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FREGE: DA CONCEITOGRAFIA À NOVA TEORIA DO JUÍZO

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FREGE: DA CONCEITOGRAFIA À NOVA TEORIA DO JUÍZO

FREGE: FROM CONCEITOGRAFIA OF THE NEW JUDGEMENT THEORY

Eduardo Antonio Pitt

LABLE/UFSJ

Resumo: Frege, na Conceitografia (1879) apresentou pela primeira vez a sua notação conceitual, que tinha como objetivo provar a sua tese logicista. Frege, no entanto, reformulou algumas noções e aspectos importantes dentro da sua linguagem formal porque suas primeiras noções eram problemáticas. Essas modificações foram apresentadas a partir de 1980 e é consenso que elas inauguram uma nova teoria do Juízo no plano geral do pensamento fregiano. Tratar dessas modificações é, em outras palavras, entender como o pensamento desse lógico foi sendo construído em prol de seu objetivo. Pois bem, apresentar em linhas gerais as causas e consequências de tais modificações é o objetivo desse artigo. Palavras-chave: Conteúdo Conceitual – Sentido - Referência

Abstract: Frege in the Conceitografia (1879) introduced for the first time his conceptual notation, that had as objective prove his thesys logicista. Frege, nowhere, reformulated some notions and important aspects inside of the your proper language because your first notions were problematic. Those modifications were presented in the beginning of 1980 and is consensus that they inaugurate a new theory from Judgement in the general plane from thought fregiano. Treat of those modifications is, in the others words, to understand as the thought these logical was being built in behalf of your objective. Introduce the causes and implications of such modifications is the objective these article.

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1 Introdução

rege (1848-1925) é reconhecidamente um dos pensadores que mais contribuiu para o desenvolvimento da Lógica a partir do séc. XIX como ciência das demonstrações dos princípios de inferência válido uma vez que esses princípios estão baseados nas leis do pensamento puro. O trabalho central de Frege, conhecido como “projeto logicista”, resume-se em provar que a aritmética pode ser fundamentada em axiomas lógicos, livres de qualquer intuição. Esse projeto, uma vez bem sucedido, provaria que a aritmética seria analítica e a priori. As teses contrárias a essa hipótese seriam a de Kant que lhe atribuiu um status epistemológico de sintético a priori e a de Mill que a definiu como sintético a posteriori.

Como se sabe, Frege possuía formação matemática e em seu trabalho, segundo Sluga (1980, p. 40), encontramos influências de Leibniz, Kant, Lotze e Herbart. A idéia de uma linguagem formal que fosse única e objetiva capaz de fundamentar a ciência é nitidamente influenciada pelo projeto de linguagem universal de Leibniz ou calculus ratiocinator, mas, a notação conceitual de Frege restringia-se a fundamentar a aritmética e posteriormente, com as

modificações necessárias, os ramos avançados da

matemática como cálculo diferencial e integral. É no prefácio da Conceitografia (1879) que Frege aponta para a capacidade futura da sua notação conceitual ser aplicada na geometria, cinemática pura, mecânica e a seguir a física.

A necessidade de uma notação conceitual surgiu quando Frege tentou fundamentar a aritmética na linguagem natural. Esta por ser ambígua e possuir conceitos vagos se mostrou insuficiente já que Frege precisava de uma linguagem rígida que levasse em conta somente o que era importante para as inferências. O problema levou Frege da

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aritmética à lógica e destacamos duas vantagens para tal escolha: (1) sendo a lógica analítica o que fosse fundamentado por axiomas puramente lógicos preservaria a analiticidade e (2) a linguagem lógica possui um perfil diferente das linguagens naturais o que proporcionaria segurança e clareza nas demonstrações dos teoremas da aritmética. A comparação de Frege entre sua notação conceitual com o microscópio ilustra bem a exatidão de operação técnica que ele procurava.

De certa maneira, o projeto de Frege em fundamentar a aritmética na lógica foi interrompido em 1902 pela descoberta de Russell que o sistema de Frege implicava um paradoxo que ficou conhecido como “paradoxo de Russell”. O paradoxo emerge da sua Lei fundamental V que foi publicada em 1893 no livro Leis Fundamentais da Aritmética, da qual o próprio Frege havia feito restrições. Este paradoxo emerge da teoria dos conjuntos de Cantor (Alcoforado, 1978, p. 27) do qual Frege se serviu para definir a noção de número. Mesmo assim, encontramos nos escritos de Frege um sistema de lógica de primeira ordem e um de segunda ordem. O de primeira ordem é correto e completo e o de segunda ordem não é correto porque prova a contradição. Outras inovações são os quantificadores, a interpretação das sentenças em função e argumento o que possibilitou a unificação da lógica aristotélica com a lógica dos estóicos, nunca antes feito.

Nesse artigo pretendo mostrar em linhas gerais (i) como Frege apresenta seu sistema na Conceitografia de 1879 e os problemas que o levaram a abandonar a noção de conteúdo conceitual como valor semântico e (ii) a nova teoria do juízo a partir da interpretação dos artigos Função e

Conceito (FC) de 1891, Sobre Sentido e a Referência (SSR)

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obras citadas que perfazem o período de 1879 a 1892, apenas direcionarei o texto na tentativa de apontar as causas e as modificações principais que Frege operou em seu sistema, em outras palavras, meu objetivo é mostrar o amadurecimento do pensamento fregiano.

2: O sistema da Conceitografia e o problema do valor semântico:

A Conceitografia de 1879 é a primeira obra de Frege onde ele apresenta sua notação conceitual. Esta obra não foi bem aceita pela comunidade acadêmica que a considerou confusa tanto pela sua escrita bidimensional na página e por tantas novidades que rompiam com a tradição lógica. A

Conceitografia tem aproximadamente cem páginas e Frege

estruturou seus capítulos da seguinte maneira: Prefácio:

1- Cap.1: Apresentação e explicação dos símbolos primitivos: o juízo, a condicionalidade, a negação, a igualdade de conteúdo, a função, a generalidade. 2- Cap.2: Representação e dedução de alguns juízos

do pensamento puro.

3- Cap.3: Alguns tópicos de uma teoria geral das séries.

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explicitamente apresentou o modus ponens, mas usava também a regra de substituição e em seu sistema os

conectivos lógicos usados são →, ¬ e . O sistema fregiano

tem os seguintes axiomas com a numeração da

Conceitografia: (1) (A → (B → A)) (2) ((A → (B C)) ((A B) (A C)) (8) (A → (B → C)) → (B → (A → C)) (28) (B → A) (¬A ¬B) (31) ¬¬ A → A (41) A → ¬¬ A (52) ((A = B) → (f(A) → f(B))) (54) (A = A) (57) ((x) f(x) → f(A))

Apresentado os axiomas e os conceitos primitivos do

sistema é necessário explicarmos algumas noções

preliminares. Frege parte da diferença de conteúdo judicativo e conteúdo não-judicativo (Margutti, 1984, p. 9). Conteúdo judicativo é aquele que é passível de ser transformado em um juízo, assim, a “atração mútua de pólos magnéticos opostos” é um conteúdo judicativo porque ela permite a formulação do juízo “pólos magnéticos opostos se atraem mutuamente”. Em contrapartida, conteúdos não-judicativos não permitem ajuizamentos, por exemplo, a palavra ‘ponte’ sozinha não nos leva a qualquer juízo.

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de verdade, é um caso especial de conteúdo conceitual que não possui um valor de verdade e o juízo é o reconhecimento da verdade do conteúdo judicativo. Frege precisava atribuir um valor semântico para as entidades linguísticas dentro do seu sistema. Por valor semântico entendemos o que significa uma expressão dentro de uma linguagem formalizada, ou seja, é uma entidade não linguística que associamos a entidades linguísticas.

Na Conceitografia a noção de conteúdo conceitual

cumpria o papel de valor semântico das expressões1. Como

na Conceitografia Frege não havia apresentado a diferença entre objeto e função, segundo a terminologia posterior, isto é, de 1890 em diante, o conteúdo conceitual de um nome próprio é o objeto designado e o conteúdo conceitual das expressões incompletas é uma função. O conteúdo conceitual de sentenças completas, que pode ser designado como conteúdo judicativo por possuir um valor de verdade e entendido como “estado de coisas”, é um complexo formado pelas entidades não linguísticas definidas após 1890 como objetos e funções, ou seja, o conteúdo judicativo é formado pelos conteúdos conceituais das partes das sentenças.

Compartilho com a definição de Chateaubriand (2001, p. 299) que “estado de coisas”, em termos fregianos, “corresponde para algo como saturação; i. e., (...), para a combinação de uma propriedade com um objeto” porque da análise do conteúdo judicativo os itens não linguísticos obtidos

são os conteúdos conceituais das expressões

correspondentes.

É importante ressaltar que Frege levando em conta o valor semântico das suas expressões abandona a distinção

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entre sujeito e predicado. Frege tinha em mente que na sua linguagem formal o que era significativo para as inferências era a noção de conteúdo conceitual, este foi o motivo maior para a análise das sentenças como função e argumento e não como sujeito e predicado.

Essa nova análise das sentenças superou a noção de sujeito e predicado aristotélico. Devido os objetivos técnicos da notação conceitual Frege entendia que a análise das sentenças em sujeito e predicado era logicamente irrelevante. Algumas análises tendo em foco o sujeito e o predicado não possibilitam a inferência: se 3 < 5 e 5 < 8 então 3 < 8, já que o objeto 5 ora se apresenta como sujeito ora como predicado. Frege então estende a noção de função para todas as entidades linguísticas extralógicas.

Além do mais, o que Frege propõe é uma distinção entre a estrutura gramatical e a estrutura lógica de uma

sentença. As sentenças da linguagem natural têm

características diferentes no sentido que seus constituintes, as palavras, devem respeitar uma determinada estrutura gramatical. Se o objetivo é a análise lógica a atenção do observador deve estar voltada para a estrutura lógica da sentença e as relações lógicas que ocorrem entre as palavras. Um exemplo é o caso da sentença “César conquistou as Gáleas” que pode ser analisada logicamente assim:

1: x conquistou a Gálea. 2: César conquistou x. 3: x conquistou y.

Um dos problemas contidos na Conceitografia e que Frege modificou após 1890 foi a interpretação do sinal de identidade de conteúdo conceitual (≡). Dos conceitos primitivos o símbolo de identidade de conteúdo (≡) é diferente da negação e da condicionalidade porque relaciona nomes e

não conteúdos. Ele deve ser interpretado

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no sistema fregiano. O problema é que na Conceitografia Frege faz uma confusão entre uso e menção e usa o sinal (≡) como sinal de identidade entre conteúdos conceituais tanto para nomes como para sentenças com sentidos diferentes e acaba misturando os dois em suas demonstrações.

É importante percebermos que a própria noção de conteúdo conceitual também é uma noção complicada porque se trata de uma noção intensional e não há um critério definido para se dizer com certeza o que é o conteúdo conceitual de uma sentença. Isso gerou uma tensão porque Frege definiu um critério extensional para determinar se dois nomes próprios possuem o mesmo conteúdo conceitual, ou seja, a intersubstituição dos nomes preserva a correção de inferência quando eles denotam o mesmo objeto (§8 da

Conceitografia) enquanto que o critério para juízos

(sentenças) era intensional (§3 da Conceitografia), que tem a ver com o conteúdo informacional das sentenças.

Frege na §3 da Conceitografia (Frege, 1967, p. 12) diz que duas sentenças, A e B, possuem o mesmo conteúdo

conceitual (A ≡ B) se somadas ao mesmo conjunto de

premissas implicam a mesma consequência. Se

simbolizarmos a definição de Frege teremos: Γ, A →φ Γ, B →φ

Conforme a definição dois juízos (sentenças) A e B têm o mesmo conteúdo conceitual se, e somente se, A e B são intersubstituíveis preservando correção de inferências. Aqui o critério é intensional.

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*O autor da Conceitografia. *O autor de

Fundamentos da Aritmética.

Essas descrições definidas, no sistema de Frege funcionam como nomes próprios, possuem o mesmo conteúdo conceitual porque ambos denotam o indivíduo Frege. Aqui o critério é extensional.

É fato que a noção de conteúdo conceitual

apresentada na Conceitografia apresentava tensões

insuperáveis uma vez que era uma mistura de uma análise extensional e intensional. Um dos problemas causados é o colapso dos conteúdos conceituais das sentenças de identidade em coisas do tipo <a, a, => (Rodrigues, 2007, p. 91). Veja as seguintes sentenças de identidade:

Frege é o autor da Conceitografia.

Frege é o prof. da Universidade de Jena autor de Os

Fundamentos da Aritmética.

Frege é Frege.

Analisando as descrições como nomes próprios e considerando o conteúdo judicativo de sentenças de identidade como um complexo formado pelos conteúdos conceituais das partes das sentenças, vê que o resultado é algo do tipo <a, a, => (Rodrigues, 2007, p. 91). Isto quer dizer que na Conceitografia todas as sentenças de identidade possuem o mesmo conteúdo conceitual incluindo também as sentenças da aritmética. Com certeza Frege não concordaria com isso.

Além disso, o tratamento que Frege dá as descrições não é satisfatório porque descrições contingentes não preservam correção de inferências (Rodrigues, 2007, p. 87). Consideremos a sentença:

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E as duas descrições definidas: (a) O autor de Ética a Nicômaco. (b) O mestre de Alexandre da Macedônia.

Vejamos agora como aparece o problema se substituirmos na sentença as descrições definidas de Aristóteles.

(1a) Platão é mestre do autor de Ética a Nicômaco.

(1b) Platão é mestre do mestre de Alexandre da Macedônia.

Aqui, o que nós concluímos de (1a) não concluímos de (1b) se não temos como premissas que {“autor de Ética a

Nicômaco” e “mestre de Alexandre da Macedônia”} denotam o

mesmo indivíduo. Como é possível que “o autor de Ética a

Nicômaco” não tenha sido “o mestre de Alexandre da

Macedônia” está provado que descrições contingentes não preservam correção de inferências.

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abandonar o sinal de tripla barra (≡) e adotar o sinal (=) no sentido usual da aritmética. Na verdade a mudança do sinal de identidade já se encontra implicitamente no artigo FC onde Frege apresenta as mudanças em seu sistema e inaugura a nova teoria do Juízo.

Devido os problemas decorridos da noção de conteúdo conceitual na Conceitografia concluímos que as tensões entre os valores semânticos das sentenças e dos nomes próprios eram insuperáveis. Como vimos, a noção de conteúdo conceitual gerava dois problemas: (i) o tratamento que Frege dá ao conteúdo conceitual de sentenças e nomes próprios/descrições definidas não são coerentes levando-se em conta o critério de substitutividade preservando correção de inferências e (ii) os conteúdos judicativos de sentenças de identidade colapsam em coisas do tipo <a, a, =>.

Para solucionar esse problema Frege não abandonou a noção de conteúdo conceitual, mas reformulou a noção de valor semântico como vamos tratar adiante. Esses problemas também fizeram Frege abandonar o critério da Conceitografia de substitutividade preservando correção de inferências para substitutividade preservando a verdade (salva veritate). Essas mudanças foram fundamentais para o estabelecimento posterior da Tese de Frege (TF) que a referência de uma

sentença completa2 é um valor de verdade.

2

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3: A nova teoria do Juízo:

Um dos motivos que levou Frege abandonar a teoria semântica da Conceitografia é o fato de ter considerado o conteúdo conceitual como o valor semântico das entidades linguísticas dentro da sua linguagem. O valor semântico para as expressões linguísticas era de fundamental importância, uma vez que, a notação conceitual de Frege foi construída para expressar um determinado assunto, isto é, para provar sua tese logicista.

As mudanças decorridas no seu sistema foram implicitamente apresentadas no artigo FC. Conforme Sluga (1980, pp. 129-130) são três as principais mudanças na nova teoria do Juízo: a principal é que Frege acrescenta os percursos de valores de funções em seu sistema e considera as extensões de conceitos um caso especial destes. Como Frege considerava os percursos de valores objetos lógicos ele esperava com esse passo ter fechado uma questão não resolvida nos Fundamentos da Aritmética, porque extensões de conceitos devem ser consideradas objetos lógicos. A segunda mudança é a adição de um terceiro elemento, além do Sinal e da sua Referência, que chamou de Sentido. A terceira mudança é que a diferença entre objetos e funções a partir de 1890 é caracterizada mais nitidamente.

O artigo SSR apresenta melhor as definições de Sentido e Referência, mas o objetivo principal do texto é defender a TF que a referência de uma sentença completa é um valor de verdade. É de se notar que em SSR Frege dedica a maior parte do artigo mostrando justamente o caso onde a Referência de uma sentença completa não é um valor de verdade, mas sim um pensamento ou parte de um, o que recebeu o nome de referência indireta por ocorrer em contextos intensionais.

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um tipo de função, e aquilo que é um objeto. Kerry é da opinião que essa divisão nem sempre é rigorosa podendo às vezes o conceito se fazer de objeto. Frege mantém sua opinião e argumenta que essa divisão é irredutível e quando ela parece se enfraquecer (problema do “conceito cavalo”) é porque não temos ferramentas nas linguagens naturais e formais para expressarmos as noções primitivas da lógica.

Esses três artigos, FC, SSR e CO, foram escritos informalmente, no sentido de serem elucidatórios e de caráter mais filosófico do que lógico ou matemático. Por isso, no contexto geral da obra de Frege eles têm uma função mais propedêutica. Principalmente SSR que faz referência direta ao uso da linguagem o que fomenta a discussão se Frege seria um autêntico filósofo da Linguagem. Compartilho da opinião de Weiner, Sluga e Chateaubriand que Frege não era um autêntico filósofo da Linguagem, no entanto, Dummett endossa opinião contrária.

Como Frege não poderia usar a noção de conteúdo conceitual como valor semântico na sua linguagem ele a dividiu em Sentido e Referência. Pela sua opção pela lógica da extensionalidade, implicitamente no artigo FC e explicitamente em Digressões sobre o Sentido e a Referência (1892/1895) (Frege, 1978, pp. 113-114), definiu agora que a Referência das expressões linguísticas cumpriria o papel de valor semântico em seu sistema.

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complementação.

Do lado oposto das categorias lógicas nós temos as funções. Funções no sentido fregiano são tanto os termos funcionais (x + 3 = 4), os termos conceituais (x é brasileiro) e os operadores lógicos. Para Frege as funções são sempre insaturadas, pois necessitam de complementação e a referência de tais expressões incompletas são conceitos, que é um tipo de função. Para Frege então tudo o que existe ou é uma função ou é um objeto e estes, na minha opinião, devem ser entendidos não como categorias ontológicas, mas sim lógicas.

Quanto ao Sentido do sinal, Frege em SSR defini “como contendo o modo de apresentação do objeto” (Frege, 1978, p. 62). Contudo, a identidade de Referência não implica identidade de Sentido porque podemos apresentar o mesmo objeto com sentidos diferentes. A descoberta astronômica que a “estrela da manhã” é a mesma que a “estrela da tarde” deu força a essa teoria, pois ambas denotam Vênus. O Sentido das sentenças completas seria o pensamento expressado por elas. Não entendido “como um ato subjetivo de pensar, o pensamento é um conteúdo objetivo que pode ser a propriedade comum de muitos” (Frege, 1978, p. 67). Com isso, temos a formulação fregiana de Sinal, Sentido e Referência.

Conforme o critério de substitutividade preservando a verdade, adotado na segunda teoria do Juízo e levando-se em conta a hipótese de Frege que a Referência de uma sentença completa é um valor de verdade encontra-se em FC um Princípio de Composicionalidade para Referência (PCR):

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considerar uma das sentenças como verdadeira e a outra como falsa; e no entanto, ambas as sentenças devem ter a mesma referência, pois apenas se trocaram as palavras ‘Estrela Vespertina’ por ‘Estrela Matutina’, que têm a mesma referência, isto é, são nomes próprios do mesmo corpo celeste (Frege, 1978, pp. 43-44).

Conforme as palavras de Frege, o PCR pode ser expresso assim:

Se ref.(a) = ref.(b) → ref.(...a...) = ref.(...b...).

O PCR assegura que somente importa para a Referência de sentenças compostas a Referência de suas partes e não o Sentido das partes.

Com o PCR Frege têm em mãos um critério que confirma a preservação da verdade, pois desconsidera o Sentido das expressões e leva em conta somente a Referência. É importante ressaltar também que o PCR tem papel fundamental no argumento que comprova a TF (Frege, 1978, p. 70). Em linhas gerais, com o PCR Frege descarta o pensamento para ocupar a função de Referência das sentenças e conclui que não há outra alternativa a não ser os valores de verdade, está implícito que a noção de conteúdo judicativo da Conceitografia já estava descartada perante as tensões que ela causava.

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(1) Se algo é a Referência satisfaz PCR (2) O pensamento não satisfaz PCR

(3) Em uma investigação científica estamos

interessados no valor de verdade

(4) Em uma investigação científica exigimos que as partes de uma sentença tenham referência

(5) As partes de uma sentença têm referência sse A sentença tem referência sse

A sentença tem valor de verdade

(6) Em uma investigação científica sentenças têm referência

(7) Valor de Verdade são candidatos plausíveis para o papel de Referência

(8) Valor de Verdade satisfaz PCR

Conforme o argumento Frege não tinha outra opção para a Referência de uma sentença completa, uma vez que (2) elimina o pensamento e a opção pelo conteúdo conceitual já havia sido abandonada pelas tensões presentes na

Conceitografia. A opção pela extensionalidade que levou

Frege a considerar a Referência como o valor semântico de sua linguagem tornou o sistema fregiano homogêneo e deixou sua teoria semântica madura.

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da Referência para o papel de valor semântico estabeleceu uma correspondência perfeita entre as entidades não linguísticas existentes, objetos e funções (Referências), com as entidades linguísticas existentes, expressões completas e expressões incompletas (Sinais). Os Sentidos, conforme a teoria fregiana, teriam a tarefa de nos levar do Sinal, entidade linguística, para a Referência, entidade não linguística, fazendo assim a intermediação.

Referências bibliográficas básicas

Frege, Gottlob (1879). Begriffsschrift, a formula language, modeled upon that of arithmetic, for pure thought. In HEIJENOORT, Jean van (1967). From Frege to Gödel. A source book in Mathematical Logic. Harvard University Press.

_____. Ensayos de Semántica y Filosofia de la Lógica. Edição, introdução, tradução e notas de Luis M. Valdés Villanueva (1998). Editoria Tecnos S.A. _____. Lógica e Filosofia da Linguagem. Introdução, tradução e notas de Paulo Alcoforado (1978). São Paulo. Ed. Cultrix/Ed. da USP.

_____. Posthumous Writings. Tradução Long Peter e Roger White (1979). Ed. Universidade de Chicago.

_____. The Frege Reader. Tradução de Michael Beaney (1997). Ed. Blackwell Publishing Ltd.

Referências bibliográficas secundárias

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Kenny, Anthony (1995). Frege. An introduction to the founder of Modern Analytic Philosophy. Primeira edição.

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Mendelsohn, Richard (2005). The Philosophy of Gottlob Frege. Ed. Cambridge.

Noonan, Harold (2001). Frege A Critical Introduction. Ed. Polity Press. Primeira edição.

Rodrigues, Abílio Azambuja (2007). Frege, fazedores-de-verdade e o argumento da funda. Disponível em: <www2.dbd.puc-rio.br/arquivos/160000/164800/10-164800.htm.>. Acesso em: 03/08/2009. Sluga, Hans D. (1980). Gottlob Frege. Ed. Routledge e Kegan Paul Ltd. Primeira edição.

Thiel, Christian (1972). Sentido y Referência em La lógica de Gottlob Frege. Ed. T. S. A.

Weiner, Joan (2005). Frege Explained. From Arithmetic to Analytic Philosophy. Open Court P. C.

_____ (2008). Frege in Perspective. Cornell University Press.

Referências

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