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ÓNUS DA ALEGAÇÃO ÓNUS DA PROVA PRINCÍPIO DISPOSITIVO

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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 07A958

Relator: NUNO CAMEIRA Sessão: 15 Maio 2007

Número: SJ200705150009586 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA.

Decisão: NEGADA A REVISTA.

DIREITO DE PREFERÊNCIA UNIDADE DE CULTURA

PRÉDIO CONFINANTE FACTO CONSTITUTIVO

ÓNUS DA ALEGAÇÃO ÓNUS DA PROVA PRINCÍPIO DISPOSITIVO

PRINCÍPIO INQUISITÓRIO

Sumário

I - Na acção para exercício do direito de preferência previsto no art.º 1380.º do CC, o autor carece de alegar e provar, não apenas a relação de confinância entre os prédios, e que um deles - o confinante ou o vendido - tem uma área inferior à unidade de cultura, mas também que à data da compra o réu adquirente não era dono de nenhum prédio confinante com aquele que adquiriu.

II - Este último facto constitui um pressuposto ou facto constitutivo do direito de preferência, o qual só existe, só se constitui, se a venda for efectuada a quem não seja proprietário confinante; tal o que resulta do elemento literal da norma e da sua história, designadamente da alteração introduzida pelo art.

18.º, n.º 1, do DL n.º 384/88, de 25-10.

III - O tribunal não pode considerar que o facto indicado em I e II foi

implicitamente alegado quando a petição inicial e a réplica sejam totalmente omissas a seu respeito; e também não lhe é permitido "deduzi-lo" da restante matéria de facto articulada se desta não puder retirar-se a inequívoca

intenção do autor, alegado titular da preferência, se servir dele para fazer valer em juízo a sua pretensão.

IV - No nosso ordenamento jurídico, a exigência de indicação da causa de

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pedir só fica preenchida mediante a alegação em concreto do facto com relevância jurídica de que a parte faz derivar o seu pedido (teoria da

substanciação) - arts. 193.º, n.º 2, al. b), 264.º, n.º 1, e 498.º, n.º 4, do CPC.

V - Como o princípio inquisitório não vigora entre nós relativamente aos factos integrantes da causa de pedir, mas apenas quanto aos factos instrumentais, o STJ encontra-se impedido de ordenar a baixa do processo à Relação, nos termos dos arts. 729.º, n.º 3, ou 730.º, n.º 2, do CPC, para averiguar e fixar o facto indicado em I e II, uma vez que esse facto é constitutivo do direito e não foi alegado (arts. 264.º e 664.º do CPC). *

* Sumário elaborado pelo Relator.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I. Em 13.8.98, no Tribunal de Leiria, AA e sua mulher BB moveram uma acção ordinária contra a Empresa-A, e Empresa-B.

Alegando que a 1ª ré vendeu à 2ª um prédio rústico confinante com um prédio rústico que lhes pertence sem lhes dar a conhecer o projecto de venda, os autores pediram que lhes fosse reconhecido o direito de preferir na aquisição do imóvel alienado e a condenação da ré Empresa-B a demolir um muro que ali ergueu, bem como a pagar-lhes uma indemnização pelo facto de ter cortado parte significativa do arvoredo existente no prédio.

Contestando, a Empresa-A impugnou a confinância dos prédios e arguiu a caducidade da acção de preferência. A ré Empresa-B, por seu turno, além de impugnar a confinância dos prédios e de arguir a caducidade, alegou ainda que

nenhum dos prédios tem como destino a cultura, que existem outros

preferentes e que a procedência da pretensão dos autores conduziria a um fraccionamento ilegal.

Em reconvenção, para o caso de a acção proceder, pediu esta ré a condenação dos autores no pagamento de uma quantia a liquidar em execução de sentença pelas despesas feitas no prédio objecto da preferência.

Saneada e condensada a causa realizou-se o julgamento e depois foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, reconheceu aos autores o direito de haverem para si o prédio objecto da acção pelo preço de 102.004,16 euros, ordenou o cancelamento do registo da aquisição a favor da 2ª ré e condenou esta a pagar-lhes o valor dos pinheiros que cortou, deduzido

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da despesa suportada com o referido corte, a fixar em sede de liquidação;

simultaneamente, julgou a reconvenção parcialmente procedente, condenando os autores a pagar àquela ré o valor das despesas por ela feitas com a cerca, com o muro e com os estábulos, calculado segundo as regras do

enriquecimento sem causa, também a apurar em sede de liquidação.

Apelaram a ré Empresa-B e, subordinadamente, os autores.

Por acórdão de 31.10.06 a Relação de Coimbra, com um voto de vencido, revogou a sentença, julgando a acção improcedente e absolvendo as rés do pedido.

Agora são os autores que, inconformados, pedem revista em ordem à reposição da decisão da 1ª instância. Imputando ao acórdão recorrido a violação do artº 1380º do Código Civil e dos artºs 264º, 493º, nº 3, e 712º, nº 4, do Código de Processo Civil, formulam conclusões que, balizando os

poderes de cognição deste Tribunal, podem resumir-se do seguinte modo:

1ª) Ainda que se entenda que a causa de pedir na acção de preferência é complexa, certo é que o pressuposto alegadamente em falta - a não alegação de que a 2ª ré não é titular de prédio confinante com aquele que adquiriu - constituiu uma excepção

peremptória, não um facto integrante da causa de pedir;

2ª) Ao menos implicitamente, os autores alegaram que a 2ª ré não era proprietária confinante; e dos autos resulta a impossibilidade de o prédio objecto da preferência confrontar com qualquer imóvel que lhe pertença;

3ª) Mesmo na hipótese - académica - de a 2ª ré também ser confinante, os autores beneficiariam do disposto no artº 1380º, nº 2, b), do CC;

4ª) A entender-se que a alegação do facto relativo à não confinância do

adquirente foi efectivamente omitida, então a Relação deveria ter feito uso da faculdade prevista no artº 712º, nº 4, do CPC, sem necessidade de reenviar o processo à 1ª instância, porque tal facto resultou provado e os autores

manifestaram vontade de se prevalecerem dele, desde logo através da propositura da presente acção.

A 2ª ré contra alegou, defendendo a confirmação do acórdão da 2ª instância.

Foram juntos ao processo pareceres jurídicos de dois Professores catedráticos de Direito.

Tudo visto, cumpre decidir.

II. De entre os factos que a Relação considerou definitivamente assentes interessa destacar os seguintes, visto o objecto do recurso:

1) Os autores são donos de um prédio rústico, com a área de 600 m2, inscrito na matriz sob o artigo 21 256 e descrito na Conservatória do Registo Predial

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de Leiria sob o n.º 3792;

2) Por escritura de 19.2.98 a 2ª ré adquiriu, por compra, à 1ª ré, uma terra de vinhas, semeadura, com 4 oliveiras e pinhal, com 150 sobreiros, situada na Quinta do .., com a área de 77.730 m2, a confrontar do norte com CC e outros, do sul com DD e outros, nascente com EE e FF e poente com Vala hidráulica e Linha Férrea, inscrito na matriz sob o artigo 21 444, descrito na Conservatória do Registo Predial de Leiria, sob o n.º 15987;

3) Os autores não foram informados por qualquer das rés do projecto de venda do terreno referido em b) e dos seus elementos integrantes e só tiveram

conhecimento dos elementos essenciais da venda após a realização da escritura de 19.2.98;

4) O prédio adquirido pela 2ª ré confina, a sul, com o prédio pertencente aos autores.

III. Discute-se no presente processo a titularidade do direito de preferência a que alude o artº 1380º, nº 1, do CC, cuja redacção é a seguinte:

Os proprietários de terrenos confinantes, de área inferior à unidade de

cultura, gozam reciprocamente do direito de preferência nos casos de venda, dação em cumprimento ou aforamento de qualquer dos prédios a quem não seja proprietário confinante.

Dos factos apurados resulta que os autores alegaram e provaram:

1º - Que são proprietários de um prédio rústico de área inferior à unidade de cultura (600 m2);

2º - Que a 1ª ré vendeu à 2ª ré um prédio rústico de área superior à unidade de cultura (77.730 m2);

3º - Que o seu prédio, a sul, confina com o prédio vendido à 2ª ré; e 4º - Que não foram notificados do projecto da venda e dos elementos do negócio, só dela tendo conhecimento depois de realizada a escritura de 19.2.98.

Nesta fase do processo já não se discute que, perante os factos destacados, estão preenchidos todos os pressupostos de que a lei faz depender a existência do direito de preferência ajuizado. Todos, menos o estabelecido no segmento final do preceito transcrito: venda a quem não seja proprietário confinante. E a questão colocada é, justamente, num primeiro momento, a de saber se se trata de um facto constitutivo do direito de preferência invocado, cuja prova, portanto, caiba aos autores, de harmonia com o artº 342º, nº 1, do CC, ou antes de um facto impeditivo desse direito, a provar pela ré, conforme o nº 2 do mesmo artigo. Ora, parece-nos absolutamente claro que se está perante um facto constitutivo do direito em causa: este só existe, só se constitui, se a

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venda for efectuada a quem não seja proprietário confinante. Se há casos em que o elemento gramatical da norma elimina logo à partida, praticamente, qualquer dúvida que pudesse alimentar-se a respeito do assunto, este será um deles.

Mas se a isso acrescentarmos a história (evolução) do texto legal, tendo presente o objectivo do legislador ao alargar o seu raio de acção mediante a alteração introduzida pelo artº 18º, nº 1, do DL 384/88, de 25/10, então o grau de certeza passa a ser, dir-se-ia, total; e a certeza é a de que o titular do

direito de preferência, carecendo de provar, sem dúvida, a relação de

confinância entre os prédios, e que um deles - o confinante ou o vendido - tem uma área inferior à unidade de cultura, deverá ainda alegar e provar, para ver reconhecido o seu direito, que à data da compra o adquirente não era dono de nenhum prédio confinante com aquele que adquiriu; e isto porque, como bem explica o Professor M. Henrique Mesquita no parecer junto ao processo, "...se houver vários proprietários confinantes com o prédio vendido e a venda tiver sido feita a um deles, os demais proprietários confinantes não podem arrogar- se o direito de preferir.

A venda feita a um dos confinantes satisfaz o fim da lei, que é reunir dois

prédios num só (quando um deles ou ambos tenham área inferior à unidade de cultura), sem necessidade de fazer intervir o mecanismo da preferência, que constitui sempre um entrave à liberdade de contratar". Que saibamos, este ponto não tem suscitado praticamente divergências, quer na doutrina, quer na jurisprudência: com efeito, não ser o adquirente do imóvel proprietário

confinante é sempre identificado como um pressuposto do direito de

preferência atribuído pelo artº 1380º do CC. Assim, por exemplo, na obra de maior fôlego que mais recentemente foi publicada entre nós sobre o assunto - O Exercício do Direito de Preferência, da autoria do Prof. Agostinho Cardoso Guedes, Publicações da Universidade Católica, Porto, Setembro de 2006 (dissertação de doutoramento) - não se refere nenhuma decisão ou

entendimento doutrinal em contrário, designadamente no sentido de se estar em face de facto impeditivo do direito do pretenso titular da preferência; e se bem interpretamos o pensamento deste Autor, o tema é mesmo apresentado como isento de qualquer dúvida e à margem de possíveis objecções (cfr, em especial, págs 113 e 114, bem como a nota 6 desta última página, onde se referenciam vários acórdãos das relações e do STJ, assim como autorizada doutrina, sempre no sentido que se expôs). Deste modo, estando-se em

presença de um facto integrado na causa de pedir, um facto que faz parte do seu núcleo central, - e sendo evidente que os autores não o provaram, nem

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sequer alegaram - é claro que a decisão da Relação tinha que ser, como foi, a de revogar a sentença, julgando a acção improcedente.

Num segundo momento, os recorrentes argumentam que, implicitamente, alegaram que a 2ª ré não é proprietária confinante e, até, que isso se extrai dos autos (dos restantes factos provados, terão querido dizer). Só que não é exacto, desde logo, que deva considerar-se ter sido feita a alegação implícita do facto em apreço. São pura e simplesmente omissas a tal respeito a petição inicial e a réplica, não sendo possível "deduzi-lo" da restante matéria de facto articulada; não é possível, sobretudo, dali retirar a inequívoca intenção de os recorrentes se servirem dele para fazer valer em juízo a sua pretensão; e isso sempre seria indispensável, porquanto no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio segundo o qual a exigência de indicação da causa de pedir só fica preenchida mediante a alegação em concreto do facto jurídico (rectius: com relevância jurídica) de que a parte faz derivar o seu pedido (teoria da

substanciação) - cfr. artºs 193º, nº 2, b), 264º, nº 1, e 498º, nº 4, do CPC.

A disposição do nº 2, alínea b), do artº 1380º não vem ao caso, contrariamente ao que se alega no recurso, pela simples razão de que esta norma, como logo se vê da sua parte inicial - "sendo vários os proprietários com direito de

preferência, cabe este direito..." - está logicamente subordinada à do nº 1; ora, como já se concluiu, na situação em exame o direito de preferência dos

autores não se constituiu, não existe, porquanto um dos pressupostos em que a lei o faz assentar não se mostra preenchido.

Perante o exposto, já se vê que é de igual modo inatendível a questão posta na conclusão 4ª. Em primeiro lugar porque o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa só podem ser objecto de recurso de revista nos dois casos previstos no artº 722º, nº 2, do CPC, que na situação em exame não ocorrem, como os próprios recorrentes aceitam. Em segundo lugar porque, enquanto tribunal de revista, o STJ não tem competência para

censurar o não uso pela Relação da faculdade de anular a decisão de facto da 1ª instância ao abrigo do artº 712º, nº 4, do CPC. E em terceiro lugar - e decisivamente - porque o princípio inquisitório não vigora entre nós

relativamente aos factos da causa que não sejam meramente instrumentais (artº 264º, nºs 2 e 3, e 664º do CPC); este Tribunal, por consequência, estaria sempre impedido de ordenar a baixa do processo à Relação, nos termos dos artºs 729º, nº 3, ou 730º, nº 2, do mesmo diploma, para o efeito visado pelos recorrentes: averiguação e fixação de facto que, por se integrar na causa de pedir, está por inteiro sujeito ao princípio dispositivo (nº 1 do artº 264º).

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Improcedem, pois, ou mostram-se deslocadas todas as conclusões do recurso.

III. Com os fundamentos expostos, acorda-se em negar a revista.

Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 15 de Maio de 2007 Nuno Cameira (Relator) Sousa Leite

Salreta Pereira

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