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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA DE POLÍTICAS PÚBLICAS E GOVERNO ANDREA SERRANO DE MELLO-PEREIRA

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ESCOLA DE POLÍTICAS PÚBLICAS E GOVERNO

ANDREA SERRANO DE MELLO-PEREIRA

AÇÕES ADOTADAS PELO GOVERNO BRASILEIRO PARA COMBATER O ZIKA VÍRUS E A SUA CONSEQUÊNCIA, A SÍNDROME CONGÊNITA, À LUZ DO CICLO

DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DA ANÁLISE DE DISCURSOS

BRASÍLIA 2021

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AÇÕES ADOTADAS PELO GOVERNO BRASILEIRO PARA COMBATER O ZIKA VÍRUS E A SUA CONSEQUÊNCIA, A SÍNDROME CONGÊNITA, À LUZ DO CICLO

DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DA ANÁLISE DE DISCURSOS

Dissertação apresentada à Escola de Políticas Públicas e Governo da Funda- ção Getúlio Vargas como requisito para obtenção do título de mestre em Políticas Públicas e Governo.

Área de concentração: Políticas Públicas e Governo

Orientador: Prof. Dr. Weeberb João Réquia Júnior

BRASÍLIA

2021

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consequência, a síndrome congênita, à luz do ciclo de políticas públicas e da análise de discursos / Andrea Serrano de Mello-Pereira. – 2021

69 f.

Orientador: Weeberb João Réquia Júnior.

Dissertação (mestrado MPPG) - Fundação Getulio Vargas, Escola de Políticas Públicas e Governo.

1. Políticas públicas - Brasil. 2. Saúde pública - Brasil. 3. Vírus da Zika. 4.

Microcefalia. 5. Política de saúde. I. Réquia Júnior, Weeberb João. II. Dissertação (mestrado MPPG) – Escola de Políticas Públicas e Governo. III. Fundação Getulio Vargas. IV. Título.

CDU: 614(81)

Ficha Catalográfica elaborada por: Isabele Oliveira dos Santos Garcia CRB SP-010191/O Biblioteca Karl A. Boedecker da Fundação Getulio Vargas - SP

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AÇÕES ADOTADAS PELO GOVERNO BRASILEIRO PARA COMBATER O ZIKA VÍRUS E A SUA CONSEQUÊNCIA, A SÍNDROME CONGÊNITA, À LUZ DO CICLO

DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DA ANÁLISE DE DISCURSOS

Dissertação apresentada à Escola de Políticas Públicas e Governo da Funda- ção Getúlio Vargas como requisito para obtenção do título de mestre em Políticas Públicas e Governo.

Área de concentração: Políticas Públicas e Governo

Data de aprovação: 09/12/2021.

Prof. Dr. Weeberb João Réquia Júnior Orientador

FGV - EPPG

Prof.ª Dr.ª Hadassah Santana FGV - EPPG

Prof. Dr. Carlos Frederico C. de Albuquerque e Melo

UnB / OPAS

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A Deus por me proporcionar perseverança durante toda a minha vida.

Aos meus pais, Sérgio e Alcenira, pelo apoio e incentivo que serviram de alicerce para as minhas realizações.

Aos meus irmãos Jú e Gabi, pela amizade e atenção dedicadas quando sempre precisei.

Ao meu amado marido Neto, pelo seu amor incondicional e por compreender minha dedicação ao projeto de pesquisa.

Ao meu professor orientador Dr. Weeberb João Réquia Júnior e ao meu querido colega Carlóis, pelas valiosas contribuições dadas durante todo o processo.

A todos os meus colegas e amigos da OPAS, do Ministério da Saúde e da FGV que compartilharam dos inúmeros desafios que enfrentamos, sempre com o espírito colaborativo.

Também quero agradecer à Escola de Políticas Públicas e Governo da Fundação Getulio Vargas e o seu corpo docente que demonstrou estar comprometido com a qualidade e excelência do ensino.

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Ao final de 2015, a Declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacio- nal (ESPIN), pelo Ministério da Saúde brasileiro foi resultado de ampla investigação pelo aumento de casos reportados de microcefalia, que identificou o Zika vírus como causa.

Esse evento levou o governo brasileiro a formular um plano de resposta, contando com as contribuições de diversos profissionais de saúde, nacional e internacionalmente. O problema em questão oferece uma oportunidade de análise de um caso prático, dentro da teoria do ciclo de políticas públicas e da análise de discursos e é relevante pois permite o aprendizado por meio da experiência e do apoio de ferramentas teóricas e analíticas. Este trabalho busca responder como o ciclo de políticas públicas e análise de discurso podem ser utilizados para a avaliação das medidas de ações do governo federal para o controle do Zika vírus e da síndrome congênita. Considerou-se a hipótese de que as abordagens relacionadas ao ciclo de políticas públicas e análise de discurso podem servir para uma avaliação das políticas públicas. As ações do governo foram exploradas dentro de duas abordagens: uma análise da emergência do Zika vírus dentro do conceito ferramental do ciclo de políticas públicas; e uma análise qualitativa de diferentes discursos, apoiada no uso de uma ferramenta de análise textual multi- dimensional (IRAMUTEQ). Dentre os achados, observou-se que o Zika vírus ganhou um espaço prioritário na agenda governamental com a comoção gerada a partir da suspeita de seu vínculo causal com a microcefalia. Assim, os processos pré-decisórios e de formação de agenda tiveram um papel relevante na priorização desse tema dentro do debate público e político entre 2015 e 2016. Também há similaridade e dissonância entre discursos, primariamente com os diferentes discursos se assemelham tendo como ponto central o Zika vírus e as políticas públicas adotadas para tratar desse problema. De forma secundária, nota-se os termos relacionados à síndrome congênita e às questões sociais, sugerindo que as políticas públicas adotadas para tratar esses problemas específicos não ocuparam um lugar central dentro das ações adotadas pelo governo durante a emergência. Esse trabalho, portanto, contribui na construção de respostas em futuras emergências de saúde pública no Brasil, visto que as abordagens relacionadas ao ciclo de políticas públicas e análise de discurso aqui apresentadas servem como uma avaliação da eficiência e da qualidade das políticas públicas.

Palavras-chave: Zika vírus. Síndrome congênita. Microcefalia. Emergência em saúde.

Saúde pública. Políticas públicas. Epidemia. Ciclo de políticas públicas.

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By the end of 2015, the Public Health Emergency Declaration of National Importance (ESPIN) by the Ministry of Health was the result of extensive investigation into the increase in reported cases of microcephaly, which identified Zika virus as a cause. This event led the Brazilian government to formulate a response plan, with contributions from various health professionals, nationally and internationally. This problem offers an opportunity to analyze a practical case, within the theory of the public policy cycle and discourse analysis, and it is relevant as it allows learning through experience and the support of theoretical and analytical tools. This work aims to answer how the public policies cycle and discourse analysis can be used to assess the measures taken by the government to control Zika virus and the congenital syndrome. We considered as hypothesis that the approaches related to public policy cycle and discourse analysis can serve to assess public policies. The government’s actions were analyzed within two approaches: an analysis of Zika virus emergence within the tooling concept of the policy cycle; and a qualitative analysis of different discourses, supported by the use of a multidimensional textual analysis tool (IRAMUTEQ). Among the findings, we observed that Zika virus gained priority on the government agenda with the commotion generated from the suspicion of its causal link with microcephaly. Thus, the pre-decision and agenda-setting processes played a relevant role in prioritizing this issue within the public and political debate between 2015 and 2016. There is also similarity and dissonance between discourses, primarily with the different discourses being similar, having the Zika virus and the public policies adopted to address this problem as a pivotal point. Secondarily, the terms related to the congenital syndrome and social issues are noted, suggesting that the public policies adopted to deal with these specific problems did not occupy a key role within the actions taken by the government during the emergency. This work, therefore, contributes to the construction of responses in future public health emergencies in Brazil, as the approaches related to the public policy cycle and discourse analysis presented here serve as an assessment of the efficiency and quality of public policies.

Keywords:Zika virus. Congenital syndrome. Microcephaly. Health emergency. Public health. Public policy. Epidemic. Public policy cycle.

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Figura 1 – Ciclo de políticas públicas na emergência do Zika vírus . . . 44

Figura 2 – Nuvem de palavras do conjunto de artigos analisados . . . 45

Figura 3 – Grafo de similitude . . . 47

Figura 4 – Classificação Hierárquica Descendente - Classes . . . 48

Figura 5 – Classificação Hierárquica Descendente - Composição . . . 48

Figura 6 – AFC - Agrupamento por atores . . . 51

Figura 7 – Nuvem de palavras - Grupo: Especialistas internacionais e Ministério da Saúde . . . 52

Figura 8 – Nuvem de palavras - Grupo: Especialistas nacionais e academia . . 52

Figura 9 – AFC - Agrupamento por ano de publicação . . . 54

Figura 10 – Nuvem de palavras - Grupo: anos 2015 a 2018 . . . 55

Figura 11 – Nuvem de palavras - Grupo: anos 2019 a 2021 . . . 55

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Quadro 1 – A saúde na Constituição Federal de 1988 . . . 18 Quadro 2 – Grifos relativos à legislação que estabelece o SUS . . . 21 Quadro 3 – Políticas públicas adotadas na emergência do Zika vírus – Plano

Nacional de Enfrentamento Microcefalia: três eixos principais . . . 42 Quadro A.1 – Artigos selecionados para a amostra . . . 65

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1 INTRODUÇÃO . . . . 10

1.1 Contextualização, justificativa e hipótese . . . 10

1.2 Objetivos . . . 13

1.2.1 Objetivo Geral . . . 13

1.2.2 Objetivos Específicos . . . 13

2 REFERENCIAL TEÓRICO . . . . 14

2.1 Políticas Públicas e o seu ciclo . . . 14

2.2 Análise de discurso e de conteúdo como ferramenta . . . 15

2.3 Políticas Públicas em Saúde no contexto brasileiro . . . 16

2.3.1 O Sistema Único de Saúde . . . 17

2.4 A Emergência do Zika Vírus . . . 22

3 METODOLOGIA . . . . 25

3.1 Etapa 1: definição da informação a ser coletada . . . 25

3.2 Etapa 2: contextualização do tema dentro do ciclo de políticas públicas . . . 26

3.3 Etapa 3: seleção dos atores mais relevantes . . . 27

3.4 Etapa 4: análise e interpretação da informação adquirida. . . 29

4 RESULTADOS . . . . 30

4.1 O enfrentamento do Zika vírus dentro do ciclo de políticas públicas 30 4.1.1 Identificação do problema . . . 31

4.1.2 Formação da agenda . . . 35

4.1.3 Formulação de alternativas . . . 37

4.1.4 Processo decisório . . . 39

4.1.5 Implementação . . . 40

4.1.6 Avaliação . . . 43

4.1.7 Extinção . . . 43

4.2 Análise de dados textuais sobre as diferentes perspectivas do tema 44 5 CONCLUSÕES . . . . 57

REFERÊNCIAS . . . . 60

APÊNDICE A – AMOSTRA DE ARTIGOS PARA A ANÁLISE DE DISCURSO . . . . 64

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1 INTRODUÇÃO

1.1 Contextualização, justificativa e hipótese

O Zika vírus foi identificado pela primeira vez em macacos e isolado na Uganda, no ano de 1947 (BROGUEIRA; MIRANDA, 2017). Mais de 20 anos depois, casos esporádicos foram reportados em países africanos e do sudeste asiático, sendo o primeiro surto do vírus em 2007, na Micronésia. Sete anos depois, em 2014, diversos surtos começaram a ocorrer nas ilhas do Pacífico, até chegar à parte continental da América do Sul (WHO, 2016a).

No Brasil, o primeiro aumento significativo de casos foi reportado em maio de 2015. Em outubro desse mesmo ano, a Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco notificou ao Ministério da Saúde o aumento de casos de microcefalia, distúrbio neuroló- gico no qual o cérebro da criança não se desenvolve completamente. Em novembro de 2015 foi declarada a Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN), devido ao aumento atípico de casos de microcefalia.

Estima-se que, de 2015 ao início de 2016, foram expostas ao vírus entre 500.000 e 1,5 milhão de pessoas no Brasil (HUMAN RIGHTS WATCH, 2017). Oliveira (2017, p.

67) explica a dificuldade da precisão na estimativa de casos em 2015, com o número limitado de testes disponibilizados a cada estado, além dos casos do alto número de testes com resultados negativos, o que dificultou a mensuração da magnitude da epidemia. Ainda em janeiro de 2016 foram reportados 4.983 casos de microcefalia, o que alertou a comunidade internacional e engatou a Declaração de Emergência em Saúde Internacional pela OPAS/OMS em fevereiro de 2016 (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2019a; WHO, 2016b).

Segundo a Fiocruz, o Zika vírus é transmitido pelo mosquito Aedes aegypti e pode causar sintomas como dor de cabeça, febre baixa, dores nas articulações, manchas vermelhas na pele, coceira e vermelhidão nos olhos, entre outros. Até o momento, não existe uma vacina ou medicamentos contra Zika, e, por isso, a única forma de prevenção é combater a contaminação através do mosquito.

A associação entre o Zika vírus e a microcefalia foi primeiro alertada por médicos de Pernambuco e mais tarde, em novembro de 2015, investigada e confirmada pelo Ministério da Saúde, através de testes realizados pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fio- cruz). A partir disso, pesquisadores brasileiros lideraram o processo de pesquisas da área, contando com o apoio da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e Orga- nização Mundial da Saúde (OMS) para investigar e classificar os casos reportados, e

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iniciar o trabalho de estruturação de um plano de contingência em resposta à epidemia com capacidade de alcance internacional.

O Ministério da Saúde, dentro do âmbito da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), promoveu a articulação e coordenação da comunidade científica brasileira para rapidamente coletar o máximo de informações disponíveis com o objetivo de mapear o problema e elaborar um plano de contingência. Essa mobilização contou com o apoio de diferentes níveis do Ministério da Saúde, entes federados, além da comunidade científica e internacional. Esses esforços resultaram na detecção e confirmação da causa do aumento da microcefalia. Dessa forma, o Brasil, em conjunto com os outros países da região e com a OPAS/OMS, adotou um plano estratégico de resposta ao surto que envolvia a detecção, a prevenção, o cuidado e apoio e a pesquisa (WHO, 2016c).

Esse plano estratégico entra na seara do desenvolvimento de políticas públicas na saúde, corroborando com o indicado por Oliveira (2016), pois vários trabalhos na área de políticas públicas em saúde ficam no nível de descrição e análise, mas não aplicam as ferramentas de análise próprias do campo de políticas públicas. Esse trabalho utiliza-se justamente das ferramentas de análise do campo de políticas públicas para explicar a emergência do Zika vírus de uma maneira interdisciplinar, valendo- se tanto do arcabouço teórico que pautam as discussões em níveis mais subjetivos, tanto como a experiência empírica das políticas públicas adotadas para responder à emergência do vírus.

Segundo Barata (2013), pode-se analisar as relações entre epidemiologia e políticas públicas como dois lados de uma equação, em que a influência das políticas sociais sobre o perfil epidemiológico está em igual nível com a capacidade da epidemi- ologia de formular, implementar e avaliar políticas públicas. Dessa forma, nota-se como a crise epidemiológica do Zika vírus desencadeou discussões e ações de especialistas da área de saúde que contribuíram para a construção de políticas públicas pensadas a fim de conter a doença.

Assim, levando em consideração a emergência do Zika vírus como pano de fundo, explora-se o estudo de caso, utilizando-se do ferramental do ciclo de políticas públicas. As teorias do ciclo de políticas públicas, conforme sintetizado por Viana (1996), buscam analisar como o Estado opera, traduzido na ação de ‘produzir’ políticas públicas. Assim, essas teorias trazem modelos explicativos para as diferentes fases das políticas públicas. Viana (1996) ainda pontua:

"Assim, os estudos aqui apresentados têm como objetivo construir modelos explicativos para as diferentes fases ou etapas das políticas públicas, isto é, para o processo de decisão inerente à formação e ao desenvolvimento de políticas,(...), procurando apreender a dinâmica que articula as várias fases do ciclo de vida de uma política. Esses

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modelos pretendem, por sua vez, identificar as diferentes variáveis que influenciam as várias etapas do percurso das políticas, assinalando as condições necessárias para que os princípios, os objetivos e as metas de uma ação pública se tomem realidade"(VIANA, 1996).

Considerando o problema exposto, o governo tomou uma série de ações, e, nesse sentido, investiga-se o racional por trás das tomadas de decisão para responder às emergências de saúde pública e as alternativas que podem ser exploradas. Por isso, é relevante compreender, através de um caso prático, como a identificação do problema é feita, as alternativas escolhidas e a implementação realizada; para que dessa forma seja possível aprender e aprimorar a resposta das autoridades governamentais a crises e emergências de saúde pública no contexto brasileiro. Pretende-se, dessa forma responder à pergunta: Como o ciclo de políticas públicas e análise de discurso podem ser utilizados para a avaliação das medidas e ações do governo federal para o controle do Zika vírus e da síndrome congênita 1?

Ademais, exploram-se os diferentes discursos, analisando as publicações de quatro pontos de vista de profissionais vinculados à temática de saúde. A análise textual de discurso permite a compreensão das ideias que estão sendo passadas através da linguagem e termos utilizados, e brinda uma qualidade quantitativa à subjetividade da interpretação dos textos que estão sendo analisados.

A análise do desenvolvimento de políticas públicas, levando em consideração o estudo de caso da emergência em saúde decorrente do Zika vírus pode contribuir para identificar as melhores práticas que podem ser adotadas pelos gestores públicos brasileiros, além de permitir a compreensão da sistemática da tomada de decisão e ações tomadas em um contexto de emergência. Espera-se, dessa forma, contribuir na construção de respostas em futuras emergências de saúde pública no Brasil, a partir da análise desse estudo de caso prático.

A hipótese dessa pesquisa é que que as abordagens relacionadas ao ciclo de políticas públicas e análise de discurso podem servir para uma avaliação da eficiência e da qualidade das políticas públicas, especificamente as políticas públicas que o governo federal brasileiro implantou durante a emergência do Zika vírus e da síndrome congênita.

1 Nesse trabalho, utiliza-se o termo “síndrome congênita” em atenção à atualização da terminologia utilizada por profissionais da saúde, que leva em consideração outros distúrbios neurológicos, além da microcefalia, que tem como causa a infecção pelo Zika vírus. Não obstante, a investigação e análise deste trabalho concentra-se, em sua maior parte, na fase emergencial do Zika vírus, quando apenas a microcefalia era vinculada ao vírus em questão.

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1.2 Objetivos

1.2.1 Objetivo Geral

O objetivo geral é analisar os diferentes discursos acerca da avaliação das políticas públicas adotadas durante a emergência do Zika vírus no Brasil, a partir do plano de contingência, levando em consideração o alcance internacional do problema.

1.2.2 Objetivos Específicos

I. Identificar os pontos principais dos discursos entre os diferentes agentes na emergência do Zika vírus;

II. Compreender como esses discursos se relacionam e influenciam a tomada de decisão frente às políticas públicas da emergência do Zika vírus;

III. Analisar como as respostas ao surto do Zika vírus se enquadram nas diferentes fases do ciclo de políticas públicas que foram pensadas para o enfrentamento dessa crise; e

IV. Avaliar a composição dos discursos dos agentes, de forma a identificar simila- ridades e diferenças entre os mesmos bem como o fluxo das políticas públicas relativas ao Zika vírus e seus desdobramentos.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Políticas Públicas e o seu ciclo

Destacam-se quatro autores considerados os “pais fundadores” das teorias de políticas públicas: H. Laswell, H. Simon, C. Lindblom e D. Easton. Laswell (1962) apresenta o termopolicy analysis(análise de política pública) nos anos 30, como forma de agrupar o conhecimento científico com a experiência empírica dos governos, e como maneira de levar o diálogo entre cientistas sociais, grupos de interesse e governo.

Simon (1966) trouxe o conceito de “racionalidade limitada” dos decisores públicos (policy makers), explicando que a limitação da racionalidade poderia ser minimizada pelo conhecimento racional.

A racionalidade dos decisores públicos, para Simon, é limitada por problemas tais como informação imperfeita, interesses próprios, tempo para a tomada de decisão, entre outros. Entretanto, segundo o autor, a racionalidade pode ser maximizada até um ponto satisfatório, através da elaboração de estruturas (conjunto de regras e incentivos) que emoldure o comportamento dos atores na direção de resultados desejados, impedindo até mesmo a busca pela maximização de interesses próprios.

Lindblom (1968) indagou a ênfase no racionalismo de Laswell e Simon, suge- rindo a inclusão de outras variáveis na formulação e na análise de políticas públicas, tais como as relações de poder e a integração entre as diferentes fases do processo decisório. Dessa maneira, as políticas públicas necessitariam incorporar outros elemen- tos a sua formulação e à análise além das questões de racionalidade, assim como o papel dos grupos de interesse, das burocracias, dos partidos e das eleições.

Easton (1965) prestou suas contribuições para a área ao explicar a política pública como um sistema. Dessa maneira, o seu entendimento é que a política pública poderia ser compreendida como a relação entre formulação, resultados e o ambiente.

De acordo com Easton, políticas públicas recebem contribuições dos grupos de in- teresse, dos partidos políticos, da mídia e, que, por conseguinte, influenciam seus resultados e consequências.

Para além da base fundadora, destaca-se o trabalho de Kingdon (1995), espe- cialmente acerca dos processos pré-decisórios na formulação de políticas públicas;

ou seja, o que faz com que uma situação seja considerada um problema assim como o que entra e o que fica de fora da agenda. Assim, o autor explora porque a agenda é composta de uma determinada maneira, e como alguns temas são priorizados em detrimento de outros, destacando que, o reconhecimento e a definição dos problemas

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afetam significativamente seus resultados.

Dessa maneira, as teorias utilizadas para compreender os tipos e fases de políticas públicas partem dessa linha de base, e apresentaremos ainda nessa seção tais autores, que introduzem modelos de formulação e análise de políticas públicas e tipologias de avaliação quanto ao impacto dessas políticas.

Assim, alguns modelos explicativos foram pensados com o objetivo de identificar e classificar as diversas interações entre a sociedade e a política, as relações de poder e seus impactos no reconhecimento de problemas e formação da agenda; os ganhos políticos a partir dos caminhos escolhidos, e por fim, a análise a partir dos impactos que determinadas políticas causam no meio em que estão inseridas.

2.2 Análise de discurso e de conteúdo como ferramenta1

Considerando a análise qualitativa de textos, existem algumas abordagens que subsidiam a sua interpretação, lançando mão de métodos para facilitar e categorizar o entendimento. Dentro dessas abordagens, destacam-se a análise de discurso e a análise de conteúdo. Na Análise de Discurso (AD), o estudo se aprofunda no uso da linguagem dentro de e entre grupos específicos de indivíduos. No Brasil, a escola teórica mais difundida é a de tradição francesa, sendo o seu precursor o filósofo Michel Pêcheux. Essa abordagem possibilita a ponderação entre a ideologia e a língua, e nesse sentido, Caregnato e Mutti (2006) resumem:

"(...) A AD trabalha com o sentido e não com o conteúdo do texto, um sentido que não é traduzido, mas produzido; (...) Portanto, na AD a linguagem vai além do texto, trazendo sentidos pré-construídos que são ecos da memória do dizer (...)."

A Análise de Conteúdo (AC), por outro lado, concentra-se nas palavras e termos utilizados e sua frequência, categorizando os termos utilizados por classes e fazendo inferências de acordo com essas repetições. A principal referência em análise de conteúdo citada por trabalhos que abordam essa disciplina é a autora Laurence Bardin.

Em suma, a técnica também é definida por Caregnato e Mutti (2006) como:

"A definição da AC em 1943 era como sendo ’a semântica estatística do discurso político’. A AC pode ser quantitativa e qualitativa. Existe uma diferença entre essas duas abordagens: na abordagem quantitativa se traça uma frequência das características que se repetem no conteúdo do texto. Na abordagem qualitativa se ’considera a presença ou a ausência de uma dada característica de conteúdo ou conjunto de características num determinado fragmento da mensagem’."

1 A ferramenta utilizada como análise de conteúdo nesse trabalho é osoftwareIRAMUTEQ, introduzido nas subseções 3.3 e 3.4 da metodologia

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As autoras ainda explicam que:

"A maioria dos autores refere-se à AC como sendo uma técnica de pesquisa que trabalha com a palavra, permitindo de forma prática e objetiva produzir inferências do conteúdo da comunicação de um texto replicáveis ao seu contexto social. Na AC o texto é um meio de expres- são do sujeito, onde o analista busca categorizar as unidades de texto (palavras ou frases) que se repetem, inferindo uma expressão que as representem"(CAREGNATO; MUTTI, 2006).

Tendo em conta essas distinções, a metodologia utilizada no presente trabalho se apoia numa ferramenta que utiliza essencialmente a abordagem da análise de conteúdo para permear as interpretações das publicações e discursos selecionados.

2.3 Políticas Públicas em Saúde no contexto brasileiro

Partindo de um ponto vista institucionalista-histórico, Abrucio (1998) afirma que que o estabelecimento da federação brasileira, na Constituição Federal de 1891, decorre de um movimento, iniciado ainda no Império, necessário à manutenção da unidade do território e, concomitantemente, à autonomia política dos entes.

Contrariamente ao processo de formação da federação norte-americana – em que as unidades territoriais, organizadas em uma confederação, acreditaram que a união entre si seria uma forma de defesa comum, as elites brasileiras compreenderam que a continuidade do atendimento de seus interesses dependia da autonomia política local, bem como do controle do respectivo processo político. Isso traz oportunidade de determinarem as regras do jogo e garantirem que os governadores – antes indicados pela corte e denominados presidentes de províncias – conformariam seus pleitos.

Nas palavras de Pierson (1995), o federalismo é um tipo particular de arranjo institucional que importa para o desenvolvimento da política pública e cuja importância se mede pelo tipo de federalismo adotado e de como as instituições – que determinam as regras do jogo e afetam as capacidades estatais – estão imbricadas em um contexto político particular.

Para o autor, no que tange ao desenvolvimento de políticas sociais, é relevante a presença de três características institucionais do federalismo: (a) a reserva de poderes específicos às unidades constituintes; (b) a forma de representação dos interesses das várias camadas no centro; (c) e a extensão do compromisso com a equalização fiscal entre as unidades constituintes, o que ratifica que não é apenas o federalismo que importa, mas o tipo específico de federalismo (PIERSON, 1995).

No caso brasileiro, a partir da CF/1988, o federalismo adquire contornos bem definidos, em relação às reservas de poder de que gozam os entes da federação e do

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papel desempenhado por cada um, sendo a independência e a autonomia da União, dos Estados e dos munícipios traços característicos da organização político-administrativa do Brasil.

Entretanto, apesar da ausência de hierarquia entre os entes da federação, é evidente que à União e aos Estados compete a coordenação das políticas públicas e do orçamento necessário à sua execução, ainda que, na norma, os municípios gozem de prerrogativas equivalentes e tenham sua autonomia resguardada.

Na prática, os municípios carecem de capacidades administrativas instaladas, o que resvala em um esforço, seja dos demais entes ou das instituições, de coordenação e de cooperação, com vistas à implantação, descentralizada, das políticas públicas nos territórios. Abrucio e Grin (2018) sintetizam:

"Desde 1988 a Constituição e as leis subsequentes confirmaram a autonomia e a responsabilidade pela implementação de boa parte das políticas públicas para os municípios, só que a grande maioria tem baixa capacidade administrativa e gerencial para tal. Mas como em sistemas federais autoridades centrais coexistem com autoridades subnacionais, suas ações são altamente interdependentes, mas de forma frequente apenas modestamente coordenadas (PIERSON, 1995;

STEPAN, 1999)".

Sob essa perspectiva e objetivando exemplificar os desafios inerentes à implan- tação das políticas públicas, em um contexto de alta descentralização que, concomitan- temente, exige dos entes da federação a pactuação de acordos de cooperação e alto grau de coordenação, com vistas ao atendimento regionalizado da população, passa-se à análise do Sistema Único de Saúde (SUS).

2.3.1 O Sistema Único de Saúde

O SUS foi implantado, no Brasil, em 19 de setembro de 1990, data da publicação e início da vigência da Lei nº 8.080/1990, também conhecida como Lei Orgânica da Saúde. Não obstante, a CF/1988 havia pavimentado o caminho para a implantação do SUS, ao definir a saúde como um direito social e ao prever, nos artigos seguintes, as competências de cada ente da federação para legislar sobre o assunto e implantar a política pública (BRASIL, 1988, art. 6º). O texto inclusive estabelece que as ações e os serviços devem integrar uma rede regionalizada, hierarquizada, descentralizada e customizada na medida das especificidades do território (BRASIL, 1988, art. 198).

No Quadro 1, é possível visualizar, resumidamente, os artigos que tratam da saúde na CF/1998 e como refletem o que o constituinte, à época, entendeu ser o desenho de federação mais adequado ao Brasil pós-ditadura.

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Quadro 1 – A saúde na Constituição Federal de 1988

Competências Intervenção Seguridade Social e Saúde

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

(...)

II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar

concorrentemente sobre:

(...)

XII - previdência social, proteção e defesa da saúde;

Art. 30. Compete aos Municípios:

(...)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:

(...)

VII - assegurar a observância

dos seguintes princípios constitucionais:

(...)

e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.

Art. 35. O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios localizados em Território Federal, exceto quando: (...)III - não tiver sido aplicado o mínimo exigido da receita municipal na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde;

Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

(...)

VI - diversidade da base de financiamento, identificando-se, em rubricas contábeis específicas para cada área, as receitas e as despesas vinculadas a ações de saúde, previdência e assistência social, preservado o caráter contributivo da previdência social;

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

(...)

§ 2º A proposta de orçamento da seguridade social será elaborada de forma integrada pelos órgãos responsáveis pela saúde, previdência social e assistência social, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias, assegurada a cada área a gestão de seus recursos.

(...)

§ 10. A lei definirá os critérios de transferência de recursos para o sistema único de saúde e ações de assistência social da União para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, e dos Estados para os Municípios, observada a respectiva contrapartida de recursos.

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I - Descentralização, com direção única em cada esfera de governo;

(...)

§ 3º Lei complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá:

(...)

II - os critérios de rateio dos recursos da União vinculados à saúde destinados aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, e dos Estados destinados a seus respectivos Municípios, objetivando a progressiva redução das disparidades regionais;

(...) Fonte: Grifos e elaboração próprios

(20)

Em relação às competências específicas do SUS, a Constituição as define no art. 200, indo do controle e da fiscalização de procedimentos, até a participação da formulação da política pública de saúde em si. Antes disso, porém, delimita as competências dos entes da Federação, deixando claro sua autonomia na execução dos recursos, sem perder de vista a hierarquização da organização da federação brasileira, em que os entes podem sofrer intervenção, na hipótese de inobservância dos princípios constitucionais.

Nesse contexto, Menicucci e Marques (2016) discutem a questão da cooperação entre União, Estados e municípios e o desafio da respectiva coordenação, a partir do arranjo do SUS e da pressuposição de que autonomia e interdependência são características intrínsecas ao federalismo. Isso sem deixar de considerar a cooperação e certo grau de interferência entre os entes, que visa a garantir a atuação homogênea – ainda que, talvez, apenas no nível legal – e à plena execução das políticas em geral.

Sob o ponto de vista legal, a CF/1988, em seu art. 6º, prevê que a saúde é um direito social, indicando, no art. 24, que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre a defesa da saúde. Sendo a atuação da União, no bojo da legislação concorrente, limitada ao estabelecimento de normas gerais, aos Estados compete legislar complementarmente, nos termos do §1º do art. 24, cabendo aos munícipios a prestação de serviços de atendimento à saúde da população, mediante cooperação técnica e financeira da União e do Estado, cf. art. 30, inciso I.

Percebe-se que, no que tange à sua organização e funcionamento, o SUS espelha a federação, na medida em que também é altamente hierarquizado, com funções e procedimentos definidos conforme grau de complexidade. Ainda segundo Menicucci e Marques (2016), na prática, a regionalização da rede é aspecto da política que carece ser desenvolvida, posto que há questões que vão além da esfera municipal de decisão. Desde a CF/1988, a descentralização dos recursos valorizou o papel dos municípios, enfraquecendo os Estados e criando um ambiente propício à competição predatória entre os entes – o denominado municipalismo autárquico.

Em 1990, com a publicação da Lei nº 8.080, ao SUS se atribuiu, no art. 4º, a definição de “conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público” (BRASIL, 1990). Essa definição ratificou o objetivo do constituinte em tornar universal a política pública de saúde, a partir da descentralização da prestação do serviço, regionalizando-o conforme as necessidades do território, mantendo-se a hierarquia entre as instituições e, principalmente, os entes da federação.

Adicionalmente, no intuito de corrigir possíveis distorções da política, dado seu caráter de extrema complexidade, foi feita a publicação do Pacto da Saúde pelo

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Ministério da Saúde, conforme Portaria nº 399/2006, entre outras ações anteriores (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2006). O documento objetivou a promoção de um conjunto de reformas institucionais do SUS, sob pactuação entre os três entes da federação (intergestores) e redefinição das responsabilidades de cada um na execução da política (CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, 2006).

A referida Portaria, vigente desde então, ao aprovar as Diretrizes Operacionais do Pacto pela Saúde, definiu seus três componentes: Pactos Pela Vida, em defesa do SUS e de Gestão. No que tange mais especificamente à gestão, o pacto promove a descentralização, o reforço da territorialização da saúde com vistas e a instituição de colegiados de gestão regional (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2006). Percebe-se um movimento em prol de um sistema que se organiza contratualmente, no sentido do estabelecimento de atividades a executar e de seus respectivos responsáveis e da busca por maior efetividade e eficiência na prestação e na gestão dos serviços.

No que diz respeito aos repasses federais, a adesão ao Pacto é uma condi- ção para que Estados e municípios os recebam, denotando a regulação da política pública pela União e a hierarquização dos papeis desempenhados por cada um, mas sem perder de vista o fato de o arranjo favorecer a cooperação, a negociação e o compartilhamento de decisões entre os partícipes. Com a regulamentação da Lei nº 8.080/1990 (BRASIL, 1990) pelo Decreto nº 7.508/2011 (BRASIL, 2011), o SUS passa a ser constituído:

"pela conjugação das ações e serviços de promoção, proteção e recu- peração da saúde executados pelos entes federativos, de forma direta ou indireta, mediante a participação complementar da iniciativa privada, sendo organizado de forma regionalizada e hierarquizada"(BRASIL, 2011).

A articulação interfederativa e intergestores, a pactuação, a assinatura de acor- dos de colaboração e a definição de critérios e diretrizes pelo Ministério da Saúde evidenciam o caráter cooperativo do sistema e o desafio de coordenação enfrentado por 5570 municípios, 26 Estados e o Distrito Federal, além da própria União. Alguns dos principais pontos estão presentes no Quadro 2.

O Relatório de Gestão do Ministério da Saúde – 2019 registrou a utilização do serviço de saúde pública por mais 70% da população brasileira; e a realização de 9.647.928 exames laboratoriais, 2.751.422 consultas, 819.507 procedimentos ambulato- riais e 99.021 cirurgias (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2019b) – números que demonstram que o intento da universalização da saúde permanece em construção, em se conside- rando o número absoluto da população brasileira, qual seja: 212.329.394 de pessoas em 2020 (IBGE, 2020).

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Quadro 2 – Grifos relativos à legislação que estabelece o SUS

Lei nº 8.080/1990 Portaria nº 399/2006 Decreto nº 7.508/2011

(...)

Art. 4º O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema Único de Saúde (SUS).

(...)

Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:

I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;

II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema;

(...)

IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo:

a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios;

b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde;

X - integração em nível executivo das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico;

XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência à saúde da população;

(...)

Art. 8º As ações e serviços de saúde, executados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), seja diretamente ou mediante participação complementar da iniciativa privada, serão organizados de forma regionalizada e hierarquizada em níveis de complexidade crescente.

(...)

I – O PACTO PELA VIDA:

O Pacto pela Vida está constituído por um conjunto de compromissos sanitários, expressos em objetivos de processos e resultados e derivados da análise da situação de saúde do País e das prioridades definidas pelos governos federal, estaduais e municipais.

Significa uma ação prioritária no campo da saúde que deverá ser executada com foco em resultados e com a explicitação inequívoca dos compromissos orçamentários e financeiros para o alcance desses resultados.

(...)

II – O PACTO EM DEFESA DO SUS:

O Pacto de Gestão estabelece as responsabilidades claras de cada ente federado de forma a diminuir as competências concorrentes e a tornar mais claro quem deve fazer o quê, contribuindo, assim, para o fortalecimento da gestão compartilhada e solidária do SUS.

(...)

III – O PACTO DE GESTÃO DO SUS : O Pacto de Gestão estabelece as responsabilidades claras de cada ente federado de forma a diminuir as competências concorrentes e a tornar mais claro quem deve fazer o quê, contribuindo, assim, para o fortalecimento da gestão compartilhada e solidária do SUS.

Esse Pacto parte de uma constatação indiscutível: o Brasil é um país continental e com muitas diferenças e iniquidades regionais.

Mais do que definir diretrizes nacionais é necessário avançar na regionalização e descentralização do SUS, a partir de uma unidade de princípios e uma diversidade operativa que respeite as singularidades regionais.

Esse Pacto radicaliza a descentralização de atribuições do Ministério da Saúde para os estados, e para os municípios, promovendo um choque de descentralização, acompanhado da desburocratização dos processos

normativos.

Reforça a territorialização da saúde como base para organização dos sistemas, estruturando as regiões sanitárias e instituindo colegiados de gestão regional.

(...)

(...)

Art. 3º O SUS é constituído pela conjugação das ações e serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde executados pelos entes federativos, de forma direta ou indireta, mediante a participação complementar da iniciativa privada, sendo organizado de forma regionalizada e hierarquizada.

(...)

Art. 15. O processo de planejamento da saúde será ascendente e integrado, do nível local até o federal, ouvidos os respectivos Conselhos de Saúde, compatibilizando-se as necessidades das políticas de saúde com a disponibilidade de recursos financeiros.

(...)

Art. 33. O acordo de colaboração entre os entes federativos para a organização da rede interfederativa de atenção à saúde será firmado por meio de Contrato Organizativo da Ação Pública da Saúde.

(...)

Art. 34. O objeto do Contrato Organizativo de Ação Pública da Saúde é a organização e a integração das ações e dos serviços de saúde, sob a responsabilidade dos entes federativos em uma Região de Saúde, com a finalidade de garantir a

integralidade da assistência aos usuários.

(...)

Art. 35. O Contrato Organizativo de Ação Pública da Saúde definirá as responsabilidades individuais e solidárias dos entes federativos com relação às ações e serviços de saúde, os indicadores e as metas de saúde, os critérios de avaliação de desempenho, os recursos financeiros que serão disponibilizados, a forma de controle e fiscalização da sua execução e demais elementos necessários à implementação integrada das ações e serviços de saúde.(...)

Fonte: Grifos e elaboração próprios

(23)

Portanto, o SUS tem um importante papel no acesso à saúde no Brasil e é uma das maiores políticas públicas brasileiras voltadas para a inclusão social. Esse papel é ainda mais central no enfrentamento a emergências de saúde pública, tornando- o a principal ferramenta de orientação e controle dessas crises no país, pelo que foi fundamental na resposta de enfrentamento ao Zika vírus, mormente face a sua capilaridade.

2.4 A Emergência do Zika Vírus

A declaração de emergência, devido a alteração do padrão de ocorrência de microcefalias no Brasil, foi feita em 11 de novembro de 2015, com a declaração a nível nacional pela Portaria nº 1.813 (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2015a). A partir da mobilização causada pela declaração de emergência, o governo federal desenvolveu o “Plano Nacional de Enfrentamento à Microcefalia”, que orientava a implementação de políticas públicas de resposta à emergência focadas em três principais eixos:

Mobilização e Combate ao Mosquito, Atendimento às Pessoas e no Desenvolvimento Tecnológico, Educação e Pesquisa (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2015b; CENTRO DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2016).

O relatório “A resposta do Sistema Único de Saúde à epidemia de Zika” é uma publicação do Ministério da Saúde e da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), que aborda as primeiras ações tomadas e a nova descoberta das correlações entre o Zika vírus e diferentes doenças. O estudo cita os impactos sociais e a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) como política de Estado para combater a epidemia (MAIEROVITCH; VASQUEZ, 2018).

A publicação do Ministério da Saúde “Zika vírus no Brasil – a resposta do SUS”, feito pela Secretaria de Vigilância em Saúde, conta com quinze artigos de profissionais da Saúde e suas experiências, considerando diferentes áreas de atuação (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017).

O primeiro artigo da publicação, “A surpresa e o grito”, relata a experiencia da identificação de crianças que nasciam com microcefalia no Nordeste, e as ações e eventos que se sucederam num primeiro momento. O artigo discorre sobre como os profissionais de saúde se mobilizaram, com os métodos utilizados para chegar à correlação entre a microcefalia e o Zika vírus. Esse artigo é especialmente relevante para compreender como o tema Zika vírus se tornou um problema e, dessa maneira, entrou como pauta prioritária na agenda do governo.

No artigo “Investigação de um surto – aprendizado para a comunidade assisten- cial e a saúde pública”, o autor faz um relato de experiência e histórico da epidemia do ponto de vista de um médico da assistência e relata o processo de construção de

(24)

hipóteses, considerando os dados clínicos e epidemiológicos, que permitiram investigar o problema.

O artigo “Gestão, articulação e mobilização” e o artigo “Atuação da Sala Nacional de Coordenação” discorrem sobre a construção da estratégia do Ministério da Saúde para responder à emergência do Zika vírus no Brasil. Ambos são particularmente importantes para a compreensão da atuação dos gestores de políticas públicas na formulação de alternativas pensadas para o enfrentamento à epidemia.

Em “O papel da Fiocruz no enfrentamento” e “A contribuição do Instituto Evan- dro Chagas” são relatados o protagonismo e importância da investigação científica na emergência em saúde causada pelo Zika, e como esses atores tiveram um papel relevante nos espaços de discussão do governo. Enquanto nos artigos “A experiência da OPAS/OMS” e “A colaboração com o CDC” é possível compreender a participa- ção internacional no combate à epidemia, que contribuíram para a implementação e avaliação das políticas públicas adotadas.

O estudo “Zika, protagonismo feminino e cuidado: ensaiando zonas de contato é uma publicação”, da revista Interface, feito por pesquisadoras da Fiocruz, cita os impactos sociais da doença, vislumbrados através das emergências e das ausências.

Em especial quanto à inação do Estado e ações tomadas pós-epidemia, com ênfase para além da emergência e com o foco na vida das crianças e famílias que precisam conviver com a microcefalia (MOREIRA; MENDES; NASCIMENTO, 2018).

Os artigos “A epidemia de Zika e os limites da saúde global” e “A assertividade das políticas de combate ao aedes aegypti no controle da tríade dengue - zika - chi- kungunya: da ameaça a pandemia”, das revistas Bioética, Lua Nova e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), respectivamente, visam explorar o tema desde uma perspectiva internacionalista, e da saúde como uma preocupação global e não isolada por Estados Nacionais, e como as respostas adotadas tiveram suas ações pautadas através desses fóruns de debate e mecanismos de cooperação internacional (NUNES;

PIMENTA, 2016; FERREIRA, 2018).

Os artigos “Arboviroses e políticas públicas no Brasil” e “A resposta do governo brasileiro à epidemia do vírus Zika: segurança em saúde e política externa” expõem o problema crônico das arboviroses no Brasil e o gatilho da epidemia para as ações mais assertivas do governo em resposta ao vírus Zika e o combate ao mosquito transmissor.

Por outro lado, o artigo “A assertividade das políticas de combate ao aedes aegypti no controle da tríade dengue - zika - chikungunya: da ameaça a pandemia”, aborda a resposta desde um ponto de vista do alcance da ação comunitária, ou seja, do trabalho de conscientização feito pelo governo para empoderar as comunidades como agentes de transformação e protagonistas na resposta à emergência através do combate ao mosquito (AVELINO-SILVA; RAMOS, 2017; PITTAS et al., 2018; FERREIRA, 2018).

(25)

Finalmente, o artigo “Comunicando sobre Zika: recomendações de prevenção em contextos de incertezas”, publicado na revista Interface Botucatu, debate sobre as ações tomadas pelo Ministério da Saúde a partir de um ponto central de condução e orientações aos profissionais de saúde em resposta à emergência dentro de um contexto de incertezas, também abordando as questões sociais relacionadas ao vírus, impactos e comunidades mais afetadas (MOREIRA; MENDES; NASCIMENTO, 2018).

(26)

3 METODOLOGIA

Este trabalho faz um estudo bibliográfico descritivo e revisão de diferentes artigos e relatórios acerca da teoria do ciclo de políticas públicas e da análise das políticas públicas adotadas na resposta ao surto do vírus Zika e a microcefalia.

Dessa maneira, o estudo foi operacionalizado a partir de quatro etapas: definição da informação a ser coletada; a contextualização do tema dentro do ciclo de políticas públicas; a seleção dos atores mais relevantes para ter amostra representativa sobre a análise a partir de diferentes atores; análise da informação adquirida através do software IRAMUTEQ; e interpretação sobre os resultados.

3.1 Etapa 1: definição da informação a ser coletada

A partir da pergunta“como o ciclo de políticas públicas e análise de discurso podem ser utilizados para a avaliação das medidas e ações do governo federal para o controle do Zika vírus e da síndrome congênita?” foi feito um levantamento bibliográfico acerca do tema da emergência do Zika vírus no Brasil e dos principais autores que teorizam acerca do ciclo de políticas públicas.

A informação foi coletada considerando a sua contribuição para a investigação da pergunta; isto é, as políticas públicas adotadas durante a emergência do Zika vírus e as percepções sobre essas ações. Dessa maneira, buscou-se em bases de dados os artigos que focassem na emergência do Zika vírus e na articulação, gestão e avaliação das ações adotadas.

O levantamento bibliográfico acerca do tema da emergência do Zika vírus no Brasil foi feito nas bases de dados eletrônicas: Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde, SCIELO e Google Scholars e PubMed. Nas três primeiras plataformas, a pesquisa foi feita em português, com os termos “políticas públicas/ transnacionais/

combate/ vírus zika” associados com “avaliação” e “microcefalia”, do dia 20 de março de 2020 ao dia 29 de setembro de 2021, resultando em 54 artigos no total.

Em seguida, foram selecionados artigos publicados entre dezembro de 2015 e julho de 2021 e que levassem em consideração a análise em questão. A decisão por esse recorte temporal foi feita baseada no período em que começou a ser identificado o risco para a saúde pública e a consequente declaração de emergência, e a posterior análise das ações e políticas públicas adotadas. A pesquisa para esse trabalho foi feita até o mês de julho de 2021 para que houvesse tempo de fazer a análise qualitativa e agrupamento da pesquisa para a apresentação do trabalho.

(27)

Após a triagem por relevância, consideraram-se os artigos e publicações que tratavam sobre o tema proposto, contando 23 publicações ao total que fazem uma análise acerca das políticas públicas adotadas pelo governo brasileiro durante o período da emergência declarada do Zika vírus.

A pesquisa na plataforma PubMed foi conduzida em inglês, utilizando os termos

“zika virus brazil public policies”, resultando em 68 artigos, publicados entre dezembro de 2015 e julho de 2021. A primeira seleção foi feita a partir da disponibilidade dos resumos de cada publicação, restando 60 artigos.

Após a leitura dos resumos das publicações, uma nova triagem foi feita conside- rando o ponto central da análise dessa dissertação: a situação de emergência durante a epidemia do Zika no Brasil, as ações, percepções e políticas públicas adotadas pelo governo brasileiro. Dessa maneira, sobraram 25 artigos, que tratavam do tema central relevante para a análise. Como originalmente os artigos estavam em inglês, seus resumos foram traduzidos para o português para compor o corpus.

A bibliografia relevante às teorias de políticas públicas foi coletada a partir das listas de indicações de leituras feitas pela Escola de Políticas Públicas e Governo da Fundação Getulio Vargas (FGV EPPG) acerca das leituras principais sobre o tema. A seleção dos autores que foram utilizados como embasamento teórico desse trabalho pautou-se sobre o discorrimento acerca do ciclo de políticas públicas, em especial atenção àqueles que norteiam determinadas etapas do ciclo.

3.2 Etapa 2: contextualização do tema dentro do ciclo de políticas públicas Para contextualizar o tema e compreender as diferentes fases da emergência e das políticas públicas adotadas, utilizou-se o modelo de Leonardo Secchi, que divide o ciclo das políticas públicas em sete etapas (SECCHI, 2014).

A primeira etapa é a identificação do problema. Nessa fase, um evento-foco quebra o status quo, levando a população e autoridades a notar uma determinada situação como um problema. Ou seja, segundo o autor, uma determinada situação passa a ser percebida como um problema quando há uma discrepância entre “o que é, e aquilo que se gostaria que fosse a realidade pública”.

A segunda etapa é a formação da agenda. Essa etapa corresponde aos assuntos que compõem um conjunto sobre os quais tanto o governo quanto os indivíduos ligados a este mantêm atenção relativa à um momento específico (KINGDON, 1995).

A terceira etapa é a formulação de alternativas. Aqui, os atores responsáveis pela criação das políticas públicas estudam as alternativas que podem ser tomadas para responder a um determinado problema.

(28)

A quarta etapa é a tomada de decisão, que segundo Secchi (2014, p. 40), é o momento em que os pontos de interesse dos atores e as intenções de enfrentamento são expostas.

A quinta etapa é a implementação. Nessa fase transformam-se as intenções em ações através de um conjunto de atividades com o objetivo de lograr os resultados para sanar o problema identificado. Nas palavras de Secchi, é importante estudar essa etapa para que seja possível “visualizar, por meio de instrumentos analíticos mais estruturados, os obstáculos e as falhas que costumam acometer essa fase do processo nas diversas áreas de política pública (saúde, educação, habitação, saneamento, políticas de gestão, etc.)” (SECCHI, 2014, p. 45).

O autor ainda cita os dois modelos de implementação – “top-down” e “botom-up”:

"Modelotop-down: caracterizado pela separação clara entre o momento de tomada de decisão e o de implementação, em fases consecuti- vas. Esse modelo é baseado na distinção wilsoniana entre Política e Administração” (WILSON, 1887), no qual os tomadores de decisão (po- líticos) são separados dos implementadores (administração). Modelo bottom-up: caracterizado pela maior liberdade de burocratas e redes de atores em auto-organizar e modelar a implementação de políticas públicas"(SECCHI, 2014, pgs. 46-47).

A sexta etapa é a avaliação. Nessa etapa avalia-se as políticas públicas adota- das, para saber se essas surtiram o efeito desejado para tratar do problema.

A sétima etapa é a extinção da política pública. Nessa fase, extingue-se a política pública considerando algum desses fatores: o problema que originou a política é percebido como resolvido; os programas, as leis ou as ações que ativavam a política pública são percebidos como ineficazes; ou o problema perdeu importância (SECCHI, 2014, p. 53).

3.3 Etapa 3: seleção dos atores mais relevantes1

Após a contextualização do tema dentro do ciclo de políticas públicas, foi feita a análise textual das ações adotadas para enfrentar a emergência, utilizando o Iramuteq.

A ferramenta IRAMUTEQ (Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires– traduzido por “Interface R para análises multidimensionais de textos e questionários”) é um software desenvolvido por Pierre Ratinaud, que tem como objetivo fazer análises estatísticas de fragmentos de textos, e que está ancorada

1 Essa subseção explora a introdução e o uso do software IRAMUTEQ, que é a ferramenta utilizada na metodologia dese trabalho, para fazer a análise de conteúdo. A ciência da análise de discurso e conteúdo é explorada na Referencial Teórico (tópico 2.2) desse trabalho, uma vez que o tema é parte estruturante dessa pesquisa.

(29)

no software R, permitindo diferentes formas de análise de texto e agrupamento de palavras, conforme apontam Camargo e Justo (2013):

"O IRAMUTEQ (...) possibilita os seguintes tipos de análises: estatísticas textuais clássicas; pesquisa de especificidades de grupos; classificação hierárquica descendente; análises de similitude e nuvem de palavras".

Esse tipo de ferramenta é particularmente útil em análises descritivas e de discursos, quando há um grande volume textual a ser estudado. Osoftware permite uma análise objetiva de ocorrências, propondo classificações, apontando similaridades (por exemplo, quando determinada palavra ou expressão é repetida em vários textos, o que é um indicativo da relevância do tópico repetido para o tema que está sendo analisado). Assim, uma análise qualitativa, que implica muita interpretação de texto e que pode estar sujeita a um importante grau de subjetividade, ganha indicadores palpáveis, que introduzem uma maior objetividade para a análise.

Nesse sentido, Camargo e Justo (2013) apontam que:

"O uso softwares específicos para análise de dados textuais tem sido cada vez mais presente em estudos na área de Ciências Humanas e Sociais, especialmente naqueles estudos em que o corpus a ser analisado é bastante volumoso (Chartier; Meunier, 2011; Lahlou, 2012;

Nascimento; Meandro, 2006). No Brasil, já desde a década de 1990 são utilizados alguns softwares para análises de textos, tais como o Ethnograph, o Nudist e o Atlas TI, os quais, ao organizarem os dados, facilitam a realização de análises de conteúdo".

Assim, utiliza-se nessa análise o software em referência como um instrumento multidimensional de avaliação, que complementa a análise qualitativa, mas que não substitui o papel central do pesquisador, como concluído por Santos et al. (2017):

"Concluiu-se que o quantitativo de investigações que utilizaram o IRA- MUTEQ foi crescente ao longo dos anos e, portanto, tal software tem sido incorporado nas pesquisas qualitativas da área da saúde produzi- das no âmbito dos programas de pós-graduação brasileiros. Realçou-se a necessidade de se compreender o IRAMUTEQ, assim como outros softwares, como mecanismo de apoio e que auxilia no processo de tratamento de dados sem substituir o papel central do pesquisador".

Para fazer essa análise, foi importante selecionar diferentes pontos de vista sobre o tema: o ponto de vista do Ministério da Saúde; o ponto de vista de profissio- nais de saúde especializados, tal como a Fiocruz; o ponto de vista de especialistas internacionais, tal como a OPAS/OMS; e o ponto de vista acadêmico, que nos permite ter uma visão mais ampla sobre os diferentes estudos e conclusões acerca da análise da condução dessa crise. Considerando esses quatro grupos, as publicações foram organizadas em um único documento de texto, conforme explicado da subseção a seguir.

(30)

3.4 Etapa 4: análise e interpretação da informação adquirida

A partir do material selecionado, 48 publicações ao total, os dados foram coleta- dos e agrupados em um corpus, organizados com as seguintes informações: autor e ano da publicação; elaborado com os resumos de cada texto. Dessa forma, o corpus foi organizado em um único arquivo de texto, com segmentos de cada publicação, separados por trechos, com o cabeçalho seguindo o modelo:

**** *id_*autor_*ano_*instituição_*database_*grupo_ (3.1) Após colocar todos os trechos no documento, foi feita a limpeza dos textos para retirar os caracteres especiais e palavras (tais como preposições e conjunções) que não agregam sentido de análise ao texto. Essa limpeza é feita para que o uso dessas palavras não interfira na análise feita pelo Iramuteq, pois o programa irá verificar os termos mais repetidos para que seja feita a interpretação em cima disso.

Dessa forma, foram consideradas as palavras com frequência de repetição acima de 10 vezes, sendo as principais palavras do conjunto: saúde (164), Zika (158) e vírus (94) foram os destaques. Outras palavras que estavam entre as 10 principais com uma alta frequência de aparição nos textos foram epidemia (70), público (70), Brasil (57), doença (53), mulher (50), emergência (49) e caso (46).

A partir da análise rodada pela ferramenta, extraiu-se a nuvem de palavras, com as palavras que mais se repetiram ao centro da figura; o grafo de similitude, que apresentou dois polos principais com as palavras mais influentes e suas respectivas ramificações.

Em relação aos grupos definidos, analisou-se os termos mais utilizados através da análise fatorial de correspondência (AFC), com cada grupo destacado com uma cor (o grupo dos especialistas está representado pela cor azul ciano, os especialistas internacionais pela cor roxa, o Ministério da Saúde pela cor vermelha e, por fim, a academia pela cor verde).

Assim, foi possível perceber a proximidade entre os grupos dos especialistas internacionais e Ministério da Saúde de um lado, e de especialistas e da academia de outro. Entendendo esses dois agrupamentos, rodou-se uma análise separada para extrair a nuvem de palavras de cada um desses subgrupos.

Ademais, a pesquisa foi analisada de acordo com o método proposto por Reinart (Classificação Hierárquica Descendente), no qual textos são classificados de acordo com os seus respectivos vocabulários e os grupos são divididos considerando a frequência das suas formas reduzidas. O objetivo dessa análise é obter classes de textos que, além de apresentar vocabulários similares, também apresentam diferenças dos segmentos de textos de outras classes.

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