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OS DIREITOS DO NASCITURO E O ARTIGO 4.º DO CÓDIGO CIVIL

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OS DIREITOS DO NASCITURO E O ARTIGO 4.º DO CÓDIGO CIVIL

Doutrinas Essenciais de Direito Civil | vol. 3 | p. 269 | Out / 2010DTR\2012\1746 Gastão Grossé Saraiva

Área do Direito: Civil Sumário:

Revista dos Tribunais • RT 131/444 • maio./1941

A leitura atenta do artigo 4.° do nosso Código Civil ( LGL 2002\400 ) deixa transparecer, em face da doutrina, uma flagrante desharmonia entre a sua primeira parte: “a personalidade,civil do homem começa do nascimento com vida”, e a sua segunda parte: “mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.

Devemos admitir, de início, que só pôde ser titular de direito quem tiver “personalidade”, isto é, quem seja pessoa natural ou jurídica.

Aceita tal premissa, podemos construir, com base no art. 4.° do Código Civil ( LGL 2002\400 ) , o seguinte silogismo:

“Todo titular de direito é uma pessoa jurídica ou natural.

“O nascituro não é uma pessôa jurídica nem natural (1.ª parte do art. 4.°). “Logo o nascituro não pôde ser titular de direito.

Esta conclusão, de que o nascituro não pôde ser titular de direito, contraria de modo absoluto a segunda parte do art. 4.° do Código Civil ( LGL 2002\400 ) , que diz “mas a lei põe a salvo, desde a concepção, “os direitos” do nascituro”.

Propomo-nos pois a estudar o assunto, e, assim, erigimos como tése a seguinte proposição contida na segunda parte do art. 4.°:

Enunciando esta tése formulamos duas afirmativas: 1.°) que o nascituro pôde ser titular de direitos;

2.°) que esses direitos estão sujeitos a uma condição suspensiva: – a do seu nascimento com vida. – Titular de direitos é aquele que tem capacidade jurídica, aptidão para adquirir direitos e ficar sujeito a obrigações.

– A essa suceptibilidade de direitos e obrigações – capacidade jurídica – é que os juristas dão o nome de “personalidade”.

– Têm personalidade as pessoas naturais e as jurídicas. – Pessôa natural é o ser humano – o homem.

– O ente humano adquire a “personalidade jurídica” desde á sua concepção, segundo a doutrina de uns; após o nascimento com vida, conforme teoria seguida por outros.

– Nascituro é o féto humano durante o período de sua gestação, ainda no ventre materno, não nascido.

– Pessôa jurídica é uma instituição social: Estado, sociedade, fundação, etc. E’ de direito público ou de direito privado.

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– A pessôa jurídica de direito público adquire personalidade no áto de sua constituição.

– A pessôa jurídica de direito privado adquire personalidade, existência legal, segundo as leis reguladoras de sua formação.

– Trata-se pois de uma “personalidade” com sentido todo especial. E’ antes uma qualidade, com requisitos determinados, necessária para o ingresso do ênte humano ou instituição social no campo do direito, isto é, na órbita em que certas relações são protegidas coativamente pela força social organizada.

– O titular de direito precisa pois ter determinada qualidade, especial, a que se dá o nome de “personalidade” ou “capacidade jurídica”. Não a confundamos com a “personalidade humana”, que surge, nasce naturalmente, com o próprio indivíduo e que se extingue, naturalmente também, com a sua morte.

– Mas o que vem a ser o “titular de direitos”?

– E’ o Sujeito, que com o Objéto, o Vínculo-jurídico e a Proteção-coação, constituem os quatro elementos essenciais e necessários de todo Direito. Onde falta um destes elementos não ha Direito. Sujeito, titular de direito, pessôa natural ou jurídica – é a quem aproveita o Direito; aquele ao qual o objéto está juridicamente vinculado por uma proteção que o Estado assegura coativamente.

Objéto – é a cousa, material ou ¡material, mas possível, sobre a qual o Sujeito exerce sua prerrogativa jurídica. O objéto está vinculado ao Sujeito nas condições e formas que a Lei estabelece e assegura coativamente, si necessário. O Objéto sofre a incidência do Sujeito.

Vínculo jurídico – é a relação existente entre o Sujeito e o Objéto. Exprime a ação que aquele pôde exercer sobre o segundo; o que o Sujeito está autorisado a fazer com o Objéto, a maneira de usar, gosar e dispô-lo. O vinculo indica a extensão e a intensidade desta ação. Em sua abstração o vínculo jurídico é a alma do Direito.

Proteção-coação – é o caraterístico do Direito. Garante coativamente a integridade do vínculo jurídico existente entre o Sujeito e o Objéto; assegura pela força, si preciso, as prerrogativas do Sujeito sobre o Objéto.

***

No pressuposto de que não ha Direito sem o concurso dos quatro elementos essenciais apontados: sujeito, objéto, vínculo e proteção, si a Lei reconhece expressamente certas e determinadas relações entre objetos possíveis e o nascituro, protegendo e garantindo o vínculo jurídico que entre ambos se formou, então, lógica e forçosamente, o nascituro pôde ser Sujeito, titular de direitos, isto é, ter “personalidade” –- “capacidade jurídica”.

***

Isto posto, vejamos, tanto nos textos das diferentes legislações como na opinião dos juristas, si ha vínculos jurídicos entre objetos possíveis e o nascituro, protegidos pela lei, isto é, si ha “Direitos do nascituro”.

No Direito Romano:

Em Roma a capacidade das pessoas dependia da sua condição jurídica. Esta condição, constituindo o estado da pessôa, compreendia, na época clássica e durante o baixo império, três elementos: a liberdade, a cidade e a família.

O estado de escravo, de homem livre e de cidadão romano se adquiria pelo nascimento ou por um fáto posterior. Em favor da liberdade admitiu-se, no século III, que, si em qualquer momento, durante o período da gravidês, a mãi viésse a ser livre, o filho nasceria livre, mesmo 110 caso da progenitora ter voltado novamente ao estado de escrava, por ocasião do nascimento. (Paulo II – 24,2).

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instituto a “curatela ao ventre”, que passou para o Código Napoleão e deste às Ordenações Portuguesas. Morrendo o marido, nomea-se um “curador ao ventre”.

No Direito Argentino:

O Código Civil ( LGL 2002\400 ) Argentino é o que mais explicitamente tratou dos direitos dos nascituros, dedicando-lhes dois títulos, os III e IV do Livro I. O título III (arts. 63 a 69) é cópia dos arts. 34 a 42 do “Esboço” de Teixeira de Freitas, e denomina-se “Das pessoas por nascer”. O Título IV: “Da existência das pessoas antes do nascimento”, nos demonstra que o legislador argentino seguiu neste assunto a doutrina que faz remontar o início da personalidade ao momento da concepção, subordinando-a todavia á condição de “nascer com vida”.

Diz o art. 70: “Desde a concepção no ventre materno começa a existência das pessoas e pódem adquirir alguns direitos antes do nascimento, como si já tivessem nascido. Esses direitos serão irrevogavelmente adquiridos si os concebidos no ventre materno nascerem com vida, ainda mesmo que só por momentos”.

E o art. 74: “Si morrerem antes de estar completamente separados do ventre materno, serão considerados como si não tivessem existido”.

No Direito Francês:

Cód. Civil, art. 725: “Para suceder é necessário existir no momento da abertura da sucessão; Assim, são incapazes de suceder:

1.° – Aquele que ainda não foi concebido.

E no seu art. 906: “Para adquirir “inter-vivos” basta estar concebido no momento da doação”.

Somente nestes dois artigos, atinentes á sucessão e ás doações e legados, foi que o código francês fugiu á regra de que a personalidade humana começa do nascimento com vida e viável, estabelecendo, no dizer de Planiol, que a creança ainda não nascida já tem capacidade para adquirir direitos desde a época de sua concepção. A isso chama o citado comentador do código civil francês: “uma antecipação da personalidade”.

No Direito Português:

Cód. Civil, art. 6.°: “A capacidade jurídica adquire-se pelo nascimento ;’ mas o indivíduo logo que é procriado, fica debaixo da proteção da lei; e tem-se por nascido para os efeitos declarados no presente código”.

E’ como já dispunha o direito romano: “a creança concebida considera-se já ter nascido, quando se trata de seus cômodos”. Ha, no dizer de Cunha Gonçalves, uma proteção da lei, condicional e resoluvel. Isto é, nascendo sem vida é como si jamais houvera existido; a proteção da lei, em vigôr durante o tempo da gestação, resolve-se com o nascimento sem vida.

No Direito Alemão:

O Código Civil ( LGL 2002\400 ) Alemão, no seu art. 1.923 reputa o nascituro como tendo nascido antes da abertura da sucessão, para o efeito de poder concorrer á herança, prevendo o art. 1.912 a nomeação de um curador para a conservação dos direitos eventuais do nascituro.

No Direito Italiano:

Estabeleceu o Código Civil ( LGL 2002\400 ) Italiano, nos seus arts. 723 e 724 que os já concebidos por ocasião da abertura da sucessão pódem suceder; mas não o podem os que não nasceram viáveis.

Ferrara, considerando o aspéto jurídico desta disposição legal, define-o como “uma espetativa dos direitos do nascituro”.

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Cód. Civil, art. 4: “A personalidade civil do homem começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Os artigos 458 e 462 sujeitam o nascituro á curatéla.

Os artigos 353, 357, 1.169 e 1.718 declaram quais os direitos do nascituro que a lei põe a salvo: legitimação do filho concebido, reconhecimento do filho ilegítimo, antes do seu nascimento, e que o nascituro pôde adquirir por doação e por disposição testamentária. Igualmente pôde herdar.

Frisemos pois os traços carateristicos da posição do nascituro nessas legislações e, comparando-os, vejamos o que têm de comum:

O Direito Romano reputa o nascituro como concebido e nascido durante o tempo em que sua mãi tinha o estado de livre.

O Direito Argentino reconhece personalidade, capacidade jurídica, ao nascituro, desde sua concepção.

O Direito Francês considera o nascituro como existente, para poder adquirir por sucessão ou “inter-vivos”.

O Direito Português tem o nascituro por nascido, para os efeitos legais.

O Direito Alemão reputa o nascituro como tendo nascido, para o efeito de poder concorrer á herança. O Direito Italiano diz simplesmente que os nascituros podem suceder e adquirir por testamento. O Direito Brasileiro põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

E’ claro, irretorquivel, que todos esses códigos protegem o nascituro, garantem-lhe certos direitos, no pressuposto lógico e necessário de que venha a “nascer com vida”. A própria doutrina seguida pelo legislador argentino, que dá capacidade jurídica – personalidade – ao nascituro, subordina a eficácia dos direitos assim adquiridos ao nascimento com vida, conforme disposição textual do já citado artigo 74 do Código Civil ( LGL 2002\400 ) :

“Si morrerem antes de estar completamente separados do ventre materno, serão considerados como si não tivessem existido”.

O dispositivo legal do Código Argentino estaria conforme á teoria por nós reputada verdadeira, si esse artigo 74 fosse assim redigido:

“Si morrerem antes de estar completamente separados do ventre materno, os direitos pelos mesmos adquiridos serão havidos como nulos de pleno direito”.

Os códigos francês, português e alemão, consideram uma cousa que ainda não é como já sendo. – Somos contrários aos sistemas legislativos que consideram o nascituro como já tendo nascido e àqueles que depois de reconhecê-lo como existente e capás de adquirir alguns direitos, o consideram como si não tivesse existido.

O legislador italiano foi mais avisado: declarou incapazes de suceder os ainda não concebidos ao tempo da abertura da sucessão, admitindo, por exclusão, os já concebidos a suceder.

O Código Civil ( LGL 2002\400 ) Brasileiro, no seu artigo 4.º diz: “A pessôa natural adquire capacidade jurídica – personalidade –, só é capás de direitos, a partir do nascimento com vida; os nascituros, todavia, desde sua concepção, têm seus direitos postos á salvo pela lei”. Em outras palavras: “é capás de ter direitos o ente humano que nascer com vida; mas a lei protege os direitos daquele que ainda não nasceu”. O artigo 4.º do Código Civil ( LGL 2002\400 ) Brasileiro contém uma contradição flagrante entre sua primeira parte e a segunda, como ressaltámos de início.

***

Pelo exposto, vemos que, de um modo geral, as diferentes legislações reconhecem certos direitos ao nascituro: personalíssimos e patrimoniais. Em Roma garantia-se-lhe o direito de ser “homem livre”, si

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durante o período da gestação sua mãi viesse a ser livre, mesmo que momentaneamente. Hoje, põe-se-Ihe a salvo o direito de ser legitimado, reconhecido; herdar, adquirir por doação e por testamento. Para representá-lo nos átos jurídicos é nomeado um curador, faltando o pai.

– As legislações dos mais diversos países nos levam pois á conclusão de que “ha direitos do nascituro”.

Ferrara – Trattato di Diritto Civile (pág. 466/467). “O nascituro não tem direitos, mas vale apenas como “spes hominis”. No rigor do direito estricto, uma disposição em favor de um concebido deveria dizer-se nula, porque falta o sujeito adquirente, mas a lei mantém tal disposição, que fica suspensa até o nascimento”.

João Luiz Alves – Cód. Civil, art. 4.° – “A personalidade desde a concepção, subordinada á cláusula do nascimento com vida, não terá outra significação que não seja a de crear, como na Teoria do Código, uma espectativa de direito. O Curador ao ventre tem precisamente por fim a defesa dessa espectativa de direitos”.

Clóvis Bevilaqua – Cód. Civil (vol 1 pg. 170) – E’ mais lógico que o início da personalidade remonte á concepção, conforme nosso direito anterior. O Código Civil ( LGL 2002\400 ) Brasileiro, como todos os outros, destaca situações, em que o nascituro se apresenta como pessôa”.

Planiol – Traité (vol 1/367) – Por derrogação á regra, o nascituro é capás de adquirir direitos desde a época de sua concepção. Ha uma antecipação da personalidade”.

Cunha Gonçalves – Tratado (vol 1/30) – “Posto que a personalidade só se adquira após o nascimento com vida e figura humana, faz-se remontá-la á época da concepção… e, assim, o recem-nascido adquire todos os direitos transmitidos neste intervalo, em que ele era já uma creatura existente e concebida”.

E. Picard – Le Droit Pur, XXXVIII – “Assim o féto, a criança já concebida, mas que ainda não saiu do ventre materno, nem morta ainda, pôde ser sujeito de direito”.

José Tavares – Princ. Fund. Dir. Civil (vol 2, pg. 14) – “Mas porque a “personalidade jurídica” do homem é um atributo do próprio ser, necessário á garantia dos seus legítimos interesses, e pois que êle e estes existem desde o fato da concepção, é a este momento que nós preferíamos atribuir a origem da personalidade. O conceito duma personalidade jurídica restrita do féto, durante a vida intrauterina, é o que melhor corresponde á realidade da vida, e é particularmente verdadeiro…” Teixeira de Freitas – Esboço:

Art. 207 – Desde a concepção no ventre materno começa a existência das pessoas naturais, e antes do seu nascimento elas pódem adquirir alguns direitos, como se já estivessem nascidas.

Art. 208 – Esses direitos porém só ficarão irrevogavelmente adquiridos, se os concebidos nascerem com vida; isto é, si a manifestarem, ainda que por instantes, depois de completamente separados de sua mãe.

Art. 212 – Se nascerem mortos por aborto, ou se morrerem no ventre materno, ou antes que de sua mãe sejam completamente separados ; serão considerados como se em tempo nenhum houvessem existido, resolvendo-se por este fato os direitos, que tiverem adquirido.

Art. 213 – Esses direitos, que não chegarão a ser irrevogavelmente adquiridos, reverterão, ou passarão, para quem de direito fôr.

Nota 203 – Tenho o meu sistema por mais conforme á verdade, portanto de fato os bens são adquiridos pelos nascituros, cujos representantes entrarão na posse deles: E que importa ficar dependendo essa aquisição da condição do nascimento com vida, se o mesmo acontece com toda a aquisição de direitos resoluveis?

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três correntes sobre os direitos e personalidades dos nascituros:

1.°) “que néga” a personalidade bem como qualquer direito ao nascituro. Seus defensores vêm apenas, nas disposições da lei objetiva, um intuito de garantir certos benefícios ao ente humano em formação, para o caso de nascer com vida; ha proteção da espectativa de direitos. (Ferrara, Luiz Alves).

2.°) “que empresta” ao nascituro a personalidade, considerando-o como já tendo nascido, para os efeitos previstos na lei. (Planiol, Cunha Gonçalves).

3.°) “que remonta” o inicio da personalidade á concepção, reconhecendo no nascituro um “titular de direitos”. (E. Picard, José Tavares, Teixeira de Freitas, Clóvis Bevilaqua).

***

Os adeptos da primeira teoria só consideram a maneira mais prática de harmonizarem o seu ponto de vista, de dar início á personalidade apenas do nascimento com vida, com o justo e são princípio de se pôr a salvo os direitos do nascituro. Confundem a personalidade humana com a jurídica. Os da segunda corrente incidem no mesmo erro, com a atenuante de “fazer de conta” que o não nascido já nasceu. Foi a doutrina seguida pelo nosso Código no seu artigo 4.°, com um arranjo de palavras feliz na aparência, mas desastroso em face de uma análise mais agúda. Dizendo que a lei põe a salvo os “direitos do nascituro”, e que a “personalidade” começa do nascimento com vida, reconhece direitos a quem não tem personalidade. E como a personalidade é a capacidade jurídica, a aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações, qualidade imprescindível para haver um titular de direitos – Sujeito –, vamos cair, com a construção do artigo 4.° de nosso Código Civil ( LGL 2002\400 ) , na teoria de Windscheid, de direito sem sujeito.

A terceira corrente está, evidentemente, com a bôa doutrina, tanto em face dos fátos, como eles se apresentam na realidade, como perante a lógica e o exame da verdadeira concepção do fenômeno jurídico.

O nascituro, o féto, existe realmente, vive desde a concepção, falta-lhe apenas a existência separada, individual. Ha certas obrigações para com o nascituro, cuja imposição coativa se torna necessária em determinados casos. O nascituro tem “personalidade jurídica”, e é titular de direitos, porque não se concebe a construção de um instituto jurídico em que haja Direito sem Sujeito.

Não sentimos nenhuma dificuldade em dar personalidade ao nascituro, muito ao contrário, achamos este o único meio de harmonizar os princípios fundamentais dos Institutos de Direito com a realidade dos fátos e a letra dos códigos.

Assim como é pacificamente reconhecida a personalidade das pessoas jurídicas, não vemos em que possa repugnar ao espírito do jurista estender-se a personalidade aos nascituros. Claro é que falamos em personalidade jurídica e não humana.

Adotando-se esta teoria, que se completa acrescentando que os direitos do nascituro ficam sujeitos a condição suspensiva do seu nascimento com vida, isto é, os átos praticados em seu benefício serão tidos como nulos de pleno direito, si o feto nascer sem vida, poderemos explicar facilmente e sempre dentro da construção sistemática do Direito, a nomeação de um curador ao nasciturno, a sua legitimação e reconhecimento pelos pais, a validade das doações quando em seu nome aceitas pelos pais ou curador, o direito de suceder, a capacidade de adquirir por testamento.

Já tendo demonstrado acima, pelo exame dos textos legislativos dos diferentes países, que ha direitos do nascituro, acabamos de verificar agora que a doutrina verdadeira é aquela que, reconhecendo os direitos do nascituro, o considera, também, como Sujeito, titular de direitos, isto é, lhe dá “personalidade jurídica”.

Assim temos justificada nossa primeira afirmação: “que o nascituro pôde ser titular de direitos.” ***

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suspensiva. O evento futuro e incerto a que está subordinada a eficácia do áto jurídico tendo por sujeito o nascituro, é o nascimento com vida; enquanto esta condição não se verificar, não terá o seu titular adquirido o direito visado pelo áto jurídico.

Durante a gestação o nascituro tem a proteção da lei, que lhe garante certos direitos personalíssimos e patrimoniais, sujeitos a uma condição suspensiva. O curador o representará nos átos destinados a conservar o direito eventual.

Nascendo com vida verifica-se o implemento da condição: o nascituro será registrado no assento de nascimento, herdará, adquirirá. Os direitos que adquirira por átos cuja eficácia dependiam do seu nascimento com vida, integrarão definitivamente seu patrimonio, mesmo vindo a falecer em seguida. Assim, autor de herança, titular de um patrimonio, transmitirá por sua vês o que tiver adquirido por herança, doação ou legado.

Nascendo sem vida será apenas registrado o fáto no assento de óbitos. Nada adquirindo, por serem nulos de pleno direito os átos praticados em seu benefício, nada transmitirá. Os átos jurídicos que o visavam têm-se como inexistentes, pois a condição a que estavam sujeitos – o nascimento com vida se tornou fisicamente impossível.

Ponto caráteristico comum, essencial, fundamental, pressuposto necessário do qual tudo depende, condição “sine qua non” a que estão subordinados todos os direitos e garantias dispensados pelas legislações ao nascituro, é o “nascimento com vida”.

Como corolário de nossa primeira conclusão, de que o nascituro póde ser titular de direitos, chegamos á nossa segunda afirmação: “que esses direitos estão sujeitos a uma condição suspensiva – a do seu nascimento com vida.”

***

De nosso estudo resulta que:

1.) – “A personalidade jurídica do homem começa desde a concepção.”

2. ) – “Os direitos do nascituro estão sujeitos a uma condição suspensiva: a do seu nascimento com vida”.

Concluímos portanto que é a primeira parte do artigo 4.º do nosso Código Civil ( LGL 2002\400 ) que claudica: a personalidade jurídica do homem “não começa do nascimento com vida, mas começa desde a sua concepção,” subordinando-se todavia a eficácia dos átos praticados em seu benefício, durante o período da gestação, á condição de nascer com vida.

Assim, finalizando este estudo com a construção de um silogismo, argumento de que nos servimos de início para a crítica ao art. 4.° do Código Civil ( LGL 2002\400 ) , teremos o seguinte silogismo perfeito:

“Todo titular de direito (sujeito ou não a condições) é uma pessôa jurídica ou natural.

“O nascituro é uma pessôa jurídica, (tése por nós defendida). “Logo o nascituro é um titular de direitos (sujeitos á condição suspensiva de nascer com vida).”

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