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TRUMP Os 12 trabalhos do mais imprevisível dos presidentes

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Nº 1, 20 JANEIRO 2017

Este caderno faz parte do Jornal Económico e não deve ser vendido separadamente.

JÚLIO ISIDRO

A casa destroçada

do “tipo porreiro”

P 14

TRUMP

Os 12 trabalhos

do mais

imprevisível

dos presidentes

P 8 e 9

‘The Donald’ visto

pelo seu advogado

português

P 10 e 11

CARLOS LEIRIA PINTO

O banqueiro português

nas Américas

P 3

PEDRO NUNO SANTOS

“O PS não se radicalizou”,

garante em entrevista

(2)

EDITORIAL

22

3

A FIGURA

Carlos Leiria Pinto, o banqueiro

português nas Américas

Numa conversa descontraída com o Et Cetera durante uma visita a casa, o banqueiro português Carlos Leiria Pinto fala da sua experiência interna-cional à frente das operações do IFC (do Banco Mundial) nos países dos Andes. O banqueiro fala também dos desafios que se colocam ao setor em Portugal e na Europa.

10

ENTREVISTA

O advogado português de Donald Trump fala sobre o novo inquilino da Casa Branca

Luís Miguel Novais é o advogado por-tuguês de Donald Trump e provavel-mente o cidadão nacional que melhor conhece o magnata que a partir de hoje se tornará presidente dos Estados Unidos. Em entrevista, fala da sua experiência com o grupo de Trump e das suas expetativas para o mandato do magnata como líder da nação mais poderosa do globo.

4

ENTREVISTA

Pedro Nuno Santos: “O PS não se radicalizou. Tudo o que tem sido feito é profundamente social-democrata”

Regressado de licença de parentalida-de, o secretário de Estado

dos Assuntos Parlamentares revela os pormenores das relações com Bloco de Esquerda e PCP e diz-nos como concilia a vida política e familiar. E garante que o Partido Socialista não voltará a necessitar de apoio dos parti-dos da direita para governar.

8

ANÁLISE

Os 12 trabalhos de Donald Trump, novo presidente dos Estados Unidos da América

Entre a surpresa da vitória e a imprevisi-bilidade das opções enquanto inquilino da Casa Branca, Donald Trump passou as últimas semanas a apresentar ideias que, diz, serão as suas prioridades a par-tir de hoje. Conheça as prioridades daquele que será o presidente

americano mais imprevisível dos últimos 150 anos.

ÍNDICE

FILIPE ALVES Diretor

ET CETERA

Um caderno

para ler

com tempo

FLAMENCO “Carmen” regressa ao Porto “Carmen”, de Bizet, regressa ao Porto pela mão da Companhia de Ballet Flamenco de Madrid, na quinta--feira, dia 26. O espetá-culo foi construído sobre uma linguagem contemporânea que se adapta a todas as pla-teias do mundo. Rompe com o pendor tradicio-nalista do flamenco, sem retirar a magia e a emoção da dança e música combinadas.

14

JÚLIO ISIDRO A casa destroçada do “tipo porreiro”

Ao convite do Jornal Económico para uma saída mais informal, Júlio Isidro escolheu duas opções relacionadas com a RTP, empresa onde fez a sua carreira. “Das duas, uma: ou vamos à Gulbenkian, terrenos nos quais come-çaram as emissões experimentais da televisão, ou vamos aos antigos estú-dios do Lumiar. Sabe? Eu fui o homem que fechou a porta do Lumiar”, contou o apresentador.

outras coisas. É isto que significa o Et Cetera, o segundo caderno do Jornal Económico, que nasce para abordar de forma mais aprofunda-da - com calma - outros temas que interessam aos nossos leitores e que não encontram a atenção devida no pri-meiro caderno.

Todas as semanas, o Et Cetera terá entre-vistas de vida, análises de fundo sobre assun-tos da atualidade nacional e internacional, opinião de qualidade e também um roteiro de cultura e ‘lifestyle’. Teremos um olhar mais atento ao lado humano das histórias, sem nunca perder de vista a missão do jorna-lismo, que é informar com independência, rigor e isenção.

O Et Cetera reforça assim o compromisso que o Jornal Económico assumiu com os seus leitores, preenchendo uma lacuna que até agora existia na nossa oferta.

No Et Cetera, temos mais espaço para ana-lisar os assuntos a fundo, para pensar a atua-lidade e selecionar o mais relevante.

Entrevistamos os grandes protagonistas da política, dos negócios, da sociedade e das artes, fugindo às questões do costume e dan-do a conhecer o ladan-do humano dessas figuras. Apostaremos também em pequenas entre-vistas com as pessoas que dão vida às histó-rias, desde o gestor português que se destaca no estrangeiro ao empreendedor que criou o próprio emprego e que agora é dono de uma empresa em crescimento. Vamos “sair” com figuras públicas e conhecer as suas facetas mais intimistas. Vamos também falar das coisas boas da vida, desde a literatura às via-gens, passando pelo luxo, ‘gadgets’, automó-veis, gastronomia e vinhos.

Acreditamos que o jornalismo - e a im-prensa em particular - só terá futuro se con-seguir acrescentar valor para o leitor e se apostar nas boas práticas deontológicas, na qualidade e na diferenciação. É isso que pre-tendemos fazer no Jornal Económico e con-tamos com os nossos leitores e parceiros para nos ajudarem a manter o rumo certo. Estamos aqui para vos servir.●

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FIGURA

CARLOS

LEIRIA PINTO

O banqueiro

português

nas Américas

Carlos Leiria Pinto é um dos poucos portugueses que ocupam cargos de topo na alta finança mundial, liderando a operação andina do In-ternational Finance Corporation (IFC). Uma experiência que, dis-se ao Jornal Económico, tem sido muito valio-sa. “São países fantásticos, com um potencial enorme”, disse o português que lidera a enti-dade que atua como braço do Banco Mundial para o financiamento ao setor privado na Co-lômbia, Equador, Bolívia, Peru e Venezuela.

Nascido em Lisboa há 54 anos, Carlos Leiria Pinto é licenciado pela Universidade Nova e tem uma longa carreira no setor financeiro e na supervisão. Ao longo das últimas décadas, passou pelo BNP Paribas, pelo Eurohypo (do grupo Commerzbank), pela ECS Capital e pelo Banco de Portugal, onde trabalhou com Carlos Costa. Até que, em 2014, recebeu um

O português Carlos Leiria

Pinto lidera as operações

do IFC, do Banco Mundial,

na Colômbia, Peru, Bolívia

e Equador. À conversa

com o Jornal Económico,

numa vinda a casa,

o banqueiro conta

a sua experiência

internacional e fala

dos desafios do setor.

FILIPE ALVES

falves@jornaleconomico.pt

“Empresas

portuguesas precisam de garantias”

Carlos Leiria Pinto con-sidera que uma das prin-cipais dificuldades das empresas nacionais está na obtenção de ga-rantias bancárias válidas para se apresentarem em concursos interna-cionais, dado o fraco

ra-ting da banca nacional.

“Sugiro que o Governo trabalhe numa solução que permita melhorar as garantias das empresas portuguesas, para que sejam admitidas lá fora. O Estado teria de en-contrar uma entidade terceira e pagar-lhe para que contra-garantisse as garantias dos bancos portugueses. Isso seria do interesse nacional”, defendeu.

Cristina

Bernardo

convite para liderar as operações do IFC nos países dos Andes. “Era um desafio de tal forma entusiasmante, poder colocar os meus conhe-cimentos ao serviço de uma das mais presti-giosas instituições financeiras internacionais, que achei que devia aceitar. O Dr. Carlos Cos-ta gentilmente compreendeu e aceitei o convi-te”, disse o banqueiro, fazendo um balanço “muito positivo” do trabalho realizado nos úl-timos dois anos e meio.

Mas mudar-se para o outro lado do mun-do teve implicações a nível familiar. “A mi-nha família está cá em Portugal. A mimi-nha mulher é médica e professora na universida-de e tinha começado a fazer o doutoramento, que era um sonho antigo. Os nossos dois fi-lhos já estão crescidos e ela tinha começado a fazer isso. E disse-me: se for contigo, neste momento, nunca mais acabo o doutoramen-to. E fizemos então um pacto: ela e os meus filhos estão cá, enquanto eu estou lá, mas ve-nho a Portugal sempre que posso”, contou.

Até quando? O gestor não sabe, mas admi-te que gostaria de voltar a trabalhar na banca em Portugal. “Sim, está nos meus planos re-gressar, se surgir uma boa oportunidade”, admitiu Carlos Leiria Pinto, sublinhando que o setor financeiro português tem pela frente vários desafios, a começar pelo pro-blema do crédito malparado. Além disso, fri-sou, é necessário resolver o problema ético que, em seu entender, esteve na origem dos grandes escândalos bancários dos últimos anos. “Para onde foram os milhares de mi-lhões de euros do BPN, do Banif, do BES e de outros bancos? Volatilizaram-se?”, disse.

Combater a pobreza

através da iniciativa privada

Tendo a seu cargo um portfólio de investi-mentos no valor de 3,1 mil milhões de dólares, Carlos Leiria Pinto lidera uma equipa de cerca de 120 pessoas, distribuídas por Bogotá (onde

está o regional hub), Lima e La Paz. Um dos fei-tos de que se orgulha é o facto de ter convenci-do o Banco Mundial a conceder financiamen-tos a empresas no Equador e na Bolívia. “Quando cheguei não se faziam operações nesses países devido ao risco político. Os go-vernos de Correa e Morales tinham feito na-cionalizações e o Banco Mundial tinha decidi-do esperar para ver. Mas, quandecidi-do iniciei fun-ções, falei com alguns empresários e depois, devagarinho, consegui convencer Washing-ton que deveríamos apoiar investimentos pri-vados na Bolívia e no Equador”, disse.

Além de investir diretamente no capital das empresas locais, numa lógica semelhante à dos

private equity mas com a preocupação de

con-tribuir para um desenvolvimento sustentável do ponto de vista sócio-ambiental, o IFC tam-bém concede linhas de crédito a bancos e a empresas privadas. “Estamos mais focados no setor financeiro, nos bancos, instituições fi-nanceiras, infraestruturas, e também no sector da energia, agronegócios, petróleo, gás e mi-nas”, explicou, acrescentando que o IFC tam-bém concede financiamentos a bancos que, depois, abrem linhas de crédito destinadas a Pequenas e Médias Empresas (PME).

A presença do Banco Mundial na América do Sul remonta ao tempo da Guerra Fria, quando o combate ao comunismo era a princi-pal preocupação dos Estados Unidos e das ou-tras potências ocidentais. O Banco Mundial atua através de duas vertentes: por um lado, fi-nanciando estados e entidades públicas, através do IBRD; e, por outro, financiando as empre-sas privadas, por via do IFC. Antes como ago-ra, o objetivo é contribuir para a redução da pobreza, no quadro da economia de mercado. Carlos Leiria Pinto mostra-se confiante no potencial de crescimento destes países da América do Sul e garante que existem oportu-nidades para as empresas portuguesas. “Há vá-rios grandes projetos a avançar”, frisou.●

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(5)

ENTREVISTA

PEDRO NUNO SANTOS

“O PS não se radicalizou.

Tudo o que tem sido

feito é profundamente

social-democrata”

Com obras na Secretaria de Estado dos Assun-tos Parlamentares e reuniões diárias com os partidos de esquerda, Pedro Nuno Santos rece-be o Jornal Económico num gabinete tempo-rário. Todos os dias há acordos para olear e as salas de reuniões naquela ala do Palácio de São Bento são um ativo disputado. A agitação diá-ria do Parlamento só é superada por uma nova exigência familiar: o governante acaba de ser pai e a entrevista é a primeira que concede des-de que regressou da licença des-de parentalidades-de.

Como tem sido trabalhar com esta solução governativa? É muito exigente no dia a dia?

É cansativo mas entusiasmante. Para mim, que defendia há alguns anos que o PS devia trabalhar com os partidos à esquerda, partici-par nesta experiência traz uma grande satisfa-ção. Vejo que funciona, com resultados. Há dias em que temos 14-15 reuniões num só dia. Em simultâneo há três, quatro reuniões, com diferentes partidos e diferentes ministros.

Então não está presente em todas.

Não consigo, mas tenho uma equipa que co-bre todas as áreas e temos adjuntos em dife-rentes reuniões. Tem sido muito interessante porque Partido Socialista (PS), Partido Comu-nista Português (PCP), Bloco de Esquerda (BE) e Partido Ecologista Os Verdes (PEV) têm aprendido a trabalhar em conjunto e a co-nhecerem-se. Temos culturas organizacionais e negociais diferentes. A democracia nasceu centrada à esquerda, numa dialética entre o PS, o PCP e a extrema esquerda, e isso marcou os partidos durante anos. As novas gerações não têm esse peso e estão a iniciar uma nova fase de negociação à esquerda. Isto não é só importante para o PS, para o PCP e para o BE. O PS não precisa da direita, nunca mais, para governar. É uma vitória muito importante.

Como é um dia típico na Secretaria de Estado dos Assuntos Parlamentares?

[Interpela o adjunto, que está na sala] Ó Hugo, podes pedir o calendário de ontem [terça-fei-ra]? Só para vermos a agenda e termos uma ideia. Temos dezenas de reuniões por dia aqui

na secretaria de Estado dos Assuntos Parla-mentares. Fizemos agora umas obras, este não é o meu gabinete. Vamos ter três salas de reu-niões ali ao fundo e mais duas lá em cima. Va-mos fazendo reuniões com diferentes ministé-rios e diferentes grupos parlamentares.

Reúnem-se todos juntos?

Não. São sempre reuniões bilaterais. Esse salto ainda não foi possível dar. O que aumenta o nosso trabalho, porque são quatro quando po-dia ser uma. Temos de fazer reunião com o PS, com o PEV, com o PCP e com o BE. Há temas que são pedidos pelo Bloco, outros pelo PCP, outros por todos e, portanto, não se fazem sempre quatro reuniões.

Com quem é que faz mais reuniões?

O partido com que o Governo reúne mais é o PS, com o grupo parlamentar do PS.

Mas aí, em princípio, não haverá grandes divergências.

Teriam de estar numa reunião do grupo par-lamentar do PS para perceberem que também não é fácil. Não só porque são mais deputados, mas porque é o partido deles que está no Go-verno. O PCP e o Bloco são muito difíceis e exigentes, mas temos conseguido ter um bom relacionamento e construir uma base de con-fiança muito grande. [O adjunto chega com a agenda]. Por exemplo, esta terça-feira tivemos debate quinzenal e depois houve reunião do ministro da Saúde com o BE, do ministro ad-junto com o PS, uma reunião do grupo de tra-balho da dívida externa, do ministro da Ciên-cia e do Ensino Superior com o PS, do minis-tro da Saúde com o PCP, do minisminis-tro do Ensi-no Superior com o Bloco, da Segurança Social com o Bloco e com o PCP, da Defesa, Empre-go e Administração Pública… Quer dizer, houve 13 reuniões depois do debate quinze-nal. A solução não funcionaria sem estas reu-niões. Como o PCP e o BE não estão no Con-selho de Ministros, é no Parlamento que este trabalho tem de ser feito.

Quantas diretas já fez?

No Orçamento são dois meses loucos.

Come-“

O PS não precisa

da direita,

nunca mais,

para governar.

É uma

vitória muito

importante”

Regressado de licença de

parentalidade, o secretário de

Estado dos Assuntos Parlamentares

revela os pormenores das relações

com Bloco de Esquerda e PCP

e diz-nos como concilia a vida

política e familiar. Quando estava

em casa com o filho ficava ansioso

sempre que lia críticas ao Governo

e não podia responder. “Mas depois

tinha uma fralda por mudar

e esquecia-me rapidamente”.

Texto: DENISE FERNANDES E JOÃO MADEIRA Fotos: CRISTINA BERNARDO

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çamos o trabalho ainda antes da proposta ini-cial, com os nossos parceiros. Depois o diplo-ma chega aqui, continuamos o trabalho na es-pecialidade e durante todo esse período há um trabalho permanente daqui para o Governo, do Governo para aqui. Muitas vezes começa-mos de pontos de partida distantes e, para nos encontrarmos, a secretaria de Estado dos As-suntos Parlamentares anda de um lado para o outro. Os nossos ministros vêm cá mas muitas vezes nós próprios fazemos sugestões para tentar que o ministro se mova um pouco – muitas vezes até à última. A entrega do Orça-mento já atrasou porque havia aí um ou outro pormenor que tinha de ser resolvido.

Nunca há reuniões com o PSD ou com o CDS?

Tivemos uma reunião com o PSD esta terça-feira, mas não é comum. A razão é óbvia. O Governo só existe por causa do PCP, do Bloco e do PEV, e por isso é com eles que nós temos de trabalhar numa base diária. Isso não impe-de que nós possamos ter acordos com o PSD em algumas matérias. Já aconteceu no passa-do. Mas obviamente que os nossos parceiros são os partidos à esquerda do PS.

Foi pai recentemente. Só gozou a licença obrigatória?

Há um período obrigatório de três semanas, logo após o parto, e cumpri-o na totalidade. Depois há dez dias facultativos durante os cin-co meses de licença, caso seja a mulher a cum-pri-los. A minha mulher está a amamentar e portanto tem de ser mesmo ela a cumpri-los – se fosse com biberon podia ser eu, mas não é o caso. Portanto, nos cinco meses em que ela vai exercer a licença eu tenho direito a mais dez dias. Usei logo seis desses dez e, portanto, tive um mês de licença até ao início de janeiro. E tenho direito a mais um mês de licença após os cinco, que também vou exercer. Vou exercer os períodos obrigatórios e tudo o que é opcio-nal. Todo o tempo que a lei me permita eu vou exercer.

Porque tomou essa decisão?

Por consciência do direito, da responsabilida-de. Temos a função de dar esse exemplo. Es-tou a fazer aquilo a que a lei obriga e o que a lei me permite. A legislação, numa sociedade que achava que a responsabilidade de acompanhar os filhos era apenas das mulheres, tentou for-çar que os homens assumissem também a sua responsabilidade. Nós sabemos que a respon-sabilidade é dos dois e que as mulheres são dis-criminadas no trabalho pela condição de se-rem mães.

Com a disputa política que ocorreu enquanto estava de licença, sentiu algum peso de consciência?

Nem um bocadinho. Apesar de igualmente cansativo, foi também muito prazeroso.

Foi fácil “desligar”?

Isso não. Estava em casa e, apesar de estar em contacto com o primeiro-ministro e com a se-cretária de Estado Adjunta [Mariana Vieira da Silva], que esteve aqui a ajudar durante aquele período, lia muitos jornais, lia os comentado-res, e a maioria deles não é assim tão favorável à nossa solução. Assistia a muitas injustiças e, como não podia intervir, aparecia sempre al-guma ansiedade. Mas entretanto tinha uma fralda para mudar e esquecia-me rapidamente.

A vida política é desgastante? Há

reuniões fora de horas, contactos permanentes.

Senti muita diferença do Parlamento para a Secretaria de Estado. As responsabilidades são outras e como aos Assuntos Parlamentares fo-ram acrescentadas as negociações com os par-ceiros, essa é a parte mais pesada do nosso tra-balho, neste momento: gerir todos os dias as relações com os parceiros. Obviamente com a participação dos nossos colegas do Governo, ministros e secretários de Estado e também com o primeiro-ministro, mas somos nós que coordenamos esse processo.

Teria algum conselho a dar ao seu colega Vieira da Silva, agora que está a viver na pele a parentalidade?

Tenho, mas não vou dizer. Ainda há muito para fazer nesta área, mas o país ainda não tem condições para fazer o que alguns países nór-dicos já fazem. A conciliação da vida profissio-nal com a familiar é um desafio e, infelizmen-te, nas nossas sociedades, são ainda as mulhe-res a parte mais prejudicada. Estamos todos conscientes dentro do Governo de que ainda há muito para fazer neste campo, mas vamos jogando com as possibilidades do país. Já aju-daria que os homens fossem assumindo mais responsabilidades. Se os empregadores perce-berem que lhes vai custar tanto contratar uma mulher ou um homem se acontecer uma gra-videz, pelo menos tenderão a discriminar me-nos a mulher.

Esta solução de Governo seria possível sem António Costa e sem Pedro Nuno Santos? O secretário de Estado faz pontes à esquerda, tem amigos nesse campo, antes do Governo escrevia no blogue Ladrões de Bicicletas.

Tenho a certeza de que, no futuro, será possí-vel replicar esta solução, com estas ou outras pessoas. Para bem do nosso país, é bom que o PS se consiga entender com o PCP e com o BE mais vezes. Havia o risco de, se a solução cor-resse mal, se adiar por muitos anos um novo trabalho em conjunto. Mas felizmente está a correr bem e tenho a certeza de que vai acon-tecer mais vezes.

Então a questão pessoal não é importante?

Não desvalorizo a importância das pessoas. Não fazemos isso no PS. Entendemos que a infraestrutura não determina tudo; as pessoas também são muito importantes. As condições económicas e sociais em que o país se encon-trava facilitaram o processo, mas é óbvio que as relações de confiança são muito importan-tes. Hoje temos uma relação de confiança mui-to importante com o PCP, o BE e o PEV e é bom que continue. Foi um dos segredos desta solução.

Já passou mais de um ano desde os acordos à esquerda e de vez em quando há uma ou outra areia na engrenagem, como se viu recentemente na Taxa Social Única (TSU). Este tipo de confronto é problemático?

Não. Não houve um confronto entre nós e os nossos parceiros na questão da TSU. Ao fim de 42 anos de democracia estamos a viver uma fase nova da democracia. Estamos habituados a olhar para o Parlamento como uma conti-nuação do Governo. Ao longo dos anos temos tido parlamentos governamentalizados. Mas não é o que temos hoje, e isso não diminui a nossa democracia. Pelo contrário, torna-a

mais forte. Temos um governo que faz o que lhe compete, e no caso da TSU o Governo participou numa negociação onde estão os parceiros sociais e o Governo, e agora há uma segunda fase que é no Parlamento, onde cada grupo parlamentar assumirá as suas responsa-bilidades com naturalidade.

Como haverá um pacote de medidas de combate à precariedade em discussão no Parlamento, estas divergências não podem ocorrer mais vezes?

Já aconteceram no passado. Logo no início, na recapitalização e venda do Banif, não ti-vemos apoio do PCP e do BE. Assinámos posições conjuntas com os nossos parceiros e temos vindo a cumprir o que está inscrito nessas posições conjuntas, e continuaremos a cumprir até ao final da legislatura. Depois há um conjunto de outras matérias que não estavam nas posições conjuntas nas quais chegámos a acordo, como o aumento real das pensões. Há um trabalho contínuo de procura de soluções conjuntas. Agora, ne-nhum dos partidos se anulou. Há matérias onde temos posições diferentes e cada um vai batalhar por elas. Em conclusão, isso quer dizer que poderá haver matérias onde não chegaremos a acordo.

Isso não põe em causa a legislatura?

Já conseguimos aprovar dois orçamentos, que são instrumentos importantíssimos para asse-gurar a estabilidade governativa. E a nossa ex-pectativa é de que consigamos mais dois, os que faltam para o final da legislatura. Durante as sessões legislativas há matérias sobre as quais vamos acordar e outras sobre as quais vamos discordar. Faz parte desta solução. E não a torna mais frágil. Quando fomos apeli-dados de ‘geringonça’ passou a ideia de que era uma construção frágil, precária, que não era sólida. Não, é uma construção diferente. Não é frágil: já provou suficientemente a solidez da solução para não termos de continuar a ante-cipar quando é que vai acabar.

Há de facto uma viragem de fundo no

Na licença

de

parentalidade,

vou exercer

os períodos

obrigatórios

e tudo o que

PS ou é apenas uma questão tática, eleitoral, para chegar ao Governo?

Se o PS tivesse maioria absoluta, obviamente que a necessidade do entendimento seria, na melhor das hipóteses, menor – para não dizer desnecessária. Sem maioria absoluta e conse-guindo nós em conjunto tê-la, o acordo foi ne-cessário. Mas não foi irrelevante o apelo do eleitorado – na última campanha, o eleitorado dirigia-se permanentemente aos líderes do PCP, BE e PS dizendo: “entendam-se”. Tal como não foi irrelevante os quatro anos que vivemos, a necessidade de interromper aquele período austeritário, de grande insatisfação popular, de falta de esperança. Esses anos fo-ram importantes para que nos juntássemos. E há também uma leitura do caminho que a so-cial-democracia tem feito por toda a Europa.

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Os nossos partidos irmãos estão numa situa-ção terrivelmente complicada num grande número de países. Hoje há um grande debate sobre a política de alianças. Em Portugal pro-vavelmente antecipámo-nos a um processo que se vai repetir no resto da Europa. Esta sex-ta-feira vou reunir com elementos do Partido Social Democrata holandês, do presidente do Eurogrupo, que está num grande debate inter-no sobre a política de alianças. Eles vêm cá três dias para estudar a experiência portuguesa. O PS não se radicalizou. Não estamos propria-mente a implementar um programa radical. Tudo o que tem sido feito neste último ano é profundamente social-democrata.

E há uma ‘desradicalização’ do BE e do PCP?

Não há uma alteração programática do PCP e do BE, e ainda bem. Não deixaram de ter uma posição extremamente crítica sobre o euro, de defender de forma aberta e ativa a restru-turação da dívida pública. No que é essencial não alteraram as suas posições. Mas percebe-mos todos que precisávapercebe-mos de nos encon-trar no fundamental para melhorar a vida dos portugueses. Durante quatro anos, o go-verno anterior conseguiu convencer os por-tugueses de que não era possível viver me-lhor cá dentro. Num ano já conseguimos pelo menos mostrar que era possível viver melhor em Portugal. Claro que é um processo. Há muito ainda por fazer.

Esta subida dos juros não vos preocupa?

Há já algum tempo que se verifica uma subida

das taxas. Temos vivido num contexto de grande incerteza internacional, sobretudo po-lítica – sejam eleições nos EUA seja o Brexit. Temos um ano de incerteza também na UE, com três atos eleitorais em países muito rele-vantes. Por isso, pensamos que é uma incerte-za temporária no plano externo. Acresce a isto que, nos fundamentos da nossa economia, os resultados são bons. No terceiro trimestre de 2016 tivemos o maior crescimento da UE, te-mos um dos saldos primários mais elevados da Zona Euro, as exportações estão a subir. Va-mos ter um défice inferior a 3% e uma redução da dívida pública líquida. Estes resultados vão refletir-se também na perceção que os merca-dos têm sobre a dívida pública. Estamos aten-tos, mas acreditamos que os resultados inter-nos vão dar confiança.●

Num ano já

conseguimos

pelo menos

mostrar que era

possível viver

melhor em

Portugal”

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O exame à era Obama:

oito anos em números

Após dois mandatos, o primeiro presidente afro-americano dos EUA deixou esta

quinta-feira a Casa Branca.O legado - bom e mau - fica. Obama sai com uma taxa

de aprovação alta, mas há indicadores em que fica atrás de outros presidentes. LMF

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Os 12 trabalhos

de Donald Trump

Entre a surpresa da vitória e a imprevisibili-dade das opções enquanto inquilino da Casa Branca, Donald Trump passou as últimas se-manas a apresentar ideias que, diz, serão as suas prioridades a partir de hoje. Parte delas não constava do que afirmou que faria du-rante a campanha eleitoral – do mesmo modo que algumas das promessas de campa-nha não foram retomadas. O que quer dizer que o grau de imprevisibilidade se mantém. De seguro, apenas uma coisa – que é, tam-bém ela, uma surpresa: a aproximação entre Washington e Moscovo, em detrimento de Pequim, cujos bancos estão a abarrotar de tí-tulos da astronómica dívida pública norte--americana.

Previsível é também a organização de mani-festações contra a tomada de posse um pouco por todo o lado – tal como sucedeu quando, aparentemente admirado, o povo americano ‘acordou’ para os resultados eleitorais. Trump sabe, por isso, que tem pouco tempo para pro-var que consegue “make América great again”, sob pena de, não o fazendo, o país poder transformar-se num agregado ingovernável de 50 estados.

Emparedada entre o Atlântico e o novo amigo americano (a Rússia), a União Europeia parece hesitar entre a reserva face aos exage-ros verbais e de postura do homem que é con-siderado o mais poderoso do mundo e a evi-dência de que, para ele, o agregado de 28 paí-ses não conta, enquanto tal, para nada.

Acabar com o Acordo Comercial Transpacífico (TPP), assinado em 2015 com 12 países da bacia do Pacífico. O fim do acordo remete para a evidência de que Trump quer dificultar as exportações para os Estados Unidos. A suceder, será uma péssima notícia para o Acordo de Parceria Transatlântico (TTIP), que se arrisca a ser um nado-morto.

Eliminar a regulação sobre a produ-ção de energia, na tentativa de impul-sionar a produção de formas baratas de ener-gia, nomeadamente o chamado petróleo de xisto, que ‘atirou’ os EUA para o topo da pro-dução mundial. A OPEP não ficará nada satis-feita, nomeadamente a Arábia Saudita.

Reformar a administração pública para acabar com aquilo a que Trump chama regularmente “o pântano de Washing-ton DC”. É a face mais visível do populismo que, em última análise, o levou até à cadeira da presidência. Os analistas estão convencidos de que se limitará a substituir um pântano por outro.

Colocar o Departamento do Trabalho a rever os programas de atribuição de vistos de trabalho e de residência. É parte de um grupo mais vasto de iniciativas anti-imi-grantes que foi uma das chaves da campanha eleitoral, mas que Trump tem “suavizado”.

Plano integral de defesa contra cibera-taques. Donald Trump parece con-vencido de que, por via informática, o segredo passou a ser uma das coisas mais raras do mundo. Como homem de negócios que é, guerras informáticas são as únicas guerras de que Trump quer ouvir falar.

Eliminar excessos legislativos que, no mundo hiper-liberal onde Trump se move com grande à-vontade, constituem uma barreira à livre circulação de negócios difícil de entender. Obama, que estava na Casa Bran-ca quando aconteceu a crise do subprime teve de fazer precisamente o contrário. Ninguém sabe até onde Trump fará chegar o processo ‘deslegislativo’.

Aproximação à Rússia, que passa a fa-zer parte do grupo de ‘amigos próxi-mos’. A China e a Arábia Saudita (que Trump parece considerar ser o país que está por trás

do Daesh) têm lugar certo na lista dos inimi-gos. Dada a sua dimensão, é apenas um fait

di-vers, mas ninguém sabe em qual das listas vai

constar Cuba.

Ainda os inimigos: Trump quer obri-gar a China a cumprir as regras inter-nacionais, nomeadamente no que tem a ver com a produção industrial e com o fator traba-lho. O laxismo de Pequim face a estas regras faz com que os EUA percam milhões e mi-lhões de dólares.

Eleger a Alemanha e o Reino Unido como interlocutores privilegiados no conjunto da UE. Trump foi dos poucos a aplaudir o Brexit e pode muito bem ‘acenar’ à Alemanha com o apoio à sua entrada no Con-selho de Segurança da ONU. Para Bruxelas, isto é o pior dos pesadelos.

Plano de investimento público em infraestruturas, designada-mente no que respeita à recuperação da rede de autoestradas, portos e aeroportos. O mag-nata quer assim promover a criação de milha-res de postos de trabalho na construção civil, feudo tradicional dos imigrantes.

Reforma da NATO, uma organiza-ção que, segundo Trump, serve para pouco. O novo presidente acha que a NATO é um dinossauro dos tempos do pós--guerra e um bastião de velhos generais a quem ainda ninguém se lembrou de dizer que o Muro de Berlim já caiu.

Reverter o Obamacare é uma obrigação, após o que Trump dis-se sobre o assunto durante a campanha eleito-ral. O problema é que, desde então , ‘embru-lhou-se’ em declarações que tornaram a posi-ção opaca, tendo mesmo chegado a dizer que não vai fazer nada.●

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ATUALIDADE

ANTÓNIO FREITAS DE SOUSA afsousa@jornaleconomico.pt

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ATUALIDADE

O PORTUGUÊS

que foi advogado

de Donald Trump

advogado portuense Luís Miguel Novais – que, entre muitas ou-tras coisas, foi admi-nistrador da Empor-def ao tempo do mi-nistro da Defesa José Pedro Aguiar Branco, holding que abando-nou em desentendimento com a tutela por causa dos Estaleiros de Viana do Castelo – considera que a “a presidência de Donald Trump representa uma rutura clara com o

es-tablishment” que se instalou na Casa Branca

nos oito anos de Barack Obama.

Ex-advogado mandatado pela Trump Casi-no Hotel Resort e mais tarde pela Trump En-tertainment “para negociar uma situação fi-nanceira internacional que envolvia Portu-gal”, Luís Miguel Novais ficou “surpreendido” com o facto de o ‘ex-patrão’ ter avançado para a candidatura. Mas rapidamente percebeu que o novo presidente dos Estados Unidos era o homem certo para “demonstrar que é possí-vel cavalgar a anti-política” como forma de fazer política. Um pouco como fez antes Sil-vio Berlusconi em Itália com evidente eficácia – apesar de o advogado de 53 anos não ver outras semelhanças entre os dois homens.

Em entrevista exclusiva ao Jornal Econó-mico, Luís Miguel Novais disse estar con-vencido de que Trump tem uma agenda in-terna e uma agenda exin-terna. A última é cada vez mais evidente: “o inimigo não é a Rússia, mas sim o autodenominado Estado Islâmi-co”, algo que a política frouxa de Obama no que concerne ao Médio Oriente tornou opa-co. Nesse quadro, a aproximação entre Wa-shington e Moscovo percebe-se: “estamos a assistir ao fim do período pós-Segunda Guerra Mundial. A aliança assume que Pe-quim fica do outro lado da barreira: a China não vai ser um aliado dos Estados Unidos, mas a relação entre os dois países vai parecer a dos dois bêbados que se aguentam em pé encostados um ao outro: um produz dívida e o outro compra-a”.

A nova posição dos Estados Unidos na cena internacional vai obrigar, segundo Luís Mi-guel Novais, a um conjunto de alterações pro-fundas nas mais diversas frentes: “ONU, NATO, Organização Mundial do Comércio, entre outras. A entrada da China para mem-bro do conselho de Segurança da ONU foi uma alteração importante”, mas a organização agora liderada por António Guterres tem

ain-Luís Miguel Novais foi

advogado de duas empresas

do novo presidente dos

Estados Unidos. Acha que

Trump vai mudar tudo, tanto

interna como externamente.

Mas, se fosse norte

-americano, não teria votado

no ‘ex-patrão’

ANTÓNIO FREITAS DE SOUSA afsous@jornaleconomico.pt

da muito do que teve de construir face à Guer-ra Fria – e isso está totalmente ultGuer-rapassado.

A NATO é uma organização ainda mais ‘datada’: “com os Estados Unidos a pagarem 75% do orçamento, Trump não vai querer voltar a ver o espetáculo que se deu quando a Rússia invadiu a Crimeia”. Será a NATO pura e simplesmente desativada? Adiante se verá, “mas que vão rolar cabeças, isso é certo”.

Quanto à União Europeia, “os Estados Unidos apostam na sua fragmentação” – como ficou bem demonstrado pelo discurso de despedida de Anthony Gardner, embaixa-dor dos EUA junto da UE há poucos dias. E Trump já definiu os seus interlocutores eu-ropeus privilegiados: a Alemanha e o Reino Unido. O resto é paisagem. Para Luís Miguel Novais, “a União Europeia não vai desapare-cer, mas esta União Europeia vai”. A que se seguirá é uma incógnita sobre a qual nin-guém consegue, para já, discernir – mas Schengen será por certo a primeira vítima.

Para tudo o que tem a ver com política ex-terna dos Estados Unidos, Luís Miguel No-vais aconselha os interessados a estarem

O

A NATO é uma

organização

datada,

segundo Trump.

Com os EUA

a pagarem 75%

do orçamento,

“cabeças vão

rolar”

(11)

atentos a Michael Flynn, diretor da Defense Intelligence Agency entre 2012 e 2014, e verdadeira eminência parda do regime que vai tomar conta da Casa Branca!

A agenda interna

Internamente, segundo a ótica do advogado – fundador da private equity Mercadores (2006), baseada no Luxemburgo –, Trump vai avançar “para uma verdadeira revolução económica”. “Desde logo, vai fomentar o protecionismo, o que lhe permitirá avançar com a reindustrialização”. O México – o país que Trump quer separar da América do Norte através da construção de um muro – será um dos países que mais tem a perder com esta alteração de rumo: “as chamadas ‘maquilhadoras’, empresas instaladas no Mé-xico a pagar ordenados do MéMé-xico, mas a trabalhar como se fossem norte-americanas, o que se dá principalmente no setor dos componentes automóveis, vão desaparecer”. O lado bom deste protecionismo “é que permite criar emprego; e, nesse aspeto, sen-do Trump um magnata sen-do imobiliário, as

“Se votaria em

Donald Trump?

Não, não me

estava a ver

a votar na

telecracia

movida a

dinheiro”

Além das empresas de Donald Trump, Luís Miguel Novais tambémassessorou a administração Obama num caso relacionado com Portugal

obras públicas vão avançar em força”. O ad-vogado – que assina o blogue Portugal Ador-mecido – antecipa que o novo presidente “vai encher o país de obras ao nível das in-fraestruturas mais importantes: autoestra-das, portos e aeroportos”. Um maná para as empresas de construção e para a diminuição da taxa de desemprego, por muito que seja à custa de trabalho pouco qualificado – nor-malmente assegurado por imigrantes.

Luís Miguel Novais – que também asses-sorou a administração Obama num caso que tinha a ver com Portugal – acha que a toma-da de posse de Donald Trump vai ser acom-panhada por muitos protestos internos, mas “tudo isso acabará por desaparecer com o tempo”, principalmente se os resultados imediatos da política económica interna se tornarem visíveis num futuro próximo.

Impunha-se uma pergunta final: “votaria em Donald Trump?” O advogado do Porto não hesitou: “não; não me estava a ver a vo-tar na vitória da telecracia, movida a dinhei-ro”. Mas que ela chegou à Casa Branca, disso não há dúvida.●

A IMPROVÁVEL PARIDADE DO EURO-DÓLAR EM 2017

O euro-dólar na paridade é, prova-velmente, a previsão mais badala-da de 2017. O racional badala-da maior parte dos analistas que faz esta previsão assenta principalmente numa premissa: a divergência de taxas de juro europeias e norte--americanas vai pressionar o par. O racional parece fazer sentido mas, na minha opinião, se o par ainda não chegou lá, é pouco pro-vável que o faça em 2017. Nesta altura, os investidores es-tão de olhos postos em Donald Trump. O presidente eleito vai to-mar posse hoje, 20 de janeiro, e poderá divulgar no seu discurso de tomada de posse mais deta-lhes sobre as políticas que vai im-plementar. Políticas essas que podem ter implicações para a di-reção do par cambial. Trump é re-levante, como é óbvio, mas exis-tem outras dinâmicas que podem ser mais determinantes para o fu-turo do euro-dólar. Uma delas é a inflação na Zona Euro, que está a despertar… E não só devido à es-tabilização dos preços dos com-bustíveis, que poderia ser um fa-tor insuficiente para fazer a infla-ção subir de forma mais persis-tente. A paridade iria reforçar esta pressão inflacionista que já se tem vindo a intensificar (como os indicadores de dezembro su-gerem), o que , por sua vez, iria pressionar o BCE a finalizar o pro-grama de compra de ativos (QE para quem procurar uma sigla com estilo) já no final de 2017. O fim do programa iria certamente provocar uma subida das taxas de juro europeias, que, diga-se, têm bastante espaço para subir, o que traria capital de volta para a Zona Euro. Isto valorizaria o euro. Do lado do dólar, o mercado tem es-tado a descontar um cenário de política económica e monetária que não é de todo certo. Na práti-ca, o aumento das taxas de juro nos EUA e a valorização do dólar, que ocorreram desde novembro, até podem causar um pequeno abrandamento da economia nos EUA, caso Donald Trump não seja célere a implementar os estímu-los que tanto vocaliza. Isso pode-ria dissuadir a Reserva Federal de demasiadas subidas das taxas de juro. Taxas de juro abaixo do que se espera iriam depreciar o dólar norte-americano. Os mercados fi-nanceiros regem-se por cenários e probabilidades, e por isso nada é certo. Mas se o euro-dólar não chegou à paridade nos últimos dois meses, com o diferencial de taxas de juro entre a Europa e os EUA em máximos, é pouco prová-vel que o faça durante 2017. Bernardo Silva Câncio, Analista Banco de Investimento Global

Foto

(12)

ATUALIDADE

IMAGENS

As mil e uma

“caretas” de

Donald Trump

Nos debates televisivos, nos discursos públi-cos ou no meio da multidão, a campanha do novo presidente norte-americano até chegar à Casa Branca foi marcada por muitas “care-tas”: desespero, ira ou gozo, Trump adaptava as expressões faciais aos discursos incendiá-rios. Até o mito de que usava uma peruca foi testado. O apresentador Jimmy Fallon desfez o penteado de Donald Trump durante o programa de televisão “The Tonight Show” ao mergulhar as mãos no cabelo loiro do candidato republicano.

Este episódio acabou por ser encarado como um bom momento para o milionário, num programa com ampla audiência e no preciso momento em que as sondagens o aproximavam de Hillary Clinton.

Entre as diversas imagens inesquecíveis podemos destacar a do dedo em riste (em baixo). Aqui, o candidato discursava no esta-do de New Hampshire, em Julho de 2015. Ao lado, finge estar a dormir num debate com os rivais republicanos Marco Rubio e Ted Cruz.

Nesse debate, em fevereiro de 2016, Rubio foi o atacante mais feroz, investindo contra Donald Trump: “Se ele construir o muro [na fronteira com o México] da mesma maneira que construiu as Trump Towers, vai utilizar trabalho imigrante ilegal”. Já a fotografia em que segura um bebé a chorar foi amplamente

divulgada nos meios de comunicação, junta-mente com outras imagens semelhantes, em que o título escolhido foi “Babies who hate Trump” (Bebés que odeiam Trump).

Em 1988, durante uma entrevista com a apresentadora Oprah Winfrey, Donald Trump disse que provavelmente nunca concorreria à presidência dos EUA. Para uns, um pesadelo. Para outros, uma vitória. Hoje, dia 20, com ou sem “caretas”, chegou o dia em que o empresário, ator em filmes, produtor de ‘reality show’ e dono de uma fortuna avaliada em mais de quatro mil mi-lhões de dólares, toma posse como presi-dente dos EUA.●

Na caminhada até à Casa Branca,

o novo presidente norte-americano saiu

também virtorioso nas muitas “caretas”

que marcaram a campanha eleitoral.

ANTÓNIO SARMENTO asarmento@jornaleconomico.pt

As várias

expressões de

Donald Trump

marcaram a

campanha

eleitoral

norte--americana

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CRÓNICA

O Ano

do Tatu

Se o ano novo chinês é o ano do Galo, o nome não podia ter sido melhor escolhido. Vejamos: os anos do galo incluem 1933, um ano de recessão; 1981, quando o desemprego disparou na Europa e os ingleses tiveram o maior aumento do desemprego; e 1993, ou-tro ano mau da história económica europeia. Para 2017 as coisas parecem estar mal, com o sistema financeiro europeu em problemas e a subida da taxa de juro em perspetiva, a ameaçar relançar a crise da dívida soberana na generalidade dos países, endividados até à crista, que isto já passou do pescoço para cima. É caso para dizer: Grande galo!

Será que estamos condenados a ter proble-mas em 2017? Ou será que, pelo contrário, temos pela frente o princípio do fim dos nossos problemas? Os modelos de previsão económica não nos podem ajudar nisto? Como muitos de vós, tenho as minhas dúvi-das, que os modelos de previsão têm andado pior que a meteorologia: são mais as vezes que falham do que aquelas em que acertam. E foi a pesquisar o que faltava aos modelos para acertarem que me dei conta da verda-deira explicação para o crescimento econó-mico, publicada em 2011 por Tatu Westling, da Universidade de Helsínquia. Demonstra o nosso Tatu no seu paper “Male

HEMP LASTRU

Organ and Economic Growth: Does Size Matter?” que é o tamanho do órgão masculi-no que explica o crescimento. Conclui ele que no período 1960-1985 quanto maior o tamanho, menor o crescimento económico, e que só esta variável explica mais de 20% da evidência observada. Isto explica o grande desempenho (económico) de países como a Coreia do Sul ou a Índia, e a menor perfor-mance (nesta matéria) de França, Itália e Alemanha. Aliás, na própria Europa explica-ria a convergência observada até 1985 entre países do Norte e do Sul, o que poria gregos, espanhóis, portugueses e irlandeses entre os países “pequenos”. Refira-se que a França li-dera a lista mas que os dados para este país foram recolhidos por “investigadores” fran-ceses, o que pode ser relevante. Mas mais in-teressante é que este padrão se alterou em 1985, assumindo a forma de um “U” inverti-do. Pode parecer injusto que já nem este be-nefício haja de se ser pequeno, mas Ciência é Ciência; a entrada na União Europeia pode ter atrasado esta realidade para portugueses e espanhóis, mas depois de 15 anos de lua de mel, ou crescemos ou o entusiamo esmore-ceu, cá nos arrastamos como os outros. Qual é a solução para isto? Infelizmente, só os paí-ses grandes podem fazer alguma coisa: cor-tar, mas para um tamanho normal, senão é pior a emenda que o soneto.

Dirão alguns que esta teoria tem falhas. À partida, é sexista: então as mulheres não jo-gam nenhum papel no crescimento das na-ções? Não vale a pena argumentar, é Ciência. Para quê perder tempo? Eu, pelo meu lado, prefiro pensar positivo: se é verdade que muitos portugueses estão a deixar o País e a ir viver para outras bandas, espero que sejam aqueles que têm o maior órgão.●

Nota biográfica:

Hemp Lastru (n. 1954, em Praga) é sobrinho neto de Franz Kafka. Democrata convicto, ativista e lutador político, é preso várias vezes pela polícia secreta checoslovaca, tendo sido sentenciado em 1985 ao corte de uma orelha sob a acusação de “escutar às por-tas”. Abandona a política em 1999, deixando Praga para residir em Espanha. Mudou-se para Portugal em 2005 porque “gostaria de viver num país onde os processos são como descrevia o meu tio-avô nos livros.”

Os modelos

de previsão

económica têm

andado pior que

a meteorologia

Qilai

Shen/

B

(14)

SAIR COM...

JÚLIO ISIDRO

A casa destroçada

do “tipo porreiro”

Júlio Isidro surpreendeu ao aparecer acom-panhado pela mulher, Sandra, porque tem um “amor sem fim, mesmo depois do seu fim”, como explica na autobiografia que lan-çou em outubro último. Se o facto de vir acompanhado causou estranheza à primeira vista, rapidamente se tornou natural, sendo que a visita guiada aos antigos estúdios da RTP, na Alameda das Linhas de Torres, em Lisboa, foi feita com Júlio e convidados. Pa-rece sina do apresentador, que se foi cruzan-do com tanto talento e que raramente esteve sozinho no pequeno ecrã.

Para este regresso ao passado, Júlio Isidro trouxe consigo na memória Artur Agosti-nho, Joaquim Letria, João Soares Louro, Fer-nando Pessa, Henrique Mendes, António Variações, Carlos Paião, entre outros nomes, muitos deles já desaparecidos, que evocou durante o reencontro com a própria história. Antes da enorme ladeira, o portão gradea-do, cá em baixo, exibe o imperativo “Não es-tacionar”. Lido em voz alta por Júlio tem um carácter ainda mais definitivo. “Está escrito não estacionar, mas e a porta, será de pas-sar?”. A pergunta é meramente retórica. A resposta é automática: “Isto é um bocado clandestino, mas estão aqui tantos carros es-tacionados...”, comenta Júlio, com a curiosi-dade de quem volta à casa de uma vida.

Antes de se mudar para a Marechal Gomes da Costa, em Cabo Ruivo, a RTP estivera nu-mas instalações que “alugou temporariamen-te por 50 anos”, e que acumulava com a histó-rica sede da 5 de Outubro, explica o apresen-tador do programa “Inesquecível”, na RTP Memória, tentando contextualizar a emoção que começa a sentir ao subir agora uma ram-pa já tomada pela natureza selvagem.

“Foi por aqui que subi há 57 anos... Foi a pé. Era pedra, basalto”. A mulher de Júlio ajuda também a desconstruir as memórias da televisão, enquanto sobem o piso alcatroado preenchido por vegetação e ramificações. “Parece um território de guerra, é terrível olhar para isto”. Isto é o que resta dos pri-meiros estúdios da RTP, passado uma déca-da déca-da sua desativação.

O frio que se faz sentir limitaria os movi-mentos de qualquer um. Não os de Júlio, que, de quando em vez, abre os braços, quiçá tentando abraçar ou ser abraçado por algo que outrora foi também seu.

Júlio Isidro explica o passado de cada edifí-cio, agora em ruínas, com paredes que já não se lembram que fizeram parte da História da

Ao convite do Jornal Económico

para uma saída mais informal,

Júlio escolheu duas opções.

Ambas relacionadas com a RTP.

“Das duas, uma: ou vamos à Gulbenkian,

terrenos nos quais começaram

as emissões experimentais da televisão,

ou vamos aos antigos estúdios

do Lumiar. Sabe? Eu fui o homem

que fechou a porta do Lumiar”.

Optámos pela segunda. E levámos

Júlio Isidro, de novo, a subir a ladeira

dos sonhos, onde tudo foi possível

durante 50 anos. E onde havia glamour

e fantasia resta hoje abandono,

destruição e sem-abrigo.

LUÍS ALVES VICENTE geral@jornaleconomico.pt

“Parece um

território de

guerra, é

terrível

olhar para

isto”

(15)

A RTP esteve “temporariamente” no Lumiar durante 50 anos, até à mudança para as atuais instalações na avenida Marechal Gomes da Costa. Os primeiros estúdios da RTP, no Lumiar, em Lisboa, deixaram de ser utilizados há cerca de uma década. Hoje estão abandonados.

(16)

Nuno Canhoto / P alavras Ditas

O apresentador, cuja carreira está profundamente ligada à história da RTP, trabalhou nos estúdios do Lumiar durante décadas.

televisão portuguesa. Entre janelas sem vi-dro e vãos sem porta, o comunicador pede à mulher, sempre tratada por “amor”, que vá tirando fotografias, pois desde o fecho da emissão, naquelas instituições, há uma déca-da, que nunca mais voltara.

O que resta do que fora um grande edifí-cio, num dos cantos do terreno, é a ruína que mais atenção merece do apresentador de 72 anos. “Fiz um programa chamado estúdio 5, que era aqui, onde inicialmente era o arma-zém de cenários e a carpintaria. O programa não está uma ruína, mas o sítio onde eu o fiz é. É também uma ruína para a palavra sauda-de; é ruinoso porque temos a ideia de que as coisas não se degradam, de que a morte não degrada, mas degrada. A não ser que isto es-tivesse em cinzas, mas não está em cinzas, está aos bocados. Desfaz-se sozinho com o tempo... é...” – Júlio Isidro não termina a fra-se. Olha de forma contemplativa. Percebe-se a emoção no seu silêncio.

O som da conversa acrescenta mais um convidado. O mais inesperado de todos. Aquela que tinha sido a casa da televisão é agora abrigo de quem não o tem. “Boa tarde, está tudo bem?”, pergunta um homem de origem africana, reparando apenas que tinha visitas. “Entrem, venham cá”. O convite é substituído pela questão sobre se conhece a história daquele local, ao que o sem-abrigo responde afirmativamente.

“Era a RTP, não era? Pelo menos foi o que me disseram”. A história tinha-lhe sido transmitida. Contudo, os olhos daquela pes-soa ganham vida assim que reconhece o rosto que não passa despercebido a ninguém: “Júlio Isidro!”, exclama prontamente. “Você já

tra-balhou aqui!”. O tratamento ganha formalis-mo depois da resposta assertiva do apresen-tador. “Sr. Júlio Isidro, quero dar-lhe uma pa-lavra de reconhecimento.” O homem desalo-jado confessa ter feito daquele recanto o seu lar. Olha para Júlio e lança-lhe o convite para que entre naquela que outrora fora a sua casa. O convite é cordialmente rejeitado. A visi-ta guiada não pára. Aqui isto, aqui aquilo. A memória do comunicador não falha. “Aqui era a montagem de filmes, aqui era o acesso das notícias, os departamentos de informa-ção. Ali era um estúdio, mas eu não me meto lá dentro”. “Não sabemos o que nos espera”, completa Sandra.

Júlio Isidro recorre à palavra “saudade”, mas rapidamente prefere “boas memórias” para descrever o sentimento que tem pelos profissionais que preencheram aquele lugar. “Na minha área recordo o Artur Agostinho, que quando morreu foi a mesma dor de quando morreu o meu pai, o Fernando Pes-sa, o João Soares Louro…”, recorda.

“Lembro-me do formalismo que isto ti-nha”, desabafa, quase parecendo obrigado a libertar aquele comentário. “Tinha contí-nuos fardados, com identificação de número de funcionário”, justifica.

Naquelas instalações, Júlio Isidro apresen-tara um programa de aeromodelismo, onde conciliaria duas paixões, que ainda hoje pre-serva. A elas soma-se a rádio e a confissão do desejo de regressar: “Gostaria de que a fase final da minha carreia fosse feita na rádio; [gostaria] de deixar de pintar a cara, de me por bonito com fatinhos e fazer apenas rá-dio”. O objetivo é fazer como Bryan Matthew, que na Radio 2, da BBC, “todos os

sábados emite um programa com música do seu tempo”. “Eu faria com facilidade um pro-grama da música dos anos 70 e 80. Para pas-sar à prática falta apresentar o projeto a uma rádio, talvez este ano de 2017”, calcula o an-tigo locutor do Rádio Clube Português.

No seu programa certamente tocaria Va-riações e Paião, talentos que descobriu sozi-nho. Sobre as diferenças entre aquela altura e agora, a palavra de ordem é arriscar: “É preci-so que as pespreci-soas de hoje em dia não se reme-tam tanto aos estudos de mercado, às poten-cialidades de A ou de B. Ao ‘será que isto vai valer a pena?’ e ao ‘será que não vamos perder audiência?’ Há que arriscar – eu arrisquei toda a vida, se calhar com alguma inconsciência, mas ainda bem, arrisquei fazer coisas diferen-tes. Umas resultaram muito bem, outras não tão bem. Não acho que tenha feito coisas mi-seráveis”, reitera Júlio com assertividade.

Tanto tempo na antena, 57 anos de carrei-ra cumpridos no dia 16 de janeiro, provam mais do que resiliência e perseverança – evi-denciam resistência à fama. A estratégia para o conseguir “é não lhe dar importância”, algo que só “é possível tendo a cabeça suficiente-mente distante dessas coisas”. O que hoje se verifica, segundo Júlio, é “a ideia de que ser famoso é ser badalado, é ser muito fotografa-do, é ser capaz de exigir tudo no camarim. Eu penso exatamente o contrário. Nunca disse aos outros: ‘quem é que vocês pensam que são? Digo ‘quem é que eu penso que sou’”, as-segura Júlio Isidro, que não se importa de que a única impressão com que os seus interlocu-tores fiquem do apresentador mais experien-te da experien-televisão portuguesa seja a de que, “afi-nal, o Júlio é um tipo porreiro.●

“Eu faria

com facilidade

um programa

da música

dos anos 70 e 80.

Para passar à

prática falta

apresentar

o projeto a uma

rádio”

(17)

Visão, olfato,

paladar, audição

e tato. É através

dos cinco sentidos

que apreendemos

o mundo

e abrimos a porta

a sensações

e experiências

que nos ajudam

a construir

o que somos.

5

Sentidos

PALAVRA DE VIAJANTE

“América

the beautiful”

Amor e ódio, amiúde em simultâneo, parecem ser os dois sentimentos mais comuns que os EUA suscitam

uerido: Estou em Montreal, capital do Canadá (…) Saí, pois, de Nova Ior-que, e fui aos cen-tros operários da Pensilvânia. Não imagine preocupa-ções sociais – não: os nervos misteriosos que vibravam constantemente em mim com um rebate tão revolucionário, adormeceram. Os pesados dias de Cuba, os americanos, três mil léguas de mar, Nova Iorque – tudo isto se tem combinado para acalmar, sossegar o meu temperamento de conspirador! Veja ca-pitalistas sem empalidecer – e cheguei a po-der examinar uma serra ou um martelo sem sentir a necessidade de exalar um hino!”

“América the beautiful”, coletânea de rela-tos de escritores portugueses pelos EUA, or-ganizada por Carla Baptista, abre logo com Eça de Queirós, com cujo excerto começa esta crónica. Eça, na altura cônsul nas Anti-lhas Espanholas (hoje Cuba), empreende uma viagem para norte, que narra em cartas ao seu amigo Ramalho Ortigão.

Tal como hoje, entre finais do século XIX e a década de 1970, período abrangido nesta coletânea, os EUA exerciam um grande poder de atração nos viajantes, quer em viagem de lazer (como Eça de Queirós, António Ferro ou Natália Cor-reia), quer enquanto residentes, caso de Jorge de Sena. É, então, pelo olhar destes e de outros autores que percorremos clubes de jazz, a floresta de sequóias, universida-des, museus e jornais, drugstores e drive-ins, a fábrica de sonhos de Hollywood e os ar-ranha-céus de Nova Iorque.

A América, sobretudo graças ao poder da sua indústria cinematográfica, faz parte do imaginário coletivo e, quando nos confron-tamos com a realidade, ficamos com a sen-sação de estarmos dentro de um filme. Es-peremos que esta familiaridade, que simul-taneamente conforta e incomoda, e que tanto facilita e potencia a integração e ab-sorção de outros povos e outras culturas, não seja posta em causa nos próximos tem-pos. Que um país tão estimulante possa fi-car envolto nas trevas deve preocupar to-dos aqueles que defendem os direitos hu-manos, a justiça e o futuro do planeta.

Claro que estas questões já se colocaram no passado, ainda que talvez não de forma tão premente. Aliás, neste livro encontra-mos autores que abordam valores éticos e políticos, que discutem questões como qual é a fonte da felicidade dos americanos, como conciliam as noções de individualismo e de comunidade ou, ainda, como se vive com a discriminação racial e a desigualdade.

E é quando se penetra mais fundo nesta sociedade eminentemente materialista que o fascínio pode dar lugar a um certo

desen-canto. O fascínio não desaparece completa-mente, mas instala-se um certo incómodo. Natália Correia, num dos textos mais inte-ressantes desta compilação, afirma gostar das cafetarias “porque elas são representati-vamente americanas, sem pretensão de se-rem outra coisa (…). Ali, o consulente esco-lhe, serve-se, paga e sai, sem usufruir do la-tiníssimo gozo de aquecer o lugar”. E acres-centa que outro aspeto fascinante destas ca-fetarias é “a diversidade do espectáculo hu-mano”, mas que aí lhe pareceu ainda mais pungente a “tragédia da solidão dos velhos”. Amor e ódio, amiúde em simultâneo, pare-cem ser os dois sentimentos mais comuns que os EUA suscitam.●

“América the beautiful”, editado pela Tinta da China, com o apoio da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, é a sugestão de leitura desta semana da livraria Palavra de Viajante..

O MUNDO NA SUA MÃO TODAS AS PÁGINAS NO POCKET

Está a ver um grande arqui-vo cheio de dossiês com do-cumentos antigos? Esque-ça, esse tempo já acabou. Agora pode ter tudo no seu bolso.

A mais-valia da aplicação Pocket, que serve para guardar páginas de internet, é a sua função multiplatafor-ma. Pode guardar páginas de interesse – artigos mais longos, planos de viagens, informação útil sobre o tra-balho – enquanto está ao computador e, depois, con-sultá-las no smartphone. Para isso, basta adicionar a extensão da Pocket ao seu navegador, seja o Chrome, o Firefox, o Safari ou o Edge. Ainda no PC, a extensão pode ser útil pelo seu modo de leitura mais clean que apresenta, quando compa-rado com certos sites. Ao abrir a página que se preten-de ler, carrega-se no botão com o ícone da extensão, que está no lado superior di-reito, no enfiamento da bar-ra de endereço.

No smartphone, a aplicação, que tem versões iOS, An-droid e Windows Phone, permite ler as páginas guar-dadas mesmo sem internet, sendo esta a grande valên-cia da Pocket. Dentro da pá-gina, no computador, ou da aplicação, é possível criar separadores para organizar os artigos por géneros. A Pocket também cataloga textos, sendo aqueles que têm mais popularidade rotu-lados como “os melhores”. Para usufruir das funcionali-dades da aplicação, tem de entrar com uma conta de correio eletrónico ou fazer automaticamente login com uma conta gmail.

Pocket

Aplicação gratuita

Disponível em iOS, Android e Windows Phone

Q

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VINHO

EVEL 2014

No meio

da lista

está

a virtude

Real Companhia Velha acabou o ano de 2016 como tinha encerrado o precedente 2015: dis-tinguida pela prestigia-da publicação especiali-zada norte-americana “Wine Spectator” como a produtora de um dos 100 melhores vinhos do mundo. Em 2015 foi o “Porca de Murça 2013”, um ano depois, o “Evel 2014”.

Para Pedro Silva Reis, presidente da Real Companhia Velha, ”num mundo tão compe-titivo em que impera a modernidade e a ino-vação, termos uma marca centenária distin-guida com tão importante galardão é sem dúvida notável e muito meritório para toda a equipa técnica”.

Para este Evel, no meio está a virtude, porque ocupa a 50.ª posição do ranking da “Wine Spectator”, com uma classificação de 90 pontos e um preço de venda ao público a rondar os 13 dólares nos Estados Unidos da América. Em Portugal, quem muito procu-rar poderá ainda encontprocu-rar algumas garrafas a quatro euros ou cinco euros, para um vi-nho que foi lançado no mercado nacional na primavera, estando (ainda) disponível nas prateleiras.

Para vigorarem nesta shortlist, os 100

vi-nhos eleitos tiveram de passar por uma cri-teriosa seleção por parte do grupo de prova-dores da “Wine Spectator”.

A classificação é apenas um dos critérios e só os vinhos da categoria “Outstanding”, ou seja, com 90 ou mais pontos, passam à fase seguinte. A qualidade, o preço, a disponibili-dade, a relação custo-benefício e o ser consi-derado um vinho excitement completam a lis-ta de parâmetros.

A Real Companhia Velha destaca que o Evel já há muitos anos mantém sólida repu-tação num patamar de qualidade. O tinto é produzido nas vinhas localizadas nas famo-sas Quinta do Casal da Granja, Quinta do Ci-drô e Quinta dos Aciprestes, localizadas nos concelhos de Alijó, São João da Pesqueira e Vale do Tua.

Fermentado em cubas inox, o vinho esta-gia em Vila Nova de Gaia, em balseiros de carvalho francês, durante oito meses. A vindima de 2014 foi feita em condições difí-ceis, com chuva a partir de meados de se-tembro, prolongando a safra até meados de outubro, mas os vinhos mostram-se muito bonitos e frescos, caracterizando-se por se-rem vinhos mais jovens e fáceis. O Evel deste ano é brilhante, cor rubi profundo, com notas de frutos maduros, leves toques de baunilha.●

MARCA:Evel

CASTAS:Touriga Franca, Touriga Nacional, Tinta roriz ANO:2014

REGIÃO:DOC (Denominação de Origem Controlada) Douro GRAU ALCOÓLICO:13,5º PAÍS:Portugal

PRODUÇÃO:320 mil garrafas (750 ml) NOTAS:Armazene em local fresco e sem luz. Deve ser servido a uma temperatura entre 16º e 18º. Acompanha preferencialmente carnes, pastas e queijos.

LIVRO

O FALCÃO DE MALTA

O detetive

impassível, a

femme

fatale

e a estatueta

de ouro de Carlos V

A Ordem dos Hospitalários de São João Je-rusalém, uma organização que foi contri-buinte líquida para as Cruzadas, é expulsa da ilha de Rodes pelo sultão otomano Solimão, o Magnífico. A Ordem muda-se com armas e bagagens para a ilha de Creta, onde perma-nece sete anos.

Em 1530, convencem o imperador Car-los V, líder do Sacro Império Romano--Germânico, a ceder-lhes as ilhas de Mal-ta, Gozo e Trípoli. O imperador aceita com uma condição: todos os anos, a

Or-dem teria de lhe pagar o tributo de um fal-cão, fazendo sentir-lhes que Malta fazia parte de Espanha.

Com recursos vastos decorrentes dos sa-ques sistemáticos a que se dedicava, a Ordem aceita o trato. E como prova da sua gratidão a Carlos V, em vez de lhe entregar um sim-ples falcão, em versão natural, oferece ao imperador um maciço falcão de ouro, com 30 centímetros de altura, incrustado com as mais preciosas pedras.

Quatrocentos anos e inúmeras peripé-cias depois, ninguém sabe onde pára o va-lioso falcão. Ninguém, não é bem o caso, como poderão descobrir depois de lerem a trama arquitetada por Dashiel Hammett no delicioso “O Falcão de Malta”, também

A

conhecido por “A Relíquia Macabra”. No desenrolar do enredo, surge-nos um dos detetives com a história mais fulminante da ficção policial (Miles Archer), uma verda-deira femme fatale (Miss Wonderly, aliás, Miss O’Shaughnessy) e um detetive impassí-vel (Sam Spade).

Na procura da centenária estatueta an-dam ainda criminosos de diversos recortes. E não podia faltar um célebre par de polí-cias (o bom e o mau) que tentam investigar os assassinatos que vão pingando no decor-rer da genial ação engendrada por Hammett, tendo São Francisco por pano de fundo.

O suspense vai subindo à medida que estas e outras personagens se vão cruzando, sendo surpreendente o desenlace, como convém. Sam Spade foi poupado, na trama, para nos-so deleite em outras aventuras.

“O Falcão de Malta” regressou recente-mente às livrarias portuguesas pelas mãos da Livros do Brasil, uma chancela que agora pertence à Porto Editora, numa coleção que replica a famosa Coleção Vampiro, que en-cantou leitores desde o final dos anos 40 do século passado até 2010.

Esta referência da literatura policial uni-versal foi publicada pela primeira vez em 1930 e logo no ano seguinte foi passada ao cinema, mas só 10 anos mais tarde gerou outra obra-prima na tela: Sam Spade terá para sempre a pose e a voz de Humphrey Bogart, a femme fatale foi encarnada por Maryh Astor, Peter Lorre fez a sua estreia, assim como o realizador, um tal de John Houston. É considerado um dos melhores filmes de sempre.●NMS

1523.

TÍTULO:O Falcão de Malta

AUTOR:Dashiell Hammett EDITORA:Livros do Brasil TRADUÇÃO:Gonçalo Neves

(19)

MUSICA

s auscultadores sem fios MDR-1000X da Sony, com cancela-mento de ruído, permitem a quem os utiliza personalizar a experiência, atra-vés de uma solução específica da marca ni-pónica. Têm, também, uma função, deno-minada quick attention, que permite ao utili-zador interromper o que estiver a ouvir para, por exemplo, falar com alguém, sem que seja necessário retirar o equipamento da cabeça, mas apenas encostar a mão aos auscultadores.

A Sony diz que estas capacidades só são possíveis pelo desenvolvimento da

tecnolo-Uma experiência

personalizada

com assinatura

da Sony

“Bowie 70” é um tra-balho feito por fãs, como já explicou Da-vid Fonseca, produtor, instrumentista, voz e peça central deste pro-jeto, que aceitou o de-safio de juntar vozes para interpretar/rein-terpretar clássicos do camaleão do pop rock, nos 70 anos do seu nascimento.

São 12 canções mais uma; 12 vozes convi-dadas, sete mulheres e cinco homens, e, ain-da, mais uma, a de David Fonseca, que fecha o disco a interpretar Lazarus, tema do últi-mo trabalho de David Bowie, publicado imediatamente antes da sua morte, há um ano, com 69 anos.

“Bowie 70” abre com Absolute Beginners, de 1986, a cargo de Tiago Bettencourt; prosse-gue com Modern Love, do álbum Let’s Dance, interpretado por Manuela Azevedo, dos Clã;

12 vozes

reinterpretam

clássicos do

camaleão do pop

rock nos 70 anos

do seu

nascimento

TÍTULO:Bowie 70 AUTOR:David Fonseca e convidados EDITORA:Sony Music

BOWIE 70

12 fãs + 1 em tributo

GADGET

SONY

MDR-1000X

Som sob

controlo,

sem fios

O

seguindo para Let’s Dance, canção que dá nome ao álbum de 1983, aqui por Afonso Ro-drigues, conhecido como Sean Riley.

António Zambujo canta Life on Mars, do primeiro álbum da banda Spiders From Mars, que acompanhou Bowie na pela de Zi-ggy Stardust; segue-se Camané com Space Oddity, do segundo álbum do camaleão, da-tado de 1969, e que leva como título David Bowie, tal como o primeiro trabalho, de dois anos antes, Catarina Salinas, dos Best Youth, interpreta Blue Jean, de 1984; e Marta Ren

desempenha Fame, de Young Americans, de 1975.

Heroes, ainda da trilogia de Berlim, fica para a voz de Rita Redshoes; This is Not America para a de Márcia.

Ana Moura canta The Man Who Sold The World, de 1970; segue-se Starman, pela voz de Aurea, ainda do period Ziggy Star-dust; e os convidados fecham com Rui Rei-ninho a interpreter Where Are We Now.

“Bowie 70” estará à venda a 17 de feverei-ro.●RSF

gia Sense Engine, que integra técnicas exclu-sivas de análise e processamento de sinais áudio.

Os MDR-1000X são, também, os primei-ros auscultadores a integrar a tecnologia DSEE HX, para melhorar a música compri-mida de qualquer fonte para uma qualidade

de som próxima de áudio de alta resolução, mesmo sem fios.

As primeiras unidades, poucas, que chega-ram ao mercado português já desaparecechega-ram. Portanto, este topo de gama regressa às lojas no final do mês, para um segundo round, com um preço de venda ao público de 399 euros.●

B

Referências

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