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Rev. adm. contemp. vol.2 número1

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Academic year: 2018

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Carlos Osmar Bertero

No momento os programas de pós-graduação em determinadas áreas estão li-dando com a introdução dos mestrados profissionais. Embora mestrados profissi-onais sejam parte da tradição norte-americana de estudos pós-graduados, em nos-so país se manteve, desde o início, a conhecida separação entre lato e stricto sensu, implicando mestrados e doutorados do lado acadêmico, e especialização do lado profissional.

Trata-se de uma aproximação do modelo que reconhece a existência de progra-mas profissionais de pós-graduação. Assim, nos Estados Unidos de há muito en-contramos os MBA (Master of Business Administration), o MPA (Master of Public Administration), o MLS (Master of Library Science) e até cursos profis-sionais oferecidos em nível de doutorado, que todavia mantêm a característica de doutorados profissionais e não se confundem com o doutorado científico ou Ph.D. É o caso dos doutores em medicina (MD) e advogados ou LLD. No Brasil mante-ve-se, até recentemente, uma separação rígida entre profissionais e acadêmicos; caso o desejassem, os primeiros deveriam realizar algum trabalho de pós-gradua-ção lato sensu ou de especialização, que acabou caracterizado por menor prestí-gio científico e também social. Mestres e doutores continuaram sempre a ser se-cretos e intensos objetos de desejo, mesmo por parte de profissionais.

Atualmente começam a surgir no país mestrados profissionais em administra-ção, com a sigla de MBA, letras que hoje despertam na comunidade de profissio-nais de administração, e até fora dela, tal encantamento, que já se anunciam MBAs até mesmo em contabilidade, direito e outras áreas, atestando que a ignorância, como a sabedoria, não conhece limites.

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pro-fissional se abre para setores mais amplos da sociedade; no caso da administra-ção, o seu objetivo é a formação de profissionais capazes de levar ao aprimora-mento das práticas administrativas, que beneficiarão a sociedade em geral e as organizações em que irão atuar de maneira específica.

Enquanto o acadêmico não pode estar desvinculado da produção de conheci-mento, que deve ser de preferência científico, o mestrado profissional se dirige à prática e ao aperfeiçoamento da administração, não necessariamente enquanto ciência ou acumulação de conhecimentos sistematizados. Não estamos aqui adentrando o complexo universo das relações entre teoria e prática, que consti-tuem tópico fundamental para a área de administração. Simplesmente não o fare-mos, porque não consideramos seja este o momento e o espaço adequado para tratamento da questão, que mereceria outro momento.

Se nos quisermos aproximar de um formato que seria o de orientação e suges-tão do que deveria ser uma tese de mestrado profissional em administração, forma de conciliar o MBA profissionalizante com o prestígio do grau de mestre brasilei-ro, privilégio do stricto sensu, vão aqui algumas idéias inventariadas por tópicos.

Primeiramente a questão dos objetivos: deve-se sempre levar em conta que a principal razão para que se escreva uma tese num mestrado profissionalizante é para que o mestrando obtenha o grau respectivo. Certamente a maioria preferiria, se forem bons mestrandos em programas profissionalizantes, dedicar o seu tempo à realização de outras coisas, como trabalhar numa organização e produzir. Se realmente tivessem que escrever alguma coisa, talvez optassem por um relatório voltado ao diagnóstico ou à solução de problemas organizacionais reais e concre-tos. Mas já que o grau tem de ser obtido e que para tanto se faz necessária uma tese, que ela seja próxima do universo de preocupações do mestrando. Seria, por-tanto, uma tese que poderia usar teorias, modelos ou conhecimentos de alguma forma sistematizados, que foram obtidos durante a realização do curso, mas que não deveriam necessariamente procurar construir ciência, pelo que não vejo ne-cessidade de elaboração de hipóteses que viessem a ser comprovadas ou negadas. O trabalho de tese não deve ser percebido pelo candidato como desvio de seu universo de preocupações; deve nascer de um mundo de preocupações, típicas de profissional. Não vejo inconveniente que se aproxime do formato de um bom relatório de consultoria que se dedique a diagnosticar, analisar e propor soluções para um problema organizacional. Isto permite tanto uma tese com conteúdo e orientação funcional, como multifuncionalidade e posturas generalistas.

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ciên-cia própria do positivismo lógico. É o modelo de ciênciên-cia consolidado entre as ciências exatas, geociências e também, em boa medida, entre as biociências. Sua aplicação em pesquisas administrativas é pelo menos problemática. A não ser excepcionalmente, em administração, especialmente quando se trata de pesquisas que envolvem organizações enquanto unidades de análise, não se consegue obter a necessária e metodologicamente recomendável amostra que seja estatisticamen-te significativa. Na ausência de amostras que sirvam para justificar e embasar um bom tratamento estatístico, no contexto de um universo probabilístico, o que se acaba fazendo é aplicar pacotes quase sempre o SPSS (Statistical Program for the Social Sciences), cujos resultados estatísticos carecem de sentido, seja porque a amostra não é representativa do universo, seja porque a operacionalização de variáveis não foi adequadamente realizada. Conseqüentemente acabamos compa-rando variáveis incomparáveis, mas fazendo de conta que são comparáveis, pros-seguindo e consolidando uma cadeia de equívocos.

A questão da metodologia deve estar atenta à multifuncionalidade da adminis-tração e ao caráter interdisciplinar e até mesmo sincrético, palavra nada recomen-dável em teoria da ciência, que a área como um todo possui. Cada área funcional acaba tendo diferenças enormes, que desencorajam a adoção de um único tipo de metodologia para o conjunto da administração. Desta forma podemos ter áreas, como produção e operações, que podem optar por uma metodologia que envolva modelagem matemática e que as distanciaria definitivamante de qualquer positivismo lógico, já que este modelo implica adoção, ab initio, de uma base empírica de dados e numa postura objetivista. A modelagem matemática nos leva ao plano do idealismo epistemológico e ao afastamento, por desnecessária, da realidade empírica. Modelagens matemáticas lidam sempre com entes de razão e não com dados de realidade empírica. Situações semelhantes podem ser encontra-das na área financeira, particularmente com a aproximação que se vem dando nos últimos vinte anos entre finança empresarial (corporate finance) e o universo conceitual e analítico da economia. Há prêmios Nobel recentemente concedidos a obras que não são necessariamente econômicas, mas que se caracterizam pela sua aplicabilidade e pela sua capacidade de produzir instrumentos de análise ao gestor financeiro.

Se atentarmos para a área comercial (marketing e vendas), recursos humanos e algumas abordagens organizacionais, verificaremos que, dependendo do design

da pesquisa, será adequada uma metodologia de tipo neopositivista, especialmen-te se for respaldada por fundamentações especialmen-teóricas de tipo funcionalista ou marxis-ta, que têm em comum o realismo e a objetividade do ponto de vista epistemológico.

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envolvem análise cultural a partir de uma perspectiva simbólico-interacionista, cuja realidade e significado se constroem socialmente. Não se pode recusar à etnometodologia um lugar de destaque, se as opções mencionadas forem adotadas pelo pesquisador. Mas, independentemente de tudo o que se afirmou, é um fato de nossa produção científica em administração no Brasil, que parte substancial dos trabalhos são estudos de caso, ou de um par de casos, que surgem simplesmente depois de uma discutível revisão teórica talvez, state of the art, e não necessaria-mente relacionada com ela; os casos não negam, tampouco confirmam o que as teorias apresentam, mas há o consenso de que aquilo é o que se pode produzir a partir das limitações que o pesquisador enfrenta, tanto de tempo como de recursos materiais para a pesquisa, como também considerando as limitações intelectuais do mestrando ou doutorando.

Do exposto, a conclusão que se pode tirar para teses de mestrado profissionalizante é que o estado da produção científica em administração em nosso país e a diversidade e a própria inconsistência científica da área de adminis-tração recomendam que se adote uma postura de tolerância e humildade. Não se leia aqui leniência em compactuar com maus trabalhos. É possível produzir óti-mas e péssióti-mas teses de mestrado profissionalizante, adotando qualquer das abor-dagens metodológicas disponíveis. O apelo à tolerância é para que se evite intransigência, arrogância e pretenso rigor e exatidão numa área onde tais atitu-des não são cabíveis. A eliminação da leniência é feita em nome da exigência de qualidade, que deve estar presente em todas as teses, profissionalizantes ou aca-dêmicas.

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dados que conseguiu levantar junto ao cliente, no ambiente de negócios em que o cliente atua e incluindo sua capacidade interpretativa e explicativa, fazendo uso de teorias e modelos e da sua própria experiência. Se isto tudo chegar a bom termo, é a hora da terapia, ou seja, ninguém busca o clínico, se não for para livrar-se de livrar-seus males e sofrimentos. Nenhuma empresa contratará consultores, livrar-se não quiser ter os seus problemas solucionados. As recomendações do consultor costu-mam sempre ser esperadas com maior ansiedade do que suas interpretações, pois estas podem até mesmo desagradar ao cliente, a ponto de resistir em aceitá-las. Mas nunca se deixa de prestar atenção no que se prescreve como solução ou terapia para os problemas enfrentados.

Como se pode constatar, a estruturação de uma tese profissionalizante no for-mato de um relatório de consultoria não pode ser descartada como inadequada. Acredito que freqüentemente poderia ser até recomendável, pois estará mais pró-xima do universo do mestrando, que é um profissional, ou tornar-se-á em breve e, portanto, tem origem num mundo em que o mestrando vive ou viverá dentro em pouco.

Um aspecto muito importante de nossas teses de mestrado é a do espaço e da importância que se conferirão à revisão teórica, ou pomposamente ao estado-da-arte”. Não nos esqueçamos de que programas de mestrado acadêmico entre nós listam, em seus regimentos ou material de divulgação, que uma revisão da litera-tura ou apresentação do estado-da-arte sobre determinado tópico pode ser aceita como tese de mestrado. Se isto vale para a academia, e tem tanta importância, o que se pode dizer de uma tese num mestrado profissionalizante? Acredito que pode ser igualmente aceitável. Mas em geral nos sentimos um pouco decepciona-dos, quando algum orientado nos aparece querendo fazer apenas uma revisão da literatura. Gostaríamos de um pouco mais de ambição, ou que o tal estado-da-arte fosse pelo menos algo publicável como um capítulo dos Handbooks que nos che-garam ao longo de três décadas e pouco. O Handbook of Organizations, coorde-nado por James G. March nos anos sessenta, ou o recente Handbook of Organization Studies, coordenado por Stewart R. Clegg, Cynthia Hardy e Walter R. Nord. Fora isto, a decepção não é facilmente controlável e a auto-estima de orientador e orientado pode despencar.

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dou-torados como os graus efetivamente acadêmicos e os mestrados como corredor de passagem e adicionalmente constrangido pela desejabilidade do doutorado dire-to, caso o candidato tenha maturidade e condições de saltar o mestrado. Portanto a revisão da literatura deve ser exigida com rigor, pois ela é parte importante do aprendizado em mestrados em que o total de créditos que se obtém em cursos anda ao redor de 30, ou seja, raramente mais de dez cursos.

Mas que a revisão da literatura não seja uma péssima, truncada e tediosa repe-tição do que pode ser mais bem entendido pela leitura direta dos autores e teorias revistos. A revisão da literatura tem de conter algo de crítico, tem de ser transmi-tida em linguagem e pulsação intelectual, que é a do mestrando, onde fique real-mente demonstrado que a literatura revista foi absorvida e o que está sendo revis-to é relevante para o tema da tese da qual é parte integrante. A revisão não deve repetir literalmente o que os autores revistos já escreveram, nem deve conter mui-tas citações. Cumpre seja feita numa linguagem concisa, e que seja do autor da tese, nunca dos autores revistos.

A escolha do tema é certamente a parte menos problemática de ser tratada em cotejo com uma tese de mestrado acadêmico. Já se disse no início desta colocação que o compromisso da tese acadêmica pode, mas não deve necessariamente ser como a produção científica. Já o mestrado profissionalizante se volta ao mundo da gestão, da prática ou da aplicabilidade. Isto é particularmente importante numa área, onde a aplicabilidade tem sido vista quase universalmente como sua predo-minante e talvez exclusiva característica. No mundo científico talvez nós, admi-nistradores, ou professores de administração, nos surpreendamos ao constatar que não há expectativas com relação a uma ciência da administração, mas há expectativas não só acadêmicas como sociais de que a administração forneça os instrumentos para uma boa prática. Não há dúvida, a maioria das pessoas, espe-cialmente se não forem administradores, concordarão que se há algo que se faz mal é administrar as coisas. Todos querem estados, universidades, prefeituras, empresas, hospitais, polícias, escolas, etc, bem administrados; a maioria, creio, mostrar-se-á insatisfeita com o desempenho administrativo em quase todas essas organizações. Por isso não me parece caber dúvida de que a escolha de tema para uma tese de mestrado profissionalizante há de voltar-se à gestão e não à constru-ção teórica, ou à comprovaconstru-ção ou refutaconstru-ção de hipóteses. Deixem esse mercado para os doutorandos e para os mestrados acadêmicos.

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ativida-des escolares importantes. Entre nós é raro que as pessoas poupem para pagar um mestrado profissional. O mais comum é fazê-lo enquanto empregado de uma or-ganização. Isto é uma realidade nossa que não podemos deixar de reconhecer e que, portanto, justifica o envolvimento da organização com o mestrado profissionalizante de seus membros.

É sempre muito difícil falar ou sugerir algo sobre o que as outras pessoas deve-rão pesquisar e escrever. Mas podemos dizer que o tema deve ligar-se de preferên-cia a problemas organizacionais concretos e envolver sempre uma perspectiva administrativista. Mestrados profissionais, embora não afastem e não devam dei-xar de abordar e ensinar teorias, são afinal programas comprometidos com a gestão de organizações.

Outra consideração que cumpre estar presente na escolha do tema é o que o mestrado significa para o mestrando em vias de se tornar mestre. A idéia de mestrado profissionalizante, especialmente as três miraculosas letras MBA, cons-tituem artigo de importação. No seu país de origem, MBAs, às vezes frenetica-mente, vêm sendo procurados pelo fato de serem patamares decisivos nas carrei-ras das pessoas. O cotejo entre salários antes e depois de um MBA nos Estados Unidos é enorme, pelo menos para os graus conferidos pelas principais escolas de administração de negócios. No Brasil não creio o grau tenha essas mesmas carac-terísticas; os salários não estão inevitavelmente atrelados à posse de um MBA. Na verdade os empregadores entre nós não parecem ter noção muito clara do que seja um mestrado, pós-graduação lato sensu e mestrados profissionais. Cabe ain-da às universiain-dades um trabalho de informar ao mercado e aos potenciais com-pradores exatamente o que o produto é, e fornecer juntamente com a mercadoria um Manual do Usuário. Isto todavia não deve impedir que se atente para o fato de que as pessoas buscam programas de pós-graduação e especialmente mestrados profissionais, porque acreditam que tais graus, e a experiência universitária que obtém, os tornem mais capazes individualmente e dotados de um diferencial com-petitivo no mercado de trabalho, mercado este, repete-se à fadiga, torna-se cada dia mais difícil, cruel e competitivo. Na escolha do tema de uma tese de mestrado profissional, é portanto razoável que o candidato busque um tema que o ajude em sua carreira; isto não implica necessariamente conflitos com outras característi-cas que uma boa tese deve possuir.

A distinção entre teoria e prática entre academia e mercado de trabalho é fugaz e nublada em administração, área que todos reconhecem é hoje ainda mais uma prática do que ciência ou conjunto razoavelmente articulado de teorias. Mesmo assim, é bom advertir os professores que tenham tido sua experiência docente em

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Referências

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