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SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

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SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

LEILA DE LIMA MAGALHÃES

O CAMPO TEM COR?

PRESENÇA/AUSÊNCIA DO NEGRO NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO NO PARÁ

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LEILA DE LIMA MAGALHÃES

O CAMPO TEM COR?

PRESENÇA/AUSÊNCIA DO NEGRO NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO NO PARÁ

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Mestrado Acadêmico em Educação, na linha de pesquisa: Currículo e Formação de Professores, do Instituto de Ciências da Educação da Universidade Federal do Pará – ICED/UFPA, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação.

Orientador: Dr. Salomão Antonio Mufarrej Hage.

BELÉM

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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) –

Biblioteca Profª Elcy Rodrigues Lacerda /Instituto de Ciências da Educação/ UFPA, Belém-PA

Magalhães, Leila de Lima.

O Campo tem cor?: presença/ausência do negro no currículo da educação do campo no Pará; orientador, Prof. Dr. Salomão Antônio Mufarrej Hage. – 2009.

Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal do Pará, Instituto de Ciências da Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação, Belém, 2009.

1. Educação rural – Currículos - Pará. 2. Relações raciais. 3. Currículos - Pará. I. Título.

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LEILA DE LIMA MAGALHÃES

O CAMPO TEM COR?

PRESENÇA/AUSÊNCIA DO NEGRO NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO NO PARÁ

Dissertação submetida à avaliação, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação.

Aprovado: _________________________ Belém, ____de _________________2009.

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________ Prof. Dr. Salomão Antonio Mufarrej Hage

Orientador: ICED/UFPA

__________________________________________ Prof. Dr. Kabengele Munanga

Membro: USP/SP

__________________________________________ Profª. Dr. Marilú Campelo

Membro: IFCH/UFPA

__________________________________________ Profª. Dr. Ivany Pinto

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A Deus, meu fiel amigo e companheiro. A minha estimada e amada mãe Odinéia. A minha filha Ana Rebeca, meu eterno tesouro. Companheira incansável nesta produção.

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AGRADECIMENTOS

Comparo a produção de um texto dissertativo semelhante a uma viagem que os atores entram em um barco e todos ocupam papéis estratégicos na condução da navegação. Entretanto, durante o percurso da viagem muitos fatos ocorrem, outras pessoas vão embarcando, outras vão desembarcando. Mas, o barco continua sua viagem com objetivo de atracar no porto. Porto este que significa o trabalho final.

O que seria da produção científica se não fossem as diversas forças humanas que se envolveram na condução desse barco? Agora é o momento de agradecer a alguns, dos muitos personagens que se fizeram presente, trazendo vários raios de luz e força para a produção deste texto dissertativo. Por isso agradeço imensamente:

A minha filha guerreira, Ana Rebeca, família que formei. Negra menina, com sonhos e força de gigante. Eternamente, o presente mais precioso que Deus me deu.

Aos meus pais Odinéia Magalhães, João Francisco, Hélio Hagapito e irmã Leiliane Magalhães. Registro minha gratidão ao companheirismo de vocês.

Carinho e respeito ao meu orientador, Profº. Dr. Salomão Mufarrej Hage, que me ajudou a olhar para o meio rural na perspectiva acadêmica e nunca deixou de perceber a importância deste trabalho científico. Agradeço pela acolhida e sensibilidade que demonstrou em nossos encontros de orientação.

A Profª Dr. Zélia Amador de Deus, amiga e conselheira essencial nos diálogos de construção deste estudo. Obrigada a vocês pelas interações compartilhadas entre encontros, telefonemas, e-mails durante o processo de construção que este estudo exigiu.

Calorosamente agradeço a minha Banca Examinadora. Suas contribuições enriqueceram de maneira ímpar este trabalho. Ao Profº. Dr. Kabengele Munanga, pelos aconselhamentos, paciência e sabedoria de contribuir no fortalecimento de meus passos como militante negra intelectual. A Profª. Dra. Marilú Campelo por me acompanhar desde a qualificação. A Profª. Dra. Ivany Pinto por interagir com a primeira leitura do então projeto desta dissertação.

Meus sinceros agradecimentos aos Professores (as) do ICEd e aos ministrantes das Disciplinas que cursei durante o Mestrado: Olgaíses Maués, Ronaldo Lima, Sônia Araújo, Josenilda Maués, Wilma Baía, Paulo Almeida, Salomão Hage, Ivany Pinto, Laura Alves.

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A Secretária da Pós-Graduação do ICED, especialmente a Conceição Mendes, minha querida Conceiçãozinha, obrigada pela sua enorme grandeza, incentivo e dedicação, sentirei falta do seu abraço acolhedor. A Alice e Mayara pela sensibilidade em atender-me a qualquer momento que solicitei vossa colaboração.

Aos colegas do Mestrado de 2007, por proporcionar leveza a esta jornada a esta jornada titulada “Mestrado”, em especial, a colegas da linha de currículo: Ana Paula Vieira; Sheila Abbud; Jorge Eiró; Adalcilena; Danielle Vasco; Raquel Amorim. Obrigada pela amizade e companheirismo, também estendido a minha filha Ana Rebeca “a nossa mais nova mestranda.”

Ao Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação do Campo na Amazônia – GEPERUAZ/ UFPA, pela receptividade e acolhimento nesta produção.

Ao Centro de Estudo em Defesa do Negro no Pará pelo apoio nas primeiras leituras sistemáticas das relações étnico-raciais. Ao Núcleo de Estudo e Pesquisa Formação de Professores em relações étnico-raciais – GERA/ UFPA.

Aos organizadores do Fórum Paraense de Educação do Campo por se prontificaram em conceder documentos e entrevistas. Sem esse apoio seria impossível a produção deste estudo.

A Zélia Amador de Deus – “Zelinha” –, as palavras me fogem, as lágrimas descem. Você se eternizou no meu coração como a guerreira negra que me libertou, me acompanhou e cuidou. Luz e aplauso eterno a minha eterna mãe, se assim me permite referi.

Ao “seu” Anselmo, que com suas brincadeiras me fazia rir quando estava aflita. Muito obrigada pelos vários incentivos para continuar meus estudos e terminar este trabalho.

A Nilma Bentes, – “a Estamira” –, obrigada por ser quem és, militante atuante, com um coração negro gigante em defesa da causa negra.

Obrigada a população negra, especialmente, aos sujeitos negros do campo que, com força e coragem, continuam a fortalecer o Movimento Negro no Pará.

Aos amigos que conheci ao longo de minha vida. Que os caminhos que proporcionaram nosso encontro, permaneçam fortalecendo a nossa amizade.

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Ao Dr. José Willians e a Dra. Ana Cristina pelo apoio imprescindível e o encorajamento para lidar com as adversidades.

Ao projeto “Escola acreditar”. Raio de luz e esperança na reorientação da caminhada de muitas mães e crianças com deficiência. Serei eternamente grata a todos, especialmente, a Dra. Madacilina Teixeira e Madalena. Aplausos a família Acreditar.

Ao casal Liliane, Helder e a tia Célia, “A Célia Maria”, por estarem sempre prontos para cuidar de Ana Rebeca. Sem o apoio de vocês para cuidar de minha filha, eu não teria o tempo para me dedicar a produção deste texto.

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“Quando vou a algumas lojas, no shopping, no supermercado, o olhar do gerente, do vigia, estar sempre te vigiando, apesar de todo o sistema de segurança que tem instalado, mas vão estar sempre de olho em ti, nunca olha da mesma forma como vão olhar pra o outro de uma pele mais clara. Eu participei dos encontros em Santarém há uns 10 anos atrás, fui convidado por um quilombola da comunidade Saracura, uma comunidade bem em frente mesmo a Santarém na várzea, foram três dias de encontro que serviu muito pra mudar a minha visão em respeito a isso. Apesar de ser negro, mas, eu não me considerava, não me considerava próximo disso, apesar de ser negro, não me considerava parte desta população, os choques em algumas reuniões, os choques dentro das lojas, os choques na convivência que foi me fazendo entender, toda essa questão, todo esse traço cultural”.

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RESUMO

O tema principal desta dissertação é investigar sobre a presença/ ausência do negro no currículo da Educação do Campo no âmbito do Fórum Paraense de Educação do Campo, expressão do Movimento Paraense por uma Educação do campo. Como ponto de partida, a autora realizou um estudo exploratório nas ações do Fórum e, por meio de documentos e entrevistas, buscou identificar em que medida as relações étnico-raciais, a partir da Lei 10639/03, estão incluídas na proposta educativa e curricular do Fórum. Ao mesmo tempo, buscou um diálogo com a literatura que trata da Educação do Campo como área específica e com a literatura das Relações Étnico-raciais. Para isso, utilizou o referencial metodológico qualitativo como forma de análise e propõe estratégias para dinamizar as relações étnico-raciais na educação do campo no Pará.

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ABSTRACT

The main focus of this paper is to investigate about the presence/absence of the Negro in the syllabus of Education in the Countryside on the scope of the Forum Paraense of Education in the Countryside, an expression of Paraense Movement for an Education in the Countryside. As a starting point, the writer performed an exploratory study over the actions taken by the Forum and, through documents and interviews, aimed at identifying to what extent the ethnic-racial relations, from Act 10639/03 on, are included in the educational and curricular proposal of the Forum. Together with that, she sought to make a dialog with the literature which deals with Education in the Countryside as a specific field, and with the Ethnic-racial Relations. For that, she used the qualitative methodology reference as a means of analysis and propose strategies to dynamize the ethnic-racial relations in the education in the countryside on the State of Para.

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LISTA DE SIGLAS

ANPED Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação ARCAFAR Associação Regional das Casas Familiares Rurais do Pará

ANPUEC Articulação Nacional por uma Educação do Campo CECAM Coordenação de Educação do Campo

CECAF Coordenação Geral de Educação do Campo das águas e das Florestas CEDENPA Centro de Estudo em Defesa do Negro do Pará

CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil CNE Conselho Nacional de Educação

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CPC da UNE Os Centros Populares de Cultura da União Nacional dos Estudantes COPIR Coordenadoria de Promoção da Igualdade Racial

DATALUTA Banco de Dados de Luta pela Terra

DEDIC Diretoria de Educação para Diversidade, Inclusão e Cidadania DOU Diário Oficial da União

EAFC Encontro Estadual na Escola Agrotécnica Federal de Castanhal EJA Educação de Jovens Adultos

EMATER Empresa de Assistência Técnica Rural do Estado

ENERA Encontro Nacional de Educadoras e Educadores da Reforma Agrária FAOR Fórum da Amazônia Oriental

FETAGRI Federação dos Trabalhadores da Agricultura

FETRAF Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar FNB Frente Negra Brasileira

FPEC Fórum Paraense de Educação do Campo

FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação

FVPP Fundação Viver Produzir e Preservar

GEPERUAZ Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação do Campo na Amazônia GPT Grupo Permanente de Trabalho de Educação do Campo

GT Grupo de Trabalho

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICED Instituto de Ciências da Educação

IDH Índice de Desenvolvimento Humano IES Instituições de Ensino Superior

IFPA Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

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MCP Movimentos de Cultura Popular

MALUNGU Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Pará MDA Ministério de Desenvolvimento Agrário

MEB Movimento de Educação de Base MEC Ministério da Educação

MPEG Museu Paraense Emílio Goeldi

MPPUEC Movimento Paraense por uma Educação do Campo MPUEC Movimento Por Uma Educação do Campo

MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra MTE Ministério do Trabalho e Emprego

NEP Núcleo de Estudo em Educação Popular Paulo Freire

NERA Núcleo de Estudos e Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária PDE Plano de Desenvolvimento da Educação

PJR Pastoral da Juventude Rural PNE Plano Nacional de Educação

PNUD Programa Nacional das Nações Unidas para o Desenvolvimento P.P.P Projeto Político Pedagógico

PROCAMPO Programa de Vivência Estudantil Camponesa

PRONERA Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária

SECAD Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade SEDUC Secretaria de Estado de Educação

SEIR Secretaria de Estado de Integração Regional SINTEPP Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Pará TEN Teatro Experimental do Negro

UEPA Universidade Estadual do Pará UFPA Universidade Federal do Pará

UFRA Universidade Federal Rural da Amazônia UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFS Universidade Federal de Sergipe

ULTAB União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil UNAMA Universidade da Amazônia

UnB Universidade de Brasília

UNDIME União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação

UNESCO Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura UNESP Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho

UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 14

1 TRANÇADO METODOLÓGICO: (des) amarrando o Encontro do Movimento Negro e da Educação do Campo na Amazônia Paraense... 23 2 O NEGRO NO MOVIMENTO PARAENSE POR UMA EDUCAÇÃO DO CAMPO... 45

2.1 EDUCAÇÃO RURAL VERSUS EDUCAÇÃO DO CAMPO: novos olhares sobre a educação escolar do meio rural... 45

2.2 MARCOS HISTÓRICOS DO MOVIMENTO PARAENSE POR UMA EDUCAÇÃO DO CAMPO: incluindo a educação do campo na agenda da política pública... 58

2.3 A LUTA DO MOVIMENTO NEGRO POR UMA REEDUCAÇÃO DA RELAÇÃO ÉTNICO-RACIAIS... 68

3 RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NA EDUCAÇÃO DO CAMPO: afirmando a [in] visibilidade da população negra... ... 3.1 EIXO 1 – [IN] VISIBILIDADE DO NEGRO NO CURRICULO DA 79 EDUCAÇÃO DO CAMPO PARAENSE... 80

90 3.1.1 Estratégias para dinamizar a inclusão da lei 10.639/03 no fórum paraense de educação do campo... 105

3.1.1.1 Formação de professores... 105

3.1.1.2 Reorientação curricular... 108

3.1.1.3 Ação do movimento negro e da educação do campo paraense... 114

CONSIDERAÇÕES FINAIS... 120

REFERÊNCIAS... 123

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INTRODUÇÃO

O objetivo central deste estudo dissertativo é identificar as propostas de inclusão das relações étnico-raciais, existentes no âmbito do Movimento Paraense Por Uma Educação do Campo (MPPUEC), investigando como as orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana para efetivar a Lei n. 10.639/03 estão sendo incluídas nas propostas do Fórum Paraense de Educação do Campo (FPEC), expressão mais significativa de mobilização do MPPUEC (HAGE, 2009).

O FPEC tem fortalecido a Articulação Nacional Por Uma Educação do Campo (ANPUEC). Esta que, desde 1990, vem se mobilizando para incluir o território do campo e seus sujeitos, como prioridade na agenda da política pública nacional da educação brasileira. Para isso, a ANPUEC tem como um de seus objetivos a construção de uma sociedade justa, democrática, igualitária, comprometida em afirmar os seres humanos como sujeitos de direito. O FPEC aglutina movimentos sociais, universidades, órgãos governamentais ligados ao desenvolvimento e a educação do campo. Com o objetivo de defender, elaborar e implementar políticas públicas e experiências educativas para os cidadãos paraenses, preferencialmente, para população do campo, entendida como: “[...] agricultores/as familiares, indígenas, quilombolas, ribeirinhos, pescadores, extrativista” (CARTA DE BELÉM, 2005, p. 9). Isso se contrapõe, assim, ao modelo de desenvolvimento e educação rural que ao invés de valorizar a diversidade do campo e de seus sujeitos, nega, silencia e exclui na formação escolar os saberes da população do campo

Além desse modelo escolar excludente, existe o desafio originado da relação conflituoso de apropriação do meio rural, que se reflete na falta de prioridade dos sujeitos do campo nas políticas públicas. Nesse sentido, o MPPUEC, objetivando consolidar a educação do campo, tem enfrentado vários desafios que têm origem na forma como a relação campo/cidade foi historicamente construída.

O Pará, ao estar situado geograficamente na Região Norte1 do Brasil, ocupa um lugar estratégico na política de desenvolvimento sustentável do mundo. Por isso, vem concentrando muitos conflitos na luta pela posse da terra. Cabe mencionar que no meio rural está concentrada a maior reserva bio-sócio-florestal: a floresta Amazônica. A Amazônia é mundialmente conhecida pela sua exuberância que, em muitos aspectos, ainda está

1 A Região norte é formada por sete Estados: Acre (AC), Amapá (AP), Pará (PA), Rondônia (RO), Roraima

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inexplorada pela ação humana, especialmente nos aspectos social, econômico, cultural, biológico e hídrico.

O Estado também é o segundo maior da Região Norte, com 1, 25 milhão de Km², sendo que 73% dessa área são cobertas por florestas. Embora seja um grande exportador de matéria prima, como: energia, madeira, alumínio, que gera uma devastação incalculável, enfrenta um dos maiores desafios, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)2 é baixo – 0,727, considerando a média nacional – 0,830.

Na atualidade, o Pará é dividido em 12 regiões de integração: Baixo Amazonas, Tapajós, Xingu, Araguaia, Carajás, Lago Tucuruí, Rio Capim, Tocantins, Rio Caetés, Marajó, Guamá, Metrópole Belém. Tem como capital a cidade de Belém, conhecida popularmente como “Cidade das Mangueiras3”. É composto por 143 municípios e possui uma população

estimada em 7.065.573 de habitantes. Cabe ressaltar que dos 143 municípios, 86 ou 60,5% dos municípios apresentam um IDH igual aos países mais pobre do continente africano.

Fig. 1- Mapa do Pará dividido por Região de Integração.

Fonte: Secretaria de Estado de Integração Regional (SEIR)/ GeoPARÁ, 2008.

O meio rural paraense tem se caracterizado pela existência de dois projetos de desenvolvimento. O primeiro, originado das elites dominantes que têm instalado nesse lugar o

2 Combinação de indicadores de renda, expectativa de vida e escolaridade, medida pelo Programa Nacional das

Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD. In: NINNI, Karina; ROGGE, Jan; OLIVEIRA, Paulo de Tarso. O Pará no contexto da Amazônia e do Brasil. Observatório da Cidadania 2. Políticas Públicas e Social. Belém: Fórum da Amazônia Oriental – FAOR, 2003.

3Belém ficou conhecida nacional e internacionalmente como “Cidade das Mangueiras”, pelo fato que no centro

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agronegócio e as grandes empresas capitalistas, visando exclusivamente à lucratividade de um pequeno grupo de pessoas ligadas a essa elite, causando uma grande devastação ambiental e social com efeitos ainda incalculável para a sobrevivência da humanidade. Este projeto desestrutura, também, o modo de vida e sobrevivência da maioria da população do campo, o que gera grandes bolsões de miséria, pobreza e exclusão social.

De outro lado, existe o projeto formado pela articulação e mobilização de pessoas, estas ligadas ao FPEC que, em sua maioria, são reconhecidos como sujeitos do campo, composto de pequenos agricultores rurais, camponeses, extrativistas, ribeirinhos, pescadores, indígena, quilombola que têm o território do campo como construção de sua subjetividade e sobrevivência familiar.

Esses sujeitos, ao seu modo, se organizam por meio de várias associações, entidades, com intuito de garantir por meio da educação novos processos sócio-culturais que se contraponha ao projeto da elite para o meio rural. É em sintonia com esse segundo projeto que a ANPUEC e o MPPUEC vêm afirmando e valorizando os conhecimentos, a cultura, enfim, o modo de existência do campo e de sua população (CORRÊA, 2005; CALDART, 2004).

As elites brasileiras, que detêm o poder e o comando dos órgãos estratégicos que legitimam as políticas públicas, construíram no imaginário social, por meio da educação e do currículo escolar, inclusive, que o meio rural é o lugar do atraso, escolarização desqualificada, de pessoas inferiores. Considero que esta maneira de pensar o campo também está ligada às ideologias raciais que objetivaram negar a participação do Negro africano e afro-brasileiro que fizeram do campo um dos lugares para se contrapor a exclusão e a negação socioeconômica e racial, advinda do sistema escravocrata.

Seguindo a linha desse raciocínio, uma das razões para não priorizar nas políticas públicas os sujeitos do campo, deve-se ao fato de que no meio rural os ex-escravos contribuíram para a organização e o fortalecimento da agricultura familiar. O trabalho ligado à agricultura familiar influencia, ainda, hoje, no modo de sobrevivência da maioria da população do campo. Assim, na visão da elite brasileira, a escolarização com qualidade para esses sujeitos seria desnecessária, uma vez que esses indivíduos desenvolvem um trabalho primitivo e não lucrativo aos moldes do capital.

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[...] Apresenta um índice de analfabetismo absoluto, para pessoas de 15 anos ou mais de idade, da ordem de 11,5% , que supera a média nacional que de 11%. Ao se verificar o analfabetismo funcional, esse percentual sobe drasticamente para 27,1% , novamente superando a média nacional que é de 23,5%. Quando observadas essas duas categorias nos espaços urbano e rural da região Norte, verifica-se, respectivamente: analfabetismo absoluto 8,9% e 29%; analfabetismo funcional 21,9% e 43,7%. (p.16).

Conforme a análise apresentada por Corrêa (2007), quanto ao oferecimento do Ensino Fundamental é garantida a educação escolar no campo, na maioria das vezes, precariamente, caracterizando-se a ofertar apenas as quatro primeiras séries desse nível de escolaridade em escolas multisseriadas. No que se refere ao tempo de estudo dos indivíduos que moram no meio rural é de 4,4% e, do espaço urbano é de 7,1%. Enquanto que a média nacional é de 7,1%.

Como forma de se contrapor a esse cenário, o FPEC tem como princípio a recuperação e a valorização dos conhecimentos dos sujeitos do campo. Para tanto, se compromete em reivindicar uma educação escolar que possibilite a afirmação da diversidade do território do campo e de sua população (CARTA DE BELÉM, 2005).

O FPEC reivindica uma educação escolar do campo que compreenda que a maioria da população deste território teve sua história marcada pelo silenciamento e negação de seus saberes no cotidiano escolar (SANTOMÉ, 1995), preferencialmente, no currículo selecionado para compor o processo de ensino-aprendizagem.

Nesse aspecto, a educação do campo como instrumento para afirmar os sujeitos negros do campo deve se comprometer em reivindicar a reeducação para as relações étnico-raciais, como forma de combater o racismo e a discriminação racial, que excluem a população negra de ser reconhecida como sujeitos de direito. Cabe ressaltar, que a arquitetura ideológica do racismo causou a invisibilidade no currículo da educação escolar brasileira, seja do meio rural seja do espaço urbano, dos saberes oriundos da herança africana e afrobrasileira.

A promulgação da Lei n. 10.639/03, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9394/ 96 (LDB), tornou obrigatória a reeducação para as relações étnico-raciais, pois, a inclusão da “[...] História e Cultura Afro-brasileira e Africana no currículo da educação escolar, automaticamente, passa ser responsabilidade do sistema educacional brasileiro o compromisso com a reeducação das relações étnico–raciais” (GOMES, 2008, p.81).

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étnico-raciais, inclusive por meio da educação escolar. Nesse aspecto, não há como desmerecer o papel atuante do Movimento Negro, para que as ações afirmativas se constituíssem, hoje, responsabilidade do Estado. Assim:

[...] a militância e os intelectuais negros descobriram que a escola também tem responsabilidade na perpetuação das desigualdades raciais. O sistema de ensino brasileiro pregou, e ainda prega uma educação formal de embranquecimento. (SANTOS, 2005, p. 22).

A implementação da Lei nos diferentes projetos educacionais, construídos pelos grupos sociais que integram a sociedade, possibilitará a todos - independente de seu pertencimento racial - conhecimentos históricos e culturais que foram silenciados pelo projeto de educação eurocêntrica e hegemônica construído pela elite dominante branca. Projeto este que teve o intuito de negar a negritude brasileira.

Portanto, a efetivação da Lei possibilitará não apenas ao negro brasileiro o orgulho de seu pertencimento racial e de sua ancestralidade, com também servirá de ferramenta para libertá-lo do estigma de inferioridade racial. Em contrapartida, colocará em xeque o estigma da superioridade do branco, contribuindo para abrir um processo de reconstrução da identidade ético-racial do país.

O desafio de trazer à cena, por meio desta pesquisa, alguns aspectos ainda pouco inexplorado pelo conhecimento acadêmico sobre a população negra do meio rural do Pará, é de fundamental importância para o atendimento de uma das reivindicações históricas advindas do Movimento Negro, expressa na Lei n. 10.639/03. A Lei, se posta em prática na educação escolar do campo, irá produzir novos referenciais educacionais curriculares para uma educação antirracista.

É necessário compreender que o currículo serve também como mecanismo ideológico de dominação e determina as identidades dos seres humanos que integram os diferentes grupos sociais da sociedade. Portanto, o currículo tem intencionalidade. Para Silva (2002, p.46), “[...] O conhecimento corporificado no currículo é um conhecimento particular. A seleção que constitui o currículo é o resultado de um processo que reflete os interesses particulares das classes e grupos dominantes”.

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(2001, p.152), a “[...] raça assume grande poder justamente quando é ocultada por não problematizar as razões que fazem com que o racismo e a discriminação racial se perpetuem, mascarando o lugar de exclusão que a população negra ocupa na sociedade brasileira”.

Compreendo o currículo como instrumento formador de mentalidades e subjetividades. Por isso, nesta linha, a seleção dos conteúdos que irão compor o processo de ensino-aprendizagem da educação escolar do campo deve estar na direção de incluir conhecimentos que nunca fizeram parte da política do conhecimento oficial. E, o FPEC, composto por inúmeros movimentos sociais, inclusive pelo Movimento Negro, não deve estar à margem de reivindicar o cumprimento da Lei na educação paraense.

Uma das entidades do Movimento Negro que integra o FPEC é o Centro de Estudos em Defesa do Negro no Pará (CEDENPA). O CEDENPA tem como um de seus princípios que, o negro para „se tornar negro‟ precisa se reconhecer e assumir sua identidade. Identidade, aqui, entendida, conforme o dizer de Munanga (2006, p.119), [...] “como um processo sempre negociado e renegociado, de acordo com os critérios ideológico-políticos e as relações de poder”.

A identidade negra, nessa perspectiva, deve ser entendida na relação do sujeito negro com outros grupos sociais. Pois, é a partir dessa relação, que o pertencimento racial do negro com o outro não-negro ganhará o lugar de afirmação ou de negação. Gomes (2005, p.45) adverte que “[...] a naturalização da discriminação racial tão costumeiramente aceitável no espaço escolar tem legitimado o ideal de embranquecimento da população negra”. Esse embranquecimento tem sido a principal estratégia de fortalecimento do racismo. Pois, no contato com essas ideias, sistematizadas pela escola, o negro é ensinado a pensar e agir conforme o ideal branco.

Nesse momento, convém explicitar a maneira como ocorreu o meu contato e participação no Movimento Negro. Em 2004, minha filha de quatro anos de idade foi vítima de discriminação racial no ambiente escolar, numa turma do maternal de uma escola-creche. A situação de discriminação racial sofrida por ela foi manifestada pela violência física e verbal e veio da parte de uma criança de sua turma. Para mim, era evidente que a atitude de violência fora motivada pelo seu pertencimento racial. Ao chegar à escola-creche, perguntei à professora sobre o tratamento dado por ela à questão. A professora, com uma atitude de aparente normalidade, pormenorizou o fato, argumentando que era comum esse tipo de violência entre as crianças.

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tão pequena pode ter tanto preconceito racial? Segundo Fazzi (2006, p.218), “[...] são nas interações que as crianças aprendem o significado social de raça, assim como as diversas formas de manipulação e disputa para não se reconhecer igual ao outro considerado diferente”.

A criança que ofendeu minha filha, chamando-a de “pretinha feia”, decerto, já havia assimilado as formas consideradas negativas do imaginário social coletivo, em relação à raça negra. E minha filha? Como terá se sentido frente a tal humilhação? O que deveria estar passando por sua cabeça? Aqui, ainda é Fazzi (2006) quem me auxilia a compreender essa situação. No caso da criança negra, há um verdadeiro drama devido ao seu pertencimento racial, pois existe a negatividade associada à categoria preto/negro, que expõe as crianças

nela classificadas a um permanente ritual de inferiorização, em que são especialmente atingidas por gozações e xingamentos. Na maioria das vezes, automaticamente a criança branca usa de xingamento e estereótipo para não ser igual e nem semelhante ao ser considerado diferente e inferior.

Assim, com base nessa experiência pessoal procurei o CEDENPA para responder algumas de minhas indagações, buscando entender preferencialmente, de que forma o Movimento Negro agia em casos correlatos ao meu. No CEDENPA me deparei com a Lei n. 10.639/03, que trata sobre a inclusão “[...] no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira e Africana” 4. A partir disso, a

política curricular de formação de professor para o tratamento das relações raciais no ambiente escolar, torna-se meu objeto de investigação.

O processo de violação, impingido à população negra, nega a possibilidade do negro aprender a gostar de ser negro, ele passa a se ver descaracterizado de suas raízes culturais aceitando a ideia de que, a sua história e a de seus ancestrais começa e termina com a escravidão. Não percebe, na maioria das vezes, que é vítima do emaranhado ideológico de negação da identidade negra. Isto tem servido de suporte aos desenhos curriculares efetivados nas escolas, que obriga o aluno negro a aprender por meio dos códigos da cultura hegemônica branca.

Desse modo, para que a educação do campo afirme a população negra, um dos primeiros desafios é problematizar sobre algumas questões no que se refere ao perfil das relações étnico-raciais que na própria população do campo, defendida pelo FPEC, aparta os negros dos não-negros. É necessário enfrentar que as raízes históricas de exploração e

4 (DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES

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desvalorização dos sujeitos do campo, apesar das semelhanças, comportam diferenças. Diferenças que, muitas vezes, por haverem sido hierarquizadas desigualam a população do campo em negros e não-negros.

Portanto, devido à recriação e reatroalimentação do racismo, a diversidade do campo e de seus sujeitos tem cor/ raça, que os fazem iguais e diferentes, pois, ao serem homens, mulheres, negros, índios, deficientes, crianças ocupam lugares diferentes. Lugares de exclusão de direitos numa sociedade racial e socialmente hierarquizada.

Do ponto de vista metodológico, esta dissertação compreende a seguinte composição: no primeiro momento, foi realizado um estudo exploratório nas ações articuladas pelo FPEC. Em seguida, foi coletado alguns documentos finais originados dos Seminários Estaduais de Educação do Campo e do Projeto Político Pedagógico (P.P.P) do Programa Saberes da Terra da Amazônia Paraense. Por fim, a realização de entrevista semi-estruturada com alguns representantes das entidades que integram o FPEC.

Os Seminários Estaduais de Educação do Campo têm se caracterizado como eventos estratégicos para agregar os participantes do Movimento Por Uma Educação do Campo (MPUEC) nacional e local. E, os documentos gerados desses eventos têm sido orientadores para as reivindicações do FPEC e também apontam orientações para o MPPUEC consolidar a educação do campo no Pará.

O P.P.P do Programa Saberes da Terra foi organizado em colaboração e co-gestão com dos parceiros do FPEC, contou com a participação expressiva do MPPUEC. O Saberes,

assim ficou vulgarmente conhecido, se constitui como uma ação educativa que tem a finalidade de materializar os objetivos, princípios e finalidades do FPEC e da educação do campo no Pará.

Assim, tomando por base as reflexões anteriores, a primeira sessão deste estudo dissertativo trata do Trançado Metodológico, que significou a primeira fase desta pesquisa a qual se materializou por meio de um estudo exploratório realizado nas ações desenvolvidas no âmbito do FPEC para definir o problema de pesquisa e conhecer o MPPUEC.

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delimitada ao quilombo. Por último, enfoco o Movimento Negro e a sua trajetória por uma educação antirracista tendo como princípio a reeducação para relações étnico-raciais expresso na Lei n. 10.639/03.

Na terceira sessão, elaboro duas hipóteses para a recorrente delimitação da população negra ao quilombo elaborada pelo FPEC: a primeira é de que o FPEC entende o quilombo a partir do significado de lugar de negros fugidos do sistema escravagista. Portanto, negros que lutavam pela posse da terra. A segunda é de que esses negros, ao se fixarem nessa terra, construíram uma organização de trabalho que foi determinante para o reconhecimento do trabalhador rural vinculado à agricultura familiar.

Ainda nesta sessão, destaco nas propostas explicitadas no âmbito no FPEC e do

Programa Saberes da Terra que tratam, especificamente, sobre a população negra que os conceitos cor/raça, diversidade étnico-racial, quilombolas, embora incluídos nas propostas, não conseguem reeducar para as relações étnico-raciais expressas na Lei n. 10.639/03. Isso pode ser determinante para uma presença/ ausência do negro na educação do campo.

Por fim, sem querer pretender esgotar a discussão, mas, ainda condizente com o propósito desta pesquisa, proponho algumas estratégias para encaminhar a inclusão da Lei n. 10.639/03 no âmbito do MPPUEC por meio do FPEC. Para isso, tomei como referência às propostas dos entrevistados; a Resolução n. 1 e o Parecer de 17 de Junho de 2004 e as

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1 TRANÇADO METODOLÓGICO: (des) amarrando o encontro do Movimento Negro e da Educação do Campo da Amazônia Paraense

Por longo tempo, a pesquisa científica orientou-se pela perspectiva de que todos os fenômenos sociais pudessem ser comprovados. Essa forma de produção do conhecimento, construída pela visão positivista, tratava esses fenômenos como objetos estáveis. No decorrer do tempo, essa visão começou a ser questionada pelos novos referenciais da pesquisa qualitativa, que argumentavam que nem todos os fenômenos culturais, emocionais, ideológicos produzidos pelos seres humanos poderiam ser passiveis de mensuração.

A pesquisa qualitativa compreende os fenômenos sociais na dimensão de suas complexidades. Ou seja, tudo que está visível e invisível tem razões possíveis de ser explicado. Porém, nem sempre a quantificação consegue verificar aquilo que está submerso e determinando as relações sociais, raciais e culturais da vida em sociedade (CHIZZOTI, 1991). Ao trazer como protagonista, neste estudo, o Movimento social, a pesquisa qualitativa nos possibilitará entender alguns problemas, oriundos da realidade vivida pelos sujeitos sociais que, no uso de uma pesquisa com enfoque apenas quantitativo, seria impossível compreender as realidades problematizadas na visão desses movimentos. Cabe ressaltar que a realidade é composta de inúmeras interferências, originadas da própria ação humana, que determinam a forma como os indivíduos em sociedade assimilam ou negam, aquela determinada realidade.

Portanto, nesta pesquisa, o Movimento social também é entendido na direção de um movimento dinâmico, na perspectiva de entender-questionar-propor, para o cotidiano das relações sócio-culturais e raciais outras formas de pensar as interações existentes na sociedade. O Movimento Social enfrenta o desafio permanente de se contrapor às dificuldades vividas pelo grupo social por ele representado e tem o papel de questionar a naturalização da realidade. Assim, elabora, propõe, articula e intervém na realidade, objetivando responder aos problemas enfrentados e questionar as relações de poder que determinam tal dificuldade (BENTES, 1993; CARDOSO, 2002; CORREA, 2007).

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Considero que um dos maiores desafios desta pesquisa foi enveredar por dois movimentos sociais que têm peculiaridades em suas ações, em alguns aspectos, no entanto, podem dialogar para ter suas reivindicações materializadas nas políticas públicas de educação do Pará. A relevância deste estudo está em trazer à cena dois importantes movimentos sociais como protagonistas das políticas públicas: Movimento Negro e MPPUEC. Esses protagonistas exercem um papel de reivindicar e propor ao Estado, novos paradigmas para materializar as demandas dos segmentos sociais por eles representados.

A partir do princípio de que as relações sociais e raciais nem sempre poderão ser analisadas somente pela pesquisa com princípios quantitativos, pois, se assim proceder à análise poderá não considerar aquilo que porventura possa estar submerso, determinando as atitudes dos indivíduos nessas relações; por outro lado, as contribuições dos estudos estatísticos sobre a população negra, sempre que necessário, emergirão no decorrer deste trabalho, como forma de possibilitar um melhor entendimento das razões que legitimaram as políticas de ações afirmativas curriculares, como estratégia para diminuir as desigualdades sociais e raciais que têm discriminado a população negra do campo e da cidade.

Segundo Nogueira (1985), as relações raciais, que se materializam na sociedade, precisam ser entendidas sob interferências das construções ideológicas do racismo. Na mesma linha, Maués (1987) afirma que para entender o discurso do negro sobre as relações étnico-raciais faz-se necessário, primeiramente, compreender o “discurso do branco sobre o negro”. Portanto, essas dimensões ideológicas, se não problematizadas, podem determinar a naturalização da exclusão do lugar do negro na sociedade e, principalmente, entender as lutas do Movimento Negro como individualizadas sem que faça parte de um todo social. Consequentemente, o FPEC, como expressão do MPPUEC, não pode fugir desse contexto.

Como estratégia para combater a política curricular de embranquecimento dominante na educação brasileira, a Lei n. 10.639/03, fruto das reivindicações históricas do Movimento Negro, busca promover um processo de reeducação das relações étnico-raciais hegemônicas que desprestigiaram e negaram os saberes culturais e históricos do africano e do negro brasileiro. Conforme expressa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais (2006):

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população negra ao contrário diz respeito a todos os brasileiros, uma vez que devem educar-se enquanto cidadãos atuantes no seio de uma sociedade multirracial e pluriétnica, tornando-se capazes de construir uma nação democrática. (p.239).

A política da educação do campo tem estado a reivindicar um processo educativo para os sujeitos do campo, que seja mediado por relações de trabalho e de cultura própria dos sujeitos. Essa política educacional deve se comprometer com um processo de ensino-aprendizagem com conhecimentos que estejam vinculados aos referenciais teórico-práticos que proporcionem mudanças na condição de exclusão dessa população. Logo, a história e cultura afro-brasileira e africana possibilitarão aos grupos sociais, existentes no campo, um direito que foi negado por longo tempo na educação brasileira.

A educação do campo no Pará materializa suas ações por meio da articulação entre pesquisa, intervenção, docência e militância, e tem como principal reivindicação políticas públicas educacionais e curriculares comprometidas com a construção de novos processos sócio-culturais no campo, em que a escola possa funcionar como a precursora e afirmadora das culturas silenciadas que integram o espaço educativo (SANTOMÉ, 1995; CALDART, 2004).

De acordo com Triviños (1987), a pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como forma de coleta de dados. Por sua vez, o pesquisador deve interagir como observador da realidade investigada para poder levantar possíveis problemas de pesquisa. Optei como uma das fases desta pesquisa pelo estudo exploratório, em algumas ações desenvolvidas no âmbito da articulação realizada pelo FPEC no período de 2007/2008, com objetivo de conhecer o MPPUEC.

[...] Os estudos exploratórios permitem ao investigador aumentar sua expectativa em torno de determinado problema. O pesquisador parte de uma hipótese e aprofunda seu estudo nos limites de uma realidade específica, buscando antecedentes, maior conhecimentos para, em seguida, planejar uma pesquisa descritiva ou do tipo experimental...Um estudo exploratório, por outro lado, pode servir para levantar possíveis problemas de pesquisa. Pensa-se que a realização de um estudo exploratório, por ser aparentemente simples, elimina o cuidadoso tratamento cientifico que todo investigador tem presente nos trabalhos de pesquisa. Este tipo de investigação, por exemplo, não exime a revisão da literatura, as entrevistas, o emprego de questionário etc., tudo dentro de um esquema elaborado com a severidade característica de um trabalho científico. (p.109-110).

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Café pedagógico; I Encontro de Pesquisa em Educação do campo; Oficinas de Formação continuada com professores do campo promovidas pelo Programa EducAmazônia; V oficina pedagógica do Programa Saberes da Terra da Amazônia Paraense; III Seminário Estadual de Educação do Campo.

O GEPERUAZ a convite da Prefeitura Municipal de Portel5 em fevereiro 2007, realizou a Semana Pedagógica com o tema “O Planejamento Curricular para as Escolas do Campo”. O evento contou com aproximadamente 200 professores que desenvolviam suas atividades exclusivamente nas escolas do meio rural.

Fui à Portel na condição de integrante da equipe de profissionais que iriam atuar na formação continuada dos professores. Para realizar a formação, fiz um levantamento bibliográfico sobre a educação do meio rural e, por curiosidade, procurei verificar como as relações étnico-raciais na educação do campo estava incluída naquele contexto educativo. Durante este levantamento, me dei conta do déficit da literatura acadêmica sobre o assunto. Diante dessa constatação, passei a investigar em que medida o MPUEC incluía as relações étnico-raciais em seu projeto de educação.

A Semana Pedagógica do Município de Portel tinha como um de seus objetivos, sensibilizar os professores para valorização do campo como proposta político-pedagógico do processo de ensino-aprendizagem. Nesse evento percebi, quando do debate, com os professores, que para tratar da educação do campo na escola era necessário construir novos olhares, novas formas de refletir sobre o estar no mundo e como a realidade pode vir a ser transformada (CALDART, 2004). Percebi que para tanto, se fazia necessário assumir identidades de pertencimento pessoal, racial e social, ter orgulho dessas identidades e, ao mesmo tempo se autodesafiar no movimento da transformação.

No desenrolar das atividades, houve a participação de vários movimentos sociais, como: Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Pará (SINTEPP), Agricultores, Pescadores, Artistas, entre outros. No entanto, não estava presente no evento nenhuma instituição que representasse o Movimento Negro, nem mesmo os quilombolas. A justificativa pelos organizadores era que os quilombolas não estavam presentes por haverem tido problemas com transporte.

A ausência do Movimento Negro pode ser consequência da falta de tratamento sobre a questão racial na sociedade, inclusive na escola. Essa situação emergiu no decorrer dos

5 O Município de Portel compõe o Arquipélago do Marajó. O GEPERUAZ tem se inserido neste Município a

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debates. Aproveitei a oportunidade para mapear minha pesquisa sobre as relações étnico-raciais na educação do campo. Para isso, fiz algumas perguntas aos professores. Cabe esclarecer que a abordagem feita aos professores era sempre realizada quando eles estavam nas atividades de grupo espalhados por todo o lugar onde ocorria o evento. Dessa forma, tive a possibilidade de interagir com todos os professores que estavam em outras salas sob a orientação de integrantes do GEPERUAZ.

Em conversas informais durante a produção das atividades, perguntei sobre como eles definiam a sua cor/raça. A maioria deles, se autodeclaravam, como: pardos, morenos6. Menos, como negros e negras. Fiquei a fazer conjecturas: por que aqueles professores não se „enxergavam‟ como negros? A resposta que me veio de pronto: o racismo. Decerto os professores não viam negros por causa das diferentes formas de inferioridade produzidas pela Arquitetura ideológica do racismo existente em nossa sociedade. Racismo fortalecido pelo projeto de embranquecimento e pelo mito da democracia racial que são fenômenos que fortalecem a negação da negritude e levam as pessoas a se identificarem com o ideal de brancura, inferiorizando o significado social e cultural da palavra negro/negra.

Arquitetura no dicionário Aurélio (1986, p.68.) é entendida como “[...] arte de criar espaços organizados e animados por meio do agenciamento urbano e da edificação, para abrigar os diferentes tipos de atividades humanas”. Neste trabalho, essa palavra está sendo usada para definir o processo de construção da ideologia racial brasileira, no que se refere à população negra, pois, considero que para cada momento, para cada detalhe das relações raciais e de poder na sociedade, o racismo, mesmo naquele espaço submerso, oculto de interferências externas, se reconstrói e se realimenta na representação social brasileira.

Por isso, faz-se necessário o desmantelamento dessa arquitetura ideológica por referenciais teórico-práticos que incentivem uma educação antirracista, como uma maneira permanente, dinâmica e significativa de combater o racismo. Nessa linha, o termo raça tem, neste estudo, dimensão social e política, pois na sociedade brasileira a invisibilidade do negro, foi construída com a negação de sua cultura e de seu fenótipo.

Consequentemente, a razão para a depreciação dos traços físicos visíveis do negro, nos conduz também a pensar que o corpo negro ao está presente nos grupos sociais que compõe esta sociedade, na maioria das vezes, é tratado como objeto estranho e incômodo (SOUZA, 1983). No que tange o termo raça neste trabalho é entendido como afirma Siss (2003):

6 Em termos regionais, a população branca está mais concentrada no Sul e Sudeste; a população parda no Norte e

Nordeste; e a população „preta‟ no Sudeste e Nordeste, obedecendo, em linhas gerais, aos padrões históricos de

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[...] A categoria raça... é entendida como mecanismo de estratificação social fundamentado na percepção da diversidade fenotípica, como cor da pele e textura de cabelo. A raça se constitui como um mecanismo importante e poderosíssimo na medida em que opera enquanto determinante de distinção social, ou seja, da alocação dos indivíduos na estrutura social. Portanto, as desigualdades sociais são histórica e socialmente produzidas, constituindo-se como resultado de relações de poder assimétricas, social e politicamente construídas. Nessa perspectiva, e categoria raça aqui se distancia de qualquer filiação a determinismos biológicos, ao mesmo tempo em que rompe com reducionismos simplistas de classe, que concebem a raça como um mero hepifenômeno. (p. 21).

Ainda em Portel, durante o debate, entre uma atividade e outra, os professores problematizavam as dificuldades enfrentadas para realizar uma educação de qualidade nas escolas que trabalhavam. Argumentavam que faltava quase tudo para funcionar: infraestrutura, material didático, recursos humanos, formação continuada, recursos financeiros. Enfim, o discurso demonstrava a falta de compromisso do poder público com a garantia de uma educação de qualidade para os sujeitos do campo. No entanto, em nenhum momento, essa ausência era vinculada às desigualdades raciais que, a meu ver, decerto contribuem também para que as escolas e os professores do campo enfrentem um sistema educacional excludente.

No intuito de verificar em que medida as escolas do meio rural do Município de Portel tratavam à questão racial, perguntei aos professores de que forma o currículo escolar contemplava as relações étnico-raciais? Na maioria das „falas‟, por sinal, bastante significativas, os professores sempre referiam que na proximidade de suas comunidades existia uma escola quilombola ou uma comunidade quilombola. Mas, não falavam sobre a inserção da relação étnico-racial no currículo na sua escola, tampouco referiam situações de conflitos ou qualquer outra questão que pudesse marcar a presença do negro no processo de ensino-aprendizagem materializado no cotidiano escolar.

A partir dessa situação, comecei a investigar em que medida a educação do campo paraense incluía a população negra, já que o projeto de educação do campo tem como um de seus princípios “[...] o respeito à diversidade das populações do campo, dos rios e das florestas em suas múltiplas dimensões: ambiental, econômica, política, social, cultural, raça/cor, étnica, gênero e de geração” (CARTA DE BELÉM, 2005, p.9).

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Durante a realização do I Café Pedagógico do Campo, denominado “Dia Internacional da Luta Camponesa: Educação do Campo em Movimento”, ocorrido no dia 16 de abril de 2008, no espaço Ver-o-Rio7, resolvi fazer uma enquete informal. Perguntei aos participantes, especificamente, aos militantes do Movimento dos Sem Terra (MST)8, como eles auto-declaravam sua cor. A maioria das pessoas, respondiam que em sua certidão estava escrito que eles eram pardos, logo, se auto-declaravam como pardos.

Do total de vinte (20) pessoas que responderam, apenas uma (1) se auto-declarou “negra”, cinco (5) como “morenos” e catorze (14) como “pardos”9.Meu objetivo com essa

enquete era verificar se o fato que ocorreu no município de Portel sobre os professores não se verem como negros e sim como pardos e morenos, também se refletia no Movimento social ligado diretamente à luta pela terra.

Outro evento que demarca a história da educação do campo no Pará foi a realização do I Encontro de Pesquisa de Educação do Campo, ocorrido em Belém em maio de 2008. Evento bastante representativo do qual participaram os grupos envolvidos na área de pesquisa de educação do campo em nível Estadual.

Constatei nesse evento que dos 18 grupos de pesquisa que investigavam sobre a educação do campo, cadastrados na plataforma do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico de pesquisa (CNPq), nenhum deles fazia o recorte racial. No que diz respeito aos trabalhos que foram inscritos para Comunicação oral e pôster durante o evento, dos 94 trabalhos inscritos, houve a inscrição de apenas um trabalho sobre a temática racial. O trabalho tratava de um dos aspectos da discussão desta dissertação, que é o pertencimento racial da população do meio rural.

Ainda no I Encontro de Pesquisa de Educação do Campo, esteve presente uma das lideranças da ANPUEC, que vem contribuindo desde início com o FPEC. No final de sua palestra, tive a oportunidade de lhe fazer o seguinte questionamento: como as demandas do Movimento Negro a partir da Lei n. 10.639/03 vêm sendo incluídas nessa articulação? Ela me respondeu da seguinte forma:

7 O espaço Ver o Rio é uma praça pública localizada de frente a Baía do Guajará, principal Rio que banha

Belém, capital do Estado.

8 A escolha naquele momento pelo militante do MST foi devido à representação e luta desse movimento na

Articulação nacional e local do Movimento Por Uma Educação do Campo (MPUEC).

9 Na pesquisa por amostragem organizada pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária

(NERA) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho (UNESP),

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[...] O negro não está sendo expulso de sua terra porque são negros, mas, porque existe uma disputa pela terra advinda do agronegócio e da agricultura familiar. As demandas que vem do movimento negro são importantes, mas, não se constitui como principal motivo para que no campo tenha a disputa por terra que existe hoje. (líder ANPUEC).

Essa resposta veio ao encontro de algumas “falas significativas” que eu já havia escutado em outros debates, palestras, oficina de formação de professores, seminários, encontros, enfim, existe uma forte tendência no âmbito do movimento da educação do campo de fortalecimento da classe social em detrimento da raça. E, se justifica essa valorização, devido ao processo de exclusão social que passaram todos aqueles que o movimento considera como sujeitos do campo. É como se os habitantes do campo se constituíssem num todo homogêneo e diversificado. Nesse sentido, o FPEC para uma das lideranças entrevistada deve ter o sentido de totalidade.

[...] Eu vejo que no fórum e no movimento nacional da educação do campo a centralidade tem sido no campo da agricultura familiar. E isso é um desafio que está posto pra nós da educação do campo, mas, está posto também pro movimento da educação indígena, pro movimento da educação da diversidade étnico-racial, no sentido de nós, nos compreendermos, nos percebemos como uma totalidade. (ABACATAL).

Outra ação do MPPUEC por meio do FPEC está as atividades desenvolvidas pelo “Programa EducAmazônia: construindo ação Inclusiva na Amazônia”. No período de 2007/2008, houve ações educativas nos Municípios de São Domingos do Capim, Acará, Tomé-Açu, Moju, com a finalidade promover a educação do campo com intervenções educacionais que viessem a fortalecer a participação coletiva e as identidades dos sujeitos do campo.

O Programa EducAmazônia começou a ser desenvolvido logo após o II Seminário Estadual de Educação do campo em 2005, tinha como objetivo fortalecer a educação do campo no Pará e considerava a educação como instrumento de transformação e de desenvolvimento social. Para tanto, desenvolvia suas atividades na perspectiva de afirmar a

diversidade amazônica e camponesa e as diferenças geográficas, socioeconômicas e étnicas dos povos da região. O programa, no período de 2005 a 2008, foi gestado e executado de forma compartilhada entre o FPEC e outros parceiros. A partir de 2009, passou a ser coordenado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).

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considerando as diferenças e peculiaridades regionais dos respectivos municípios, havia uma similaridade no comportamento dos professores. A reação se fazia semelhante a que já fora observada em Portel, concernente ao pertencimento racial, ou seja, os professores enxergavam a população negra apenas nos quilombos e se auto-identificavam como pardos/ morenos.

Outra experiência-piloto de suma importância para a educação do campo paraense, foi o “Programa Saberes da Terra da Amazônia Paraense”, que tinha como finalidade escolarizar a juventude agricultora. Este programa tinha como principal objetivo formar jovens agricultores em nível de Educação Fundamental e qualificação profissional e atuava na formação de educadores do campo. Atendeu 760 jovens agricultores, na faixa etária de 15 a 29 anos, na Modalidade da Educação de Jovens Adultos, Ensino Fundamental completo com qualificação social e profissional inicial em agricultura familiar.

O Saberes, em sua execução e gestão, também contou com a colaboração do FPEC e de vários parceiros. O financiamento do programa veio da parte do Ministério da Educação (MEC) e do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Esse programa foi implantado no ano de 2005 em 15 Municípios paraenses: Juruti, Concórdia do Pará, Ipixuna do Pará, Santa Luzia, Paragominas, Viseu, Breves, Portel, São Sebastião da Boa Vista, Igarapé-Miri, Moju, Marabá, Xinguara, Medicilândia e Uruará.

A proposta pedagógica dos Saberes da Terra se fundamenta na metodologia da pedagogia da alternância10 que se orienta pelo currículo integrado11. O currículo integrado do Programa Saberes da Terra tem como tema gerador “Agricultura Familiar e sustentabilidade na Amazônia”. Esse tema gerador, por sua vez, se subdivide nos seguintes eixos temáticos: (1) agricultura familiar; gênero, raça, etnia e identidade cultural; (2) organização social,

10 É uma metodologia desenvolvida pela conjugação de períodos alternados de formação na escola e na família e

pelo uso de instrumentos pedagógicos específicos. Isto é, o tempo escola, corresponde ao período em que os estudantes permanecem efetivamente interno ao espaço da unidade escolar em contato com o saber sistematizado, planejando e recebendo orientações em sua ação pelos/as educadores/as, neste período, os estudantes planejam a execução de projetos experimentais que serão desenvolvidos em suas propriedades. O tempo família, corresponde ao período, em que os estudantes são motivados a partilhar seus conhecimentos e suas experiências em sua família ou local comunitário desenvolvendo seu projeto experimental sob planejamento

e acompanhamento pedagógico dos/as educadores/as. “No Brasil, a alternância é experienciada há mais de trinta

anos, e um resultado positivo que pode ser destacado, é o fato de que a maioria dos ex-alunos têm permanecido

no meio rural, desenvolvendo atividades na agricultura ou noutras áreas”. (BRASIL, SABERES DA TERRA:

Programa Nacional de Educação de Jovens e Adultos integrada com qualificação social e profissional para agricultores (as) familiares. MEC: SECAD. Brasília, outubro de 2005, p.32).

11 O currículo integrado deve envolver dimensões técnico-científica, sócio-política, metodológica e

étnico-cultural, por isso, “[...] para que a formação seja de fato integrada é necessário construir uma ponte entre os saberes da educação geral e os da qualificação social e profissional de modo a garantir a apropriação das tecnologias específicas. A observação dos processos de transformação presentes no campo, das temáticas de gestão e de controle dos processos produtivos, das organizações do trabalho e da organização da produção em

constante diálogo com as áreas de estudo que compõe o ensino fundamental”. (BRASIL, SABERES DA

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políticas públicas e cidadania no campo; (3) Sistemas de produção e processos de trabalho no campo; (4) desenvolvimento sustentável, economia solidária e enfoque territorial. Esse desenho curricular é parte do P.P.P do Programa.

O P.P.P do Programa Saberes da Terra foi eleito para identificar se nele constavam propostas relacionadas à reeducação das relações étnico-raciais com base na Lei 10.639/03, por duas razões: primeiro, pelo fato do Programa se constituir como uma experiência educativa construída e efetivada do inicio ao fim pelo FPEC e na elaboração de seu P.P.P houve uma expressiva participação das pessoas envolvidas no MPPUEC. E, por último, pelo significado do P.P.P, pois, “[...] reflete a realidade da escola, situada em um contexto mais amplo que influencia e que pode ser por ela influenciado. Em suma, é um instrumento clarificador da ação educativa da escola em sua totalidade” ( VEIGA, 1998, p.12).

Em março/2008 participei da V Oficina Pedagógica Saberes. O evento objetivava tratar do planejamento das atividades para 2008. O Coordenador Pedagógico Estadual do programa ao ser indagado sobre como a Lei n. 10.639/03 estava sendo incluída no programa, respondeu: “_ Essa temática ainda não é desenvolvida nas atividades curriculares no programa, apesar da existência desde 2003. Reconhecemos que ainda precisamos caminhar bastante para falar sobre isso, para implementar a lei”.

Durante esse evento, em uma das mesas redondas, estava presente um dos Coordenadores Estadual do MST. Ao ser indagado sobre a questão racial, sua resposta foi contundente: “[...] No MST, nós não tratamos dessa questão diretamente por percebermos que a mesma enfraquece a discussão principal do movimento que é a classe social, pois, discutir sobre direito a terra é pensar não diretamente em raça, mas, em classe [...]”.

As situações presenciadas no Saberes pressupõem que para se efetivar realmente um processo de garantia de direitos para a população negra do meio rural, a questão racial deve ser encarada, pois, enquanto os sujeitos sociais não problematizarem essa questão, o negro sob a rigidez das diversas faces do racismo, estará sempre em desvantagens, devido à reprodução das desigualdades sociais e raciais, cabe ressaltar que “[...] ao apresentarmos a raça de forma direta, a nossos olhos, poderemos desafiar o Estado, as Instituições da Sociedade Civil e a nós mesmos, como indivíduos, a combater o legado da desigualdade e da injustiça herdadas do passado” (APPLE, 2001, p.147).

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dizendo, justificavam que a exclusão e as desigualdades sociais dos sujeitos do campo eram imensas e que ao fortalecerem as demandas desses sujeitos, automaticamente, estariam atendendo as demandas da população negra do campo.

Cabe ressaltar que, com base nas observações empíricas, a maioria das pessoas com quem tive contato durante esse período: professores, lideranças e os sujeitos do campo, embora aparentassem um fenótipo que se aproximava de pardo ou negro (a), não se identificavam como tal. Diziam-se morenos. Se levar em consideração o povoamento demográfico do país12, a cor desses indivíduos, conforme as categorias utilizadas pelo IBGE pode ser preta/parda.

Diante desses fatos observados e dessas situações vivenciadas, algumas indagações reflexivas emergiram: por que as pessoas só veem negros no quilombo? Por que as pessoas não se enxergam como negros (as)? Será que o FPEC tem efetivado ações para incluir as relações étnico-raciais em suas reivindicações curriculares? É provável que as pessoas estejam influenciadas pelas ideologias das relações raciais elaboradas pela elite dominante brasileira, que tem ainda orientado o imaginário da representação do negro na sociedade.

Essas ideologias, a primeira vista, causam a impressão de presença, quando admitem o negro em seus discursos. Entretanto, ao mesmo tempo coloca o negro na condição de sujeito ausente, por não enfrentar a arquitetura ideológica do racismo como principio da invisibilidade negra. Por esse motivo, lanço como hipótese deste estudo, que o MPPUEC delimita o negro ao quilombo por não enfrentar as causas do racismo em suas proposições curriculares.

Quando da realização do estudo exploratório, observei que os sujeitos envolvidos na educação do campo, sejam, lideranças, professores, sindicalistas, trabalhadores rurais, entre outros, em sua maioria, sempre quando se referiam à população negra existente no meio rural, delimitavam seu espaço como sendo apenas o quilombo. Esses mesmos sujeitos quando inquiridos, sobre a inclusão do negro nas escolas do meio rural, respondiam que em seu Município existia uma comunidade ou uma escola quilombola. Ao refletir sobre esses discursos surgiu a seguinte indagação: a população negra do campo só existe no quilombo?

Para a pesquisa documental deste estudo dissertativo, foi selecionado o documento final do I, II e III Seminário Estadual de Educação do Campo, documentos respectivamente assim denominados: Carta de Belém, o Manifesto do II e do III Seminário Estadual de

12 Em termos regionais, a população branca está mais concentrada no Sul e Sudeste; a população parda no Norte

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Educação do Campo, da Floresta e das Águas da Amazônia Paraense. Esses documentos são resultantes dos debates no Grupo de trabalho (GT) e aprovados na plenária geral que costumam ocorrer ao final de cada evento. A Carta de Belém, nome atribuído ao documento do I Seminário, consiste numa declaração que contém os princípios, objetivos e finalidades do FPEC.

As propostas, encaminhadas que compõem os manifestos dos II e III Seminário, foram organizadas tomando como referência no debate do GT: Educação e Reforma Agrária, Trabalho e Educação no Campo; Educação e Infância no Campo; Educação e Juventude no Campo; Educação do Campo e Gênero; Educação do Campo e Povos da Floresta; Educação do Campo e Povos das Águas; Educação do Campo e Poder Local; História da Educação do Campo e Lutas Sociais; Educação do Campo e Formação de Educadores; Educação do Campo, Saberes e Identidade Étnico-Racial; e por último, Educação do Campo e Economia Rural.

Os manifestos se estruturam em quatro sessões, assim nominada: quem somos? O que defendemos? O que queremos? O que vamos fazer? Na sessão “quem somos?”, o FPEC define quem o compõe e ratifica seu compromisso com os sujeitos do campo, “historicamente excluído”. Na sessão, “O que defendemos?”, o documento destaca os desafios da educação do campo e reafirma o compromisso com a luta do campo e seus sujeitos.

No tópico O que queremos?, se organiza em torno de algumas reivindicações que possam assegurar uma política pública com qualidade social à população que vive e trabalha no campo, nas águas e na floresta da Amazônia Paraense por meio das seguintes condições: 1) Universalização do acesso à Educação Básica; 2) ampliação do acesso e garantia de permanência da população à Educação Superior; 3) Formação e valorização de educadores; 4)Financiamento da Educação; 5) Gestão Educacional Democrática; 6) Ressignificação do projeto político pedagógico e do currículo.

E, por último, na sessão, O que vamos fazer?, o documento sugere estratégias para serem realizadas na direção de garantir a inclusão das propostas do FPEC nas prioridades das políticas públicas educacionais e curriculares. O conjunto dessas propostas constitui o plano de ação do FPEC e indicativos de ações a serem desenvolvidas pelo MPPUEC. Cabe esclarecer que o documento relativo ao III Seminário traz em seu bojo o manifesto do I Seminário Estadual da Juventude do Campo.

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Fig. 1- Mapa do Pará dividido por Região de Integração.
Foto 3                                                                               Foto 4

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