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. 23, jan–dez, publicação contínua, 2020, p. 1–21.
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Introdução
Com a cabeça parcialmente coberta por um gorro cinza, Heather Donahue (nome da atriz e também da personagem) olha dire-tamente para a câmera. A composição visual é confusa, desordenada: uma pequena parte do rosto ocupa a metade direita do quadro, enquanto o lado esquerdo mostra escuridão. A moça grava o vídeo numa � loresta, mas nada vemos além de sua face; a localização é sugerida pelo ambiente sonoro pontilhado de insetos, que marca presença ao fundo. O rosto está próximo da câmera. É uma imagem de medo e desespero: lágrimas se acumulam na ponta no nariz e salpicam toda a face enquanto ela, antevendo a morte próxima, deixa um recado de despedida para a família. “Estou com medo de fechar os olhos, estou com medo de abri-los! Nós vamos morrer aqui! ”, balbucia.
A câmera fi xa enquadra o rosto de Heather durante dois minutos e 12 segundos em que dura a mais famosa sequência de A bruxa de
Blair (� e Blair witch project, Eduardo Sánchez
O papel da respiração
no cinema de horror
Rodrigo Carreiro
Universidade Federal do Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil
Resumo
Nas últimas três décadas, a respiração tem ganhado mais destaque no som de fi lmes, especialmente de horror. Impulsionados por avanços tecnológicos, cineastas, atores e sound designers têm dado mais ênfase ao conteúdo não semântico da voz. Partindo de uma revisão histórica e conceitual, este artigo analisa os motivos do fenômeno, procurando re�letir sobre a construção do som em fi lmes contemporâneos de horror, e sugerindo que a tendência estilística da respiração proeminente na banda sonora ativa um potencial sinestésico (ou cinestésico) de engajamento afetivo entre espectador e personagem, com capacidade de mobilizar outros sentidos fi siológicos. Palavras-chave
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e Daniel Myrick, 1999)1. Mas a imagem,
sím-bolo da cultura pop reconhecido tão instan-taneamente quanto a fi gura de Janet Leigh no chuveiro em Psicose (Psycho, Alfred Hitchcock, 1960), não responde sozinha pelo elemento cênico de maior impacto dramático, emocio-nal e afetivo. Esta tarefa cabe especialmente aos sons que saem da boca da atriz: as pala-vras, que elaboram um pungente discurso de despedida, mas sobretudo o conteúdo não semântico, pontuado por gemidos, soluços e pela respiração ofegante que sublinha toda a cena, inserindo uma sensação de horror que não cabe na citação literal da fala de Heather. É um monólogo e tanto, mas teria a mesma efi ciência em engajar afetivamente o especta-dor na ação dramática sem o medo e o deses-pero, que gradualmente saem do controle, e estão fortemente assinalados na respira-ção da personagem? Esta cena tornou-se tão in�luente que o monólogo diante da câmera se tornou um clichê dos fi lmes que recorrem ao formato found footage – [Rec] (Paco Plaza e Jaume Balagueró, 2007), Cloverfi eld –
Mons-tro (Matt Reeves, 2008) e The Tunnel (Carlo
Ledesma, 2011), por exemplo, apresentam cenas idênticas, com o mesmo uso da respi-ração ofegante, por personagens que sabem estar à beira da morte. Mas não são apenas
1 A cena pode ser vista na íntegra neste link: https://youtu.be/Z66RpatHajQ.
os títulos vinculados a esse subgênero que apresentam a respiração dos personagens da fi cção no primeiro plano sonoro. O monólogo de Heather Donahue simboliza uma das ten-dências mais salientes do sound design de fi l-mes de horror nas últimas três décadas. Os exemplos são múltiplos: desde fi lmes de grande orçamento, como mãe! (mother!, Dar-ren Aronofsky, 2017) e Um lugar silencioso (A
quiet place, John Krasinksi, 2018), a longas de
baixo orçamento, como O mal não espera a noite (Midsommar, Ari Aster, 2019), Hereditário
(Here-ditary, Ari Aster, 2018) e O homem nas trevas
(Don’t breathe, Fede Alvarez, 2016); passando por títulos brasileiros de baixíssimo orça-mento, a exemplo de O animal cordial (Gabriela Amaral Almeida, 2018) e Desaparecidos (David Schürmann 2011), e enveredando por outros gêneros fílmicos, como o melodrama
Gra-vidade (Gravity, Alfonso Cuarón, 2013) e o thriller O nome da morte (Henrique Goldman,
2018). Alguns desses fi lmes chegam inclusive a dar à respiração dos personagens destaque no contexto do enredo, como ocorre em Um
lugar silencioso e O homem nas trevas (em ambos,
qualquer pessoa que fi zer barulho ao respi-rar, morre) e O último suspiro (Dans la brume, Daniel Roby, 2018). Nos dois últimos, per-sonagens precisam usar máscaras especiais
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para respirar, e o som da respiração domina as bandas sonoras.
A lista apresentada é uma amostragem minúscula de um fenômeno amplo, mas serve para destacar a presença, em primeiro plano sonoro, da respiração dos personagens, com variados graus de ênfase. A antologia
Histó-rias de além-túmulo (Ghost stories, Jeremy Syson
e Ady Nyman, 2018) chega a apresentar os créditos iniciais do fi lme, sobre tela negra, acompanhados do som da respiração de um homem ofegante, como alguém que acabou de tomar um enorme susto. A respiração, con-tudo, não pertence a nenhum personagem. Quando o fi lme começa de fato, não há nin-guém em quadro. Trata-se de uma voz sem corpo, um mero índice acústico que busca gerar tensão no espectador.
Carroll (1999) estabelece o horror como inte-grante de uma tríade – os outros são o thriller de suspense e o fi lme de mistério – de gêne-ros fílmicos cujos nomes “derivam do pró-prio afeto que pretendem provocar” (p. 30). O horror, portanto, recebe o nome de uma emoção que constitui sua identidade funda-mental. A condição crucial de um fi lme para integrar a categoria é que coloque o espec-tador, pelo menos em alguns momentos da trama, no estado emocional do horror, que Carroll (1999) identifi ca como uma soma de medo e repulsa. Esse estado emocional, por
sua vez, provoca uma torrente de sensações percebidas pelo corpo do espectador (que, espera-se, espelhem as mesmas reações sen-tidas pelos personagens):
Uma emoção envolve uma espécie de exci-tação, de perturbação ou de suspensão, fi siologicamente marcada por uma acelera-ção do batimento cardíaco, da respiraacelera-ção e de reações assemelhadas. [...] Em relação ao horror artístico, algumas das sensações – ou agitações fisicamente sentidas, ou respostas automáticas, ou sentimentos – são contrações musculares, tensão, enco-lhimento, tremores, recuo, entorpecimento, enregelamento, paradas momentâneas, calafrios (portanto, “frios na espinha”), paralisias, estremecimentos, náusea, um reflexo de apreensão ou um estado de alerta fi sicamente incrementado (uma res-posta ao perigo), talvez gritos involuntários etc. (CARROLL, 1999, p. 41).
A longa descrição de efeitos sensoriais que o filme de horror provoca no espectador – e que inclui, logicamente, a respiração como um dos mais importantes – indica que o gênero fílmico pode ser muito ativo dentre aqueles capazes de fazer o espectador expe-rimentar o fi lme com o corpo inteiro, con-vocando outros sentidos para além da visão e da audição.
Podemos afi rmar, nesse sentido, que o gênero do horror possui características narrativas adequadas acionar com efi ciência um poten-cial sinestésico – ou cinestésico, para usar
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o neologismo criado por Sobchack (2004) – de engajamento afetivo entre espectador e personagem através dos sentidos fi
siológi-cos2. Esse potencial, que permanecia pouco
utilizado, em parte por causa das limitações tecnológicas nas áreas de gravação, edição, mixagem e reprodução sonoras, é capaz de
mobilizar o tato (MARKS, 1999; BARKER, 2009)
e os demais sentidos corporais, criando uma
forma de escuta háptica (QUINLIVAN, 2011), ou
auralidade háptica (COULTHARD, 2012), que
permite ao espectador experimentar o fi lme
com o corpo inteiro (SHAVIRO, 2015).
Seria essa a razão pela qual a respiração ganhou destaque na banda sonora de fi lmes, em particular do gênero horror, nas últimas três décadas? Onde podemos localizar a ori-gem exata dessa tendência estilística? Qual a relação dela com os avanços tecnológicos nas áreas de gravação, edição, mixagem e reprodução sonora na indústria audiovisual? E, afi -nal, qual o motivo pelo qual algo tão prosaico, quase sempre invisível aos olhos da plateia, gere empatia entre personagens da ficção e espectadores? O que a presença da respira-ção destacada de personagens agrega a um fi lme, especialmente no gênero do horror?
2 O neologismo cinestesia combina a palavra sinestesia (sensação captada por mais de um sentido fi siológico) com
cinema, e com dois outros termos da biologia (synaesthesia e coenaesthesia), que designam estruturas do aparelho
sensório do ser humano. Desde então, a noção tem sido usada na teoria do cinema como sinônimo de narrativa audiovisual que evoca sensações fi siológicas e táteis.
Este artigo tem o objetivo de examinar essas questões. Para cumprir esse objetivo, preten-demos dividir o texto em duas seções, segui-das pelas conclusões fi nais. Na próxima parte, discutiremos o papel preponderante da voz no cinema clássico, bem como as inovações tecnológicas que permitiram aos realizadores ampliar, pouco a pouco, os usos não semân-ticos dessas gravações, para além do papel narrativo tradicional que privilegia o con-teúdo semântico como condutor principal da progressão dramática. Trataremos desse tópico a partir de uma revisão teórica ampla dos escritos de pesquisadores como Bordwell (1985), Aumont (2006), Chion (2008) e Kerins (2010), entre outros.
A segunda seção mostrará como, mais recen-temente, pesquisadores como Coulthard (2012), Greene (2016), Lovatt (2016), Costa (2017) e Quinlivan (2011) – esta última, autora do primeiro estudo específi co sobre o papel da respiração no cinema – passaram a dis-cutir os múltiplos usos estilísticos e a impor-tância de elementos como timbres, texturas acústicas, sotaques e modalidades não ver-bais produzidas no contexto do discurso oral, incluindo gritos, sussurros, suspiros,
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gemidos, gargalhadas, choro e, claro, a respi-ração, para a narrativa fílmica.
A longo do texto, discutiremos os motivos pelos quais o horror tem sido um dos gêne-ros fílmicos que mais tem se benefi ciam dessa tendência estilística. Ao discutir alguns usos da respiração em filmes de horror, como
A bruxa de Blair, tentaremos demonstrar
como o poder cinestésico produzido por esse elemento vocal exerce papel importante nos processos cognitivos que produzem no espec-tador o afeto do horror, estimulando cone-xões empáticas mais vigorosas entre público e personagens.
Pequena arqueologia de voz
e respiração no cinema
Desde a introdução das inovações tecnológi-cas que permitiam a reprodução sincrônica de sons pré-gravados junto com a imagem, em 1927, a voz tem sido o componente central da banda sonora dos fi lmes: “todo o resto [efeitos sonoros, música] pode ser gravado e introdu-zido na trilha sonora depois, durante a fase
da pós-produção” (CARREIRO, 2018, p. 54).
Este foi o paradigma central do sistema de produção sonoro que os grandes estúdios desenvolveram em conjunto, entre os anos de 1927 e 1932, e chamaram de re-recording, termo
3 Em tradução livre, “fi lmes falados”.
hoje utilizado como sinônimo de mixagem (BUHLER; NEUMEYER; DEEMER, 2010). Não é à toa que os primeiros fi lmes sonoros eram
cha-mados de talkies3.
Na concepção de Hollywood do “observa-dor invisível” monocular e monaural, o som consistia essencialmente da voz humana. Até o fi nal da década de 1930, a dublagem da voz oferecia baixa fi delidade, então a maioria dos diálogos tinha que ser cap-turada no momento da gravação, no som direto. Mais importante: no cinema sonoro, a voz tornou-se tão central para a banda sonora quanto a fi gura humana para a tri-lha da imagem. Assim como a construção corporal e a expressão facial, a voz indivi-dualiza e caracteriza personagens, conduz o desenvolvimento narrativo do enredo e dá acesso a fatores psicológico-causais (BORDWELL, 1985, p. 540).
A importância da gravação legível da voz orientou as inovações tecnológicas persegui-das pelo comitê formado em Hollywood para unifi car procedimentos técnicos e estéticos entre os estúdios. O microfone unidirecional funciona como exemplo: foi desenvolvido em
1936, pela RCA, com o objetivo de isolar a voz
dos atores dos ruídos de fundo, captados com um nível de intensidade muito mais baixo, devido à seletividade espacial da cápsula dos
microfones (CARREIRO, 2018). O uso de raios
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som ajudou a reduzir sibilâncias produzidas
por vozes muito agudas (BORDWELL, 1985).
Além disso, a partir de 1938, Hollywood desen-volveu um protocolo de equalização sonora, a fi m de uniformizar a reprodução do som em salas de projeção. O protocolo, chamado de Academy Curve, atenuava as frequências
sonoras acima de 8 KHz (mais agudas), com
o propósito de permitir maior legibilidade da
voz (CARREIRO, 2018).
Até meados dos anos 1970, a grande maioria dos fi lmes tinha som mixado em um único canal. Ele podia ser reproduzido nas salas de projeção por vários alto-falantes, mas todos exibiam o mesmo conteúdo. Como todos os componentes sonoros do fi lme disputavam lugar nesse canal, incluindo os ruídos natu-rais e a música, os mixadores precisavam ser seletivos. Essa seletividade, combinada à qualidade técnica incipiente dos microfones direcionais, aos métodos de edição analógi-cos (nos quais cada corte feito na fi ta ou pelí-cula aumentava o ruído de fundo e reduzia a clareza sonora) e a baixa relação sinal-ruído
(RSR) dos sistemas de reprodução monocanal4,
4 A relação sinal-ruído (RSR) consiste na diferença entre os níveis do som desejado (no caso, principalmente a voz) e o ruído de fundo. Nos anos 1940, a RSR dos sistemas de reprodução era de 50 dB (FRAYNE, 1976, p. 514). Para efeito de comparação, a taxa aumentou para 78 dB em 1975, após a introdução do sistema Dolby Stereo, que contava com uma tecnologia eletrônica de redução de ruído. Foi ampliada, ainda, para 100 dB, depois da instituição dos sistemas multicanais digitais, como Dolby Digital, DTS e Dolby Atmos (KERINS, 2010, p. 54). Como o decibel cresce em proporção geométrica, e sabe-se que a intensidade sonora duplica a cada 10 dB, pode-se afi rmar que o som que ouvimos atualmente, nas salas de projeção, é pelo menos três vezes mais intenso do que nos anos 1970, e cinco vezes mais do que nos anos 1940-50.
é um motivo importante pelo qual a respira-ção, assim como os demais conteúdos não semânticos da voz, aparecem pouco e com discrição nos fi lmes mais antigos. Naquele contexto, a legibilidade das palavras era fundamental, pois permitia a condução do enredo sem sobressaltos.
É por essa razão que Chion (2008) afi rma que o cinema é, mais do que vococêntrico (ou seja, conduzido pela voz), um meio de expressão
verbocêntrico (ou seja, centrado nas palavras):
“não se trata da voz dos gritos e dos gemidos, mas da voz enquanto suporte da expressão verbal” (p. 13). Para ele, o fato de a maioria maciça dos filmes ser verbocêntrica tem uma explicação cognitiva simples: o compor-tamento cotidiano das pessoas também o é. Se ouvimos uma massa sonora que contenha vozes em meio a outros sons, instintivamente procuraremos compreender o signifi cado das palavras que ouvimos, e atribuir a elas um sentido lógico.
O raciocínio de Chion é referendado por Aumont (2006), que percebe no uso da voz
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(em especial diálogos e narração) uma corre-lação direta com o ritmo da narrativa. Para Aumont, aliás, o cinema clássico de Holly-wood – o mesmo que tinha predomínio claro da função semântica da voz – é pródigo em exemplos de fi lmes velozes e acelerados, pois os personagens falam sem parar, embora fi lmados em longos planos de câmera fi xa. Aumont (2006) chama esses fi lmes, entre os quais um exemplo paradigmático é a comédia
Jejum de amor (His girl friday, Howard Hawks,
1940), de logorreicos: “fi lmes em que a fala dramatizada nunca se cala” (p. 29). De certa forma, Hollywood tem feito filmes logor-reicos, ou verbocêntricos, desde então, dei-xando em segundo plano sonoro o conteúdo não semântico da voz. Essa estética começou a sofrer mudanças em 1975.
Naquele ano, a instituição do Dolby Stereo como sistema dominante de reprodução sonora de fi lmes abriu espaço para que edi-tores e mixadores pudessem trabalhar com combinações de sons de maior complexidade e variedade. O Dolby Stereo é um sistema de quatro canais (três dianteiros e um surround, reproduzido nas laterais e atrás da sala) que contra com um sistema eletrônico de redução
de ruídos, para alcançar uma RSR com maior
amplitude entre ruído de fundo e vozes. Essas condições permitem que a equipe de pós-pro-dução sonora inclua um número maior de eventos sonoros, os movimente pela sala de
exibição no eixo horizontal, e os reproduza com maior fi delidade acústica.
Essa nova condição tecnológica funcionou, nos anos 1970 e 1980, como uma variável importante para a ampliação da presença de ruídos naturais (e efeitos sonoros em geral) na banda sonora dos filmes. Sergi (2006) observa que a época de instituição do Dolby Stereo viu nascer a primeira geração de sound designers, entre eles Walter Murch, Alan Splet, Ben Burtt, Gary Rydstrom e Randy � om. Todos davam maior impor-tância ao desenvolvimento de processos mais complexos e detalhados para a criação de efeitos sonoros verossímeis, algo obser-vado por Chion (2008, p. 122):
O som dos ruídos aproveitou então a defi -nição recente que lhe foi conferida pelo Dolby para reintroduzir nos filmes um sentimento agudo de materialidade das coisas e dos seres e favorecer um certo cinema sensorial.
O mesmo raciocínio que explica a valoração estilística dos ruídos naturais a partir dos anos 1970 deve ser aplicado ao uso da respi-ração e demais elementos não semânticos da voz: foi exatamente nessa época, entre o fi nal dos anos 1970 e o início dos anos 1980, que a respiração começou a ganhar destaque narrativo e estilístico no som dos fi lmes. Um dos exemplos mais signifi cativos de fi lmes que colocam a respiração em primeiro plano
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narrativo, dando a ela uma função expressiva e dramática crucial para o desenvolvimento do enredo, é O homem elefante (� e elephant
man, David Lynch, 1980), que conta a vida
de John Merrick (John Hurt), um trabalha-dor que vive na Londres industrializada no século XIX, e tem um defeito físico que lhe deixa a respiração asmática, quase a ponto
de entrar em colapso5. Greene (2016) observa
que a respiração difícil de Merrick serve, no contexto do fi lme, para assinalar a luta persis-tente do personagem para sobreviver.
No gênero do horror, os sons de respiração começaram a ganhar destaque na mesma época. A sequência de abertura de Halloween (John Carpenter, 1978), um plano-sequência subjetivo de cinco minutos que mostra o pri-meiro assassinato cometido pelo serial killer
mascarado, ainda criança6, é pontuada por
sons de respiração, emparelhando os pontos de vista visual e sonoro do agressor. Carpen-ter, cuja contribuição criativa para o som no cinema de horror também foi importante
no terreno da música7, utiliza a respiração
do personagem para pontuar ritmicamente
5 Uma cena do fi lme pode ser vista aqui: https://youtu.be/Mi42ZodnbIc.
6 Veja a sequência analisada aqui: https://youtu.be/nnWw060ygG8.
7 Uma das tendências mais signifi cativas da música no cinema de horror contemporâneo consiste na utilização massiva de drones, um estilo musical composto por notas longas, sustentadas por longos períodos de tempo, sem regularidade melódica, harmônica ou rítmica.
a cena, na qual o garoto espiona a irmã e seu namorado pela janela, entra na casa, pega uma faca, sobe as escadas e mata o casal. É importante destacar que no momento cul-minante da sequência, quando Michael esfa-queia o casal, a mixagem de som aumenta o volume da respiração, que acelera, enfati-zando a excitação e o prazer do assassino em matar. Trata-se de um excelente exemplo de uso da respiração como modo não verbal de enfatizar sensações e afetos que vão além dos sentidos da audição e da visão – é uma cena cinestésica, que antecipa a forte tendência contemporânea em explorar texturas visuais e sonoras para evocar uma experiência háptica (MARKS, 1999; QUINLIVAN, 2011).
Vale a pena lembrar, ainda, da cena de aber-tura de Um tiro na noite (Blow out, Brian de Palma, 1981), fi lmada de modo muito pare-cido com a descrita no parágrafo anterior: um plano-sequência subjetivo de três minu-tos, que assume os pontos de vista e escuta de um assassino, com uma faca, que invade uma casa onde ocorre uma festa e ataca uma
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mulher tomando banho8. A música – rítmica,
atmosférica – está presente na maior parte da cena, mas ouvimos com careza a respiração cadenciada do agressor. O ritmo e a textura da respiração, nesse exemplo, não se alteram, o que estabelece para este fi lme uma persona-lidade muito diferente – frio, distante – do assassino. O conteúdo não semântico da voz, como podemos perceber, é importante para informar aspectos da psicologia do persona-gem. Sequências subjetivas pontuadas pela respiração de personagens aparecem, ainda, em fi lmes de horror como A hora do espanto (Fright night, Tom Holland, 1985).
Embora o uso da respiração nesses filmes não seja tão ostensivo quanto nos longas de horror contemporâneos – nos quais, em alguns casos, é tratado de modo
hiper--realista (CAPELLER, 2008; SMITH, 2013) –,
demarca uma distância considerável de outros trabalhos realizados apenas alguns anos antes, que foram mixados em mono e com faixa dinâmica muito mais estreita, de apenas 50 dB. É o caso, por exemplo, de
O exorcista (The exorcist, William Friedkin,
1973), no qual a adolescente Regan MacNeil (Linda Blair) passa toda a segunda metade do fi lme amarrada na cama, em um quarto gelado. Nesse filme, a respiração é um
8 A sequência analisada está aqui: https://youtu.be/XJu-jcfFxAE.
elemento mais visual do que sonoro. Mesmo assim, e apesar do meticuloso trabalho de sobreposição de vozes que agrega texturas ameaçadoras à psicologia do personagem, pouco conseguimos ouvir da sua respiração. A tecnologia incipiente, nesse caso, exerceu um papel limitador nessa escolha estilística da equipe de sound design.
Nesse sentido, podemos afi rmar que a intro-dução de tecnologias de reintro-dução de ruídos e reprodução multicanal abriram caminho para a inclusão mais agressiva e sistemática de elementos cinestésicos, hápticos e sen-soriais de experiência audiovisual, embora o modelo estético sonoro predominante con-tinuasse seguindo – como ainda o faz – as convenções narrativas estabelecidas pelo sis-tema re-recording, consolidado em Hollywood
desde 1932 (BUHLER; NEUMEYER; DEEMER,
2010). Esse modelo é construído em torno da voz (sempre posicionada no canal central), que conduz o �luxo de informações capaz de fazer o enredo avançar. Os efeitos sonoros funcionam como elemento responsável por dar verossimilhança e perspectiva espacial às cenas, enquanto a música tem a função de sinalizar a leitura emocional de cada cena, modulando os afetos que ligam personagens
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Nas décadas de 1970 e 1980, porém, como vimos, o uso ostensivo da respiração em fi l-mes de horror surge somente nas sequências de ponto de vista subjetivo. Esse uso só seria ampliado a um novo nível de destaque nar-rativo a partir da disponibilização de tecno-logias digitais de gravação, edição, mixagem e reprodução. Essas tecnologias permitem que a organização de sons mais delicados seja complexa e variada.
A partir de 1992, o Dolby Stereo foi substituído por uma multiplicidade de sistemas de repro-dução multicanal digitais, tais como Dolby
Digital, DTS, Dolby Surround 7.1 e, desde 2012,
Dolby Atmos e DTS-X9, rotulados por Kerins
(2010) pela sigla DSS, de Digital Surround Sound
(a tradução literal seria “sons digitais que nos cercam”). Todos esses sistemas são capazes de reproduzir múltiplos sons simultâneos (de seis a 128 canais), com faixa dinâmica que chega a 100 dB; ou seja, a diferença entre os sons mais quietos (apenas o room tone e o discreto zumbido dos alto-falantes) e os mais ruidosos
9 Os dois últimos sistemas possuem a capacidade de codifi car metadados com coordenadas espaciais nos arquivos sonoros, permitindo que eles sejam reproduzidos por alto-falantes posicionados em qualquer lugar da sala, inclusive no teto e no chão. Desde 2017, essas tecnologias também estão disponíveis para reprodução em home theaters especiais, chamados de soundbars.
10 A exposição a sons superiores a 120 dB pode romper o tímpano (membrana auricular) e provocar danos irreversíveis ao sistema auditivo.
11 Também conhecido no Brasil como “ruído de sala”, a atividade do foley consiste em uma espécie de dublagem de ruídos, no qual uma equipe de artistas reproduz em estúdio, com a ajuda de objetos, sons resultantes da interação do homem com o ambiente: passos, tiros, aberturas de portas e janelas, toques em objetos, movimento de talheres, farfalhar de roupas etc.
(tiros, explosões) pode ir da percepção de
silêncio quase absoluto ao limiar da dor10,
estabelecendo uma RSR que favorece o uso
do conteúdo não semântico da voz.
Aliás, as condições técnicas favorecem todos os tipos de ruídos e efeitos sonoros míni-mos, delicados, que contribuem para refor-çar a complexidade e a verossimilhança da narrativa. É o caso, por exemplo, do farfa-lhar das roupas dos personagens, um grupo discretíssimo de sons conhecido no Brasil como mumunhas, e gravados na fase de
pós--produção sonora pela equipe de foley11. Como
no caso da respiração, esses sons mínimos ajudam a estabelecer conexões afetivas com a plateia. O destaque que eles recebem na mixagem dos fi lmes contemporâneos levou Smith (2013, p. 338) a considerar o “foley hiper--detalhado” como tendência importante da
estética da continuidade intensifi cada (
BORD-WELL, 2006; SMITH, 2013) – uma estética que
tem como objetivo conseguir do espectador reações mais viscerais – na banda sonora.
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De certo modo, a afi rmação de que a respira-ção tem sido tratada como efeito sonoro por editores, mixadores e sound designers con-temporâneos é coerente. A noção é, contudo, redutora, pois presume que, ao assumir um papel que valoriza características expressivas da narrativa fílmica, a respiração estaria esti-listicamente se distanciando do tratamento logorreico, dado à voz pelos editores e mixa-dores, para ser tratada como um componente da banda sonora mais ambíguo e complexo – o conteúdo háptico, pertencente ao reino dos sentidos. Ocorre que é impossível dis-sociar plenamente o conteúdo semântico da voz e suas características não verbais. As duas dimensões interagem e se complemen-tam o tempo inteiro. As falas da personagem da menina possuída de O exorcista teriam o mesmo impacto emocional sobre a plateia sem o cuidadoso trabalho vocal de texturas, timbres e sobreposições de vozes organizado pela equipe de pós-produção sonora?
Voz e cinestesia no horror
contemporâneo
Pesquisadores como Doane (1985), Carroll (1999), Quinlivan (2011) e Costa (2017) re�le-tiram sobre usos não semânticos da voz em fi lmes. Eles observaram que, embora as prá-ticas criativas dos realizadores tenham nos acostumado a pensar a voz de uma perspec-tiva mais utilitária, essa extensão invisível do corpo humano pode agir, e tem agido, como
um poderoso elemento de ligação afetiva, mobilizando outros sentidos para além da audição, a fi m de estabelecer conexões emo-cionais e sensoriais entre espectador e perso-nagem. Costa (2017, p. 24), comentando um texto de 1976 escrito por Don Ihde, afi rma que:
[...] a palavra falada é um centro possível para o sentido, mas a apreensão desse sentido passa pela complexa personifi ca-ção dessa voz, pela presença de um corpo, com tudo que ele seja capaz de manifestar. [...] a palavra pode parecer o centro do sen-tido, mas no centro da palavra está o som em si, a respiração mesma. [...] Uma fi loso-fi a da escuta deveria, segundo Ihde, levar em conta o que está ao mesmo tempo entre as palavras, abaixo e acima delas, o que as circunda.
A maior parte dos estudos sobre a voz no cinema envolvem o conteúdo semântico de
diálogos, monólogos e narrações (JAECKLE,
2013), e mobilizam a dicotomia entre fi deli-dade e legibilideli-dade dos registros sonoros, pro-posta por James Lastra (2012). O pesquisador sugere que existem, desde a instituição do sis-tema de re-recording (portanto, desde a década de 1930), dois modos dominantes de apresen-tação de sons em meios audiovisuais – e os fi lmes oscilam entre ambos, aderindo mais a um ou a outro por razões estilística, eco-nômicas ou ideológicas. O primeiro, que ele denomina de “fonográfi co”, privilegia a fi de-lidade às características acústicas presentes nos registros sonoros originais. Já o segundo,
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chamado de “telefônico”, enfatiza a clareza dos aspectos semânticos. Como a maioria dos fi lmes está mais próxima do modelo
“telefô-nico” (LASTRA, 2012, p. 248), é natural que
Chion, Aumont e outros teóricos tenham dis-cutido com mais atenção os aspectos semân-ticos da voz. Mas há exceções notáveis, das quais vamos nos ocupar nesta seção.
Uma das exceções foi Siegfried Kracauer, que dedicou parte de sua teoria a descrever maneiras de retirar dos diálogos a ênfase estabelecida pelas convenções narrativas dominantes. Os cineastas podiam desta-car mais a casualidade da fala, permitir aos personagens da fi cção falar sobre assuntos não relacionados à trama e, claro, enfatizar
o conteúdo não semântico (CARREIRO, 2018,
p. 96) – ele menciona o uso do eco em fil-mes de Luis Buñuel, o timbre grave da voz do monarca em Ivan o Terrível (Ivan Groznyy, Sergei Eisenstein, 1944), e o vozerio em
pri-meiro plano nos fi lmes de Jacques Tati (
KRA-CAUER, 1997, p. 109). Kracauer não menciona a respiração diretamente, mas deixa claro que a qualidade não verbal da voz pode até tornar um fi lme menos legível, mas também deixa-o mais afetivo e emocional.
A argumentação do crítico alemão ecoa no clássico texto de Doane (1985), uma das pri-meira tentativas – junto com as teorizações de Chion (2008) sobre sons acusmáticos,
originários de alguma fonte sonora que não aparece em quadro – de enfatizar a impor-tância da conexão afetiva entre voz e corpo. Para Doane (1985), a voz, e em particular suas características não semânticas, dá ao espec-tador consciência do seu próprio corpo, ofere-cendo a ele a oportunidade de experimentar (e não apenas ver/ouvir) o fi lme em sua ple-nitude, inclusive acessando a psicologia dos personagens através desse elemento narrativo invisível: “A voz demonstra o que é inacessível à imagem, o que excede o visível: a ‘vida inte-rior’ do personagem. A voz é aqui a marca pri-vilegiada da interiorização, virando o corpo “às avessas” (p. 466).
Este é um dos argumentos centrais desen-volvidos por Quinlivan (2011), no primeiro estudo específi co sobre o papel da respira-ção nos fi lmes. Tomando emprestado teorias sobre a voz que vêm de outras disciplinas – em particular a ontologia da respiração proposta pela socióloga Luce Irigaray, que afi rma a respiração como um motivo funda-mental para o estabelecimento da noção de interioridade, e mesmo de espiritualidade, do corpo humano –, Quinlivan (2011) avança a ideia de Mary Ann Doane, propondo que a respiração tem papel central na conexão afetiva e sensorial entre corpos de perso-nagens e espectadores, numa dimensão em que filme e espectador – dois corpos, embora de naturezas diferentes, conforme
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proposto por Barker (2009) – se reúnem, gerando a experiência cinematográfi ca. Traduzindo esse raciocínio para os estudos do som, Quinlivan (2011) propõe a respiração como uma espécie de contraparte sonora das
ideias de visualidade háptica (MARKS, 1999),
um modo de ver que enfatiza a textura tátil
das imagens e o cinema cinestésico (
SOBS-CHAK, 2004), que enfatiza uma forma de
experimentar o fi lme com o corpo inteiro. Como elemento capaz de transcender fron-teiras, como o visível e o invisível, o interior e o exterior do corpo, a respiração teria a capaci-dade de “orientar a percepção da experiência
fílmica” (QUINLIVAN, 2011, p. 11), por interpelar
afetivamente o espectador de forma contínua, através da modulação do ritmo da respiração. O ritmo, aliás, constitui um componente par-ticularmente importante para a experiência do horror no cinema, como enfatiza Schaub (2005), ao afi rmar que a mais importante fun-ção antropológica da escuta é a estabilizafun-ção do corpo no espaço, dando-lhe uma orien-tação tridimensional: “o olho busca e rouba, enquanto o ouvido escuta às escondidas aquilo que nos espolia. O ouvido é o órgão do medo” (p. 76).
De certa forma, a pesquisa de Quinlivan (2011) procura discutir, de uma perspectiva mais próxima dos estudos do som, as teorias
propostas por Sobchack (2004) e Marks (1999), ambas intensamente visuais e pouco desenvol-vidas em termos acústicos. Assim, as noções de visualidade háptica e cinestesia seriam complementadas por um modelo de escuta
háptica (QUINLIVAN, 2011), que aproximaria
o ato de ouvir à interioridade de personagens e espectadores. Este elo tornaria a experiência fílmica uma experiência não apenas cognitiva, mas emocional, afetiva e fisiológica. Desse modo, cada vez mais, a teoria contemporânea do cinema reconhece que “o cinema sempre se dirige ao espectador de maneiras
multissenso-riais” (ELSAESSER; HAGENER, 2018, p. 154).
É nesse contexto que Quinlivan (2011) percebe a grande importância do ato de respirar no fi lme de horror. Neste gênero, segundo ela, a respiração dos personagens ganha desta-que generoso na banda sonora pordesta-que arti-cula, através do afeto do horror abundante
e obrigatório ao gênero (CARROLL, 1999), uma
conexão signifi cativamente mais forte, entre espectador e personagem, do que qualquer outro gênero fílmico:
Quando uma pessoa se vê diante de um momento de horror, na vida real ou diante de um filme, o evento (na forma de estímulos audiovisuais) toma dois caminhos através do cérebro, que o neu-rocientista Joseph E. LeDoux chama de “caminho superior” e “caminho inferior” [...]. O primeiro caminho busca uma com-preensão consciente do evento, por meio
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de percepção e avaliação intelectual. O segundo conecta o momento do horror ao corpo físico (através da amígdala – um depósito de medos primais e memórias emocionais), que desencadeia uma des-carga de adrenalina, respiração rápida, pressão arterial e frequência cardíaca ele-vadas. Essa resposta fi siológica põe todo o corpo repentinamente em estado de alerta. (WHITINGTON, 2014, p. 176).
No fi lme de horror, plateia e seres da fi cção fre-quentemente entram em uma espécie de sin-cronia rítmica, na qual ambos experimentam o afeto do horror ao mesmo tempo, através da modulação de cenas em que as duas instân-cias mantêm sincronicamente a “respiração pesada, o silêncio, a repressão e, fi nalmente,
a liberação do grito” (QUINLIVAN, 2011, p. 23).
Esse tipo de modulação narrativa do afeto do horror, de fato, aparece em literalmente cente-nas de fi lmes do gênero, como aponta Carroll (1999, p. 32): “nas obras de horror, as respostas emocionais do público, idealmente, correm paralelas às emoções dos personagens”. Sem esquecer que o grito constitui elemento central para a construção sonora do horror, é importante salientar que Quinlivan (2011) descreve com clareza, na passagem anterior, uma experiência fílmica em que convergem visualidade háptica, cinestesia e escuta háp-tica – ou auralidade hápháp-tica, termo alterna-tivo proposto por Lisa Coulthard (2012), que nos parece mais preciso e adequado ao fenô-meno descrito por Quinlivan (2011, p. 24):
[…] a grande importância da respiração dentro do gênero do horror se relaciona com uma expressão narrativa de natureza mais emocional está relacionada a uma expressividade mais emocional, que pode ser compreendida como uma técnica de realismo emocional amplifi cado.
A questão da sincronia emocional que a respi-ração estabelece entre espectador e persona-gem, através do ritmo, é um elemento crucial para explicar o motivo de tantos fi lmes con-temporâneos estarem aproveitando a faixa dinâmica mais larga oferecida pelos sistemas reprodução digitais para explorar narrativa e cinestesicamente os sons da respiração. Um dos fi lmes de horror mais bem-sucedidos de 2018, Um lugar silencioso, oferece um dos exem-plos mais salientes dessa técnica. O enredo induz à modulação da tensão do fi lme através do silêncio e da respiração dos personagens: estamos em um futuro no qual quase toda a população humana foi dizimada por mons-tros cegos de audição extremamente sofi sti-cada. Os poucos sobreviventes precisam fazer o mínimo possível de ruídos para não serem localizados e mortos pelas criaturas. Por isso, andam descalços, não usam veículos e se comunicam através da linguagem de sinais. Todo o fi lme é pontuado por cenas em que os personagens literalmente prendem a respira-ção quando percebem que há algum monstro por perto, o que faz com que o ato de respi-rar esteja sempre no centro das atenções dos
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personagens (e dos espectadores); ou seja, a respiração funciona, no filme, como elo afetivo fundamental entre os seres da fi cção e a plateia. Além disso, por ser consequência do estado de tensão e medo provocado pelo
afeto do horror (CARROLL, 1999), a respiração
tem uma ligação direta com o grito – como afi rma Quinlivan (2011) em passagem já citada anteriormente, a respiração pesada e a própria suspensão da respiração costumam preceder o grito, o mais importante elemento sonoro do
fi lme de horror (CARREIRO, 2019).
No caso de Um lugar silencioso, a dupla de
sound designers Eric Aadahl e Ethan Van Der
Ryn usa a respiração da personagem como elemento central da modulação do suspense na cena em que a protagonista Evelyn (Emily Blunt), grávida de nove meses e com a mem-brana que envolve o útero já rompida (ou seja, prestes a dar a luz), pisa num prego enferru-jado. Apesar da dor, ela não pode gritar para pedir socorro ou para extravasar o sofrimento, pois isso a levaria (e também o bebê) à morte. A longa sequência em que a mulher se arrasta pela casa e se abriga em uma banheira, com o rosto lavado de lágrimas e um esgar de dor, é dominada acusticamente pela respiração
cadenciada e profunda12.
12 A sequência analisada pode ser vista aqui: https://youtu.be/Ge-rjjwYOsM.
13 Uma das cenas comentadas está aqui: https://youtu.be/76yBTNDB6vU?t=49.
Outro fi lme de horror contemporâneo que coloca a respiração em primeiro plano é O
homem nas trevas. Neste caso, a própria
con-venção narrativa descrita por Quinlivan (2011) e explorada no exemplo anterior está colocada explicitamente no título original do fi lme (em tradução literal, “Não respire”). Na trama, três jovens arrombam a casa de um senhor cego de meia idade (Stephen Lang) para roubá-lo, mas descobrem que o homem possui uma casa cheia de armadilhas e, armado, os per-segue. Em vários momentos, os ladrões e a vítima fi cam frente a frente; nesses momen-tos, os jovens prendem a respiração para não
serem descobertos13. Em outras cenas, eles
revelam sua presença inadvertidamente, por não conseguirem prender a respiração por tempo sufi ciente, desempenhando uma convenção de gênero que Lovatt (2016, p. 169) descreve assim:
[…] no gênero do horror e no [subgênero do] slasher, nos momentos de maior ten-são, (normalmente mulheres) personagens prendem a respiração para evitar serem descobertas pelo assassino: a respiração em si se torna uma marca audível da vul-nerabilidade da vítima, tanto quanto as exa-lações agressivas do matador evocam sua proximidade física e a ameaça iminente que ele representa.
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A mesma convenção pode ser vista na sequên-cia fi nal de [Rec]. Na cena em questão, uma repórter e um cinegrafi sta entram na cober-tura de um prédio de Barcelona, descobrem uma criatura monstruosa no local, e tentam prender a respiração para não serem desco-bertos (mas o ato de respirar os denuncia). A estilística de documentário empregada na fi lmagem reforça ainda mais o paralelo fi sio-lógico entre as emoções dos personagens e do espectador – e a cena, como nos fi lmes
ante-riores, culmina com uma sinfonia de gritos14.
Em Hereditário (2018), o diretor e roteirista Ari Aster usa a respiração de Peter (Alex Wol� f), em primeiro plano sonoro, para assinalar fi siologicamente o peso emocio-nal da tragédia que se abate sobre a família Graham, com a morte da irmã mais nova, num acidente automobilístico provocado pelo personagem masculino. De forma semelhante, em O mal não espera a noite (2019), o mesmo Aster utiliza a respiração cadenciada da atormentada estudante Dani (Florence Pugh) como um acompanhamento quase musical, para modular a desorien-tação e o horror físico que a personagem experimenta, em particular na sequência fi nal, ao ver o ex-namorado ser queimado
14 A sequência analisada está aqui: https://youtu.be/qbqt884tkLs.
15 A entrevista está aqui: https://youtu.be/aPGaPTdno10?t=2814 .
vivo. O diretor dos dois fi lmes confi rmou, em entrevista recente, a intencionalidade do uso da respiração dos personagens como elemento estilístico capaz de gerar tensão
e ansiedade na plateia15.
Considerações fi nais
A respiração, portanto, possui uma função narrativa importante nos fi lmes de horror contemporâneos: o reforço ou estabelecimento de uma empatia sensório-afetiva entre perso-nagem e espectador. Essa empatia é muitas vezes modulada pelo ritmo dessa respiração. Nesse sentido, vale a pena lembrar o que Scha-fer (2001) escreveu sobre a conexão existente entre o ritmo da respiração e o aparelho sen-sório do ser humano – quando estamos nos sentindo bem, respiramos mais lentamente; se algo vai errado, respiramos mais rápido. Schafer (2001) enfatiza a importância da respi-ração no estabelecimento de ritmos e métricas internas nas artes, e diz se surpreender pelo fato de poucos críticos literários terem escrito sobre a importância da respiração (do autor, e também do personagem) no �luxo narrativo. Podemos dizer o mesmo sobre as produções audiovisuais. Talvez por causa do caráter não semântico, ou talvez por ser algo tão delicado
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e banal, a respiração parece não ter ainda chamado apropriadamente a atenção dos pesquisadores para o papel importante que exerce na criação e na modulação dos ritmos que conectam personagens e espectadores. De todo modo, ainda que o papel da respi-ração nos fi lmes ainda seja pouco discutido, não há dúvida de que esse elemento acústico vem ganhando destaque na teoria do cinema nos últimos anos, como reconhecem Elsaesser e Hagener (2018, p. 155).
Elsaesser e Hagener (2018) enfatizam, ainda, a tendência de teóricos contemporâneos – muitos dos quais citados neste artigo, como Shaviro (2015), Barker (2009), Sobchack (2004) e Marks (1999) – a pensar o corpo inteiro como receptáculo afetivo da experiência cinemato-gráfi ca, que envolveria os cinco sentidos, e não apenas a visão e a audição. Essa tendência conceitual é compatível com a proeminência crescente da respiração na banda sonora dos fi lmes, algo percebido por Lovatt (2016, p. 170):
Em momentos-chave do enredo, a ausên-cia de música pode ser combinada com lacunas no diálogo para criar espaço den-tro da ecologia acústica do fi lme, a fi m de permitir momentos de intimidade senso-rial entre o espectador e os seres na tela. Nessas cenas, o som da respiração dos personagens pode ser ouvido alto na mixa-gem, criando a impressão de proximidade espacial e alinhamento afetivo, e dando a impressão de que nós [espectadores] tam-bém estamos envolvidos na ação fílmica.
A partir dos estudos de Quinlivan (2011), Coulthard (2012), Greene (2016), Lovatt (2016) e Costa (2017), é possível seguir os passos de Carroll (1999) e afi rmar que a res-piração constitui, atualmente, um dos ele-mentos estilísticos mais efi cientes na tarefa de convocar o espectador a experimentar o fi lme de perspectivas afetivas (e não ape-nas sonora) similares ou próximas àquelas ocupadas pelos personagens da fi cção. Por-tanto, a respiração proeminente contribui de modo efetivo para que a plateia experi-mente cinestesicaexperi-mente o fi lme, tendo o corpo inteiro afetado pelo conteúdo fi ccional. Em última instância, a respiração materializa uma forma háptica de o espectador res-ponder ao fi lme com o corpo. E se o ato de respirar é importante para o cinema con-temporâneo, podemos reiterar que é ainda mais central para o cinema de horror.
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O HOMEM ELEFANTE (� e elephant man). Direção: David Lynch. Produtora: Brooksfi lms. Estados Unidos/Inglaterra, 1980. 1 DVD (124 min).
O HOMEM NAS TREVAS (Don’t breathe). Direção: Fede Alvarez. Produtora: Ghost House Pictures. Estados Unidos, 2016. Video on demand (Net�lix, 88 min).
O MAL NÃO ESPERA A NOITE (Midsommar). Direção: Ari Aster. Produtora: A24. Estados Unidos, 2019. 1 Blu-Ray (147 min).
O NOME DA MORTE. Direção: Henrique Goldman. Produtora: Globo Filmes. Brasil, 2018. 1 DVD (98 min).
O ÚLTIMO SUSPIRO (Dans la brume). Direção: Daniel Roby. Produtora: Quad Productions. França, 2018. 1 Blu-Ray (89 min).
PSICOSE (Psycho). Direção: Alfred Hitchcock. Produtora: Universal Pictures. Estados Unidos, 1960. 1 Blu-Ray (109 min).
THE TUNNEL. Direção: Carlo Ledesma. Produtora: Distracted Media. Austrália, 2011. Video on Demand (90 min).
UM LUGAR SILENCIOSO (A quiet place). Direção: John Krasinksi. Produtora: Platinum Dunes. Estados Unidos, 2018. 1 Blu-Ray (91 min).
UM TIRO NA NOITE (Blow out). Direção: Brian de Palma. Produtora: Filmways. Estados Unidos, 1981. 1 DVD (108 min).
Informações sobre o artigo
Resultado de projeto de pesquisa: O artigo faz parte do projeto de pesquisa intitulado
“A estética da imperfeição e outras formas do real”, conduzido desde 2018 no PPGCOM da UFPE. Fontes de fi nanciamento: Auxílio fi nanceiro da Pró-Reitoria de Pesquisa (Propesq)
da UFPE, através do edital nº 9/2019 (Produtividade em Pesquisa). Considerações éticas: não se aplica.
Declaração de confl ito de interesses: não se aplica. Apresentação anterior: não se aplica.
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E-compós (Re
vista da Ass
ociação Nacional dos Pr
ogr
amas de P
ós-Gr
aduação em Comunicação), ISSN 1808-2599, v
. 23, jan–dez, publicação contínua, 2020, p. 1–21.
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/doi.or
g/110.30962/ec.1860
Rodrigo Carreiro
Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em
Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco. Professor do Departamento de Comunicação
da Universidade Federal de Pernambuco. Universidade Federal do Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil.
E-mail: rcarreiro@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3087-9557
El papel del aliento en
el cine de terror
Resumen
En las últimas tres décadas, la respiración ha ganado más destaque en el sonido de las películas, especialmente de horror. Impulsados por avances tecnológicos, cineastas, actores y diseñadores de sonido han dado más énfasis al contenido no semántico de la voz. Este artículo analiza los motivos de este fenómeno. Con base en la revisión histórica y conceptual del asunto, tratamos de re�lexionar sobre la construcción del sonido en películas contemporáneas de horror, y sugerir que la tendencia estilística de la respiración prominente en la banda sonora activa un potencial sinestesico de compromiso afectivo entre espectador y personaje, con capacidad de movilizar otros sentidos fi siológicos. Palabras clave
Aliento. Horror. Voz. Diseño de sonido. Cinestesia.
The role of breath in horror fi lm
Abstract
In the last three decades, breathing has gained more prominence in fi lm sound, especially on the horror genre. Driven by technological advances, fi lmmakers, actors and sound designers have placed more emphasis on the non-semantic content of the voice. � is article analyzes the reasons for this phenomenon. Based on historical and conceptual review of the subject, we sought to re�lect on the construction of sound in contemporary horror fi lms, and to suggest that the stylistic tendency of the prominent breathing in the soundtrack activates a synesthetic potential of a�fective engagement between spectator and character, with the ability to mobilize other physiological senses. Keywords