª Dra. Selma Maria da Fonseca Viegas, por todo carinho e paciência em me ensinar os caminhos da pesquisa cientifica! Também te levo em meu coração, obrigado!

Agradeço aos membros da banca, por aceitarem fazer parte deste momento. A minha querida prof.ª Dra. Rosane Gonçalves Nitschke, onde nossos caminhos se cruzaram logo na primeira fase do curso e continuaram até os dias de hoje. Obrigado por todos os ensinamentos e carinho por mim. A prof.ª Dra. Soraia Dornelles Schoeller, obrigado por compartilhar comigo, por diversas vezes, a sua expertise sobre as deficiências e por todas as orientações no projeto deste trabalho. A minha querida parceira de grupo de pesquisa, Dda. Daniela Priscila do Vale Tafner, por todo apoio, ajuda e incentivo, para eu desenvolver este trabalho. Obrigado, Dani!!

A todos os membros do NUPEQUIS-FAM-SC, que me incentivaram e me apoiaram neste trabalho!

Aos meus queridos amigos de graduação, Amanda, Ana Clara; Andréa, Isabela, Jakeliny, Ketlen, Lays, Lucimar e Nolly, por tornarem a minha vida tão mais leve e feliz! Amo vocês!

À Universidade Federal de Santa Catarina, pela qualidade em me tornar Enfermeiro! Obrigado!

A todos os meus professores, por cada ensinamento! Por me mostrarem os caminhos de ser Enfermeiro, obrigado!

A todas as pessoas surdas que conheci, obrigado por me mostrarem a cultura surda e por me apresentarem a Libras! Espero que o meu estudo ajude a diminuir essa exclusão que é tão presente no quotidiano de vocês!

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Aos participantes deste estudo, obrigado por aceitarem e participar! Espero contribuir com a comunidade surda, através de vocês.

E por fim, a todos os meus pacientes que em todos os momentos me ensinaram! Obrigado por fazerem parte da minha formação!

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RESUMO

Introdução: Pessoas surdas estão presentes em todos os ambientes da sociedade, vivenciando

situações conflituosas no quotidiano, como: a dificuldade de comunicação, de acesso à saúde e à educação regular e superior, de lazer e no âmbito do trabalho. Para a sociedade, a imagem da pessoa surda revela limitações e dificuldades, pouco se direciona o olhar para as suas potencialidades. Objetivo: Compreender as potências e os limites no quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda. Método: trata-se de um estudo qualitativo e interpretativo, desenvolvido com 18 estudantes de Cursos de Graduação da Universidade Federal de Santa Catarina, no Sul do Brasil, sendo: 04 estudantes do Curso de Enfermagem; 04 de Farmácia; 04 de Fonoaudiologia; 03 de Medicina; 01 de Nutrição; 01 de Odontologia e 01 de Psicologia, no período de outubro a novembro de 2019. A coleta de dados se deu por meio de entrevistas individuais, adotando-se um roteiro semiestruturado, contendo questões sobre a vivência dos estudantes no cuidado à pessoa surda. Para análise das entrevistas foi utilizado o método de Análise de Conteúdo Temática de Bardin, envolvendo: pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados e interpretação, guiada pelo olhar da Sociologia Compreensiva e do Quotidiano de Michel Maffesoli. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina, através do Parecer Nº 3.631.821 e CAAE: 20420419.7.0000.012. Resultados: as potências no quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda se mostram quando o estudante busca maneiras de se comunicar por meio da escrita, da mímica, dos gestos, do desenho e da fala pausada, denotando uma proxemia e uma ética da estética, que se apresenta pelo desejo de cooperação. Falar Libras e integrar-se à comunidade surda é uma potência na formação do estudante, possibilitando desenvolver capacidade crítica, reflexiva e de compromisso social. É uma condição essencial para a aproximação com a pessoa surda, conferindo-lhe competência no cuidado e satisfação pela possibilidade de interação e de resolução. Mesmo que a comunicação em Libras não seja fluente entre a pessoa surda e o profissional da saúde, a possibilidade de ser ouvido e compreendido em suas necessidades, possibilita uma comunicação interpessoal mais afetiva, portanto efetiva e empática. A tecnossocialidade por meio de aplicativos estimula o protagonismo da pessoa surda acerca da compreensão do processo saúde-doença. Os limites no quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda se fundamentam na dificuldade da comunicação, potencializada pela inobservância dessa temática na formação dos estudantes. Os modelos e

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práticas pedagógicas atuais são insuficientes porque não atendem, em sua totalidade, às demandas de cuidado à pessoa com deficiência ao longo da sua formação. A comunidade surda, que tem seus direitos de acesso à saúde negligenciados pela falda de comunicação adequada e satisfatória nos ambientes em saúde, colocando em risco a segurança da pessoa surda. Disciplina introdutória de Libras, seja como disciplina obrigatória ou optativa, isolada da vivência técnica dos cursos da área da saúde não é suficiente para atender as necessidades da pessoa surda no contexto da saúde. Faz-se necessário conhecer os sinais dos termos técnicos e específicos para se fazer entender e passar as informações necessárias. Conclusão: Conclui-se que os estudantes se sentem despreparados para o cuidado à pessoa surda, denotando a necessidade de refletir sobre os currículos dos cursos da área da saúde e possibilitar a inclusão da disciplina de Libras como obrigatória, integrada à prática clínica para possibilitar a qualidade da comunicação em todos os níveis de atenção à saúde, de modo que ao desenvolver um cuidado efetivo, o estudante promova a inclusão social e a promoção da saúde dessas pessoas, fortalecendo o Sistema Único de Saúde (SUS) e as políticas de atenção à saúde da pessoa surda, que recomendam às instituições públicas e empresas de serviços de assistência à saúde, garantir o atendimento e o tratamento adequado às pessoas surdas.

Descritores: Surdez; Pessoas com deficiência auditiva; Formação de estudantes; Atividades

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Fluxo dos acadêmicos por curso ... 28 Quadro 2: Exemplo da identificação das entrevistas... 30

... 31

Quadro 3: Quadro representativo dos resultados envolvendo as categorias identificadas

...32

Quadro 4: Diagrama representativo dos resultados envolvendo as categorias e

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LISTA DE ABREVIATURA E SIGLAS

BVS: Biblioteca Virtual em Saúde

CAPES: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CCS: Centro de Ciência da Saúde

CEAQ: Centro de Estudos sobre o Atual e o Quotidiano CFH: Centro de Filosofia e Ciências Humanas

CRI-MSH: Centro de Pesquisa sobre o Imaginário dB: Decibéis

Hz: Hertz

IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística Libras: Língua Brasileira de Sinais

MEC: Ministério da Educação MS: Ministério da Saúde

NCBI: National Center for Biotechnology Information

NUPEQUIS-FAM-SC: Laboratório de Pesquisa, Tecnologia e Inovação em Enfermagem, Quotidiano, Imaginário, Saúde e Família de Santa Catarina

OMS: Organização Mundial da Saúde

PIBIC: Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica SUS: Sistema Único de Saúde

TCC: Trabalho de Conclusão de Curso

TCLE: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido UFSC: Universidade Federal de Santa Catarina

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 14

2 OBJETIVO ... 18

2.1 Objetivo geral ... 18

3 REVISÃO DE LITERATURA ... 19

3.1 O quotidiano da inclusão social da pessoa surda ... 19

3.2 Políticas de atenção à saúde para à pessoa surda ... 22

4 REFERENCIAL TEÓRICO ... 23 5 MÉTODO ... 27 5.1 Tipo de estudo ... 27 5.2 Cenário do estudo ... 27 5.3 Participantes do estudo ... 27 5.3.1 Critérios de elegibilidade ... 28 5.4 Coletas de dados ... 28

5.5 Análise dos dados ... 29

5.6 Aspectos éticos ... 30

6 RESULTADOS ... 32

6.1 MANUSCRITO – POTÊNCIAS E LIMITES NO QUOTIDIANO DA FORMAÇÃO DE ESTUDANTES DE GRADUAÇÃO NO CUIDADO À PESSOA SURDA ... 33

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS DO TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO ... 55

REFERÊNCIAS ... 57

APÊNDICE A - DECLARAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE DADOS NA INSTITUIÇÃO – EDUCAÇÃO FÍSICA (BACHAREL) ... 64

APÊNDICE C - DECLARAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE DADOS NA INSTITUIÇÃO – FÁRMACIA ... 66

APÊNDICE D - DECLARAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE DADOS NA INSTITUIÇÃO – FONOAUDIOLOGIA ... 67

APÊNDICE E - DECLARAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE DADOS NA INSTITUIÇÃO – MEDICINA ... 68

APÊNDICE F - DECLARAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE DADOS NA INSTITUIÇÃO – NUTRIÇÃO ... 69

APÊNDICE G - DECLARAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE DADOS NA INSTITUIÇÃO – ODONTOLOGIA ... 70

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APÊNDICE H - DECLARAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE DADOS NA INSTITUIÇÃO – PSICOLOGIA ... 71 APÊNDICE I - DECLARAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE

DADOS NA INSTITUIÇÃO – SERVIÇO SOCIAL ... 72 APÊNDICE J: INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS ... 73 APÊNDICE K – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE) ... 74 ANEXO A – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA E PESQUISA ... 76 ANEXO B – PARECER FINAL DA ORIENTADORA SOBRE O TCC ... 80

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1 INTRODUÇÃO

A história dos surdos durante antiguidade é marcada por tragédias. Os surdos eram submetidos a tratamentos desumanos, eram mortos por diversos motivos e não tinham direito à vida (MAIA, 2017).

Durante a idade média, os surdos passam a ter direito à vida, mas ainda não eram reconhecidos como seres humanos. Sendo colocados fora do meio social e comparados a animais irracionais, pois os consideravam incapazes de pensar (SCHLÜNZEN; DI BENEDETTO; SANTOS, 2012).

No fim da idade média e começo da idade moderna, começam a surgir pesquisas sobre surdez. Cardano, a fim de compreender e ajudar seu filho surdo, através de suas pesquisas descobriu que a escrita representava ideias e pensamentos, e não somente ideias faladas. Ponce de Leon, foi um monge Benedito, que usava sinais para se comunicar por conta de um voto de silêncio que havia feito. A língua de sinais originou-se a partir dessa comunicação proposta por Ponce de Leon junto a duas pessoas surdas, que passaram a viver em seu mosteiro. E a ele é conferido o crédito da descoberta de que a pessoa surda era capaz de realizar atividades diversas, como qualquer ser humano, inclusive, a de raciocinar (SCHLÜNZEN; DI BENEDETTO; SANTOS, 2012).

Com isso, o modo como a pessoa surda é vista pela sociedade e com o passar do tempo, surgiram as políticas relacionadas a surdez e a inclusão destas pessoas. Uma das leis mais importantes e que é comemorada pela comunidade surda, no Brasil, é a Lei Nº 10.436, de 24 d e abril de 2002, que reconhece a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como a segunda língua oficial do Brasil. Sendo decretado pelo Congresso Nacional que Libras é reconhecida como meio legal de expressão e comunicação, e também outros recursos de expressão a ela associados. Decreta também que as instituições públicas e empresas de serviços de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado às pessoas surdas de acordo com a normas legais em vigor (BRASIL, 2002).

Segundo o Censo Demográfico de 2010, no Brasil, cerca de 9,7 milhões de pessoas, totalizando 5,10% da população, tem deficiência auditiva. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE), 2010).

De acordo com o decreto Nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, a deficiência auditiva pode ser definida como perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500Hertz (Hz), 1.000Hz,

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2.000Hz e 3.000Hz. E torna a disciplina de Libras obrigatória nos cursos de licenciatura para o exercício de magistério, nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, e optativa para os demais cursos superiores (BRASIL, 2005).

De acordo com Cavagna et al. (2017), “a percepção do paciente surdo acerca do profissional de saúde ainda é feita pelo distanciamento. Não se tem a total confiança para um atendimento, pois a falta de comunicação existente neste binômio se apresenta de maneira complexa” (p. 38).

As leis que cercam o Sistema Único de Saúde (SUS), buscam prestar atendimentos de forma integral e igualitária a todas às pessoas. Para os surdos, o SUS e as esferas governamentais, tentam proporcionar formas de maior acessibilidade, para que estes se sintam mais à vontade no cuidado à sua saúde. Porém o grande impasse para este cuidado integral e de qualidade é a comunicação entre o profissional e a pessoa surda. A grande maioria dos profissionais de saúde não sabem Libras, o que impede a comunicação entre profissional e o surdo ocorra (FRANÇA; SILVA, 2018).

Ao buscar os serviços de saúde a pessoa surda não se sente acolhida pelos profissionais, devido a deficiência na comunicação entre eles. O não compartilhamento da mesma língua, cria uma barreira que impede a transmissão de informações necessárias para o cuidado (SILVA; ALMEIDA, 2017). Tornando o cuidado a pessoa surda insuficiente, devido a não comunicação com o profissional (SARAIVA et al., 2017).

A estratégia de comunicação que teria maior chance de promover o cuidado à saúde da pessoa surda e a humanização do atendimento, seria o profissional saber falar Libras. O que tornaria possível aos surdos terem um amplo acesso à saúde. Com isto, menos surdos desistiriam dos atendimentos, pois teriam maior independência e autonomia ao procurar os serviços de saúde (NASCIMENTO et al., 2015).

A comunicação efetiva é fundamental para que ocorra uma consulta integral, com diagnóstico correto e tratamento adequado. Os surdos apontam a capacitação dos profissionais em Libras como a principal solução para esta barreira. Além de aspectos sobre a cultura surda que devem ser de conhecimento dos profissionais, para que não haja prejuízos de informação causados por esse obstáculo (PEREIRA et al., 2017).

Vemos alguns avanços como a Lei Nº 3.027, de 30 de abril de 2019, que dispõe sobre a obrigatoriedade do ensino de Libras, desde a Educação Infantil até o Ensino Fundamental, como disciplina obrigatória para crianças surdas e ouvintes matriculadas na rede pública de ensino do município de Cabo Frio – Rio de Janeiro (CABO FRIO (RJ),

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2019). Mas é preciso ampliar para outros seguimentos da sociedade, bem como nos ambientes da saúde.

Acredita-se que a língua de sinais é um dos caminhos para promover uma comunicação efetiva com esses usuários nos serviços de saúde. Porém, ter a presença do intérprete de Libras, não é garantia de um atendimento de qualidade (NÓBREGA; MUNGUBA; PONTES, 2017). Pois os surdos acompanhados por seus familiares ou por intérpretes, ocorre que a comunicação é estabelecida entre os ouvintes, o que os torna passivos nesse processo e ocorre a perda da privacidade e do protagonismo acerca do entendimento sobre o seu processo de saúde-doença (OLIVEIRA; CELINO; COSTA, 2015).

Lima et al. (2015), ressaltam que a inclusão de Libras na formação dos profissionais de saúde, contribuirá para efetivar a comunicação entre os profissionais e os surdos. Para que assim, este profissional possa atender adequadamente e identificar as reais necessidades das pessoas que ele assiste. Sendo que as necessidades que o usuário tem, devem orientar a assistência prestada pelo profissional, para conseguir possibilitar uma boa receptividade e garantir a humanização do cuidado.

Se torna necessário qualificar melhor os profissionais que estão em formação nas instituições de ensino. Para assim, estabelecer um vínculo de comunicação entre o profissional e o surdo, que também faz parte da sociedade e conseguir garantir o cumprimento das necessidades destas pessoas (LIMA et al., 2015).

Berndt (2018), reitera a necessidade de maior quantidade de estudos acerca da atenção à saúde auditiva e a necessidade de inserir a abordagem sobre a deficiência auditiva na formação dos enfermeiros.

Mesmo com as leis e decretos existentes que visam garantir um atendimento à saúde das pessoas surdas de melhor qualidade, muitos profissionais se encontram despreparados para realizar o cuidado aos surdos, recorrendo a mímica e gestos, o que faz a qualidade do atendimento ficar comprometida. Surge então, o anseio de passar maiores informações, orientações, esclarecer dúvidas e etc. O que fica evidente a necessidade de capacitação destes profissionais, para atender esta população (FRANCISQUETI et al., 2017).

Com isto, surge a necessidade de refletir sobre os currículos dos cursos de formação para saúde e possibilitar a inclusão da disciplina de Libras como obrigatória, para garantir a melhor qualidade da comunicação e providenciar capacitação para os profissionais que já estão atuando (SOARES, 2018). É necessário que os profissionais de

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saúde tenham contato com a Libras durante sua formação, visto que há uma demanda de surdos que procuram os serviços de saúde e que estes, preferem que os atendimentos sejam realizados pela equipe de saúde e não por profissionais intérpretes, ou pela interpretação de seus familiares. O que tornaria valorizado os princípios de autonomia e a voz de suas mãos (SARAIVA et al., 2017).

Meu interesse pela temática se dá pela vivência enquanto acadêmico de enfermagem e por experiências pessoais com pessoas surdas. Isto originou a busca de estudos sobre o quotidiano de cuidado à pessoa surda, na qual se observou uma lacuna importante, que se associa à inobservância dessa temática em minha formação acadêmica.

Assim, busco compreender como o quotidiano se mostra na formação de estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda nos ambientes de saúde? E identificar quais são os limites e as potências no cuidado à pessoa surda, durante a formação acadêmica? Importa salientar, que o conhecimento de potências e limites no quotidiano da formação de estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda, pode indicar práticas de cuidado qualificadas e que atendam às necessidades dessas pessoas, respeitando-as em suas singularidades e estimulando o protagonismo acerca da compreensão do processo saúde-doença.

Compreendendo o quotidiano como a “maneira de viver dos seres humanos que se mostra no dia a dia, por suas interações, crenças, valores, significados, cultura, símbolos, que vai delineando seu processo de viver, em um movimento de ser saudável e adoecer, pontuando seu ciclo vital” (NITSCHKE et al., 2007, p.7). “Esse percurso pelo ciclo vital tem uma determinada cadência que caracteriza a maneira de viver, influenciada tanto pelo dever ser, como pelas necessidades e desejos do dia a dia, que se denomina como ritmo de vida e do viver” (NITSCHKE et al., 2017, p. 8).

Para o desenvolvimento desta pesquisa, buscar-se-á subsídio no referencial teórico-epistemo-metodológico, da micro-sócioantropologia, ou seja, a Sociologia Compreensiva e do Quotidiano, descrita pelo sociólogo francês Michel Maffesoli, pela possibilidade de compreensão do quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda, permitindo a identificação de potências e limites no cuidado dessas pessoas e, sobretudo, ressaltando que “a sociologia da vida quotidiana e do imaginário sensível sabe pertinentemente dizer que: quando nada é importante, tudo tem importância” (MAFFESOLI, 2010, p.31).

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2 OBJETIVO

2.1 Objetivo geral

Compreender as potências e os limites no quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda.

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3 REVISÃO DE LITERATURA

Para discussão dos resultados e dar sustentação teórica, e assim, alcançar o objetivo proposto, foi realizado uma revisão narrativa de literatura trazendo os principais assuntos relevantes para abordagem da temática (BERNDT, 2018).

A revisão narrativa é utilizada para descrever e discutir o desenvolvimento de um assunto, sob o ponto de vista teórico ou contextual. (ROTHER, 2007). “Constituem, basicamente, de análise da literatura publicada em livros, artigos de revista impressas e/ou eletrônicas na interpretação e análise crítica pessoal do autor” ROTHER, p. 6, 2007. Este tipo de revisão permite ao autor atualizar-se sobre o conhecimento existente de um assunto específico (ROTHER, 2007).

As referências utilizadas foram encontradas nas bases de dados: Centro Nacional de Informações Biotecnológica (NCBI), Portal de Periódicos - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)/Ministério da Educação (MEC), Biblioteca Virtual em Saúde Brasil (BVS) e sites governamentais, como o Ministério da Saúde (MS). Utilizou-se os seguintes descritores: surdez; perda auditiva; pessoas com deficiência auditiva; estudantes; atividades cotidianas e; saúde. A elaboração da revisão iniciou-se em maio de 2019 e finalizou-se em dezembro de 2019.

3.1 O quotidiano da inclusão social da pessoa surda

A pessoa surda apresenta características que necessitam de uma análise mais profunda. São inúmeras as situações e dificuldades enfrentados por essa população, como: a dificuldade de comunicação, acesso à saúde e à educação regular e superior, lazer e no âmbito do trabalho. O que leva a comunidade surda a ser vista pelas suas limitações e dificuldades, e não pelas suas potencialidades (ALVES; LEÃO; AGAPITO, 2017).

As dificuldades que as pessoas surdas vivenciam dizem respeito à incapacidade de ouvir e, portanto, de se comunicar com a sociedade que ouve, pois eles não compartilham o mesmo canal de comunicação. Esta situação impede a integração total das pessoas surdas em suas famílias (se tratando de pais ouvintes não sinalizadores), e na sociedade, já que os relacionamentos sociais são estabelecidos primariamente por sons (MONTEIRO; SILVA; RATNER, p. 1, 2016).

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Com o passar dos anos, o modo como a pessoa surda é percebida pela sociedade mudou. E isto possibilitou refletir que não é a pessoa surda que deve se adaptar para integrar a sociedade. Pelo contrário, é a sociedade que deve oferecer meios dignos e inclusivos para a vivência de todas as pessoas, isto é, a sociedade que deve repensar sua forma de agir, pois é ela que exclui (SANTOS; TEIXEIRA, 2019).

A primeira inclusão que deve acontecer com a pessoa surda é com a família. O acolhimento da família permite ao surdo a noção de “lugar no mundo”, o que leva a desenvolver um sentimento de pertencimento. E este pertencimento fortalece a pessoa surda para os embates futuros (OLIVEIRA; FERREIRA; PRADO, 2017).

As pessoas que vivem com surdez, ao buscarem os serviços de saúde, se deparam com diversas dificuldades. A falta de preparo do profissional, a ausência de Libras, a dificuldade de comunicação, falta do protagonismo no autocuidado, dependência dos ouvintes, uso inadequado das estratégias de comunicação, condições desfavoráveis de trabalho, limitações do surdo e as compreensões por ambas partes, impactam diretamente na qualidade do cuidado que está sendo executado (ARAÚJO et al., 2015; NASCIMENTO; FORTES; KESSLER, 2015; OLIVEIRA et al., 2015).

“(...) os surdos sentem dificuldade em promover cuidados preventivos de saúde, e buscar serviços nesse sentido ou seguir adequadamente um tratamento de saúde, devido à barreira da comunicação” (OLIVEIRA et al., 2015, p. 557). Os obstáculos de comunicação e informação faz com que se torne um desafio à assistência humanizada e integral a esta população (NÓBREGA; MUNGUBA; PONTES, 2017).

“Mesmo existindo capital jurídico que regulamenta o atendimento às necessidades especiais da pessoa com surdez e fomenta o aperfeiçoamento profissional, os serviços de saúde e as instituições formadoras ainda têm dificuldade em atender às exigências ministeriais para o bom desempenho de tais ações. Talvez porque não perceberam, ainda, essa legislação como um incentivo a processos inovadores, ampliadores das chances de resolubilidade das ações em saúde para casos especiais como a surdez” FRANÇA et al., 2016, p. 109). À pessoa surda não recebe uma assistência em todos os níveis de saúde de forma adequada e satisfatória, o que gera frustrações e falta de resolutividade. Sendo assim, surge a necessidade de ter um enfoque maior na comunidade surda, para que ao acessar os serviços de saúde, esse acesso seja universal e igualitário para todos, sem exceção (SOUZA et al., 2017).

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Para amenizar esses obstáculos e dificuldades, o ensino de Libras nas profissões que atuam na área da saúde, e a educação permanente para os profissionais já atuantes, seria uma estratégia para melhorar a comunicação entre o surdo e o profissional. O que leva a um passo a mais na integralidade do cuidado e no cumprimento dos direitos das pessoas que vivem com surdez (LOPES; VIANNA; SILVA, 2017).

No acesso à educação os surdos são excluídos, ignorados, segregados do ambiente de ensino e aprendizagem. Por isso, ao falar de inclusão escolar, deve-se pensar em outro modelo de escola, pois o que está presente atualmente, continua a excluir esta população. Ainda, há a necessidade que as políticas públicas sejam efetivadas, pois há a existência de legislações que preconizam o ensino inclusivo, sendo um direito básico e essencial de todos os alunos (ROSA; BARALDI, 2016).

O número de estudantes surdos na graduação aumentou, e com isso, surge a necessidade inclusão no ensino e no seu processo de aprendizagem. E o grande desafio, é mudar o modelo das práticas pedagógicas, para que se consiga dar respostas iguais a todos os estudantes. As práticas pedagógicas, devem valorizar a heterogeneidade, a cultura surda e a língua das pessoas surdas, para que essas possam se sentir parte e integradas no ambiente universitário (SANCHES; SILVA, 2019).

Já para o lazer, as dificuldades encontradas são a falta de acompanhantes e ou de acessibilidade, o que leva para a necessidade uma reflexão sobre os direitos das pessoas surdas em relação à cultura, esporte e lazer. Pois o lazer é um importante fator na vida das pessoas em todos os contextos sociais (FONSECA et al., 2017).

No ambiente de trabalho, os surdos enfrentam a falta de acessibilidade comunicacional e tem seus direitos negligenciados, impactando diretamente no bom desempenho no trabalho e no relacionamento com os colegas e chefes. Isto gera uma grande rotatividade dessas pessoas nas empresas, pois os surdos pedem demissão, na busca de algo melhor, que ofereça melhor condições de trabalho, acessibilidade e respeito (SILVA, 2017).

É notório a importância do papel dos profissionais ligados diretamente à comunidade e cultura surda, assim como, os pesquisadores interessados em contribuir na melhoria da qualidade de vida dessa população (SANTOS; SILVA, 2019). É preciso que a cultura da comunidade surda ganhe visibilidade social, para que a sociedade em geral, possa conhecer e tratar com dignidade as pessoas que vivem com surdez (SILVA, 2017).

Compreender os aspectos da comunidade surda, como suas lutas, conflitos culturais, suas identidades e os artefatos culturais que integram e auxiliam na formação

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da identidade da pessoa surda, ajudam na discussão do poder que esses fatores exercem na inclusão e exclusão social da população surda. Existe na sociedade diversos grupos culturais, e cada um desses grupos não vive de maneira isolada, mas sim integrados, mesmo com conflitos. Por viver em conjunto e com diferentes culturas, nenhum grupo social deve ser deixado de lado, incluindo a comunidade surda (ROCHA, 2017).

As barreiras que são presentes no quotidiano da comunidade surda e impedem o progresso dos mesmos, precisam ser removidas, para que assim o surdo se sinta respeitado e incluído na sociedade. Para que essa inclusão não fique apenas no papel, é necessário ações de ouvintes e surdos que sejam conscientes dos direitos e deveres como cidadãos. O que torna a proposta de inclusão um desafio, pois é necessário a ruptura de conceitos e atitudes existentes na sociedade (DINIZ; SILVA, 2017).

3.2 Políticas de atenção à saúde para à pessoa surda

O modo de como as pessoas surdas são vistas pela sociedade, refletiu na evolução das políticas e leis educacionais para surdos no Brasil e no mundo, quebrando barreiras e surgindo novos paradigmas (MAIA, 2017).

A Lei Nº 10. 098, de 19 de dezembro de 2000, estabelece normas e critérios para promover a acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, buscando a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos (BRASIL, 2000). Esta lei se refere a superação da barreira de comunicação, o que abrange as barreiras encontradas pelas pessoas surdas e assim define:

“O Poder Público promoverá a eliminação de barreiras na comunicação e estabelecerá mecanismos e alternativas técnicas que tornem acessíveis os sistemas de comunicação e sinalização às pessoas portadoras de deficiência sensorial e com dificuldade de comunicação, para garantir-lhes o direito de acesso à informação, à comunicação, ao trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao esporte e ao lazer” (BRASIL, 2000).

A Lei Nº 10.436, de 24 d e abril de 2002, além de tornar a Libras a segunda língua oficial, define: “As instituições públicas e empresas concessionárias de serviços públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado aos portadores de deficiência auditiva (...)” (BRASIL, 2002). Porém, a lei não traz como deve ser este tratamento adequado ou como as instituições deve agir.

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Já o decreto Nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, que regulamente a Lei Nº 10.436 – Traz como definição do que é considerado deficiência auditiva. Sendo considerado deficiência auditiva a perda de 41 dB ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500Hertz (Hz), 1.000Hz, 2.000Hz e 3.000Hz. E torna obrigatória o ensino de Libras como disciplina obrigatória nos cursos de licenciaturas e para o curso de Fonoaudiologia. Ou seja, Fonoaudiologia é o único curso da saúde, onde os estudantes, por lei, têm que cursar a disciplina de Libras. No restante dos cursos da saúde, a lei torna a disciplina de Libras optativa, o que faz com que a maioria dos estudantes não cursem a disciplina. (BRASIL, 2005)

Afim de garantir acesso universal para às pessoas com surdez a Portaria Nº 2.073 de setembro de 2004, define: “Promover a ampla cobertura no atendimento aos pacientes portadores de deficiência auditiva no Brasil, garantindo a universalidade do acesso, a equidade, a integralidade e o controle social da saúde auditiva” (BRASIL, 2004).

As leis que visam garantir a inclusão nos serviços de saúde das pessoas surdas estão presentes. Mas o que não é feito, é a fiscalização para efetivação destas medidas definidas pelas leis. É necessário que as informações sobre os direitos das pessoas surdas, sejam direcionados a esta população, para que estes possam conhecer e se informar sobre os seus direitos (KRAUSE; KLEIN, 2018).

Mesmo com as políticas e as leis existentes no Brasil, a inclusão e a independência do surdo ao procurar os serviços de saúde, ainda é baixa, devido à falta de conhecimento sobre si e seus direitos por parte dos profissionais que os atendem (PIRES; ALMEDIA, 2016).

À implementação e a efetivação das políticas públicas possibilitará o exercício pleno dos direitos e cidadania das pessoas que vivem com surdez, o que irá levar a estes indivíduos assumir a corresponsabilidade à sua própria vida e saúde (ARAÚJO et al., 2015).

4 REFERENCIAL TEÓRICO

Para melhor compreensão do quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda, buscarei subsídios no referencial teórico-epistemo-metodológico, a Sociologia Compreensiva do Quotidiano, de Michel Maffesoli. “A

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Sociologia Compreensiva de Maffesoli cria outro paradigma nas pesquisas científicas, valorizando não somente os aspectos da razão – que também são essenciais – mas também os aspectos impalpáveis, como os do sentimento e do imaginário” (NÓBREGA et al., 2017, p. 376).

Meu interesse pela Sociologia Compreensiva do Quotidiano, surgiu a partir de discussões no Laboratório de Pesquisas e Estudos em Enfermagem, Quotidiano, Imaginário, Saúde e Família de Santa Catarina (NUPEQUIS-FAM-SC), durante o desenvolvimento da minha bolsa de Iniciação Científica, pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), do projeto intitulado “O Quotidiano da Equipe do Consultório na Rua em Florianópolis: Potências e Limites Para Promoção da Saúde”, coordenado pela professora Dra. Rosane Gonçalves Nitschke, para o Estágio Pós-Doutoral de Selma Maria da Fonseca Viegas, docente da Universidade Federal de São João del-Rei, Campus Centro Oeste, Minas Gerais,

A Sociologia Compreensiva do Quotidiano, busca valorizar os saberes do quotidiano e o senso comum (MAFFESOLI, 2008; MAFFESOLI 2010), tornando-se pertinente lançar esse olhar sobre esta pesquisa, já que o estudo se refere ao quotidiano, às experiências vividas por estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda.

Michel Maffesoli é sociólogo francês, nascido em 14 de novembro de 1944 em Graissessac (Hérault), casado, pai de 4 filhas, é professor de Sociologia da Universidade de Paris-Sorbonne Descartes. Fundou junto a Georges Balandier, em 1982, o Centre d´Etudes sur l´Actuel et le Quotidien - Centro de Estudos sobre o Atual e o Quotidiano (CEAQ) e do Centro de Pesquisa sobre o Imaginário (CRI-MSH), voltados às novas formas da sociologia e do imaginário. Maffesoli é autor de vários livros, como: Lógica de Dominação (1976); A Conquista do Presente, Sociologia do Cotidiano (1979); Elogio da Razão Sensível (1996); O Ritmo da Vida – Variações sobre o Imaginário Pós-moderno (2004); Tesouro Escondido (2015); A palavra do Silêncio (2016); Ser Pós-moderno (2018); A Força da Imaginação (2019). (CEAQ, 2019).

Maffesoli utiliza metáforas, analogias, noções flexíveis e moventes pela característica da vida social que, por sua natureza, não pode ser compreendida de forma estática, mas em movimento. Deste modo, destaco algumas noções desenvolvidas pelo autor que contribuem para o nosso olhar no encontro com os estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda, tais como: quotidiano, potências, limites, tribo, solidariedade orgânica.

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Michel Maffesoli (2012, p.16), define o quotidiano como “o modo de vida, a maneira de ser, de pensar, de se situar, de se comportar em relação aos outros e à natureza”. Há ainda, um conhecimento empírico que não pode ser eximido. Esse “saber-fazer”, “saber-dizer” e “saber-viver”, todos dotados de tão diversas e múltiplas implicações (MAFFESOLI, 2007).

Maffesoli (2010) diz que as potências são como a força que vêm do interior de cada pessoa, sendo da ordem da libertação e da cooperação. Já os limites envolvem a noção de determinação ou empenho, sendo um mecanismo de sobrevivência diante de situações quotidianas, ou seja, aquilo que nos protege de determinados acontecimentos característicos da condição humana (MAFFESOLI, 2001).

Tribo ou ainda tribo urbana, refere-se a grupos de pessoas que compartilham

entre si um mesmo estilo de vida, atividades e interesses similares (MAFFESOLI,

1997). A solidariedade orgânica se dá pelas relações consigo e com os outros. Ou ainda, pelos sentimentos de potência e cooperação que nasce de dentro do ser. A solidariedade orgânica se dá pela espontaneidade e pelo sentimento de querer estar junto (MAFFESOLI, 2005).

Em seu livro, “O conhecimento comum: introdução à sociologia compreensiva”, Michel Maffesoli destaca o que denominou de cinco pressupostos teóricos da sensibilidade, incitando-nos a compreensão do presente em uma dimensão relativista, quais sejam: 1) a crítica ao dualismo esquemático; 2) a forma; 3) a sensibilidade relativista; 4) a pesquisa estilística; e 5) pensamento libertário (MAFFESOLI, 2010).

O primeiro pressuposto: a crítica ao dualismo esquemático, Maffesoli traz que para analisar um fenômeno é percorrido por duas atitudes complementares: a razão e imaginação. Sendo a primeira, sustentado na crítica, no mecanismo e na razão. Já a segunda, sustentado na natureza, no sentimento, no orgânico e na imaginação. O autor então propõe uma ciência de dentro, na qual o pensador, não tem de se abstrair, pois ele faz parte daquilo que descreve, podendo, deste modo, ter uma visão desde dentro, uma “intuição”. (MAFFESOLI, 2010, p. 27-28).

O segundo pressuposto: a forma, Maffesoli traz sua noção de formismo, entendendo que esta permite “descrever os contornos de dentro, os limites e a necessidade das situações e as representações que constituem a vida quotidiana”, temperando-se, assim, a rigidez do estruturalismo, com o “cuidado de manter a sua perspectiva, pertinente, de invariância; trata-se de uma modulação temperada que permite apreender a labilidade e as correntes quentes da vivência” (MAFFESOLI, 2010, p. 36-37).

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O terceiro pressuposto: uma sensibilidade relativista, Maffesoli sustenta que a forma que traz consigo, as comparações, é possível pela existência de um relativismo metodológico. Sem haver realidade única. A clássica instrumentação já não basta para descrever uma “constelação societal onde a imagem e o símbolo ocupam um lugar de eleição” (MAFFESOLI, 2010, p. 36-40).

O quarto pressuposto: a pesquisa estilística, Maffesoli expõe o alerta de que a ciência precisa se expressar de modo “a saber dizer o seu tempo”. Ele propõe que a ciência se mostre através de um “feedback” constante entre a empatia e a forma, com uma escrita mais aberta (MAFFESOLI, 2010, p. 41).

O último e quinto pressuposto: um pensamento libertário, o autor defende a importância da libertação do olhar. Onde o pesquisador, ao interagir com o participante, torna-se parte da pesquisa, o que leva um outro olhar para a situação social (MAFFESOLI, 2010, p. 49).

Neste sentido, considero que as noções e os pressupostos da Sociologia Compreensiva, trazidos por Maffesoli, poderão possibilitar maior compreensão sobre o quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda, a partir de um olhar para o que de fato “é”, apreendendo as potências e os limites como substrato para fortalecer ações de cuidados à pessoa surda.

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5 MÉTODO

5.1 Tipo de estudo

Trata-se de um estudo qualitativo e interpretativo. A base da pesquisa qualitativa é o senso comum, que referido pelas experiências e vivências que conduzem o indivíduo nas ações do seu quotidiano. A vivência de cada indivíduo sobre o mesmo acontecimento é única, pois reflete nas características, na personalidade e na biografia de cada um. Com isso, o senso comum origina-se de valores, opiniões, crenças, modos de se relacionar, agir e pensar que mostram as direções das condutas de cada ser humano. O principal objetivo na análise qualitativa é compreender, e para esta compreensão, é necessário que se entenda que cada indivíduo é único, porém a sua vivência é com outras pessoas e, por isso, estes são envolvidos e contextualizados pela cultura da sociedade/dos grupos a que pertencem (MINAYO, 2012).

A pesquisa interpretativa coloca “interesse central no significado humano na vida social e na sua elucidação e exposição por parte do investigador” (ERICKSON, 1986, p. 119). Favorece assim, a compreensão da história vivida, onde por diferentes elementos de interação possibilitarão refletir sobre os processos sociais vividos.

5.2 Cenário do estudo

O cenário do estudo foi a Universidade Federal do Sul do Brasil, para os cursos de Enfermagem, Farmácia, Fonoaudiologia, Medicina, Nutrição, Odontologia e Psicologia.

5.3 Participantes do estudo

Participaram deste estudo 18 estudantes de graduação, que já realizaram cuidado à pessoa surda no ambiente de saúde, envolvendo os Cursos de Enfermagem, Farmácia, Fonoaudiologia, Medicina, Nutrição, Odontologia e Psicologia. A escolha dos cursos se fez, por ser os cursos que desenvolvem o cuidado em saúde e por serem os cursos

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presentes no cenário deste estudo. Os participantes tinham idade entre 21 e 27 anos, sendo 12 participantes do sexo feminino e 06 participantes do sexo masculino. Não foi possível encontrar participantes que se enquadrassem nos critérios de inclusão do estudo nos cursos de Educação Física (Bacharel) e Serviço Social.

Abaixo, segue o quadro com o fluxo dos acadêmicos por curso.

Quadro 1: Fluxo dos acadêmicos por curso.

Curso Quantidade de Acadêmicos por Curso

Enfermagem 4 Farmácia 4 Fonoaudiologia 4 Medicina 3 Nutrição 1 Odontologia 1 Psicologia 1 TOTAL: 18 Acadêmicos Fonte: elaborado pelo autor, 2020.

5.3.1 Critérios de elegibilidade

Critérios de inclusão: ter pelo menos 18 anos, ser estudante dos cursos de

graduação (Educação Física (bacharel), Enfermagem, Farmácia, Fonoaudiologia, Medicina, Nutrição, Odontologia, Psicologia e Serviço Social, que estavam regularmente matriculados e que já tinham prestado cuidado à pessoa surda em algum momento durante a graduação em ambientes de saúde.

Critérios de exclusão: estudantes que estivessem em licença maternidade e em

trancamento da matrícula.

5.4 Coletas de dados

A coleta de dados ocorreu após a aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa (ANEXO A), no período de outubro a novembro de 2019.

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Etapa 1: Apresentação do projeto do estudo aos Coordenadores dos Cursos de

Graduação, solicitação de autorização para o desenvolvimento da pesquisa (APÊNDICE A, B, C, D, E, F, G, H e I) e indicação de estudantes que já tinham realizado atendimento à pessoa surda nos diversos ambientes de saúde. Porém os coordenadores, em sua maioria, não tinham conhecimento de quais alunos já haviam feito o cuidado à pessoa surda.

Etapa 2: Por isso, o convite para participação e apresentação da proposta do projeto aos

estudantes foi realizado pelo pesquisador, em sala de aula, durante horário de aula dos mesmos. A partir do primeiro contato com os estudantes, optou-se também pelo método “bola de neve”, onde os próprios participantes indicaram outros novos participantes com características e perfil desejados para a pesquisa. A técnica “bola de neve” é uma forma de amostra não probabilística, onde os participantes iniciais do estudo indicam novos participantes com características e perfil desejados a partir da sua própria rede pessoal. Até que seja alcançado o objetivo proposto pelo estudo (VINUTO, 2014).

A coleta de dados se deu por meio de entrevistas individuais em profundidade, na qual foram gravadas e posteriormente transcritas. As entrevistas foram realizadas pelo autor principal e guiadas com roteiro semiestruturado, contendo questões sobre a vivência dos estudantes dos cursos de graduação no cuidado à pessoa surda nos espaços em saúde (APÊNDICE J).

5.5 Análise dos dados

Para análise das entrevistas foi utilizada o método de Análise de Conteúdo Temática, considerando-se as seguintes fases: pré-análise; exploração do material; tratamento dos resultados; inferência e a interpretação (BARDIN, 2011).

A pré-análise teve a finalidade de tornar operacional e sistematizar as ideias inicias. A primeira etapa a ser desenvolvida foi a leitura flutuante, que consistiu em conhecer e se familiarizar com o material (BARDIN, 2011).

A exploração do material foi na codificação e categorização dos dados obtidos. É na codificação que ocorre a transcrição de características intrínsecas, o que permite alcançar uma representação do conteúdo e/ou de sua expressão (BARDIN, 2011). É a concretização das decisões que foram tomadas na pré-análise, isto é, o que retrata os significados evidenciados na leitura flutuante.

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A categorização é onde se deu a classificação dos elementos textuais por diferenciação e em seguida, pelo agrupamento, por meio de características ou significados comuns desses elementos (BARDIN, 2011).

A última fase da análise foi o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação (BARDIN, 2011), isto quer dizer, que primeiramente houve um agrupamento dos dados obtidos, o que levou a compreensão sobre o quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda em espaços de saúde.

5.6 Aspectos éticos

A pesquisa foi desenvolvida respeitando a Resolução Nº 466, de dezembro de 2012, que visa garantir os direitos e deveres aos participantes da pesquisa, à comunidade científica e ao Estado. Está resolução, está sob a ótica do indivíduo e coletividades, que abrange os referenciais da bioética, tais como: autonomia, não maleficência, beneficência, justiça, equidade e outros (RESOLUÇÃO Nº 466, 2012).

Os participantes foram informados acerca dos objetivos da pesquisa, seus benefícios e riscos, anteriormente, às entrevistas. Antes e durante as entrevistas, foi deixado explícito que o participante era livre para permanecer e contribuir ou não à pesquisa, comprometendo-se o máximo possível de benefícios e o mínimo de danos e riscos ao entrevistado. Foi apresentado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (APÊNDICE K), sendo elaborado em duas vias, e assinado pelo pesquisador e pelo participante e rubricado em todas as demais páginas, por ambas as partes.

Para garantir o sigilo e anonimato dos participantes na apresentação dos resultados, estes foram identificados pela letra “A” de acadêmico, seguido pela letra inicial do curso e do número da ordem das entrevistas, conforme exemplificado no quadro abaixo.

Quadro 2: Exemplo da identificação das entrevistas.

Curso Número da entrevista Abreviação

Enfermagem 1 AE1

Farmácia 2 AFC2

Fonoaudiologia 3 AF3

Medicina 4 AM4

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Odontologia 6 AO6

Psicologia 7 AP7

Fonte: Elaborado pelo autor, 2020.

As entrevistas foram gravadas com autorização prévia dos participantes. As gravações, os dados e os instrumentos utilizados para as entrevistas, ficarão arquivados com o pesquisador por no mínimo 5 anos e serão destruídas após esse período. Os dados coletados foram tratados com segurança, a fim de garantir a confidencialidade e sigilo em todas as etapas do estudo.

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6 RESULTADOS

Os resultados deste estudo serão apresentados em forma de manuscrito, conforme a resolução do CNE/CES nº 3 de 2001 para apresentação do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Os resultados apresentam duas categorias e suas subcategorias, conforme exemplificado no quadro abaixo:

Quadro 3: Quadro representativo dos resultados envolvendo as categorias identificadas

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6.1 MANUSCRITO – POTÊNCIAS E LIMITES NO QUOTIDIANO DA FORMAÇÃO DE ESTUDANTES DE GRADUAÇÃO NO CUIDADO À PESSOA SURDA

RESUMO:

Introdução: A comunicação é uma barreira linguística entre o profissional da

saúde e a pessoa surda, impactando diretamente no acesso aos serviços de saúde e na melhor qualidade do cuidado para estas pessoas. Objetivo: Compreender as potências e os limites no quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda. Metodologia: Trata-se de um estudo qualitativo e interpretativo, desenvolvido no período de outubro a novembro de 2019, com 18 estudantes de Cursos de graduação em Enfermagem; Farmácia; Fonoaudiologia; Medicina; Nutrição; Odontologia e Psicologia, que já realizaram cuidado à pessoa surda nos ambientes de saúde. A coleta de dados se deu por meio entrevistas individuais, utilizando-se um roteiro semiestruturado, contendo questões sobre a vivência dos estudantes no cuidado à pessoa surda. Para análise das entrevistas foi utilizado o método de Análise de Conteúdo Temática de Bardin, envolvendo: pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados e interpretação, guiada pelo olhar da Sociologia Compreensiva e do Quotidiano de Michel Maffesoli. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina, através do Parecer Nº 3.631.821. Resultados: As potências no quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda se mostram no desejo de cooperação, buscando maneiras criativas de se comunicar com a pessoa surda. Denotando uma proxemia e uma ética da estética. Falar Libras confere ao estudante, competência no cuidado e satisfação pela possibilidade de interação e de resolução, além de possibilitar uma comunicação interpessoal mais afetiva, portanto efetiva e empática. Integrar-se à comunidade surda é uma potência na formação do estudante, possibilitando desenvolver capacidade crítica, reflexiva e de compromisso social. Quanto aos limites no quotidiano da formação de estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda, observa-se que os modelos e práticas pedagógicas atuais são insuficientes porque não atendem, em sua totalidade, às demandas de cuidado à pessoa surda ao longo da sua formação. Tem-se a necessidade de incluir nos currículos de graduação dos Cursos da saúde, disciplinas obrigatórias que abordem a temática deficiência e reabilitação, abrangendo ensino, pesquisa e extensão. A disciplina de Libras isolada da especificidade técnica dos cursos de graduação da área da saúde não é

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suficiente se fazer entender e passar as informações necessárias no âmbito da saúde.

Conclusão: Conclui-se que há a necessidade de se refletir sobre os currículos dos cursos

da área da saúde, no que se refere ao cuidado à pessoa surda e possibilitar a inclusão da disciplina obrigatória de Libras, de modo que os estudantes tenham competências para o cuidado desta população em todos os níveis de atenção à saúde, para que possamos diminuir as barreiras de linguagem e garantir acesso universal à saúde à pessoa surda, fortalecendo assim o Sistema Único de Saúde (SUS) e as políticas de atenção à saúde à pessoa surda.

Descritores: Surdez; Pessoas com deficiência auditiva; Estudantes; Atividades cotidianas e; Assistência à saúde.

INTRODUÇÃO

Há um número expressivo de pessoas com deficiência na população e por isso este tema tem sido de grande relevância de discussões a nível global e nacional (SOUZA, et al., 2017). Em relação a surdez e segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o último Censo Demográfico (2010), no Brasil, há cerca 9,7 milhões de pessoas (5,10% da população do país) e segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2018, estima-se que mundialmente há aproximadamente 466 milhões de pessoas (6,10% da população mundial) com algum grau de surdez (World Health Organization, 2018).

A qualidade de vida relacionada à saúde, para quem vive com a surdez, dever ser percebida como um fator de grande importância. Pois mesmo com todas as discussões mundiais, as pessoas surdas ainda são excluídas nas políticas de saúde (TSIMPIDA; KAITELIDOU; GALANIS, 2018).

A Lei Nº 10.436, de 24 d e abril de 2002, além de reconhecer a Língua Brasileira de Sinais (Libras), como a segunda língua oficial do país, também decreta que as instituições públicas e empresas de serviços de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado às pessoas surdas de acordo com a normas legais em vigor (BRASIL, 2002). Porém, as pessoas surdas ainda enfrentam diversas barreiras na acessibilidade aos diferentes serviços, em especial aos serviços de saúde, devido à barreira comunicativa e a difícil inclusão destes na sociedade ouvinte (SOUZA, et al., 2017). Então, identificar os determinantes da qualidade de vida, em relação à saúde das

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pessoas surdas, é decisiva, para que as condições de saúde desta população possam ser melhoradas. (TSIMPIDA; KAITELIDOU; GALANIS, 2018).

A Portaria Nº 2.073 de setembro de 2004, garante a ampla cobertura no atendimento a pessoas surdas no Brasil, garantindo a universalidade do acesso, a equidade, a integralidade e o controle social da saúde auditiva (BRASIL, 2004). Mas a ausência de comunicação efetiva entre o profissional de saúde e a pessoa surda, a necessidade de intermediação pelo acompanhante/intérprete, o despreparo dos profissionais que os atendem, o não entendimento dos cuidados e orientações passadas a pessoa tratamento, faz com que estes direitos não sejam cumpridos. (PIRES; ALMEIDA, 2016).

Os currículos para formar profissionais da saúde não abordam ou não tem preocupações relacionados à pessoa que vive com a deficiência. Então, estes não são capacitados para prestar assistência a esta população (DEVKOTA, et al., 2017). Com isto, ao prestar um cuidado à pessoa surda, os profissionais de saúde se sentem incapazes, impotentes, inseguros, constrangidos, entre outros, devido à dificuldade de comunicação, pela falta de preparo dos mesmos e por não saberem a Libras. (FRANCISQUETI, et al., 2017).

Considerando que a surdez é um acometimento que afeta o ser humano em sua condição física, psíquica e social, e, tendo-se a compreensão, a partir da Sociologia Compreensiva e do Quotidiano (MAFFESOLI, 2001), de que a potência é a força que vem do interior de cada pessoa, sendo da ordem da libertação e da cooperação. E, que os limites são noções de determinação ou empenho, sendo um mecanismo de sobrevivência diante de situações quotidianas, ou seja, aquilo que nos protege de determinados acontecimentos característicos da condição humana, questiona-se: Como se dá o quotidiano da formação de estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda nos ambientes de saúde?

Entendendo o quotidiano como a “maneira de viver dos seres humanos que se mostra no dia a dia, expresso por suas interações, crenças, valores, símbolos, significados, imagens e imaginário, que vão delineando seu processo de viver, num movimento de ser saudável e adoecer, pontuando seu ciclo vital. Esse percurso pelo ciclo vital tem uma determinada cadência que caracteriza nossa maneira de viver, influenciada tanto pelo dever ser, como pelas necessidades e desejos do dia a dia, que se domina como ritmo de vida e do viver.” (NITSCHKE et al., 2017, p.8).

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Este estudo teve por objetivo compreender as potências e os limites no quotidiano da formação dos estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda.

MÉTODO

Trata-se de um estudo qualitativo e interpretativo, tendo como cenário uma Universidade Federal do Sul do Brasil. Participaram do estudo 18 estudantes de Cursos de Graduação, sendo: 04 estudantes do Curso de Enfermagem; 04 de Farmácia; 04 de Fonoaudiologia; 03 de Medicina; 01 de Nutrição; 01 de Odontologia e 01 de Psicologia. Estes cursos foram escolhidos por desenvolverem práticas de cuidado em saúde à pessoa surda e por serem os cursos presentes no cenário deste estudo. Não foram encontrados estudantes dos Cursos de Educação Física (bacharel) e de Serviço Social que preenchessem os critérios de inclusão da pesquisa.

Inicialmente a seleção dos sujeitos seria realizada a partir da indicação do Coordenador de cada Curso de graduação. Porém, os coordenadores, em sua maioria, não tinham conhecimento de quais alunos já haviam realizado cuidado à pessoa surda. Por este motivo, o convite para participação no estudo foi realizado pelo pesquisador principal aos estudantes, em sala de aula, durante horário de aula dos mesmos. A partir do primeiro contato com os estudantes, optou-se também pelo método “bola de neve”, onde os próprios participantes indicaram outros novos participantes com características e perfil desejados para a pesquisa.

Considerou-se como critérios de inclusão dos participantes: ter pelo menos 18 anos, ser estudante dos cursos de graduação dos cursos de Educação Física (bacharel), Enfermagem, Farmácia, Fonoaudiologia, Medicina, Nutrição, Odontologia, Psicologia e Serviço Social, que estavam regularmente matriculados e que já tinham prestado cuidado à pessoa surda em algum momento durante a graduação em ambientes de saúde.

A coleta de dados aconteceu entre outubro e novembro de 2019, por meio de 18 entrevistas, guiadas por um roteiro semiestruturado, elaborado pelo autor, baseada em duas questões norteadoras: Quais as facilidades e as dificuldades no cuidado à pessoa surda? Durante a sua formação acadêmica você teve algum preparo para o cuidado à pessoa surda nos ambientes de saúde? A suspensão da inclusão de novos participantes se deu quando os dados coletados se mostraram repetitivos, determinando assim, que os dados primários foram suficientes para alcançar os objetivos propostos e compreender o objeto em estudo.

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As entrevistas foram áudio-gravadas, em profundidade, em local de preferência dos participantes, sendo posteriormente transcritas na íntegra, e realizada a pré-análise. Como método de análise, utilizou-se o modelo de Análise de Conteúdo Temática de Bardin (2011), considerando as seguintes fases: pré-análise; exploração do material; tratamento dos resultados; inferência e a interpretação, integrando-se à lógica da Sociologia Compreensiva e do Quotidiano (MAFFESOLI, 2010), ao considerar que tudo o que é humano merece ser objeto de nossa análise.

A pesquisa foi desenvolvida após a aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa, sob Parecer de n° 3.631.821 e seguiu os preceitos éticos referentes à pesquisa e ao cuidado com seres humanos. Para a garantia do anonimato dos participantes, estes foram identificados no estudo por meio da letra “A” de acadêmico, seguido pela letra inicial do curso e do número da ordem das entrevistas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO:

A população foi constituída por: 04 estudantes da Enfermagem, 04 da Farmácia, 04 da Fonoaudiologia, 03 da Medicina, 01 da Nutrição e 01 da Odontologia, totalizando 18 estudantes. A faixa etária dos estudantes era de 21 a 27 anos. Sendo 12 participantes do sexo feminino e 06 participantes do sexo masculino.

A aproximação com o quotidiano da formação acadêmica dos estudantes permitiu compreender as potências e os limites no quotidiano da formação de estudantes de graduação no cuidado à pessoa surda. Os resultados apresentam em duas categorias e suas subcategorias, conforme quadro abaixo:

Quadro 4: Diagrama representativo dos resultados envolvendo as categorias e

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Fonte: Elaborado pelo autor, 2020.

Potências no quotidiano da formação de estudantes de graduação para o cuidado à pessoa surda

Desejo de cooperação

No dizer de Maffesoli (2010), a potência é uma força que vem do interior de cada pessoa, sendo da ordem da libertação e da cooperação e é neste desejo de cooperação que alguns estudantes, participantes da pesquisa, mesmo não sabendo se comunicar em Libras, buscam suas potências, suas forças internas para se comunicar com a pessoa surda, possibilitando o acesso à saúde.

AM11: “[...] se esforçar, de ajudar o máximo que der, mesmo que não saiba Libras, pelo menos se esforçar para escrever [...] para tentar fazer essa comunicação.” AM11

Pelo olhar da Sociologia Compreensiva do Quotidiano de Maffesoli (1984), esse “desejo de cooperação” é da ordem do instituinte, da solidariedade orgânica, que se apoia nos laços sociais afetivos, na ambiguidade básica da estruturação simbólica, garantindo a

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“coesão” do grupo, da troca, da partilha de valores, de lugares, de ideias, em contraponto à solidariedade mecânica, que é da ordem do instituído.

Na busca pela “coesão na troca de saberes” e no atendimento às necessidades da pessoa surda, os estudantes de graduação utilizam a criatividade na arte de se comunicar por meio da escrita, da mímica, dos gestos, do desenho e da fala pausada, como se mostra nos relatos abaixo:

“Ele escrevia e eu escrevia no papel também [...] “ AM11

“[...] ela (pessoa surda) foi lendo e eu gesticulando e ela respondendo no papelzinho para mim [...]” AFC14

“[...] você tem que falar calmo, falar pausadamente, articular muito bem, para ele conseguir fazer a leitura labial.” AF5

“[...] os desenhos que eu fiz sobre as doses e para perguntar sobre as sobras de medicamentos [...]” AFC13

É através da comunicação que se expõe o pensar, o sentir e revela a necessidade que a pessoa tem no momento. A incidência de profissionais da saúde que sabem falar Libras é bem reduzida (OLIVEIRA; ANDRADE, 2016). Com isto, os profissionais de saúde, ao não se comunicar por meio da Libras, buscam através de outras possibilidades, potências para se comunicar com os usuários surdos, como por exemplo, a escrita, gestos ou leitura labial (SOARES, et al., 2018).

Tecnossocialidade: tecnologias inclusivas que promovem a socialização da pessoa surda

O termo tecnossocialidade se refere à relação social propiciada pela tecnologia. Esta noção - tecnossocialidade - é compreendida por Michel Maffesoli como o desenvolvimento da técnica com a imagem numa religação ou re-aliança. Assim, mesmo que num primeiro momento possamos observar uma tendência ao isolamento, é evidente a existência de novas possibilidades de convívio social permitidas pela tecnologia. O uso de tecnologias da informação e comunicação se configuram como um meio de interação interpessoal, acesso à saúde e inclusão social no cuidado à pessoa surda. A tecnossocialidade é uma potência no processo de comunicação entre a pessoa surda e os profissionais da saúde nos espaços em saúde por estimular o protagonismo da pessoa surda acerca da compreensão do processo saúde-doença (MAFFESOLI, 1996).

“[...] eu ainda uso alguns aplicativos [...] para me comunicar com eles e me lembrar de alguns sinais.” AE16

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Possibilidades e potências que revelam a arte de viver sem argumentos formuladas antes nem preconceitos, trata-se de se ajustar aos momentos vividos, uma maneira sensível de socializar que não vem do exterior, de um caráter abstrato, mas que utiliza o procedimento “iniciático” procedimento fundamentado no sensível (MAFFESOLI, 2019, p. 65).

Comunicação em Libras

Para os estudantes de graduação, saber se comunicar em Libras é uma condição essencial para a aproximação com a pessoa surda, conferindo-lhe competência no cuidado e satisfação pela possibilidade de interação e de resolução.

“A Libras praticamente é o ponto principal, se a gente não tem a Libras, a gente não consegue trabalhar no contexto da criança surda.” AF12

“Durante a graduação, eu fiz o curso básico de Libras, e isso me ajudou muito. Eu era a única pessoa que conseguia se comunicar com as crianças diretamente, não tendo que falar com os pais [...]” AE16

As barreiras que os profissionais e os surdos se deparam ao se comunicar, leva a um comprometimento do atendimento. Com isto, e a fim de amenizar este problema, a comunicação entre o surdo e profissional de saúde deve ser por meio de Libras, sem mediação de intérprete (LOPES; VIANNA; SILVA, 2017). A Libras da competência ao profissional de saúde, para reconhecer as necessidades desta população em sua integralidade, e, assim, melhorar a relação profissional e pessoa surda (CAVAGNA, et al., 2017).

Mesmo que a comunicação em Libras não seja fluente entre a pessoa surda e o profissional da saúde, a possibilidade de ser ouvido e compreendido em suas necessidades, possibilita uma comunicação interpessoal mais afetiva, portanto efetiva e empática. De acordo com Terezam; Reis-Queiroz e Hoga (2017) a adoção de atitudes empáticas, a escuta receptiva e atenta, os cuidados relativos à comunicação não verbal, a consideração das percepções das outras pessoas em relação às nossas características e o aprendizado gerado pelas próprias experiências também contribuem para desenvolver a habilidade da empatia.

“[...] ele estava bem disposto, acho que ele entendia as dificuldades [...]”AE2 “[...] eles se disponibilizam bastante para fazer você entender, eles têm bastante paciência. Então eu vi que só de você [...] se mostrar “eu quero te ouvir, eu quero te entender”, já deu para gente se comunicar bem [...].” AP6

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“[...] a paciente era muito compreensiva e calma. Porque ela estava feliz de poder se comunicar, então, ela tinha toda a paciência de repetir o gesto ou de soletrar se a gente não entendesse, tentar falar de alguma outra forma, então, isso foi muito bom.” AE17

A empatia implica em compartilhar a emoção percebida no outro, sentir com o outro, destacando uma ética da estética, entendida enquanto desejo de comunicação, na emoção ou na vibração comum, substrato da experiência e do reconhecimento do outro que fundamenta o ser-estar junto, mesmo que às vezes, seja conflitual (MAFFESOLI, 2016).

É nessa busca que se permite pensar, ao mesmo tempo, a diferença e a unicidade, em um vasto mosaico de pessoas e de coisas. É conjugando suas forças específicas para chegar a essa “inteligência social” que é estar-junto como capacidade de unir forças opostas. (MAFFESOLI, 2016, p. 215).

Devido as pessoas que vivem com a surdez, encontrarem diariamente barreiras para se comunicar, o que leva a exclusão social, essas pessoas surdas trabalham para fazer acontecer a própria inclusão, esforçam-se para aprender e compreender, buscando interagir com os ouvintes (SANCHES; SILVA, 2019).

Integrar-se à tribo da comunidade surda

Integrar-se à comunidade surda é compreender o quotidiano da pessoa surda, entendendo o quotidiano como a “maneira de viver dos seres humanos que se mostra no dia a dia, expresso por suas interações, crenças, valores, símbolos, significados, imagens e imaginário, que vão delineando seu processo de viver, num movimento de ser saudável e adoecer, pontuando seu ciclo vital. Esse percurso pelo ciclo vital tem uma determinada cadência que caracteriza nossa maneira de viver, influenciada tanto pelo dever ser, como pelas necessidades e desejos do dia a dia, que se domina como ritmo de vida e do viver.” (NITSCHKE et al., 2017, p.8).

Para os estudantes de graduação, além do conhecimento em Libras, o contato com a comunidade surda ajudou-os na compreensão da dinâmica do processo de viver e da cultura surda. Estar em contato com a comunidade surda diminui o distanciamento imposto pelas barreiras de comunicação essa população, melhora o cuidado e tornar este momento de melhor qualidade.

Referências

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